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Cerca de 500 músicos utilizam o Stop como sala de ensaios e estúdio de gravações, mas há também artistas plásticos e alguns negócios
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Cerca de 500 músicos utilizam o Stop como sala de ensaios e estúdio de gravações, mas há também artistas plásticos e alguns negócios

RUI OLIVEIRA/OBSERVADOR

Cerca de 500 músicos utilizam o Stop como sala de ensaios e estúdio de gravações, mas há também artistas plásticos e alguns negócios

RUI OLIVEIRA/OBSERVADOR

Artistas lutam contra encerramento do centro comercial Stop: "Se isto fechar, o Porto perde a sua casa da música"

Edifício do antigo centro comercial tem problemas estruturais que precisam de ser corrigidos. Espaço é utilizado por cerca de 500 músicos para ensaios e gravações, muitos não têm outra alternativa.

Quem passa apenas pelo exterior do Stop não imagina os mundos que se juntam dentro deste edifício na cidade do Porto. Pelos corredores escuros, e vindo de várias salas, ecoa o som inconfundível de guitarras e baterias que deram uma nova vida a este espaço. É aqui que, atualmente, estão cerca de 500 músicos que utilizam este espaço como sala de ensaios e estúdio de gravações, mas também onde há artistas plásticos e alguns negócios que desde os anos 90 começaram a arrendar as lojas vazias deste antigo centro comercial.

“Quem vem de Lisboa, Aveiro, Viseu, etc. e está ligado à música tem que vir ao Stop. Quem vem de Espanha já vem ao Stop. Há uma procura para conhecer o que existe aqui”, conta Rui Guerra, presidente da Associação de Músicos do Stop, enquanto mostra o estúdio de gravação que construiu numa das salas. O futuro, no entanto, tem sido de incerteza e o Stop corre o risco de fechar portas por questões de segurança. Alguns já começaram a ponderar alternativas, mas há quem não tenha outra hipótese sem ser este espaço para continuar a fazer música. E todos lamentam se o desfecho for o encerramento de um dos espaços culturais mais conhecidos do Porto.

Rui Guerra, recorda a sua chegada ao Stop há cerca de 20 anos: “Já estavam cá alguns músicos, mas poucos. Fui para o último piso e ainda havia lojas abertas”. Juntamente com outros músicos, tem tentado lutar contra o encerramento deste espaço, que precisa de algumas obras para que possa ser legalizado. A história já se arrasta há quase dez anos, mas voltou a intensificar-se nos últimos dias.

Segundo a Câmara Municipal do Porto, noticiou o Jornal de Notícias (JN), o Stop tem problemas estruturais que “comprometem a segurança do edifício e de quem o frequenta”, sendo necessária a “apresentação do projeto de especialidades no processo de licenciamento”. Em causa estão obras como a instalação de sistemas de deteção de incêndio, de saídas de emergência e a execução de um projeto acústico.

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Segundo a Câmara do Porto, o Stop tem problemas estruturais que exigem um conjunto de obras para que fique legalizado

Rui Oliveira/Observador

A associação de músicos refere que este projeto já existe,  mas que não há verbas suficientes para que possa ser executado. O facto de se tratar de um espaço privado, acrescenta Rui Guerra, dificulta a situação e o acesso a apoios. “A situação vai-se prolongando porque nós não temos dinheiro. Nem nós,  músicos, nem o condomínio, nem os proprietários, porque as rendas são muito baixas e há rendas que estão pelo preço do condomínio e, portanto, os proprietários não ganham nada. Não há dinheiro”, lamenta o músico, dirigente da associação criada para tentar resolver esta situação.

O prazo dado pelo município para a apresentação do projeto, explica o responsável da associação, termina este domingo, 6 de novembro. E a esperança dos artistas do Stop está mesmo na ajuda da autarquia: “Acreditamos que a Câmara possa executar os projetos que aqui forem necessários, porque as conversações sempre foram nesse sentido. Antes da pandemia, a Câmara sempre se disponibilizou para isso. Neste momento, há realmente necessidade de resolver esta situação e a Câmara quer resolver, com toda a justiça e com toda a razão. Nós também não podemos continuar assim num edifício ilegal”.

Rui Guerra foi um dos primeiros a chegar ao Stop e é atualmente o responsável da Associação dos Músicos do Stop

Rui Oliveira/Observador

Se o Stop encerrar “perde-se muito”, avisa Rui Guerra. “Perde a cidade, perdemos nós, perde toda a gente. Isto é um bem comum. Estamos aqui todos pacificamente, fazemos a produção às horas que queremos, aquilo que nós quisermos e não incomodamos ninguém. Temos liberdade para produzir e para trabalhar tudo aquilo que nós quisermos, sem incomodar. Só isso é muito bom”, explica. Além de centenas de músicos perderem as condições para trabalharem, a própria cidade, diz, também vai sair a perder com o desaparecimento “de um espaço mítico, procurado até por quem vem de fora”.

