A agência Fitch decidiu retirar o outlook positivo que tinha para a dívida portuguesa, que tem o rating em BB+ (o nível mais elevado dos que se consideram de alto risco). A agência de notação de crédito teme que haja uma “rutura” da coligação governativa em 2016 ou nas negociações para o Orçamento do Estado para 2017.
Eis os principais argumentos da agência de rating, que constam de um relatório divulgado esta sexta-feira:
Sobre o défice passado
A Fitch começa por dizer que “a execução orçamental ficou muito aquém dos objetivos em 2015”, tendo em conta o défice de 4,2% (incluindo custos da resolução do Banif). “Mesmo excluindo o custo extraordinário com o Banif, o défice poderia ter ficado acima de 3%”, acredita a agência de rating. Assim, “o país não irá sair do Procedimento de Défices Excessivos nesta primavera, como estava previsto”.
A Fitch critica, também, o facto de “a consolidação orçamental ter sido interrompida em antecipação às eleições de outubro”.
Sobre o défice futuro
“Os planos do governo de redução do défice em 2016 também estão em risco”, diz a Fitch, considerando que os objetivos da primeira versão do défice eram baseados em “pressupostos otimistas” para o crescimento e para a taxa de inflação. “Além disso, há alguma incerteza sobre como o novo governo vai financiar a despesa associada às reversões de política anunciadas para este ano, diz a agência de rating.
Nas suas estimativas, o défice orçamental será de 2,8% do PIB.
Sobre a solidez do governo de esquerda
A Fitch diz-se confiante de que o governo liderado por António Costa e apoiado pelos partidos da esquerda “irão manter a atitude pró-europeia que, historicamente, sempre teve”. Contudo, “atingir um equilíbrio entre o cumprimento das regras orçamentais europeias e as exigências do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista está a mostrar-se uma tarefa difícil, o que cria riscos polítivos significativos no curto prazo”.
A necessidade a aplicar mais medidas de austeridade ao longo de 2016 ou durante [as negociações para] o orçamento do Estado de 2017 pode criar um ponto de rutura na coligação.
Se regressar a incerteza política, isso irá “aumentar os riscos negativos do ponto de vista orçamental e macroeconómico”.
Sobre o crescimento e a política económica do governo
O crescimento económico em Portugal “continua num nível moderado”, diz a Fitch. A agência de rating acredita que o aumento do consumo privado, que já animou o crescimento económico na segunda metade de 2015, “deverá continuar em 2016, ajudado pela continuação da queda do desemprego, os preços mais baixos da energia e as maiores transferências monetárias para os segmentos da população com rendimentos menores”.
Porém, “os incentivos orçamentais [do governo] terão, provavelmente, apenas um impacto limitado no impulso ao crescimento, já que devem ser ofuscados pelo ambiente externo menos favorável e pelo baixo ímpeto do investimento”.
O crescimento em 2016 será de 1,6%, estima a Fitch, mais pessimista do que o governo.
O rating da Fitch continua, assim, em BB+, com perspetiva estável – não se perspetivando, assim, que saia de lixo nos próximos tempos. Portugal continuará, portanto, dependente do rating da canadiana DBRS para o financiamento direto dos bancos no BCE e para a inclusão no programa de compra de dívida pública pelo BCE.
A agência avisa, contudo, que o outlook pode voltar a cair – agora, seria para negativo — se o governo não conseguir fazer progressos na redução do endividamento e na correção dos desequilíbrios em relação ao exterior. Além disso, um crescimento menor do que o esperado levaria a dificuldades na banca e nas finanças públicas – pelo que, também por aí, a perspetiva do rating poderia voltar a cair.
Por outro lado, um aumento da confiança na “consistência na política orçamental” ou eventuais melhorias nas expectativas de crescimento no médio prazo são fatores que podem justificar decisões mais favoráveis em relação ao rating.