Maria do Rosário Ferreira
77 anos
“Tive três filhos e o meu marido nunca me viu nua. Sempre ouvi a minha mãe dizer que o meu pai nunca a tinha visto nua e que uma senhora decente não mostra o corpo ao marido. Namorei quatro anos e fui sempre muito recatada. Quando casei vestia-me no quarto de banho e ia para a cama já de camisa de dormir. De manhã levantava-me, ia buscar as cuecas lavadas, ia à casa de banho lavar-me, vestia-as lá. Depois, para vestir o resto, sentava-me na borda da cama com as costas viradas para ele. Vestia o soutien e o resto da roupa e já estava. Mas ele dizer assim: “Vi a minha esposa toda nua como a mãe a pariu”, não! Isso nunca aconteceu. E agora que temos esta idade cada um vira para um lado e vestimo-nos. Agora, quando preciso que ele me lave as costas chamo-o mas fecho as pernas muito fechadinhas — que eu sou muito forte de pernas –, enrolo-me toda muito enroladinha e ele assim não vê nem as maminhas nem vê mais nada. Ele tentou ver-me nua quando éramos mais novos! Depois de ter perdido a virgindade, ele continuava a lá ir ter comigo à noite. Então, saltava um portãozinho, batia à janela — e a minha mãe sabia de tudo! Um dia tentou com um focozinho de luz que levava para ver onde punha os pés. Uma vez deitou as mãos ao foco, levantou a roupa da cama e tentou ver o que estava debaixo dela. Mas eu puxei-a, encostei os braços aos meus peitos, tracei as pernas e não viu nada de ninguém. Também não havia grande preocupação sobre métodos contraceptivos. Quando queríamos evitar ter filhos usávamos — como é que as senhoras dizem? — o coito interrompido. Quando era na altura dele, está a perceber, tirava fora. Uma vez apanhei um sustozinho, mas foi só um atraso. Sempre que acabávamos eu lavava-me com água fria para evitar engravidar. Só quando a minha filha começou a ser mulher é que comecei a estar mais atenta a essas coisas. Uma vez a minha filha disse que queria ir ao planeamento familiar e eu fiquei muito envergonhada porque no nosso tempo tudo era um tabu. Mas ela explicou-me que o planeamento familiar não tinha só a ver com namorados, que também tinha a ver com a proteção do nosso corpo. Então foi, com uma amiga, e depois disse-me que via lá senhoras da minha idade que são vistas e havia a pílula. Eu desconhecia isso tudo, mas depois começou a ser vendida nas farmácias e usei uns anos. Mas aquela pílula era muito forte: havia alturas do mês que só me apetecia chorar desalmadamente. Então parei de a tomar e desde então nunca mais usei nada.”
“Era um diamante em bruto e não sabia o valor que tinha enquanto mulher no que toca ao aspeto físico. Um dia um fulano num descapotável vermelho parou ao meu lado e disse: “500 paus, queres?” e eu nem parei porque na altura nem entendi o que era. De outra vez, estava a passar ao lado de um café com uma amiga e outro fulano disse-me: “Ai, que tesão”. Também nem percebi o que aquilo significava — nem sabia se ele tinha dito “tissão” ou “ticão” — e a minha amiga só se ria e não me explicava. Como já namorava fui perguntar ao meu namorado e ele só disse: “Daqui por um tempo digo-te”. Percebi que não havia de ser coisa boa, mas só entendi o que era quando perguntei a uma das minhas irmãs. Posso afirmar que o que de “maldade” existe ou existia foi o meu marido que me ensinou. Não se falava de sexo em minha casa. Era tão tímida que não deixava que ninguém, nem a minha mãe ou as minhas irmãs, lavassem os meus soutiens ou cuecas. Lavava-as, estendia-as e punha uma toalha por cima da roupa interior para ninguém ver. Era tão menininha, tão bonequinha na minha família, que era comedida a este nível. Um dos meus irmãos sabia que ficava tão envergonhada com a roupa interior que não havia Natal que não me desse um soutien à frente de toda a gente só para me embaraçar. Quando me veio a primeira menstruação eu comecei a gritar e a chamar pela minha mãe e um dos meus irmãos, que estava à janela, percebeu o que seria e começou a rir às gargalhadas.”
