Carlos Moedas teve ao seu lado em campanha o líder do partido e também o líder do outro partido da coligação. Já Fernando Medina teve consigo o líder do partido e também o outro possível futuro líder do partido. Os dois candidatos a Lisboa partilharam o palco com figurões das respectivas famílias políticas num esforço final para o apelo ao voto ou, no caso do candidato socialista, promover a governação do país a favor da sua candidatura.
Numa altura em que as sondagens mostram uma distância dilatada entre Moedas e Medina, surgiram em campanha Rui Rio e Francisco Rodrigues dos Santos, na coligação Novos Tempos, e António Costa e Pedro Nuno Santos, na coligação Mais Lisboa. Ao almoço ou no comboio, falou-se (nem que fosse nas entrelinhas) de muito mais do que o que está em jogo no próximo domingo.
PS “todo junto a trabalhar”, mas sobretudo com o futuro todo junto num minúsculo metro quadrado
Fernando Medina chega vinte minutos depois da hora marcada. Faz um compasso de espera, na Praça do Cais do Sodré, e lá aparecem os dois apoiantes do dia à sua recandidatura: António Costa, o líder do PS, e Pedro Nuno Santos, que quer ser líder do PS no futuro. Compunha-se um trio de quem há muito para dizer, mas nenhum deles quer conversas sobre o que pode ser o pós-costismo, nesta altura, nem sequer se há rivalidade entre dois deles. Ou até três. Mas é só isso mesmo que passa pelas cabeças de quem os vê nesta altura, ali todos em cima de um palco vermelho com pouco mais de um metro quadrado, ainda que a intenção socialista até seja a oposta.
O momento é de campanha para autárquicas e de apresentação de plano de transportes e, ao final da manhã desta quarta-feira, reuniram-se as condições para a prática de mais uma volta de campanha do PS feita por socialistas que também são membros do Governo. António Costa é o primeiro-ministro e Pedro Nuno Santos o ministro das Infraestrturas. E Fernando Medina o candidato que reapresenta ali o seu plano de transportes para Lisboa e também fala da requalificação da linha de comboio de Cascais, onde o acordo com o Governo — que está ali mesmo ao lado — é fundamental.
É nessa linha que seguem, logo a seguir, António Costa e Pedro Nuno Santos. Mas não sem antes ouvirem Medina dizer aos jornalistas que sim, “gosta” de ter António Costa ali, e que não, não há contendas no PS entre ele e Pedro Nuno Santos.
Quando lhe perguntam pelo ministro ali presente, o candidato a Lisboa responde com a “visão partilhada” que têm “sobre muitas matérias”e conclui: “Ao contrário de outro partidos em que se discute muito a sua sucessão e o que é que estas eleições significarão sobre o poder interno de um partido, aqui não”. Depois fez-se desentendido sobre se havia ali um “mano a mano”: “Dos três que vi aqui só um é candidato à Câmara de Lisboa”.
Já dentro do comboio apinhado com a caravana socialista que seguia rumo a Cascais, António Costa foi questionado sobre a leitura de futuro daquele momento em que Pedro Nuno e Medina se encontraram e largou a deixa que trazia preparada: “Pode ser vista como leitura do presente que o PS está todo junto a trabalhar para o que importa que é a resolução do problema dos portugueses”.
À sua frente estava sentado Pedro Nuno Santos e ao seu lado o presidente da Federação do PS de Lisboa, Duarte Cordeiro, que é também o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares que sucedeu a Pedro Nuno (depois deste ter sido o pivot da geringonça) e é um socialista muito próximo do ministro das Infraestruturas. Ainda havia um lugar vazio ali ao lado — Medina não seguiu na viagem –, mas não houve mais nenhum putativo futuro líder do PS a aproveitá-lo.
Em Algés entrou o candidato do PS a Oeiras, Fernando Curto, e em Carcavelos, o candidato socialista a Cascais, Alexandre Faria. Todos à boleia do Governo, ali vestidos de dirigentes socialistas, que reafirmam compromissos já firmados, nomeadamente para aquela mesma linha de comboios em que se deslocam e que vai ser reforçada e renovada com 34 composições, para substituir as 29 que estão atualmente em operação”, detalhou Costa ao que Pedro Nuno acrescentou: “E que não são substituídas há mais de 50 anos”.
O outro ponto das negociações do Governo que foi ali chamado à atenção, naquele percurso eleitoral, foi o da autorização do Conselho de Ministros para o lançamento de um concurso de aquisição de 117 automotoras elétricas. “É um grande investimento em mobilidade” e um “grande investimento feito em transportes públicos”, ia promovendo Costa em modo vendedor de medidas.
Foi ele que falou, ao lado dos dois candidatos locais, à chegada à estação de Cascais. Pedro Nuno ficou sempre na sombra, como está, por agora no PS. Seguiram os dois juntos, e com a comitiva que sobrou, de volta ao Cais Sodré.
No final ia já apenas os dois sozinhos, em amena cavaqueira junto à janela, mas longe dos tempos em que, na campanha de 2015, chutavam uma bola de futebol um para o outro, numa altura de estreitas relações entre os dois mesmo à beira de se formar a “geringonça” e que depois esfriou. Mas mais próximos do momento em que a bola passará de vez.
