Num congresso em que a palavra de ordem foi união e em que Luís Montenegro arrecadou uma vitória por mais de 90%, os melhores momentos dos três dias passados no Porto dividem-se entre presenças inesperadas, ausências nunca esquecidas e houve até quem não quisesse ouvir o novo presidente do PSD no discurso final. Foram muitas horas de discursos, umas tantas horas de atrasos e muitas cadeiras vazias durante muito tempo.
Prémio José Milhazes: José Alfredo Oliveira
José Alfredo Oliveira, vice-presidente da comissão política do PSD de Viana do Castelo, subiu ao púlpito para fazer a apresentação da moção sobre cooperação transfronteiriça, entre Portugal e Espanha, mas o auge o discurso haveria de ser uma citação de Manuel Fraga Iribarne, fundador do Partido Popular Espanhol, que deixou para os últimos segundos.
Num golpe à José Milhazes – na célebre tradução literal do russo para português em direto da SIC –, José Alfredo Oliveira acabou a intervenção a dizer: “Ou nos unimos, ou vai tudo com o carago”. Numa altura em que os trabalhos já se tinham tornado mais enfadonhos, conseguiu pelo menos uns segundos de atenção pelo fator surpresa.
Prémio ninja: Luís Marques Mendes
Conseguiu fintar as televisões e os jornalistas que estavam de plantão à espera de que os nomes maiores do congresso passassem, entrou pela porta dos fundos e ninguém deu pela sua chegada. Mas, na verdade, o objetivo do ninja Luís Marques Mendes não era passar minimamente despercebido. Ao contrário: o ex-líder do PSD quis carregar no efeito surpresa e a meio do dia de sábado as portas do Pavilhão Rosa Mota abriram-se de par em par para lhe permitir fazer uma entrada triunfante, anunciada com pompa pelo presidente da mesa, Paulo Mota Pinto. Debaixo de uma chuva de aplausos, Mendes ocupou a cadeira ao lado de Montenegro e, ao mesmo tempo, o lugar de senador do partido. Mendes argumenta, e é verdade, que costuma assistir ao primeiro congresso de cada novo líder – mas o carinho do partido não será de dispensar caso se aventure, como se especula, numa corrida a Belém em 2026.
Prémio figuração: Assunção Esteves
Chegou sem grande aparato, sentou-se na primeira fila ao lado de Luís Montenegro, mas foi ‘traída’ por Paulo Mota Pinto, presidente da Mesa do Congresso, que fez questão de referir que Assunção Esteves estava presente e que é a mulher social-democrata que atingiu o mais alto cargo de representantes da República, nomeadamente a presidência da Assembleia da República no período que coincidiu com a liderança de Luís Montenegro na bancada do PSD. Foi aplaudida de pé pelo Congresso. Contudo, não subiu ao púlpito, não discursou para os congressistas e deixou o apoio a Montenegro cingido à presença. Não é uma presença de somenos, até porque Rui Rio não teve a mesma sorte.
Prémio dom Sebastião: o(s) aplauso(s) para Pedro Passos Coelho
Talvez não seja um sinal animador para o PSD: o maior aplauso do congresso, no sábado, e a primeira ovação em pé, espontânea, dos delegados cor de laranja aconteceu quando se falou… de alguém que não estava na sala. Falamos, claro, de Pedro Passos Coelho, o fantasma de que o PSD não consegue (ou não quer) livrar-se. Com a entronização de Luís Montenegro chega ao poder uma direção com mais orgulho no consulado de Passos, como fez questão de recordar Carlos Reis, do PSD/Lisboa: “Um dos principais erros do PSD dos últimos quatro anos foi ter tido timidez na defesa do seu legado. Pedro Passos Coelho merece de Portugal finalmente o seu reconhecimento”. A referência deu direito a aplauso em pé e gritos de “PSD” (uma cena que se repetiria no domingo, quando passaram nos ecrãs as imagens dos antigos líderes do partido). Apesar de o pavilhão Rosa Mota ter estado, de facto, envolto em nevoeiro durante boa parte do dia, não consta que Passos estivesse por perto num cavalo branco. Terá mesmo de ser a nova direção a guiar o PSD para dias melhores.
Prémio retornados: Hugo Soares, Leitão Amaro, Balseiro Lopes, Maria Luís Albuquerque
Não são poucos os nomes que parecem renascidos das cinzas ao fim de quatro anos de rioísmo. Alguns dos homens e mulheres que faziam parte do núcleo próximo de Passos Coelho estiveram adormecidos, com aparições mais ou menos notórias, com ataques mais ou menos vocais, mas no balanço final nunca tiveram lugar nas escolhas de Rui Rio. Luís Montenegro não esqueceu quem nunca lhe virou as costas — durante os muitos anos em que ambicionou chegar ao lugar de presidente do partido — e isso valeu a nomes como Hugo Soares, António Leitão Amaro, Margarida Balseiro Lopes e até Maria Luís Albuquerque um regresso ao palco principal dos sociais-democratas.
