Quando era miúda, Mariana Secca fez uma lista com uns quantos países por onde iria ficar, pelo menos um mês por ano. Depois de um curso na Berklee College of Music, uma tour com Jacob Collier, singles, álbuns, colaborações no Instagram com Mayra Andrade ou Eric Clapton e de uma vitória no Festival da Canção deste ano, a cantora e compositora portuguesa, que dá pelo nome de Maro, já riscou uns quantos países. Estados Unidos da América, Brasil, Paris.
Aos 27 anos, quer continuar a atirar-se de cabeça para tudo na vida. Sabe o que quer, com quem quer estar e o que quer da música. “Não sou muito fã de competição no mundo da música. Não faz sentido. A arte é tão abstrata, que pode ser boa para uns e má para outros. É tudo tão abstrato… vou ver isto como uma oportunidade de cantar com gente amiga e mostrar o meu trabalho. Mas, no final de contas, faço-o pela música”, diz.
É com a sua “saudade, saudade”, escrita e desenhada para o avô, que vai até à Eurovisão em Turim, depois de ter obtido a pontuação máxima em Portugal. Não precisa de ganhar, nem lhe interessa muito a competição que encontra num festival desta dimensão — aliás, que reconhece na indústria musical. Vale-lhe uma mãe, professora de música, que sempre a apoiou.
Porque na carreira que vai construindo, que começou verdadeiramente em 2018 quando terminou os estudos e foi para Los Angeles viver a liberdade à americana, o que importa é continuar a ir. Mesmo que seja com pouco dinheiro. Que lhe valha a voz e a atitude. “Guardei seis mil euros, enviei metade para uma amiga que precisava de terminar os estudos. Encontrei um quarto por 900 dólares e ainda comprei um carro por mil dólares. Fiquei com 200 dólares”, diz. Certo, mas logo na semana a seguir já estava a trabalhar na MSFTS dos filhos de Will Smith, a dar aulas de piano. Sorte e engenho. Há de voltar para LA para “bater o pé à indústria”.
[a atuação de Maro na final do Festival da Canção:]
Dedicou esta “saudade, saudade” ao seu avô. A música consegue preencher o vazio das pessoas que nos deixam?
O vazio continua lá. A vida vai acontecendo à volta. Essa sensação de falta está lá sempre. A música ajuda, claro. Havia uma ligação muito direta com o meu avô, porque o vi durante anos a tocar piano, adorava música brasileira. Por haver esta conexão mais direta, de certa maneira, ajuda.
O seu avô é quem está mais presente na sua memória musical?
Também. A minha mãe é a relação mais forte, porque é professora na Escola Superior de Música de Lisboa. Era quem nos cantava quando éramos pequenos, quem nos pôs a estudar no Conservatório, sempre houve essa exposição forçada dela, porque achava que era importante para a nossa formação. Mas havia sempre o piano em casa dos avós, um Steinway vertical lindo. Quando íamos lá, tocávamos.
Não era algo sagrado, então. Fazia parte da partilha.
Sim. Tinha um órgão onde tocávamos também. Houve sempre essa partilha. Nunca foi algo de “não podem tocar”.
A música estava ligada então a uma ideia de brincadeira.
De certa maneira, sim. Era mais o lado sério, mas de paixão. De surpresa, de quão incrível a música podia ser. O quanto é possível sentir quando se ouve coisas boas.
Foi a neta que acabou por ter uma ligação mais forte com a música.
Com carreira investida, sim. Somos dez primos.
Quase uma equipa de futebol.
Neste caso tínhamos de chamar a minha avó para guarda-redes. Os meus dois irmãos têm uma relação muito forte com a música, só que não fizeram carreira. A minha prima mais velha é cantora lírica, no coro da Gulbenkian, teve uma vida diferente da minha, mas também seguiu esse caminho. Mesmo os que não seguiram, têm essa relação por causa dessa exposição, desse mundo criado pelo meu avô lá em casa.
Falemos da sua mãe. O que é que lhe disse sobre o Festival da Canção?
Ficou assustada no início. Não é que seja contra, mas percebeu que era intenso que, de repente, as pessoas estão expostas a muitas críticas. E percebo, eu concorri com mais 19 artistas que têm os seus fãs, e isso assustou-a. Uma coisa é fazer o meu projeto com as minhas pessoas, outra é entrar na televisão onde levo com imensa gente que não sabia quem eu era. Há quem não goste, está tudo certo, mas, como mãe, há aquela proteção. Não é que julgue o tipo de música, é mais esse medo de não me querer ver desanimada porque o mundo me caiu em cima. Mas está tudo a correr bem, também não estou a ler muita coisa.
