A informação foi avançada esta sexta-feira pelo Correio da Manhã: “Presidente do [Grupo] Lena confessa subornos a Sócrates” e dava conta de um depoimento ao Ministério Público de Joaquim Paulo da Conceição a admitir o pagamento de comissões ao ex-primeiro-ministro. Mas tanto os advogados do Grupo Lena como os de José Sócrates apressaram-se a desmentir, e Conceição já anunciou que o grupo irá “pedir para ser ressarcido pelos danos causados”, sublinhando os prejuízos que o caso tem trazido à empresa. “Estaremos a falar de muitos milhões”, afirmou o presidente do grupo.

“O Grupo Lena desenvolveu contactos [desde 2006], através de Carlos Santos Silva, de forma a procurar obter o apoio do poder político. O apoio fazia-se através de José Sócrates e eram realizados pagamentos para este último”. São estas duas frases que o Correio da Manhã atribui a Joaquim Paulo Conceição, presidente executivo do Grupo Lena desde 2010, como uma confissão de que o grupo de construção civil teria pago alegados subornos ao ex-primeiro-ministro, mas que o Miguel Pedrosa Machado, advogado de Conceição, desmente ao Observador categoricamente.

As declarações que são imputadas pelo Correio da Manhã ao meu cliente nunca foram ditas. É falso que o dr. Joaquim Paulo Conceição tenha prestado declarações dessa natureza ou tenha confessado quaisquer subornos”, afirmou ao Observador.

“O dr. Joaquim Paulo Conceição foi ouvido como testemunha, e não como arguido. Não foi a primeira vez que foi ouvido. Desde há vários anos, várias pessoas do Grupo Lena têm sido chamadas a prestar declarações e sempre prestaram toda a colaboração com a Justiça”, acrescentou.

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O próprio Joaquim Paulo Conceição afirmou, em conferência de imprensa, que “mentir descaradamente” sobre a empresa e “pôr em causa os funcionários e a minha honra e idoneidade, mentindo com frases inventadas jamais por mim proferidas é um crime que deve ser julgado e punido como todos os outros”. Durante a conferência de imprensa, o presidente do Grupo Lena sublinhou várias vezes as “inúmeras mentiras do Correio da Manhã”, questionando se a mentira é usada “para ganhar dinheiro a vender jornais”.

Recusando comentar os contornos do processo, Joaquim Paulo Conceição insistiu que “todas as referências entre aspas são falsas”. Questionado sobre o que disse verdadeiramente no depoimento no DCIAP, limitou-se a dizer: “O segredo de justiça conta para algumas pessoas“. O presidente do grupo negou qualquer favorecimento por parte do governo Sócrates, mas admitiu não conhecer os detalhes todos do processo, visto que apenas chegou à liderança do grupo em 2010.

O envolvimento do grupo no caso “está a ter consequências no relacionamento do Grupo Lena com todos os stakeholders“, devido à imagem “que está na praça pública” sobre a empresa. Por isso, o líder do grupo anunciou que irá fazer um pedido de indemnização pelos danos causados. “Já nos chegam as dificuldades pelas quais o país passa, pelas quais o setor da construção passa”, afirmou Conceição, acrescentando que a vida do grupo está transformada “num inferno”.

Num comunicado enviado às redações, o Grupo Lena refere que a manchete do Correio da Manhã “é totalmente falsa” e acusa o jornal de não ter exercido o princípio do contraditório ao contactar a própria empresa para prestar declarações. O comunicado refere ainda que a notícia ataca o próprio grupo empresarial.

“É inominável que, a pretexto de se justificarem determinadas teorias, se lance na lama a reputação de pessoas e empresas, de forma injustificada, cruel e despudorada, colocando em causa a sobrevivência de um grupo de empresas e a manutenção dos mais de dez mil postos de trabalho que, direta ou indiretamente, assegura nas várias geografias em que atua”, lê-se no comunicado.

Também os advogados de Sócrates, João Araújo e Pedro Delille, assinam um comunicado enviado às redações a informar que a notícia do Correio da Manhã é “uma mentira”.

“Neste caso a defesa teve igualmente acesso a esta parte dos autos e pode esclarecer que, nos dois depoimentos que o Dr. Joaquim Paulo Conceição prestou perante o responsável pela investigação e perante o titular do inquérito, este declarou exatamente o contrário do que é dito: o Grupo Lena nunca pagou o que quer que fosse ao eng. Sócrates, de quem nunca teve qualquer apoio político”, escreve a defesa do ex-primeiro-ministro.

O líder do Grupo Lena foi ouvido a 29 de junho. Apesar de ter sido convocado para prestar declarações como arguido, Pedrosa Machado insiste que o seu cliente foi ouvido como testemunha. O que aconteceu, ao que o Observador apurou, foi que três sociedades do Grupo Lena foram constituídas arguidas durante esse interrogatório, sendo Joaquim Paulo Conceição o seu atual representante.

A constituição de arguido dessas sociedades prende-se com a necessidade do Ministério Público interromper os prazos de prescrição sobre factos que imputa aquelas sociedades mas datados de 2006 e 2007.

“As relações entre o Grupo Lena e Santos Silva foram lideradas por Barroca”

Pedrosa Machado faz igualmente questão de afirmar que Joaquim Paulo Conceição é CEO do Grupo Lena desde o final de 2010. “Era um quadro da empresa e, no âmbito de uma profissionalização de um grupo que tem uma origem familiar, foi escolhido pelos acionistas para liderar a empresa”. Isto é, não está relacionado com os atos que a investigação da Operação Marquês imputa a Joaquim Barroca — ex-vice-presidente do Grupo Lena que é arguido no caso Sócrates por suspeitas de corrupção, fraude fiscal e branqueamento de capitais. “O dr. Joaquim Paulo Conceição nunca poderia ter produzido as declarações que o Correio da Manhã lhe imputa porque não tem conhecimento de factos que são anteriores à sua liderança”, afirma Pedrosa Machado.

Já no que diz respeito às declarações de Joaquim Paulo Conceição de que Joaquim Barroca sempre soube de tudo o que dizia respeito a alegados pagamentos de subornos a José Sócrates, o advogado apenas confirma que o atual líder do Grupo Lena afirmou que “as relações do Grupo Lena com Carlos Santos Silva sempre foram lideradas por Joaquim Barroca”, assegura.

O Correio da Manhã imputa igualmente a Joaquim Paulo Conceição declarações de que terá confirmado um alegado negócio simulado em Angola entre o Grupo Lena, Carlos Santos Silva e Hélder Bataglia — negócio esse que teria levado à transferência de 3 milhões de euros para Santos Silva. Neste ponto, Miguel Pedrosa Machado diz que Joaquim Barroca “assegurou” a Joaquim Paulo Conceição que esse valor servia para pagar comissões de negócios intermediados por Carlos Santos Silva. Por isso, diz o advogado, Joaquim Paulo Conceição “exigiu faturas que comprovassem esses serviços prestados ao Grupo Lena — as faturas estão nos autos e já foram validadas pela Autoridade Tributária”.

Miguel Pedrosa Machado assegura que o seu cliente vai apresentar na próxima semana uma queixa-crime por difamação e violação do segredo de justiça contra o Correio da Manhã.