Prémio revelação: Moedas (e a conversa com Pedro Nuno)
Não é que houvesse grande risco de o congresso – e a bolha política no geral – se esquecer da crise que pôs, esta semana, o enfant terrible Pedro Nuno Santos em confronto direto com António Costa. Mas Carlos Moedas não quis arriscar e assegurou-se de que a polémica continuava na ordem do dia quando se sentou diante dos microfones da rádio Observador e confessou que já conhecia o plano de Pedro Nuno, deixando assim duas hipóteses em cima da mesa: ou aquele era de facto o plano do Governo para o aeroporto e Costa mentiu; ou o ministro partilhou mais sobre as suas ideias com o PSD do que com o próprio primeiro-ministro. Seja como for, a história não fica melhor para o lado do Executivo; e Carlos Moedas teria consciência disso quando a partilhou. “Não tenho nada a esconder, nem Pedro Nuno Santos terá nada a esconder”, sentenciou. Só falta saber se Pedro Nuno e Costa concordam.
Prémio de consolação: Jorge Moreira da Silva
É um dos eternos candidatos à liderança do PSD – em maio decidiu mesmo ir a jogo, mas acabou derrotado por uma margem ampla por Montenegro. E o desgosto ainda está fresco: Moreira da Silva subiu ao palco cabisbaixo e fez questão de não disfarçar. Para quem não tivesse percebido que as palavras estavam a custar a sair, declarou: “Este é o discurso mais difícil da minha vida”. E justificou a própria candidatura: “Não se pode andar a vida toda a pensar no país e guardar as ideias no bolso”. Moreira da Silva ainda teve direito a uma onda de solidariedade e de aplausos quando foi apressado por Mota Pinto e pediu “a mesma tolerância que os derrotados continuam a ter nestas situações”. O congresso, mais do que o ex-candidato, pareceu já ter seguido em frente em direção ao montenegrismo, mas ainda assim assegurou-lhe o tempo necessário para poder deixar as suas explicações.
Prémio consulta às cinco: Paulo Mota Pinto
Um dia antes do arranque do Congresso do PSD, Paulo Mota Pinto fez questão de assumir que irá deixar a liderança da bancada parlamentar do partido. Já na reunião magna cumpriu o último congresso à frente da mesa. Um dos homens de confiança de Rui Rio afastava-se, em poucos dias, de dois cargos relevantes dentro do partido e foi um dos poucos que defendeu o agora ex-líder do PSD, desde logo com um ataque a Luís Montenegro: “À segunda-feira é fácil ganhar o Totobola” — uma metáfora que lembrava o novo presidente de que é fácil falar quando as eleições já passaram e quando os resultados já são conhecidos. Mas Mota Pinto fez mais do que isso: após apresentar os resultados das eleições para os órgãos nacionais, saiu de pasta na mão, entrou no carro e deixou o local mesmo a tempo de não ouvir o discurso de consagração de Luís Montenegro.
Prémio banho de ética: Rui Mata
O sonho de uns é, pelo menos neste caso, o pesadelo de outros. Se qualquer dirigente partidário quer aparecer nos noticiários em horário nobre, Rui Mata subiu ao púlpito poucos minutos depois das 20 horas – em pleno horário preferencial das televisões –, mas muito descontente com o facto. Certo que não teria grandes hipóteses de ver o discurso transmitido em direto, o congressista pediu mais transparência à mesa, sugerindo que as ordens das intervenções são propositadamente alteradas. “Inscrevi-me ontem, estou aqui à espera e só agora é que me chamam. Outros nem cá estão e já falaram”, disse Rui Mata depois de ver desfilar nas horas anteriores no palco do Congresso nomes como Carlos Moedas, Miguel Albuquerque, Miguel Pinto Luz ou Ricardo Baptista Leite.
Prémio sem fronteiras: Kong vai Chan
Se há quem lamente a realização do Congresso na cidade do Porto, obrigando a deslocações grandes, nomeadamente para quem vive no sul do país, que dirá Kong vai Chan? O vice-presidente do PSD Macau veio até ao Pavilhão Rosa Mota convidar Luís Montenegro a levar a locomotiva até ao oriente para visitar os militantes em Macau. Num discurso totalmente em inglês, que pelo adiantado da hora já foi ouvido por poucos, o militante Kong vai Chan falou da importância do PSD e sai do Porto com a garantia da visita de Montenegro.
Prémio fora de horas: os horários
O horário dos Congressos para o PSD serve, aparentemente, apenas para compor o guião dos trabalhos. Não houve um único horário cumprido pelos sociais-democratas ao longo destes dois dias de trabalho. Se no primeiro dia o atraso foi de cerca de meia hora, este domingo o início dos trabalhos atrasou mais de uma hora, tal com o horário previsto para o discurso de encerramento de Luís Montenegro. Com indicação de que falaria às 13 horas já faltavam pouco mais de 20 minutos para as 14 horas quando o novo líder dos sociais-democratas começou a falar ao 40.º Congresso.