Cheryshev tinha acabado de marcar um golo fabuloso, contra a corrente do jogo mas daqueles que entrarão por certo no top dos melhores do Mundial. Festa russa em Sochi, o sonho reforçado de que a anfitriã podia chegar às meias-finais no estádio Luzhniki, em Moscovo, com Inglaterra. Um dia depois, percebemos que podia gerar-se ali um problema diplomático porque as relações entre ambos já conheceram melhores dias e os novos casos de exposição ao agente Novichok adensaram ainda mais as críticas e acusações mútuas; afinal, esse cenário está colocado de parte porque foi a Croácia a dar a volta nos penáltis. A dúvida, essa, é apenas onde a adepta mais especial do conjunto balcânico verá o encontro: Kolinda Grabar-Kitarovic, presidente da Croácia.

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De falta de fair play não pode ser acusada: nesse momento do 1-0 para os russos, não perdeu o sorriso e estendeu a mão a Dmitry Medvedev, primeiro-ministro do país anfitrião, para lhe dar os parabéns pela vantagem momentânea, perante o olhar aprovador de Gianni Infantino, presidente da FIFA. No entanto, este não é propriamente um filme que Grabar-Kitarovic goste muito — aliás, não perde uma oportunidade para fugir ao protocolo, vestir a sua camisola oficial da Croácia e juntar-se aos restantes compatriotas na bancada, com as preocupações em termos de segurança que tal vontade acaba por desencadear. Mas ela é assim. E é por isso que gostam tanto dela.

Davor Suker, aquele senhor que aparece sempre também na tribuna por ser o atual presidente da Federação Croata de Futebol e que era uma das principais estrelas da seleção de 1998 que acabou o Campeonato do Mundo de França no terceiro lugar, será sempre a grande paixão de todos os adeptos de futebol, que não esquecem o génio do canhoto que passou por Dínamo Zagreb, Sevilha, Real Madrid ou Arsenal. E que também teve uma história curiosa nesta partida com a Rússia, ao sair até à zona de buffet da tribuna para beber um copito de vodka e tentar acalmar os nervos durante o prolongamento. Mas é da líder do país que se fala. Muito e cada vez mais.

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Apaixonada há muitos por futebol, Grabar-Kitarovic, primeira mulher a chegar à presidência dos balcânicos depois de passagens pela NATO, pela embaixada nos Estados Unidos e pelo ministério dos Negócios Estrangeiros, não perde uma oportunidade para ir apoiar a sua seleção e, quando o faz, não passa despercebida: paga os voos do seu próprio bolso, anda sempre em classe económica e torna-se na rainha das selfies em cada percurso feito, sendo que, segundo o ABC, decidiu também descontar do seu vencimento os dias que tem estado fora e sem trabalhar. É também por isso que granjeia de um índice de popularidade tão alto, juntando a isso o facto de gostar de ver os jogos na bancada, perto dos compatriotas, como aconteceu ao longo das três partidas da fase de grupos.

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No final do encontro, após um festejo efusivo em plena tribuna (que já tinha sido apanhado por algumas câmaras nesse local quando Vida apontou o segundo golo) e de novo cumprimento a Medvedev e Infantino, desceu rapidamente ao balneário depois das grandes penalidades e foi dar os parabéns a todos os jogadores croatas pela histórica qualificação para as meias-finais do Campeonato do Mundo, sem qualquer tipo de preocupação com aquela situação sempre complicada a nível de protocolo de haver elementos de tronco nu. E lá houve mais umas selfies pelo meio dos saltos e dos cânticos que se iam multiplicando num ambiente de festa.

Aos 50 anos, casada e com dois filhos (Katatina, de 17 anos, já é campeã nacional júnior de patinagem artística), Kolinda Grabar-Kitarovic é tida como um exemplo para a própria sociedade croata (e não só): nascida numa família muito humilde, filha de um talhante, apostou tudo nos estudos, passou vários anos nos Estados Unidos, voltou ao seu país e esteve ainda em Viena, tendo frequentado Harvard e sido professora na Universidade John Hopkins. E tem outra curiosidade: entre as sete línguas que fala, uma delas é português, por ter frequentado a cadeira de Estudos Portugueses na Universidade de Zagreb (as outras são croata, inglês, espanhol, alemão, francês e italiano). Em maio, a presidente da Croácia esteve no nosso país e foi agraciada por Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente da República, com o Grande-Colar da Ordem do Infante D. Henrique.