“Este foi o único sítio na cidade onde fomos aceites”

Numa das salas escondidas pelos corredores do Stop ensaia a Batucada Radical, com ritmos brasileiros tocados por cerca de 100 pessoas. Fundada em 1994, o grupo tem como lema “Música para todos” e pretende divulgar a cultura brasileira, dando música como integração e inclusão social. A chegada ao Stop deu-se há mais de 10 anos. E daqui nunca mais saíram.

“Éramos nómadas, porque não somos propriamente silenciosos. Normalmente a Batucada tem entre 80 a 100 elementos. Este foi o único sítio onde fomos aceites e onde podemos tocar seja a que horas for, com uma, 20, 40 pessoas. Sempre cumprindo algumas regras, mas noutros sítios éramos expulsos passado pouco tempo. Este foi o único sítio na cidade onde, de facto, fomos aceites sem nenhum tipo de entrave”, explica Helena Fernandes, presidente da Batucada Radical.

O grupo não quer pensar, para já, no cenário de um possível encerramento do Stop. “Ao longo destes 28 anos conseguimos tirar pessoas de algumas situações mais ou menos infelizes e que neste momento são músicos, dão aulas ou até seguiram educação social. Isso seria terminar um ciclo que é fazer algo pela vida das pessoas”, destaca a responsável, sublinhando que ainda não foi pensada nenhuma alternativa de espaço caso o Stop feche portas.

Numa das salas escondidas pelos corredores do Stop ensaia a Batucada Radical, com ritmos brasileiros tocados por cerca de 100 pessoas

Rui Oliveira/Observador

Na mesma situação está a banda Overdoses, que nasceu há cerca de um ano. João Martins, um dos membros, admite que também não consegue pensar noutra alternativa: “Dependo muito deste espaço e, como muitas pessoas que exercem a sua atividade a um preço acessível dentro da cidade do Porto, se o STOP fechar, muitos projetos vão acabar. E isso também terá impacto na noite do Porto”, alerta, explicando que o encerramento afetaria a vida de vários músicos “que investiram quantidades exorbitantes para equipar os estúdios” e que não têm forma de o voltar a fazer noutro espaço.

“Nós não temos alternativa. Para mim e para muitas pessoas ou é isto ou não sei…porque isto é a nossa vida, é a vida de muitas pessoas que têm trabalhos que não gostam durante o dia e que depois o único refúgio que têm é isto. Vão ter que deixar de fazer algo que, no fundo, as faz sentir vivas e isso não é bom para as pessoas”, lamenta.

João Pimenta, também membro dos Overdoses explica que o Stop é “a maior concentração de artistas por metro quadrado de qualquer cidade europeia”, o que torna o espaço único. “Seria penoso se isto acabasse ou se fechasse por causa de meia dúzia de obras que têm de ser feitas. Todos estes locais que estão aqui, tudo o que está aqui dentro foi construído pelas próprias pessoas que aqui trabalham. É um caso em que foram as pessoas que fizeram o sítio”, acrescenta.

A banda tem também esperança que a Câmara do Porto possa fornecer algum tipo de apoio para evitar o encerramento. Caso isso não aconteça, acrescenta João Martins, “as pessoas vão notar a falta deste local, porque vários projetos vão desaparecer”. “Seria trágico, não só para a vida noturna mas para a vida cultural. Não sei se as pessoas querem ter uma cidade que seja um deserto cultural”, avisa João Pimenta. “Nós estamos por tudo, só não queremos é que fechem isto“, apelam ainda.

A banda Overdoses, de João Pimenta e João Martins, nasceu há cerca de um ano no Stop

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Mas nem só de música se faz o Stop. Numa das salas ao fundo do edifício, o artista plástico Avelino e escritor Guilherme Barros guarda um autêntico mundo: há telas penduradas nas paredes e no tecto e dezenas de cadernos espalhados pelas mesas. É aqui, na oficina de reparação de letras, que o artista pinta, organiza e monta as letras de madeira dos seus textos em telas a óleo. Começou há cerca de 18 anos, quando perdeu a mãe e decidiu expressar tudo o que sentia através da escrita. Chegou ao Stop há oito anos.

“Neste momento, tenho na loja do meu lado esquerdo uns músicos austríacos a trabalhar música eletrónica, do meu lado direito estão músicos de jazz e de música clássica, mais ao fundo está uma rádio, no piso de baixo está um estúdio…em todas as salas há todo o tipo de cultura que se possa beber e conhecer concentrado num espaço só”, descreve ao Observador. O stop, diz, “é um pilar da cultura da cidade”.

