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À entrada do balneário da Splink salta à vista a relva sintética. Um tapete a imitar um campo de futebol, bolas espalhadas pelo chão de um dos escritórios, um sofá e uma consola onde é possível jogar videojogos e mais de uma dezena de camisolas emolduradas e expostas nas paredes. No Saldanha, em Lisboa, a sede desta empresa é um santuário que homenageia o desporto considerado rei.
As camisolas que são de vários clubes de futebol, portugueses e internacionais, e que têm estampado o nome de diversos jogadores, fazem parte da coleção privada de Ivan Braz. “Toda a coleção que está aqui é a minha coleção pessoal. Não tenho casa para a ter e então traz-se aqui para o escritório”, brincou, assumindo-se “viciado” em futebol. O gosto por este desporto traduziu-se numa carreira como jogador (não quis revelar os clubes pelos quais alinhou), mas uma lesão levou-o a enveredar por outros caminhos. Com 20 anos abriu a sua primeira empresa, na área de desenvolvimento de software — isto foi há 18 anos, quando ainda “não havia startups”.
O entusiasmo com que disse ao Observador ser louco por futebol foi rapidamente substituído pelas parcas palavras usadas para falar sobre si próprio. Depois de mencionar a primeira empresa, Ivan fez uma finta para passar a conversa para a sua primeira startup: a My International Arts, criada em 2014. Era um negócio ligado às artes criativas, uma plataforma online que “celebrava artistas e os conectava com entusiastas”. Foi aqui que Ivan Braz conheceu a pessoa que viria a ser o segundo elemento de uma equipa composta por três jogadores.
Dulce Guarda sempre teve um “bichinho” pela área da criatividade. Depois de um curso de gestão, um mestrado e uma pós-gradução em gestão de marketing, uma passagem pela banca e outras por agências de publicidade, decidiu concorrer a uma vaga de emprego para copy e ficou com o lugar. “Contratei-a”, revelou Ivan entre risos. Foi aqui que começou uma parceria que dura até hoje. Mas nem tudo correu bem.
“Nessa startup, tal como em muitas outras quando começam, não existiam valores para pagar aos funcionários e acabávamos por ter parte da empresa como pagamento”, revelou Dulce ao Observador para explicar como se “converteu” a cofundadora — ficando com ações da empresa como forma de pagamento — de um projeto que acredita que estava “um bocadinho à frente do tempo” e que fracassou dois anos após ter começado.
— “Passámos pela aprendizagem toda de levantar investimento…”, explicou Ivan.
— “Apresentação de projeto, pitch, concursos…”, acrescentou Dulce.
— “Levar muitos ‘não'”, disse Ivan.
— “Essa nossa startup foi para aprender”, reforçou Dulce.
— “Foi para levar boa porrada”, esclareceu Ivan.
O bate bolas entre os dois terminou ao contarem que fecharam a empresa em 2016 e que foi a partir daí que “começou o projeto inicial que deu início ao que hoje é a Splink”. Desde o “falhanço” até à possibilidade de conseguirem ficar mais perto de ter um negócio vitorioso passaram quatro épocas.
A aposta no futebol para dar um pontapé no fracasso
O jogador decisivo para que a dupla tivesse uma nova empresa inteiramente ligada ao futebol foi Ivan, mas também Dulce tem um passado ligado ao desporto, uma vez que praticou ginástica durante 24 anos. “Em cada um de nós [dos cofundadores] existe uma ligação ao desporto”, referiu a chief growth officer da Splink. A dupla acredita que o futebol ainda é uma área de negócio “muito mal explorada” e querem conseguir tirar proveito disso mesmo.
“As pessoas andam à ‘porrada’, choram e gastam imenso do dinheiro que têm e não têm para seguir a equipa e viajar. Se nós tirarmos os fãs, o futebol não existe. E isso acontece em qualquer desporto. Mas, depois, não existe um cuidado com os fãs. Os estádios estão cheios porque as pessoas pagam bilhete, só que o que é dado aos fãs não é nada face ao que as pessoas gastam. Então, a minha preocupação principal foi criarmos um produto que de alguma forma aproxime” os jogadores e os adeptos, explicou Ivan, CEO da Splink.
Sabendo à partida que o “futebol e a área do desporto eram interessantes para trabalhar” e com “potencial de crescimento tanto em Portugal como na Europa e no resto do mundo” lançaram em 2020 a startup My Lads. A escolha do nome estava, também ela, ligada à gíria futebolística. “Lads [que significa jovem] é uma palavra muito comum no mundo do futebol, principalmente no Reino Unido, de os jogadores se chamarem uns aos outros ‘hey lads’. Era uma palavra muito comum”, justificou Dulce.