Deu-lhe algum conselho?
Não. Sempre me apoiou muito. Há dois anos disse-me algo que não me esqueci: tenho reparado que todas as escolhas são muito certas. Percebi que a minha mãe confia no que quero fazer.
Existia essa dúvida?
Não, nunca houve. Mas também nunca tinha havido esta confirmação tão direta. Disse-o com muito orgulho. Às vezes vê o final e percebe que eu vi algo que ela não viu. É uma segurança e um orgulho familiar que, por mais que ela faça música, confia.
Essa confiança dá um certo embalo para o que vem a seguir.
Sim. Fui fazendo o que faz sentido para mim, vou de cabeça, se não der não dá. Mas de certeza que se não me apoiassem, se fossem contra, isso teria um peso. Tornaria tudo mais difícil, com uma certa dor ou tristeza. Como se fosse fazer para provar algo. E assim, não. Não preciso de provar nada a ninguém.
Já tinha ponderado entrar no Festival da Canção? Porquê agora?
Já tinha sido convidada nos últimos três anos pelo Nuno Galopim, só que nunca deu certo, não estava disponível. Honestamente, nunca pensei que fosse fazer isto. Não queria ser exposta ao público geral, mas sim ir fazendo a minha cena. Quem descobre, gosta, fica, e quem não gosta, passa e não fica. Está tudo certo. Mas, por alguma razão, o ano passado, fui convidada e pensei: isto é mesmo antes do lançamento do meu álbum. Não sou conhecida em Portugal, logo, podia ser uma boa oportunidade de mostrar o meu trabalho e seguir para o próximo capítulo. Os timings batiam certo. Se o Nuno não tivesse perguntado uma quarta vez, não tinha acontecido.
Para quem se atira sempre de cabeça, aqui já houve alguma ponderação. É estratégia?
Sim. Não tanto de uma maneira global, mas mais por ser Portugal. Se fosse do mundo, não teria feito, nunca. Estou a construir algo há alguns anos. A minha carreira começou em 2018, lancei discos, acabei a escola. É aí que começo a carreira, mas muito mais pelo mundo fora do que cá. Gostava que em Portugal fosse maior, de fazer cá concertos, que as pessoas gostassem e conhecessem os meus trabalhos. Nunca estive muito incluída porque estou sempre fora. Parece que existem os músicos de Portugal e eu nunca estava. Ao mesmo tempo, sou portuguesa.
Diz então que temos os artistas cá e depois uns ovnis.
Sim, que não são muito incluídos. Aceitei para me enquadrar, integrar, e não tanto pela exposição, mas para estar mais com o grupo de músicos portugueses.
Quer fazer parte desse grupo?
Sim, sentir que sou mais uma artista portuguesa que está a dar concertos e a escrever.
Sem o Festival da Canção não iria acontecer?
Não tão cedo. No futuro, não sei, com outros acontecimentos. É uma ótima plataforma para que isso aconteça. A equipa daqui faz questão que mostrem ao público português que existem mais artistas, fora os que já se conhecem como o Agir ou a Áurea. É uma ajuda enorme.
O Salvador Sobral deixou uma marca muito grande porque ganhou. O passado dele na Eurovisão pesa nesta ida até Turim?
Não pesa. Seria brutal um bom resultado, fazer algo bonito de que os portugueses se orgulhassem. Quero que seja um momento lindo, não interessa o resultado, porque vamos ter orgulho na performance. Não sou fã de competição no mundo da música. Não faz sentido. A arte é tão abstrata, que pode ser boa para uns e má para outros. É tudo tão abstrato… vou ver isto como uma oportunidade de cantar com gente amiga e mostrar o meu trabalho. Mas, no final de contas, faço-o pela música.
Já se preparou para os próximos passos da carreira?
Tenho uma equipa brutal, a Quincy Jones Productions, que podia apostar em pessoas que iam gerar imenso dinheiro, mas neste caso não. Escolhem artistas a dedo, de quem são fãs, escolhem quem tem amor pela música. É uma base fundamental. Depois, naturalmente, não me afeta essa competição. É por isso que faço colaborações, faço música com pessoas. Alguém de fora na indústria pode achar que estamos a competir por termos o mesmo mercado, mas isso não me interessa. Se tem o mesmo mercado, se calhar temos é de fazer música juntos. Estou me a ralar se vende ou não. Tenho esse lado do prazer da música.
Quando chega a nomes como Quincy Jones ou o Jacob Collier, houve um certo deslumbramento?