“Ele era muito chato, eu não tinha sossego. Era uma chatice, não me dava prazer nenhum. Só tinha de abrir as pernas e pronto. Só não estava sempre em cima de mim porque eu não deixava. Eu nem queria tantos filhos, mas na altura não havia televisão e tínhamos de passar o tempo de outra maneira, pois era! O meu marido chegava bêbado e eu não podia dizer que não. Dizer que não, ‘tá bónita! Sofri muito. Não sei se era por sermos primos ou o que era, a gravidez nunca ia para a frente. Tive muitos abortos. Engravidei oito vezes, mas seis não escaparam. Tinha de andar sempre em tratamento. Não bateu assim muito certo. Não era assim muito feliz, mas andava-se. Ele tinha jeito para essas coisas do sexo, tinha tinha. Só que só tinha jeito era para ele. Mas que remédio tinha eu em continuar a aceitar aquilo. Eu bem dizia que não, que aquilo fazia doer, mas ele não se importava e ia lá à mesma. Vocês agora apresentam queixa à polícia se eles tentarem à mesma? Não me diga… Naquela altura, não, senão ele fazia alguma coisa ruim. Então eu tinha acabado de abortar e ele já queria festa logo a seguir.”
“O sexo é uma descoberta do corpo. Não me apercebia como tudo acontecia porque me sentia invadida e isso era uma sensação estranha porque nós as mulheres somos muito ligada aos afetos. Nessas coisas, não somos só fêmeas e eles são só machos.Quando uma mulher cai nos braços de alguém, fá-lo por amor e pela entrega. O homem não, é pelo sexo. Fui educada num colégio de freiras e elas diziam que eu tinha vocação para ser freira também. Então fui falar com o padre para saber o que ele achava. Ele respondeu: “Tu tens é vocação para o matrimónio, para casar e ter filhos. Ou só as vacas é que se hão de casar?”. As vacas são aquelas que já têm muita experiência e é dessas que os homens gostam porque só valorizam a sensualidade de quem já passou por tudo o que eram mãos e outras coisas. Fiquei casada durante 20 anos e raramente senti prazer, mas o amor sobrevive sem ele porque às vezes bastam os beijos e os toques. Nós queremos é carinho, embora isso mude quando chegamos aos 40, 45 anos. Por essa altura divorciei-me porque ele me traía, mas também me comecei a sentir mais sensual. Antes de o deixar, tomei uma determinada iniciativa e ele só me dizia: “Não sei onde é que aprendeste isso”. Os homens nessas coisas são uns ignorantes! Só nos dão prazer se tiverem um cunho especial para a coisa ou se nós lhes ensinarmos. Eles deitam-nos as mãos à vagina e nem sabem o que estão a fazer, nem sei se eles sabem o que é um clítoris. Não sabem que é precisa delicadeza e que os dedos às vezes não bastam”.
“Gostava, gostava! Cada vez que comia, queria comer mais! Agora quer saber como era o amor e o ‘séxoglo’… Antigamente era às escuras, era sempre às escuras. Nunca vi o meu homem nu nem ela me via a mim nua. E mesmo que houvesse luzes, nós faziamos ‘séxoglo’ comigo vestida e calçada com meias e sapatos. Os meus filhos, pois, fi-los de dia vestida e calçada no meio do mato. Deitávamo-nos lá no mato e pumba. Aquilo acontecia sempre que dava jeito à minha Maria, que eu gostava daquilo e não era nada rabugenta com a grila do meu homem. Eu também andava sempre sem cuecas, que ele ia lá mesmo que eu as tivesse. E se as tinha, quando estávamos no trabalho ou ele com a ‘pinguica’, era só arredar.”
“Era vestido! Como é que havia de ser? Nus? Usávamos uma saia grande que escondia isto [aponta para o meio das pernas], mas depois tinha um buraco. Não usava cuecas e depois, quando estava a ir para a cama, punha a saia entre as pernas e fazia de cueca. Nunca fiz sexo por gosto. Detestava aquilo, nossa senhora. Não gostava do meu marido porque ele me dava muita porrada. Uma vez partiu-me a cabeça com a bebedeira. Levei sete pontos. Quando ele chegava com os copos obrigava-me a entregar-me a ele. E batia-me. Quando dizia que não, ele obrigava-me e dava-me uma cachaporra até eu nem conseguir protestar. Não era paródia nenhuma. Ai, credo…”
“Não tínhamos vergonha de nos vermos um ao outro: às vezes fazíamos amor às escuras, outras vezes com luz acesa. Mas nunca gostei de estar nua e usava sempre uma camisa de dormir. As cuecas tirava-as, mas no fim também as vestia logo. Não me sentia bem sem cuecas. É, o meu marido para essas coisas era matreiro. Agora, gostava tanto de fazer amor com ele. Não era nada um esforço. Ele também não precisava de ser desafiado, que estava sempre pronto e desejoso. Estava sempre pronto para…. Sempre! Nunca precisei de fazer uma força para ele fazer. Ele é que me procurava, eu nunca o procurei. E eu fazia-lhe a vontade sempre. Ele queria sempre agora, agora e logo, logo. E eu fazia-lhe a vontade porque, olhe, já ficava despachada para esse dia pelo menos. Ai, o que eu vou dizer… Então houve uma noite que foi sete vezes! Estavam a ser tantas que comecei a contar as vezes. Olhe, sete! Eu nem me cansava, já ia embalada. Claro que às vezes tinha prazer, outras vezes não, a menina sabe como é que estas coisas funcionam. Nem sempre se atinge o prazer, enquanto eles têm sempre. Antes eles não se importavam muito se a gente gostava ou não. Se fosse como é hoje, que eles são mais preocupados, coitadinho do meu homem. Tinha de trabalhar muito. Durante o meu casamento, não houve noite nenhuma em que não fizéssemos sexo. Só não acontecia quando eu estava com a regra. Era todos os dias. Mas olhe que isso não é bom, que às vezes queremos é paz e sossego. Nunca deixámos de fazer amor: foi até ao último dia da vida dele! Então, ele aqui no lar se pudesse pedia-me e fazíamos! Nem que ele às vezes não coisasse, mas tinha prazer. Gostava de estar agarrado a mim e aos beijos, de estar dentro de mim. E não precisava de ser sexo, se fosse só carinho chegava. Ele nunca me negava um beijo. E nunca se aborrecia com os beijos”.
