O Cirque Du Soleil está de regresso a Lisboa no Meo Arena até 15 de janeiro. “Varekai” é o título do espectáculo, palavra de origem romena que significa “num sítio qualquer”. Interpretado por 56 acrobatas e bailarinos de 19 nacionalidades, incluindo sete músicos e dois cantores, “Varekai” inspira-se no mito de Ícaro para contar uma narrativa feita de números e arriscados.

Os 22 camiões que transportam tudo o que é necessário para montar este espectáculo chegaram na segunda-feira a Portugal, após duas semanas de férias. Os artistas recomeçaram logo de seguida o treino para “se familiarizarem com o espaço e refrescar a memória quanto à coreografia e movimentos do corpo”, contou a responsável de comunicação do circo, Julie Desmarais. “No meio de tudo isto, funcionamos como uma família”, disse.

Esta é uma das equipas do Cirque que viaja pelo mundo a apresentar diferentes espectáculos da companhia. Um conjunto de profissionais que inclui acrobatas e bailarinos mas também aqueles que ficam quase sempre nos bastidores. Por exemplo, os figurinos foram desenhados por Eiko Ishioka, estilista japonesa que venceu um Óscar para Melhor Guarda-Roupa pelo filme “Drácula” (1992) de Francis Ford Coppola. Tudo é feito à mão e foram precisas 33 mil horas de trabalho para fazer mais de 600 figurinos.

Entre os ensaios quisemos conhecer melhor algumas das figuras que fazem “Varekai”:

O diretor artístico

Bruno Darmagnac, com 50 anos, começa por explicar que o seu papel é garantir que o espectáculo “decorra nas melhores condições, independentemente do que aconteça”. A história de “Varekai” é baseada na vida de Dominic Champagne, o criador do espetáculo que num acidente partiu as duas pernas. Teve de adaptar-se e aprender a confiar nas pessoas. A sua vida mudou completamente e isso deu-lhe a ideia de criar “Varekai”, que começa exatamente com a personagem principal a cair do céu, numa queda trágica. Durante o espetáculo, Ícaro aprende a lutar novamente, “tal como fez Dominic”, explica Bruno.

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Bruno Darmagnac

Quando não está a 100% no espectáculo, o diretor artístico gosta de ler e conhecer novas cidades. “Estar longe da família é o mais difícil, mas temos de adaptar-nos a esta vida que escolhemos. Há muitas coisas que não podemos fazer mas podemos conhecer outros sítios, por isso trata-se de um equilíbrio”. Antes de trabalhar no Cirque Du Soleil, o francês estava noutro circo na Alemanha como diretor artístico. A carreira começou-a como dançarino.

O herói

Fernando Miro (de 29 anos) é porto-riquenho e interpreta a personagem “Ícaro”. Faz o espetáculo “Varekai” há dois anos mas já tinha feito parte de outras duas produções do Cirque Du Soleil (“Believe” e “Michael Jackson THE IMMORTAL World Tour”). Sempre gostou de ginástica, diz-nos: “Era a criança maluca que gostava de subir para cima de tudo”. Na adolescência começou a dançar nas ruas, hip hop e música contemporânea, e quando chegou aos 19 juntou os dois estilos e mudou-se para Las Vegas. “Sempre quis ser um performer e pensei que aquela era a altura certa” acrescentando que “estava sempre ansioso para ser artista, por isso mudei-me para os EUA”. Daí até chegar ao Cirque Du Soleil foi um instante, “fui a uma audição e meses depois ligaram-me para entrar no ‘Believe'”.

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Fernando Miro

Fernando diz-nos que o treino é muito difícil, tanto para o corpo como para a mente, mas “tudo vale a pena porque este é o meu sonho”. A vida do Porto-riquenho é passada a treinar ou a representar mas quando não está com a cabeça no espetáculo está no meio dos jogos de vídeo: “Estou sempre com o meu Game Boy onde quer que vá, faz parte do meu mundo”. Quando pode, fala com a família ou dedica-se ao desenho, outra das suas paixões.

