O primeiro discurso à frente do CDS
Citando Adelino Amaro da Costa, devemos ser sempre autênticos até às últimas consequências. Não nos apoquentamos com as caricaturas que uma determinada elitezinha gourmet, bem pensante intelectual nos quer colar. Estamos cá para afirmarmos as nossas ideias. De um partido que não se envergonha de si. Tem coragem para se afirmar”.
Francisco Rodrigues dos Santos antecipa o que aí vem. Sabe que, por ser novo, por defender ideias conservadoras (como aconteceu no caso da ideologia de género nas casas de banho) e por ser de direita será um alvo permanente da esquerda. O novo líder do CDS fala para a direita que se queixa de uma certa “superioridade moral” da esquerda quando fala de costumes. O centrista diz que não se importa de ser ele o alvo da caricatura, até porque o seu CDS e a sua liderança será mesmo mais de direita e mais conservadora (por oposição à de Cristas, mais ao centro e mais liberal).
Não tenho arrependimentos permanentes com a história, por isso este é o momento de o partido se reconciliar com todos os seus ex-presidentes, com Freitas do Amaral, com Adriano Moreira, com Manuel Monteiro, com Ribeiro e Castro, com Assunção Cristas. (…) Tantas vezes o CDS se mostrou maior do que qualquer resultado eleitoral. (…) Compreendo a vossa desilusão, respeito a vossa decisão, mas vamos trabalhar com todos os militantes e simpatizantes do CDS para que cada um de vós possa regressar a esta que é a vossa casa.”
Francisco Rodrigues dos Santos não vai desistir de refiliar Manuel Monteiro no partido e insiste que o CDS tem de aceitar o legado de todos os seus ex-presidentes com o mesmo respeito, de Monteiro a Cristas. Por outro lado, compreende quem deixou de votar no CDS, mas quer recuperá-los e diz ter percebido a mensagem que outros não perceberam. O “compreendo a vossa desilusão”, é o momento “Je vous ai compris” de Chicão, numa referência a um célebre discurso de De Gaulle. O novo líder quer recuperar os votos perdidos e lembra: “O fracasso não é eterno”.
O CDS é um partido que se tornará sexy não por defendermos ideias que não são as nossas, mas por estratégias de comunicação acutilantes, atuais, que suscitem interesse daqueles que nos seguem.
Depois de ter sido criticado violentamente por António Pires de Lima, que em tempos defendeu que o CDS devia tornar-se num partido “sexy”, Rodrigues dos Santos assume que também quer um CDS “sexy”. Mas de uma maneira diferente de Assunção Cristas, que queria chegar a todos os eleitores. Francisco Rodrigues dos Santos quer ser “sexy” para o eleitorado de uma “nova direita”, através do conteúdo de sempre (partido de direita, conservador) mas com uma forma mais apelativa (“estratégias de comunicação acutilantes”). Não concretizou como o iria fazer, mas na primeira vez que falou ao Congresso já tinha dito que ia dispensar a “mediação da comunicação social” para passar a mensagem. O novo líder abre aqui margem para utilizar o Facebook ou o Twitter como meio privilegiado para comunicar, como fazem diversos políticos. E com criatividade, já que foi assim que a Iniciativa Liberal conquistou votos ao CDS, com cartazes e com uma comunicação agressiva nas redes sociais.
Somos um partido popular, interclassista, de todas as regiões do nosso país. Uma implantação nacional que nos faz vibrar e nos distingue dos partidos emergentes. (…) Somos um partido que é direita, sem complexos nem tibiezas. (…) Temos um passado de que nos orgulhamos e não recebemos lições de ninguém, nem dos que chegaram há mais tempo, nem dos que chegaram há menos. (…) À direita lidera o CDS, não lidera nenhum outro partido”
O novo líder do CDS quis dizer que não tem medo do lobo mau ou dos lobos maus que são o Chega e a Iniciativa Liberal. Lembra que, ao contrário dos “partidos emergentes”, o CDS vai de Melgaço a Vila Real de Santo António, e não está apenas em eleitorados mais urbanos ou suburbanos. A falar de cima para esses partidos, quase paternalista, Francisco Rodrigues dos Santos quis mostrar que André Ventura e os liberais não têm nada para ensinar ao CDS, que antes deles serem já o era (conservador, securitário e liberal na economia). E enaltece o CDS como timoneiro deste espaço político: “À direita lidera o CDS”.
