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Há uma lógica por detrás de quais são os sobreviventes ou familiares que serão ouvidos primeiro
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Há uma lógica por detrás de quais são os sobreviventes ou familiares que serão ouvidos primeiro

Getty Images

Há uma lógica por detrás de quais são os sobreviventes ou familiares que serão ouvidos primeiro

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1.700 testemunhas, 330 advogados e truques para reforçar a segurança. Os detalhes do julgamento dos ataques terroristas em Paris

Com uma nova sala no Palácio de Justiça, o mega julgamento dos atentados em Paris começa esta quarta-feira. Com 3 mil pessoas por dia, será o maior de sempre na história moderna de França.

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Com milhares de testemunhas, centenas de advogados e dezenas de arguidos, o mega processo dos atentados terroristas que mataram 130 pessoas e feriram mais de 350 em Paris, a 13 de novembro de 2015, arranca esta quarta-feira. O Palácio da Justiça na Île de la Cité, que vai receber “o julgamento do século” e um dos maiores na história de França, teve mesmo de ser remodelado para acolher aproximadamente três mil pessoas por dia, entre juízes, jornalistas e familiares das 130 vítimas mortais.

Durante a fase da instrução, que durou quatro anos e envolveu 19 países, o processo foi ganhando dimensão: de acordo com o Le Monde, tem agora 542 volumes com centenas de páginas, que, caso fossem empilhados, mediriam 53 metros de altura. Este será o ponto de partida para o julgamento que deverá terminar apenas em maio de 2022, naquilo que será uma verdadeira maratona jurídica cronometrada ao minuto.

O calendário do mega processo

Durante nove meses, de terça a sexta-feira a partir das 12h30 (hora estrategicamente escolhida para evitar a pausa do almoço, fazendo com que cada pessoa seja revistada apenas uma vez — um “truque” para reforçar a segurança), serão ouvidos mais de 1.700 sobreviventes e familiares das vítimas mortais dos atentados organizados pelo Estado Islâmico. As audiências para ouvir as testemunhas vão começar a 28 de setembro e cada parte terá meia hora para falar perante os juízes. O objetivo é que diariamente sejam ouvidas 14 pessoas por dia, explica o Le Figaro.

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Atentados de Paris: o resumo do que já sabemos

A ordem pela qual serão ouvidos sobreviventes e familiares também não foi deixada ao acaso. Seguindo a ordem cronológica dos ataques na noite de 13 de novembro, foram convocados primeiro pelo tribunal aqueles que estavam nas imediações do Stade de France, depois as vítimas dos ataques nos cafés e nos restaurantes nos 10.º e 11.º bairros de Paris e, por fim, aqueles que estiveram na sala de espetáculos do Bataclan.

O Bataclan, um dos locais do ataque

IAN LANGSDON/EPA

Os 20 arguidos acusados de organizar ou financiar os ataques terroristas (incluindo os seis que vão a ser julgados à revelia) começarão a ser interrogados em novembro, mas apenas sobre os seus percursos pessoais, escolares e profissionais, além das suas ligações familiares. Os factos relativos ao envolvimento de cada um nos atentados só começará a ser discutido (se os arguidos não optarem pelo silêncio) três meses depois. Também em novembro de 2021 serão presentes a tribunal, enquanto testemunhas, os responsáveis políticos da altura, como o ex-Presidente francês François Hollande, ou antigo ministro do Interior francês, Bernard Cazeneuve.

Enquanto testemunhas, François Hollande e Bernard Cazeneuve foram convocados a falar perante os juízes

Getty Images

As alegações finais dos advogados das vítimas deverão acontecer já em abril de 2022 — e não serão curtas. Sobretudo tendo em conta que, no total, são 330 os advogados que vão intervir diretamente no processo, que defendem associações, vítimas individuais ou ainda grupos de vítimas que não se inserem nas associações.

Esta será já a reta final do julgamento, que terá, entre 2 e 5 de maio, um dos seus momentos mais importantes: ouvidas todas as partes, a acusação vai anunciar que penas entende serem as mais adequadas para cada um dos arguidos, sabendo-se que doze arriscam prisão perpétua. Só então serão feitas as alegações finais da defesa, de 6 a 23 de maio.

A decisão fica, então, na mão de cinco juízes. Absolvições ou condenações — e respetivas penas — deverão ser anunciadas a 24 e 25 de maio, uma data provisória e que poderá ser, entretanto, adiada.

Os problemas logísticos — e as obras num edifício do século XIII

Para além da complexidade judicial do processo, houve vários problemas logísticos na preparação de um julgamento para o qual poderão comparecer mais de três mil pessoas. A começar precisamente por essa dimensão inédita: até agora, não existia um tribunal em Paris que pudesse albergar tanta gente.

A escolha do espaço acabou por recair sobre o Palácio de Justiça de Paris, que data do século XIII, onde foi construída uma nova sala de audiência temporária, designada de Sala dos Passos Perdidos.