O Quincy é um marco na história. Se ele fez tudo o que fez e gosta do meu trabalho, há uma confirmação do que estou a fazer. Mas faço o meu trabalho com seriedade e empenho. Tenho deslumbramento com amigos meus que fazem música, não é preciso ser famoso. O Lucas Fonseca, amigo meu da Berklee College of Music, que toca guitarra e parece que está a cantar, é o mesmo deslumbramento de tocar com o Jacob.
Interessa-lhe mais a música que sai, é isso?
A pessoa também importa. Pode ser o maior virtuoso em qualquer instrumento, mas se for uma besta quadrada não quero tocar. Reconheço o talento, mas não tenho interesse em trabalhar.
O que é que encontrou nos Estados Unidos da América: competição ou partilha?
Muita competição. Esta coisa do “american college”, onde há drama…
…é como nos filmes?
Exato. Achei que numa escola de música não acontecia, mas acontece. É um lado feio e difícil. Mas encontrei muita gente como eu, movidas pela música, com ligação forte à família e amigos. Comecei a série “Berklee People” para contrariar essa ideia de competição.
Como é que os colegas respondiam a esse desafio?
Ficaram inspirados. Passados três meses, toda a gente sabia quem eu era na escola. Há o termo “Berklee Famous” por alguma razão e eu nunca pensei ser famosa. De repente, era uma dessas pessoas só por fazer estes vídeos. Não houve resistência, vários colegas quiseram fazer parte.
Tornou-se numa influencer por acidente.
Não, não. Isso nunca se sabe, depende do impacto. Na altura, foi muito giro. Um monte de pessoas que queria participar. Juntei gente que não se conhecia, era sem ensaio, e punha a gravar.
Completamente cru.
Sim. Nota-se. A vibe está lá sempre. As pessoas depois ficavam muito amigas, unidas pela música. Adorei ver isso a acontecer. E é o que quero viver, quero fazer isto, seja no topo ou completamente fora.
Então não é bem como o filme do “Whiplash”, com o professor agressivo e obcecado com a perfeição.
Não tanto. Tive sorte. Os do jazz talvez, sim. Esta escola, especificamente, tinha a onda da pessoa fazer o que queria. O meu curso era o “Professional Music”, onde podia escolher as aulas que queria. Ia para lá mas depois queria fazer a minha música, como outros colegas. Não vi esse lado agressivo. Também tínhamos gente focadas em produção, composição para filmes, em jazz, mas, no geral, era tudo mais descontraído do que noutras escolas nos EUA.
Termina os estudos em 2017 e diz que 2018 é o “melhor ano da sua vida”. Como é que chegou a essa conclusão?
Estive sempre em escolas, nunca fui uma pessoa de estar em escolas. Mesmo nos EUA, e mesmo conhecendo pessoas incríveis. Não gosto de aulas, daquela coisa marcada. Em 2018, pela primeira vez, tinha os estudos feitos, com a minha mãe a dizer-me para fazer o mestrado, mas disse que não. Nem conseguia fazer mais uma semana de aulas. Fui para Los Angeles, viver para um sítio completamente novo, comprei o meu carro, tive o meu quarto, comecei a fazer surf. Sempre dividi o quarto com a minha irmã, em Boston também dividi com outras pessoas. Em LA tive uma liberdade que nunca tinha sentido na vida. Já podia fazer só o que queria. Na Berklee também, muito privilegiada, mas havia coisas que não queria fazer. Em 2018, já não.
Esteve lá quanto tempo?
Um ano e ia ficar mais. Só que a tour com Jacob começou em 2019, em 2020 ia voltar, mas a pandemia aconteceu.
Explique-me lá isso da liberdade.
Dois dos meus grandes amigos estão lá e são os dois produtores. Comecei a trabalhar com eles, fazer música com os dois melhores amigos. Comecei a aprender a fazer surf.
Ainda faz?
Quero continuar, mas já não faço há imenso tempo. Depois, fui conhecendo pessoas, comecei a dar aulas na MSFTS, do Jaden Smith e da Willow, filhos do Will Smith. Eram miúdos quando os conheci, e tinham aberto uma escola. Estava num meio incrível.
Foi a Mariana que encontrou essas oportunidades?
Tudo foi acontecendo. Foi pelo Instagram. Um grande amigo do Jaden descobriu o meu trabalho, estava a uma semana em LA, disse-me para ir ter à escola.
O lado bom das redes sociais.
Nunca entendi isso de se ser contra a internet. Temos de aprender a gerir.
Sim há quem queira acabar com ela, de facto.
Isso. Fui-me focando na música que queria fazer e o resto foi resultando.
Nunca houve desconforto por ter ido sozinha?