Ainda não tem planos para o futuro mas acabou de comprar uma casa em Las Vegas, ainda que reconheça: “Infelizmente não posso viver nela mas em breve, quando decidir não fazer mais espetáculos, aí terei o meu ninho”. Fernando admite que talvez gostasse de ser diretor artístico de outros espetáculos: “Como fiz muitos, acho que tenho um bom olho, por isso estou interessado em crescer nesse aspecto.”

A protagonista

Irina Naumenko é de São Petersburgo, tem 32 anos e interpreta “A Prometida”, a personagem que será a luz-guia de “Ícaro” e o motor para a sua metamorfose. Admite que passa a maioria do seu tempo a treinar mas quando não está em digressão gosta do “essencial”: “Passar tempo com o meu filho”. Antes de chegar ao Cirque Du Soleil fazia espectáculos em teatros e eventos na sua cidade onde nasceu, onde praticava diferentes modalidades acrobáticas, entre elas o hand balance.

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Irina Naumenko

Um dia normal da sua vida começa com o aquecimento. “Depois, pratico os exercícios e por norma tenho um ensaio no palco, normalmente duram três horas. Depois aproveito para descansar.” Quanto ao futuro prefere não pensar: “Quero viver o dia de hoje porque não sei o que vai acontecer. Os treinos são muito duros mas a nossa saúde também é muito importante”.

O técnico de som (português)

Fernando Cardoso tem 30 anos, é o único português na equipa e é técnico de som no Cirque Du Soleil desde 2013. A equipa com que trabalha é responsável por todos os aspectos sonoros, do equipamento aos ensaios, da montagem à banda que acompanha os espectáculos (que têm música ao vivo).

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Fernando Cardoso

Antes de chegar ao Cirque Du Soleil, Fernando trabalhava em Portugal, em festivais mas não só. Chegou ao circo com “a infelicidade de um colega que se magoou”. “Na altura, outro colega português recomendou-me, fui à experiência e fiquei até hoje”. Como só tem um dia de folga, admite que está sempre a pensar nos espetáculos e que é difícil viver qualquer outra coisa: “Durante a tour estamos na nossa bolha e só respiramos o circo. Quando estou em casa não sou muito dado a passeios. Acho que levo isso comigo em digressão e não gosto muito de conhecer outras cidades”. Ainda assim, quando lhe perguntamos onde gostou mais de estar com o Cirque du Soleil, diz-nos sem pensar muito: “Auckland, na Nova Zelândia”.

E para lá do Cirque du Soleil? O português ainda não sabe ao certo o que irá fazer mas tem algumas ideias: “O circo é uma grande experiência mas talvez gostasse de voltar às tours de rock. Desde que tenha colunas e microfones, fico contente”.

O acrobata

Rafael Nepomuceno é brasileiro, tem 34 anos e é acrobata e dançarino. Antes de trabalhar no Cirque Du Soleil, atuava num circo tradicional no Brasil, onde fazia trampolim, equilíbrios e também dançava break dance. Chegou à companhia através de uma audição no Brasil, em 2008. “Tinha uma amiga que trabalhava no circo, ela disse-me que andavam à procura de alguém para uma determinada personagem, enviou algum material sobre mim e eles escolheram-me.”

Quando não está a trabalhar, Rafael gosta de estar com a família mas adora a oportunidade que tem para explorar outros países e outras culturas. “A cultura de cada país é um alimento para a nossa arte. Já tinha estado em Lisboa, mas agora que tenho um pouco mais de tempo vou aproveitar para ver a cidade, parece-me maravilhosa, sinto-me em casa.”

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Rafael Nepomuceno

Apesar de fazer um treino muito intensivo para o corpo, explica que não há nada que não faça por causa do espetáculo: “Acho que em tudo na vida, o importante é o equilíbrio. Faço trabalho físico há muitos anos, por isso já consigo escutar quando estou muito cansado. Hoje em dia, já sei respeitar e ir mais devagar. Às vezes até progredimos mais depressa porque temos mais consciência dos nossos limites.”

Depois do “Cirque Du Soleil”, o brasileiro quer “criar e produzir” ou então “ser treinador, ensinar os artistas mais novos”.

“Varekai” está no Meo Arena, em Lisboa, até 15 de janeiro. O preço dos bilhetes varia entre 37€ e os 75€