As sondagens, o feeling e o sonho do voto útil
Carlos Moedas chega sozinho, à hora certa, e antes de quase todos ao restaurante “A Gina”, no Parque Mayer, em Lisboa. Entra no espaço reservado para o feito, com mesa posta para 120 pessoas, e fica tranquilamente à conversa com os poucos apoiantes que por lá cirandavam. As estrelas da tarde, Rui Rio e Francisco Rodrigues dos Santos, chegariam 18 minutos depois das 13 horas para se juntarem ao homem que quer derrotar Fernando Medina.
Na mesa, disposta de frente para os apoiantes, o friso de dirigentes também tinha significado político. Carlos Moedas ao meio, Rui Rio à direita, Francisco Rodrigues dos Santos à esquerda. Ângelo Pereira, líder da distrital do PSD/Lisboa, José Silvano, secretário-geral do partido, e Luís Newton, líder da concelhia, à direita de Rio e por esta ordem. À esquerda de Francisco Rodrigues dos Santos estavam Filipe Anacoreta Correia, número dois na lista, Francisco Tavares, secretário-geral, e Diogo Moura, líder da concelhia do CDS/Lisboa. O grande ausente? João Gonçalves Pereira, líder da distrital do CDS/Lisboa, que acabou por ficar de fora das escolhas da coligação e rompeu em definitivo com a atual liderança.
A ausência evidente e comentada de um dos grandes responsáveis pela campanha surpreendente de Assunção Cristas há quatro anos era óbvia, previsível e comentada entredentes. Mas candidato e líderes pareciam pouco ou nada atrapalhados. Era dia de dar força a Moedas.
Despachada a grelhada mista — só Ângelo Pereira preferiu o arroz de feijão e com pataniscas –, tempo para uma curta volta dos noivos pelas mesas. Francisco Rodrigues dos Santos levantou-se e foi cumprimentar quase tudo o que era convidado. Carlos Moedas lenvantou-se e idem idem aspas aspas. Rui Rio ficou sempre sentado à mesa, conversando sobretudo para a sua direita.
Cumpridos os cumprimentos da praxe, era tempo dos discursos. Começa Francisco Rodrigues dos Santos, disserta uns longos minutos sobre a importância dos artistas e da cultura, cola Medina a António Costa nos problemas de Habitação, Saúde e Segurança, até que chega onde queria chegar.
“Só há duas opções pela frente, ou o passado ou o futuro, ou mais do mesmo com os mesmos, ou a mudança, ou socialismo ou liberdade. Aqueles que acham que votando noutra candidatura que não seja a de Carlos Moedas estão a ajudar a cidade, saibam que o voto que não seja em Carlos Moedas é um voto em Fernando Medina”, atira o líder do CDS.
Feito o apelo ao voto útil à direita — será esta a mensagem mais forte da candidatura de Carlos Moedas até ao final da campanha, bola para Rui Rio. O líder social-democrata gasta algum tempo com elogios a Carlos Moedas, o “candidato ideal” para Lisboa, até que se dedica finalmente a um dos seus desportos favoritos: o tiro ao alvo às empresas de sondagens.
Percebe-se porquê: esta quarta-feira vai ser divulgada uma grande sondagem para a Câmara Municipal de Lisboa e os rumores que vão circulando nos circuitos da candidatura são tudo menos positivos para Carlos Moedas. A distância para Fernando Medina continua muito dilatada.
Rio não é homem de acreditar nas sondagens e dá o exemplo alemão — onde as sondagens de todas as empresas têm um padrão constante — para questionar a credibilidade e a independência das sondagens.
“Aqui numa semana dão mais 20% ao candidato A, na seguinte mais 7% ao candidato B. Isto, desculpem-me o termo, é uma vigarice, algumas sondagens são encomendadas, tudo bem, mas mesmo as que não são encomendadas. Aqui é de qualquer maneira, por um lado, e as outras são compradas”, acusa Rio.
Sem se alongar em grandes apelos ao voto em Moedas, Rio remata: “Quem vai ganhar? Não sabemos, o meu feeling é que ganha o Carlos Moedas e é isso que temos de continuar a fazer até dia 26 de setembro.”
Chega finalmente a vez do protagonista da tarde. Carlos Moedas não perde muito tempo com especulações sobre sondagens ou estados de espírito, e retoma o apelo ao voto útil. “Faltam quatro dias para ganharmos Lisboa. Se querem mudança, só podem votar em Novos Tempos/Carlos Moedas. Não vale a pena votarem em partidos que vão para Medina”, remata o social-democrata.
Estava despachado o almoço com os líderes, que seguiram para outras paragens. Rodrigues dos Santos foi o primeiro a despedir-se de Moedas, colando as mãos à cara do candidato. Rio ainda ficou para um café e melão na companhia do candidato. Só voltarão a Lisboa no dia 26, para acompanharem os resultados eleitorais. Moedas terá de cumprir a reta final de campanha sem a ajuda dos líderes.