A entrada no mercado desportivo começou com uma caixa mistério que continha produtos dos clubes, como porta-chaves, canecas ou notebooks. Mais uma ideia e mais um fora de jogo para a equipa que percebeu que “os portugueses não gostam de não saber o que vem dentro da caixa”: “Mas eu vou pagar e realmente vale a pena ou não?”, questionavam os clientes. Mesmo sabendo que queriam ter um produto original patenteado e desenhado pela equipa dentro da caixa mistério perceberam que, mais uma vez, precisavam de “mudar o conceito”.
Foi preciso voltar a calçar as chuteiras. Debatidas as ideias, o vencedor foi uma réplica do equipamento dos jogadores de futebol em miniatura. Um Ronaldo em ponto pequeno, mas totalmente equipado com a camisola da seleção nacional, os calções, as meias e as chuteiras. “A ideia começou por aqui, mas percebemos rapidamente que não poderia ser simplesmente um produto físico”, revelou a dupla.
Não queríamos ser mais uma empresa de colecionáveis, mais uma empresa que tinha um inventário que não conseguia escoar. Começámos a perceber que a realidade aumentada estava a começar e que tinha um grande potencial para entregar aos fãs algo realmente único”, explicaram.
A necessidade de começar a trabalhar mais com a tecnologia leva um dos cofundadores a entrar mais para o mundo tecnológico da empresa. Hugo Matinho ajudou Dulce e Ivan a entender o que era possível fazer com a realidade aumentada e quais os seus limites — porque ainda é uma ferramenta em evolução. O membro que mais tarde se juntou à dupla Dulce e Ivan e que assume as funções de chief technology officer não esteve presente na conversa com o Observador, mas Dulce revelou que estudou no liceu francês e é “adepto do Futebol Clube do Porto” (ao contrário da dupla, que é do Sporting).
O potencial de “levar o jogador até ao fã” foi entendido logo no início: “Quando perguntávamos às pessoas o que elas mais gostavam nunca diziam passar tempo com os jogadores porque para elas isso era, à partida, inacessível. Mas percebemos que é isso o que as pessoas realmente querem e entregámos”. A perceção de que a realidade aumentada conseguia fazer as miniaturas ganhar vida levou o agora trio de ataque a uma nova jornada.
As miniaturas ganham vida através da realidade aumentada
O primeiro clube a apostar em Ivan, Dulce e Hugo para fazer os seus jogadores ganharem uma nova vida digital onde, enquanto ‘bonecos’, conseguem interagir com os fãs através da realidade aumentada, foi o Benfica. Um clube “muito internacional” ter apostado na startup levou a empresa a outros voos, explicou Dulce. Durante a pandemia fecharam parcerias com o Sporting e a seleção nacional. Mais tarde, seguiu-se o FC Porto e o Atlético de Madrid.
Para os clientes —até mesmo para os que pouco percebem de futebol — o esquema não é complexo. Basta seguir a seguinte tática:
- Comprar a miniatura do equipamento do jogador que mais gostam. Ronaldo, Bruno Fernandes, Vlachodimos, Pepe ou Coates são algumas das opções disponíveis.
- Descarregar de forma gratuita a aplicação da empresa (Splink) que está disponível para Android e iOs e abrir a aplicação no telemóvel.
- Fazer scan do produto físico para ter acesso às experiências interativas com a realidade aumentada. Mas atenção: não existe qualquer QR Code. “Ele reconhece o produto e adiciona-o na aplicação. O reconhecimento é automático”, explicou Ivan. “Tudo na caixa — desde o emblema do clube ao nome do jogador, à caixa em si, às cores — é reconhecido pelo nosso programa. Quando compramos o colecionável, abrimos a aplicação e colocamos no modo câmara. O sistema reconhece logo o produto que ali está e adiciona-o à coleção” que o cliente possa já ter, acrescentou Dulce.
Com o processo de scan concluído existem “três situações em realidade aumentada” que as pessoas podem usufruir. Tirar uma fotografia “com” o jogador é uma delas. Depois de comprarem as miniaturas e já com a aplicação instalada, os utilizadores devem apontar o ecrã do telemóvel para o chão para que a versão digital do futebolista apareça mesmo “a seu lado”, onde quer que estejam.
Na aplicação, os fãs também conseguem visitar digitalmente o estádio da sua equipa e todas as áreas privadas a que normalmente não têm acesso: o balneário, as salas de reuniões, os campos de treino, e, no caso da seleção, até o hotel onde os atletas ficam hospedados e os respetivos quartos.
Tentamos negociar sempre com os clubes e as seleções as áreas que sejam interessantes para os fãs verem e a que normalmente não têm acesso. No caso da seleção nacional deixaram-nos filmar o hotel onde os jogadores ficam, que é a Casa dos Atletas” e isso possibilita uma visita virtual, por exemplo, ao quarto do Ronaldo, detalhou Dulce.
