Ao fim de três dias envoltos nas notícias de que não pagou impostos à segurança social durante cinco anos, Pedro Passos Coelho decidiu jogar todas as cartas e, para se defender, partiu para o ataque. Numa intervenção fortemente aplaudida pelo partido, Passos acusou o PS de estar por detrás daquilo a que chama de “ataques pessoais” contra si, numa altura em que se aproximam as eleições e se antevê um combate renhido. Numa alusão implícita à detenção do ex-primeiro-ministro José Sócrates, garantiu que não é um cidadão “perfeito” mas que nunca usou o cargo político “para enriquecer” ou “fazer favores”.

“Não sou nem nunca serei um cidadão perfeito, tenho as minhas imperfeições, mas por mais que remexam não encontrarão no cidadão Pedro Passos Coelho ninguém que, como primeiro-ministro, tenha usado o lugar que tinha para enriquecer, prestar favores ou viver fora das suas possibilidades”, disse, à margem do encerramento das jornadas parlamentares do PSD, no Porto.

A menos de oito meses das eleições e depois de várias tentativas de justificações sobre as dívidas à segurança social, Passos Coelho procurou associar o facto de não ter pago aqueles impostos entre 1999 e 2004 (e outras notícias semelhantes que antecipou puderem vir a público) a questões do “foro pessoal”. E arrastou as culpas para o PS, dizendo tratar-se de um “ataque” da oposição contra si próprio apenas tornado público por uma questão de “desespero” político, já que as últimas sondagens mostram que as eleições legislativas de outubro “podem não ser um passeio” para os socialistas. 

“À medida que os bons resultados aparecem, parece que um certo desespero se começa a instalar numa certa área política e, uma vez que sondagens não estão a revelar aquilo que se esperava, e que se começa a perceber que estas eleições podem não ser um passeio, verificamos que se insiste em querer atribuir relevância política a aspetos de natureza pessoal, centrados em mim próprio”, disse.

Mostrando-se “pessoalmente preparado” – “eu e toda a minha família” – para entrar num ano de eleições centrado “neste tipo de debate político”, Passos não se poupou no argumento de que o seu percurso fiscal está a ser usado como arma política. “Preferiria que pudéssemos centrar a nossa discussão na política, mas quando os nossos adversários têm pouco para oferecer, julgo que alguma chicana política possa servir alguns propósitos. Espero que não vão por aí, mas não será sob pressão nem ameaças dessa natureza que deixarei de fazer aquilo que o meu dever de consciência mandar”, acrescentou. As palmas da assistência, composta pelo grupo parlamentar social-democrata mas também pelo líder parlamentar centrista, Nuno Magalhães, sucediam-se a cada frase.

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Num ataque que também foi dirigido a “jornais e jornalistas” que estarão a “remexer na esfera privada”, ao querem expor aspetos da sua vida fiscal, o primeiro-ministro quis antecipar-se a notícias que possam surgir nos próximos dias, revelando que o seu gabinete tem sido confrontado nos últimos dias com perguntas sobre alegados atrasos na entrega de declarações fiscais que podem ter estado na origem de processos disciplinares contra o cidadão Passos Coelho no passado – e de multas consequentes.

“Talvez agora, lendo essas perguntas que me têm sido feitas [pela comunicação social], se perceba melhor os processos instaurados de gente que procurou conhecer detalhes da minha carreira fiscal”, disse, admitindo que se pode ter atrasado “muitas vezes” na entrega das declarações fiscais, ou tê-las “entregado apenas na altura em que o Estado o exigiu”. Mas garantindo que hoje não tem “nenhuma dívida ao fisco”.

A ideia que procurou passar foi de que, apesar das suas “falhas” enquanto cidadão contribuinte, e as demais que poderão vir a ser reveladas nos próximos dias, não o fez enquanto primeiro-ministro. E, nessa lógica, defendeu-se das críticas virando o jogo para o ataque ao ex-primeiro-ministro socialista, mesmo sem o nomear:

“Nunca encontrarão em mim alguém que, como primeiro-ministro, tenha usado o lugar para disfarçar ou esconder qualquer tratamento que não fosse exatamente igual ao de qualquer outro cidadão”. “E também nunca encontrarão em mim ninguém que tenha usado o seu lugar para enriquecer, prestar favores ou viver fora das suas possibilidades”. Mais: “Ninguém que tenha protegido alguém, nomeado alguém por favor, ou que estivesse andado a traficar influências ou a pressionar jornalistas para que certas notícias apareçam ou não apareçam”, acrescentou.

Depois do ataque, garantiu que voltará à sua vida “normal” quando deixar de ser primeiro-ministro. “Quando sair do lugar de primeiro-ministro, aconteça isso quando os portugueses entenderem, voltarei à minha vida normal, que não alterei em todos estes anos, pagando ao banco os empréstimos que tenho (assim a vida me ajude a fazê-lo), a tratar da família, e a viver com as minhas posses, que hoje não são maiores do que as que tinha quando iniciei o mandato”.

Sobre o país, Passos Coelho defendeu ainda que “o crescimento que temos tido não é obra do acaso” e que a economia “já não está a divergir da Europa”. “À medida que o desemprego vai, paulatinamente, baixando e o emprego começa a subir, mais se torna evidente aquilo que sabíamos há um ano, que hoje é cada vez maior e mais elevado o número de pessoas que sentem que as suas perspetivas estão bem melhores – ou, usando uma expressão em voga, bem diferentes”, afirmou Passos Coelho, numa farpa a António Costa que foi aplaudida pela audiência.

Antes de Passos falar, no entanto, o líder parlamentar Luís Montenegro já tinha dado vivas ao primeiro-ministro, num discurso de lançamento para a campanha eleitoral. Em jeito de conclusão dos dois dias de jornadas parlamentares, que foram inevitavelmente marcados pelas dúvidas que reinavam entre os deputados, nos corredores, sobre o pagamento tardio da dívida à segurança social, Montenegro quis reiterar a confiança política no presidente do partido. “Temos um líder sério, competente, determinado, com sentido de Estado e temos sobretudo um líder muito bem preparado”, disse. E continuou: “Não tenho dúvidas em dizer aos deputados e aos portugueses que o português mais bem preparado para exercer as funções de primeiro-ministro nos próximos cinco anos se chama Pedro Passos Coelho”.