Não.
É caro…
Caríssimo. Guardei dinheiro, seis mil dólares. Quando cheguei, enviei metade do dinheiro para uma amiga que estava aflita para acabar o curso na minha escola. E em LA paga-se 1500 dólares por quarto por mês. Depois, encontrei uma casa ao pé da praia por 900 dólares, com um quarto grande. O tipo que estava a sair tinha um carro, vendeu-me por mil dólares. Tive de deixar mais mil para a caução, fiquei com 200 dólares na primeira semana.
Como é que deu a volta?
Comecei a dar as tais aulas. Nos EUA é tudo caríssimo, mas recebe-se muito melhor. Quem quiser ter uma aula de ténis, paga 80 dólares por aula. Recebe-se melhor. Tinha cinco horas de aulas de piano por semana que pagavam a renda. Tive sorte e trabalhei muito. Meti na cabeça que só ia um ano, se não desse não dava, se desse, continuava. Foi assim. Não me senti desamparada.
Gostava de voltar?
Vou voltar. Só por causa da pandemia é que estou aqui. Não quero ficar para sempre, mas até aos 30 e poucos anos, sim. Bater o pé na indústria.
Deixou projetos suspensos?
Sim. Quando voltar, é ter sessões de gravação e começar a trabalhar com pessoas. Vai ser fácil retomar. Não vim para cá e fiquei parada. Estou a lançar o meu álbum e estou a fazer outras coisas. Vou voltar com mais trabalho em cima.
Tem muito espírito português do desenrasca.
Sou mesmo portuguesa, não é brincadeira.
Sempre foi assim ou alguém ajudou a que fosse?
Ninguém me disse, mas a minha mãe é completamente assim. Sem notar, fui vendo. Mas é uma questão de personalidade. Os meus dois irmãos são desenrascados para algumas coisas e outras não.
[um dos vídeos da série de colaborações no Youtube ITSA ME, MARO!, aqui com Mayra Andrade:]
As suas músicas têm um toque pessoal e vão também muito atrás na sua vida por vezes. Retoma partes da sua infância, da sua juventude, tira da gaveta temas com muitos anos. Onde fica a privacidade?
Há muitas coisas que não revelo. Vou vendo. Nem me exponho muito. Há coisas que, por agora, não têm de estar relacionadas com a parte artística. Se sair mais vulnerável, tudo bem. Para já, tenho isto bem separado.
Ainda viveu no Brasil e em Paris. O que é que andou a fazer por lá?
Música. Aos 12 ou 13 anos fiz uma lista de cidades onde queria viver um mês por ano para o resto da vida. A primeira foi Paris, porque adoro francês. Veio a Covid-19, estava no Brasil, voltei para Portugal e, em 2021, estava tudo parado outra vez, e pensei: é agora. Queria começar este estilo de vida, mas mais estável. Só que não estava a pagar renda por estar a viver com a minha mãe, e então decidi ir para Paris. Fiquei três meses, queria conhecer a cidade e aprender francês.
Com mais dinheiro desta vez?
Voltei aos tempos de LA, com o dinheiro contado. Lancei o projeto com o Nasaya, que já estava acabado, o Pirilampo. No Brasil foi igual. Como o mundo estava parado, fui para onde me sentia bem. Lá fui para casa de uns amigos numa fazenda, no meio do nada. São pessoas muito especiais. Estive lá cinco meses. Foi aí que comecei “ITSA ME MARO” [colaborações no Instragram de artistas como Eric Clapton ou Mayra Andrade]. Não gravei nada para mim, escrevi imenso, saiu tudo em brasileiro. Vai ser estranho quando lançar essas músicas, mas também não porque o sotaque não é perfeito. O mundo estava um caos, foi uma escapatória perfeita.
[“Pirilampo”, Maro com Nasaya:]
Estes tempos tenebrosos prenderam-lhe a criatividade?
Lá não, estive isolada. 2021 foi complicado, o segundo ano já era um puxão. Muito tempo parada.
Como se estimula o cérebro assim?
Fazer algo novo, ouvir muita música, ver filmes, tocar.
Que filmes? E o que procura neles?
Gosto muito de vídeo, de fotografia e de enquadramento. Adorava ser diretora de fotografia, talvez um dia. Vejo um filme e olho mais para esse enquadramento, para os planos e cores. Ainda assim, acaba por ser só por entretenimento. Perceber se é bom ou não. Ser uma crítica amadora, mas sem dar a minha opinião a alguém.
Do que é que está à procura quando escreve música?