A notícia de um possível encerramento ainda não caiu em Avelino. “Com a estrutura toda montada, tenho aqui um ‘berbicacho’ que não sei como resolver, porque isto são peças que não são fáceis de transportar”, confessa, acreditando que “ainda há muito para se fazer no Stop”. 

O artista plástico Avelino e escritor Guilherme Barros guarda um autêntico mundo no espaço que arrendou no Stop há oito anos

Rui Oliveira/Observador

Há negócios que já pensam em alternativas: “Se o Stop fechar, o Porto perde a sua casa da música”

O bar Metalpoint chegou ao Stop há cerca de 15 anos e, desde o início, já acolheu mais de três mil concertos de bandas vindas de todos os cantos do mundo. Hugo Almeida, proprietário deste bar, recorda a história do espaço que acompanhou desde o início em que se começaram a fazer as salas de ensaio, onde também ele próprio ensaiava. Hugo também tem acompanhado a possibilidade do encerramento do Stop, uma história que vai sendo contada há cerca de 10 anos. Mas, desta vez, acredita que pode ser definitivo. “Nas outras vezes penso que era um bocado novela e aquela coisa de falar por falar. Agora, não sei porquê, acho que a coisa é mais séria”, revela ao Observador.

Questionado sobre o impacto que este encerramento poderá ter, Hugo não tem dúvidas: “O Porto perde a sua casa da música. A casa da música do Porto é esta, para todos os géneros e para toda a gente”. O responsável pelo Metalpoint conta como as bandas internacionais que recebe “ficam pasmadas com o fenómeno do Stop”, pelo facto de se conseguir concentrar num só espaço tantos músicos de diversos estilos.

O bar Metalpoint, de Hugo Almeida, chegou ao Stop há cerca de 15 anos e já acolheu mais de três mil concertos

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Se o Stop encerrar, acrescenta, a deslocalização do bar é uma possibilidade e já há algumas alternativas de espaço a serem estudadas. “Mas ainda estou para ver, porque esta história já é tão recorrente que uma pessoa nunca sabe quando é que vai acontecer e quando é que vai ser verdade”, ressalva. Hugo acredita que “se está a apertar com a parte fraca do Stop”: a parte financeira. “E isso vai ser muito difícil de combater”, lamenta.

Uma história com mais de uma década

Inaugurado em 1982 como centro comercial, desde meados dos anos 90 que o Stop passou a ser utilizado como sala de ensaios e estúdio de gravações por músicos, mas também como espaço de trabalho para outros artistas. Hoje, é um dos espaços culturais mais emblemáticos da cidade do Porto — acolhendo desde o rock alternativo ao jazz e até ateliers de pintura. Das 152 lojas existentes, 80 estão arrendadas para música.

A possibilidade do encerramento é discutida desde 2010, quando a autarquia exigiu que todas as lojas tivessem licença de utilização. Caso contrário, poderiam ter de fechar portas. O processo de licenciamento nunca chegou a ser concretizado e a incerteza ficou sempre no ar, mas as conversações com a Câmara do Porto foram-se mantendo. Em 2019 foi criada a Associação dos Músicos do Stop para tentar impedir um possível encerramento e fazer a ponte entre a comunidade de músicos e outras entidades como a autarquia.

Agora, a Câmara do Porto deu um prazo para a “apresentação do projeto de especialidades no processo de licenciamento”, para que sejam resolvidos os problemas de segurança do edifício, noticiou o Jornal de Notícias. Apesar de reconhecer o valor cultural do Stop, a autarquia lembrou que reuniu várias vezes com os seus representantes e com a administração do condomínio, no sentido de “procurar soluções viáveis”, mas alertou para o facto de que “são os proprietários das várias lojas que têm de reunir o consenso necessário para as intervenções indispensáveis para o correto funcionamento do local, por mais boa vontade que possa existir por parte do condomínio e do Município”.

Inaugurado em 1982, desde meados dos anos 90 que o Stop deixou de ser um antigo comercial, passando a ser utilizado como sala de ensaios e estúdios de gravações

Rui Oliveira/Observador

A CDU fez, entretanto, uma proposta de recomendação para ser discutida na próxima reunião da Câmara do Porto, agendada para a próxima segunda-feira, “para que se encontre uma solução estável para o STOP, visando assegurar a atividade de centenas de pessoas”. O documento indica que uma das soluções poderá passar pela “tomada de posse administrativa do STOP por parte da Câmara Municipal do Porto e/ou Ministério da Cultura, para garantir a realização de obras mínimas, visando melhorar as condições de segurança e conforto”.

A proposta, que será apresentada pela vereadora Ilda Figueiredo, defende ainda a realização das obras necessárias por piso, “assegurando, se necessário, um local alternativo temporário, para que possa continuar a percentagem de atividades afetadas pelas obras” e também “uma solução de gestão para o STOP que inclua os representantes dos músicos e que garanta as condições atuais de alojamento, designadamente as rendas”.

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