Cumpre dar sinais de união, de um partido que quer agregar, que não quer dividir. É por isso que apresentamos listas que apresentam diversas sensibilidades que se apresentaram ao congresso, mas que se souberam unir no combate aos nossos adversários políticos que não estão dentro do partido, que estão lá fora. Agradeço, em particular, a Lobo D’Ávila pela humildade. (…) Porque o CDS é muito maior do que as pequenas diferenças que esbatemos em Congresso. E ao António Carlos Monteiro por ser um vice-presidente que vai dotar o CDS da sua experiência, cultura, mundividência e conhecimento das estruturas, que serão determinantes neste processo de reorganização do partido. Permitam-me uma palavra especial a João Almeida, dirigente que muito estimamos e que continuará a ser muito útil ao nosso partido na sede parlamentar, a defender as nossas ideias, as nossas propostas e a deixar o CDS orgulhoso da sua marca.”
Francisco Rodrigues dos Santos até pode não querer a união plena, já que ter um inimigo interno ajuda a mobilizar os seus. Mas publicamente e externamente a estratégia passa por clamar por união interna. Daí que tenha dois vice-presidentes que emanam das duas principais listas (Lobo d’Ávila, que era o número um, e António Carlos Monteiro, apoiante de João Almeida que aceitou o convite de ‘Chicão’ antes de comunicar a decisão ao deputado). A integração de António Carlos Monteiro foi polémica e, claramente, os apoiantes de João Almeida votaram massivamente em branco (451 votos) na lista única para a direção. Há uma guerra surda e ‘Chicão’ sabe disso. Por isso, a primeira palavra foi para Lobo d’Ávila, que passou para o seu lado sem tropas, o que considerou um ato de “humildade”. Sobre João Almeida, o novo líder optou por destacar os dotes de deputado, sem grandes considerações sobre a unidade do partido.
O CDS [fará uma] oposição que não será uma trovoada de críticas, nem será de protesto. Uma oposição construtiva empenhada em erguer a raiz alternativa às esquerdas que nos governam. De um partido que não pede autorização à esquerda para defender os seus valores.”
Francisco Rodrigues dos Santos tem aqui um problema para resolver. Para já, diz que não será um “partido de protesto” e que não vai fazer uma “trovoada de críticas” ao Governo. O CDS de Rodrigues dos Santos irá assim optar por uma “oposição construtiva”, o que até cola com a crítica de que Cristas errou ao desgastar-se no confronto com Costa (pelo nível de agressividade). O problema é que — ao mesmo tempo que diz não querer ser o tal “Bloco de Esquerda de direita” — o novo líder promete ser um forte opositor à esquerda em matérias onde o debate normalmente se crispa. É um equilíbrio difícil que terá de fazer.
Não estarei sentado no Parlamento, mas estará um grupo parlamentar da mesma craveira de João Almeida. A minha assembleia será o país, o meu escritório será as ruas de Portugal, para depois aumentar os lugares que o CDS tem no Parlamento.
Cecília Meireles pode estar descansada: o líder voltou a repetir que não quer o lugar dela no Parlamento. A número um pelo Porto nas últimas legislativas teria de abdicar para o novo líder poder enfrentar António Costa nos debates quinzenais. Os apoiantes de João Almeida queixam-se que a campanha contra Cecília Meireles já começou antes nas redes sociais por apoiantes de Rodrigues dos Santos. Resta saber se vai manter sempre esta posição e se não vai fazer pressão para a saída. Estas declarações comprometem-no.
Seremos uma nova direita, síntese de Manuel Monteiro, de Paulo Portas e de Francisco Lucas Pires.
Francisco Rodrigues dos Santos fez duas referências no discurso a Manuel Monteiro, e outras tantas a Paulo Portas. Como projeto político, o novo líder diz querer beber do melhor que tiveram estes três líderes anteriores, que tiveram abordagens diferentes. É mais uma prova da requalificação do legado de Monteiro, muito diferente do de Portas.
O CDS, através desta nova liderança, que acompanhará o próxima ciclo de eleições autárquicas, cá estará para reforçar a implantação nacional. Um CDS que em vez de contar vereadores, passa também a contar muitos presidentes de câmara a norte, sul e ilhas.
Francisco Rodrigues dos Santos promete indiretamente conquistar mais autarquias do que em 2017. Não é fácil: os centristas conquistaram seis, quatro anos antes tinham cinco e chegaram a ter apenas uma (Ponte de Lima). Fica registada a “ambição máxima”.
Queremos lançar as bases para uma nova maioria de direita em 2023, maioria que contará. Não seremos muleta de ninguém, não seremos mordomo de nenhum outro partido. Vamos à luta, por um partido de governo. Quando o CDS merece, o povo vota no CDS.
Por falar em ambição máxima, Francisco Rodrigues dos Santos quer o CDS no Governo daqui a três anos, na sequência de “uma nova maioria de direita em 2023” que quis agora lançar. Para isso precisa do PSD, mas avisa já que não está para subserviências: “Não seremos muleta de ninguém, não seremos mordomo de nenhum outro partido”. E termina a dizer claramente que o CDS quer o poder: “Vamos à luta, por um partido de governo”.