Nunca estou à procura, vai acontecendo. Conheço alguém, damo-nos bem, começamos a escrever e é o que sai. Nunca me sentei e pensei: agora vou escrever uma canção. É quando estou a sentir algo e, por sentir, tenho de ir buscar a guitarra ou sentar-me ao piano.
O que é isso do sentir?
Estar triste ou feliz. Ou meio apaixonado por alguém, esse exemplo clássico. Quando sinto que tenho de meter qualquer coisa cá para fora. Nem é para mostrar às pessoas. Nunca fiz isso de me sentar e escrever sobre um determinado tema. Até agora tem sido o que sai.
Quer que a sua carreira também tenha uma componente visual forte? Agora parece quase uma obrigação…
Comecei a editar, gosto muito de fotografia analógica, mas sem mostrar. Essa parte não se vai separar da música.
A música não vive sem o visual, é isso? Por vezes parece que o artista se perde nesse caminho.
No visual nem tenho sido forte porque tenho feito tudo sozinha. Quando a música é realmente boa, não precisa de visual. Mas a nível de marketing, ajuda muito. É dar outro plano ao que já existe. Há muitos artistas que explodiram por causa da parte visual. Percebo isso. Mas não acho que seja absolutamente necessário quando a música é boa.
Perde tempo a pensar nesta nova fase da indústria, das plataformas, de quando pagam aos artistas, etc?
Não penso muito, mas gosto de estar informada. Sou contra escrever-se algo só porque vai dar certo. Acho que há pequenas coisas que são importantes, por exemplo, organizar a lista do Spotify. Claro que hoje tenho uma equipa que pensa nisso, que me ajuda a continuar a fazer isto para o resto da vida. Quero saber de tudo isso, por curiosidade, mas que não quero que dite as minhas canções.
Gostava de não perder o lado de artista independente?
Sim. Adoraria fazer grandes espetáculos, não vou dizer que não.
Encher o Pavilhão Atlântico.
Claro, seria brutal, com música minha. Se for um teatro lindo para 200 pessoas, a situação é igualmente feliz. Cresci a ouvir música pop, acho que naturalmente vou para esse lado, mas porque gosto. Claro que há projetos que não vão ser nada comerciais e hei de investir a mesma energia. Não estou preocupada com isso.
A quem vai buscar inspiração hoje em dia?
Imensa gente. Justin Bieber, Lennon Stella, que tem uma voz brutal, o The Weeknd, com essa parte toda visual. Há gente a fazer projetos muito incríveis. Difícil é acompanhar o que sai. Parece que há um artista novo que sai todos os dias.
Mudando de assunto, porque é que queria ser veterinária? Tem ainda uma grande adoração por animais?
Completamente.
Não tem nenhum?
Não. O meu pai tem dois gatos, mas vivo com a minha mãe e ela não deixa. O que se percebe, porque estou sempre a viajar. O meu sonho é, quando estiver estável, ter um cão.
Gostava de ter essa estabilidade.
Sim, mas acho que não vai acontecer nos próximos cinco anos ou mais. Aos 35 anos e ainda vou estar a construir.
Esta é a primeira tour, que fará em abril, com esta escala?
Sim, sozinha, sim. Vou abrir para a Charlotte Cardin. Já abri para outras, mas esta é a maior. Quase todos os concertos estão esgotados. Vou ter de cantar 30 ou 40 minutos sozinha, é grande, há imensa gente que não sabe quem eu sou. A maior que fiz foi com o Jacob mas fazia parte de uma banda.
É bom ou assusta?
Assusta, mas é assim que se cresce. Se fizer isto, mesmo que corra mal, levo um andamento para as próximas fases.
Se ganhar a Eurovisão, acha que isso vai mudar muito a sua vida? A do Salvador mudou, especialmente por cá, diria.
Vai. A exposição a nível europeu é muito maior. Ao contrário do Salvador Sobral, por exemplo, tenho mais trabalho lançado e estabelecido. Vão ver que já tenho trabalho e pode ser bom para as pessoas me verem e ficarem. Mas acho difícil. São muitos países.
Li algures que tinha vergonha quando começou a cantar. Agora já sabe que o consegue fazer, certo?
Sim. Se não, não punha vídeos no Instagram.
Quando soube?
Na formação musical, percebi que era afinadinha. Quando comecei a escrever, conseguia cantar as minhas músicas. Mas perdi a vergonha aos 20 anos quando estava na Berklee.
O seu maior medo é ficar sem voz?
Sim, seria difícil. Mas existem os instrumentos. Se perder a voz, espero ter mãos.
Não há nada que tenha mais medo?
Por agora, é a voz. Amo cantar. Não imagino não cantar.