Fachada do Palácio de Paris, França
PA Images via Getty Images
Localização do Palácio de Paris, França
Getty Images
Palácio de Paris em 1856, França

Segundo o Le Monde, as obras demoraram um ano e meio e custaram 7,5 milhões de euros — sobetudo porque a nova sala teve de ser construída de acordo com os constrangimentos arquitetónicos do edifício. Embora seja temporário, este novo espaço já tem um destino seguinte: também vai receber o julgamento dos ataques terroristas de Nice, que aconteceram no dia da Bastilha, a 14 de julho de 2016.

Com capacidade logística para 550 lugares, a Sala dos Passos Perdidos, que terá uma enorme caixa de vidro onde ficarão os arguidos, ao centro, não será, no entanto, suficiente para acolher mais de três mil pessoas. Foram, por isso, ocupadas algumas salas contíguas (uma, por exemplo, para a imprensa e outra para o público) para aumentar a capacidade de acolher todos os envolvidos e interessados.

A par deste mega julgamento, a atividade do tribunal de recurso de Paris, que se localiza no Palácio de Justiça, não estará suspensa nestes nove meses. Julian Quéré, assessor do presidente desta instituição de Paris, destaca ao Le Monde que o maior “desafio” passa por permitir que todos que os que desejem acompanhar o julgamento o consigam fazer, mantendo em simultâneo “a normal atividade do tribunal de recurso”.

Justiça francesa leva 20 pessoas a julgamento extraordinário pelos atentados de 2015

De forma a proteger todos os intervenientes no processo, o julgamento decorre ainda num clima de alta segurança, com reforço do policiamento na Île de la Cité. Um perímetro de segurança vai ser instalado, a partir de agora e, pelo menos, até ao dia 25 de maio de 2022, permitindo apenas o acesso às imediações do palácio de pessoas autorizadas como vítimas, advogados ou jornalistas. Todo o trânsito será cortado nas imediações — incluindo para peões.

Um julgamento gravado e uma rádio para todo o mundo

Outras das particularidades na nova Sala dos Passos Perdidos consistiu na instalação de dez câmaras que vão filmar os nove meses de julgamento e uma espécie de régie noutra sala no Palácio da Justiça, de modo a garantir que as pessoas nas outras divisões consigam ver a transmissão em direto. As imagens não serão, porém, transmitidas pela comunicação social, servindo apenas para efeitos de registo.

Saliente-se que a filmagem de processos judiciais em França acontece raramente e apenas é autorizada em julgamentos considerados de revelo. Desde 1985, só 12 processos judiciais foram gravados, um dos quais o que aconteceu na sequência dos ataques terroristas à redação da revista satírica Charlie Hebdo.

Julgamento dos ataques terroristas ao Charlie Hebdo em janeiro de 2015 em Paris começa hoje

Para quem estiver fora do tribunal tem uma alternativa: haverá ainda uma rádio online que permitirá que os sobreviventes ou familiares das vítimas que não estão em França (há mais de 19 nacionalidades representadas no julgamento) consigam acompanhar o que se vai passando no Palácio de Justiça de Paris. Mas não em tempo real: haverá um atraso de 30 minutos, para impedir a transmissão, em caso de haver algum problema no tribunal.

Os dias após os ataques em Paris

LightRocket via Getty Images

Tal como na transmissão televisiva, esta rádio online apenas estará disponível para os envolvidos no julgamento, estando protegida por um código. O objetivo? Evitar um eventual ataque informático.

Quem são os 20 arguidos?

Neste mega processo, 20 arguidos são suspeitos de envolvimento nos atentados. Todavia, apenas um deles, Salah Abdeslam, terá tido uma participação direta — os restantes acabaram por morrer durante os ataques, foram abatidos pelas autoridades ou suicidaram-se na prisão.

Salah Abdeslam, o principal arguido

Nascido em Bruxelas, Salah Abdeslam era um dos amigos de infância de Abdelhamid Abaaoud, o mentor dos ataques de Paris, e ambos faziam parte da célula jihadista que organizou esses atentados e, mais tarde, os de março de 2016, em Bruxelas.

A 13 de novembro de 2015, Abdeslam estaria preparado para um ataque bombista suicida em Paris. Contudo, por motivos que nunca confessou, desistiu da ideia e abandonou o seu cinto de explosivos. Depois, fugiu para Bruxelas, onde conseguiu ficar durante quatro meses, tendo sido capturado após uma troca de tiros com a polícia em março de 2016, quatro dias antes dos bombardeamentos que aconteceram na capital belga. 

Salah Abdeslam enfrenta agora a justiça francesa, mas também já enfrentou a justiça belga e pode ser condenado a uma pena de prisão perpétua. No primeiro julgamento a que foi presente na Bélgica, em 2018, optou por ficar em silêncio — e deve fazer o mesmo agora. “Os muçulmanos são julgados e tratados da pior maneira possível. Eles são julgados sem misericórdia. Não há presunção de inocência”, disse na altura, segundo a Euronews.

Jornalista belga entrevistou Salah Abdeslam sem saber que era o principal suspeito dos ataques terroristas de 2015 em Paris

Para além de Salah Abdeslam, serão julgados outros 19 arguidos, alguns que financiaram os atentados, outros que os ajudaram a organizar. No Palácio de Justiça de Paris estarão presentes 14 réus. Outros seis estão desaparecidos e serão julgados à revelia.

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