“Gostava de estar com ele, então! Ele nunca me obrigava a nada e também não se chateava se eu dissesse que não me apetecia. Não era muito resmungona. De manhã é que não! Gosto muito de dormir de manhã e ele que não me acordasse por causa disso. Estava sempre cheia de sono. Mas a verdade é que me faltava prática: estava muito poucas vezes com ele e o sexo era tão espaçado que de todas as vezes me doía como se fosse a primeira vez. Eu ficava muito intrigada com isso e perguntei-lhe se ele fazia ideia do porquê de doer tanto. E ele disse: “Olha, tu, quando começas a escavar aí com uma enxada as mãos doem-te, não é? Isto é igual”".
“Gostava de estar com ele, mas depois de ter a minha filha as coisas não voltaram a ser as mesmas. O parto foi difícil e a miúda teve de ser arrancada a ferros. Só que depois os médicos não me coseram e eu fiquei toda aberta. Agora noto cada vez mais, mas na altura deixei de ter prazer e acredito que ele também tivesse menos, mas não sei porque nunca falámos disso. E dava-me muita vergonha mostrar, sentia que estava aberta até ao rabo e ficava muito envergonhada na nossa intimidade. Mas nunca tratei do assunto porque havia muita timidez.”
Felisberta Marques
79 anos
“Gostava de fazer sexo porque via que ele gostava. Dava-me prazer ver que lhe estava a dar prazer. Mas nunca sentia o êxtase. O orgasmo, não sabia o que era. Uma vez perguntei às minhas irmãs, que eram muito mais velhas do que eu e já eram casadas, como é que era. Elas disseram-me que pareciam umas cócegas, como se alguém me coçasse uma comichão muito forte. Até ao meu marido morrer não soube o que era isso. Quando fiquei viúva fiquei uns 12 ou 13 anos sem sentir nada na dita cuja, mas depois a minha filha aconselhou-me a ir ao hospital fazer um Papanicolau para ver se estava tudo bem cá dentro. Eu fui. O médico era assim novinho, bem educado, uma pessoa séria. Explicou-me tudo o que ia acontecer com um molde que ele tinha no escritório e mostrou-me o aparelho que ia enfiar. Olhe, quando ele começou o exame, a menina nem queira saber. Até mordi o lábio. Assim estava bem, assim estava bem! Nunca mais quis outra coisa”.
Maria do Carmo Costa
70 anos
“Quando o meu primeiro marido morreu, a minha família não me acolheu de volta. Eu não me importava porque não precisava deles: ele era rico e fiquei com um bom dinheiro com a morte dele. Mas estava chateada com a vida e queria vingar-me daquele machismo todo à minha volta, daquele ideal de que o nosso coração, a nossa cabeça e o nosso sexo lhes pertence. Também sabia que era bonita e que fazia parar o trânsito. Por isso usei esse meu poder de mulher. Ia para a cama com tudo o que mexia. E não os deixava saírem da cama enquanto não me dessem prazer. Houve uma vez que o meu namorado na altura já não se conseguia por de pé. E eu, chateadíssima, fui buscar um vibrador que tinha comprado numa viagem que tinha feito, e masturbei-me ali mesmo à frente dele. Ele ficou tão ofendido — porque entendeu que eu estava a dizer que um objeto me dava mais prazer que ele (e estava!) — que terminou comigo logo a seguir. Saiu da cama e só o voltei a ver já casado, mas nem trocámos palavras. Até hoje não sei se não tive uma fase ninfomaníaca, porque aquilo nem era saudável. Fiz do meu corpo um boneco. Mas já está. Agora voltei a assentar, tenho um companheiro fantástico que não me julga pelo meu passado. Somos felizes em todos os aspetos do casamento”.