Uma terceira experiência consiste na possibilidade de o adepto obter dados estatísticos sobre os jogadores. “A pessoa faz o scan da superfície, por exemplo, de uma mesa, e aí aparece o jogador em realidade aumentada com toda uma área de dados estatísticos, fotografias, momentos de glória do futebolista no clube ou na seleção. Dados estatísticos como número de golos, data de nascimento ou uma frase que o jogador tenha dito. Tudo isto é atualizado em tempo real porque estamos ligados a API [Interface de Programação de Aplicações] de outras empresas que nos fornecem esses dados”, explicou Dulce. A empresa, que agora já não se chama My Lads, disponibiliza vídeos que mostram e explicam como é que o cliente consegue aceder a todas as experiências interativas.
A equipa de empreendedores parecia, com todos estes ajustamentos, estar prestes a conquistar o seu primeiro campeonato, mas teve de repensar um pormenor: a miniatura que vendia. Isto porque o feedback dos clientes nem sempre foi positivo. Às figuras vendidas pela My Lads faltava algo que os adeptos consideram ser essencial os jogadores terem: cabeça.
O conceito era o equipamento, mas começou a ser percecionado como um futebolista em que lhe faltava alguma coisa, um jogador sem cabeça”, justificou Dulce.
Ter a miniatura com cabeça implicaria “fazer um produto diferente de jogador para jogador” enquanto fazer só o equipamento era na base o mesmo para todos. “Para ter uma cara, o pormenor tinha que ser tanto que o produto ficaria demasiado caro para chegar ao consumidor normal”, afirmou Dulce.
O trio percebeu que precisava de mudar a miniatura que vendia. E em vez do equipamento passou a apostar na réplica, em ponto pequeno, apenas da camisola. Porém, o equipamento completo dos jogadores continua a ser vendido nas lojas oficiais dos clubes e na Fnac enquanto existir stock.
“Decidimos apostar na réplica da camisola a um preço muito mais acessível para o fã e que tivesse associado a tecnologia que permite ao fã ter experiências exclusivas e únicas que neste caso são em realidade aumentada”, explicou Dulce ao mencionar que as miniaturas das camisolas custam, cada uma, 16,99 euros e estão disponíveis no site da startup. Ivan admite, ainda assim, que “as camisolas são caras” e não é pelo fabrico. É “uma questão de posicionamento das próprias marcas”.
My Lads sai de jogo e Splink entra em campo
Mas havia mais uma mudança a caminho. A My Lads foi alvo de substituição, em abril deste ano, para dar entrada em jogo à Splink. A mesma empresa, os mesmos cofundadores, mas um nome diferente. Porquê? As negociações, que ainda decorrem, com o mercado britânico e norte-americano mudaram o rumo da startup. As seleções destes países e até mesmo os clubes mostraram interesse em fazer não só uma coleção de miniaturas com camisolas do futebol masculino, como também do feminino.
Lads não poderia ser porque era só entre rapazes, tanto que a tradução é mesmo rapaz. Portanto, tivemos que perceber o seguinte: se queremos avançar com eles, temos que mudar de nome agora”, explicou Dulce.
À comercialização de um novo produto juntou-se a mudança de nome, agora “gender neutral, que tanto dá para mulheres como para homens e que tanto dá para o futebol como para outra área de desporto”. “Ainda estávamos muito no início. Não nos fazia muita diferença naquele momento deixar cair o nome My Lads. Foi a altura em que abandonámos o equipamento e íamos começar só com a camisola. Fazia todo o sentido”, disse Dulce.
Quando questionada sobre a escolha do novo nome, a cofundadora soltou imediatamente um “ai” face à dificuldade que o trio de ataque teve até chegar a Splink. “Foi muito pensamento. Andámos muito tempo para trás e para a frente. Pedimos opinião a toda a gente que trabalha connosco e a pessoas de fora… até que surgiu Splink que é a junção de duas palavras e que, para nós, fazem muito sentido: sports [desportos] e link [ligação]. Splink acaba por ter uma sonoridade engraçada e nós temos essa missão de ligação com os fãs do desporto.”
Apesar de o nome e o produto físico terem mudado, as experiências de realidade aumentada permanecem as mesmas: a fotografia com o jogador, a visita a locais exclusivos e estatísticas sobre os futebolistas. Mas uma nova experiência que a empresa vai oferecer é a possibilidade de o cliente conseguir ver na aplicação a camisola oficial dos clubes ou das seleções com todos os detalhes e aí poder inscrever o seu nome e o número de que mais gostam. Visualizada a camisola, haverá um botão disponível para “comprar agora”.
Aí, o cliente é redirecionado “para a loja do clube ou para o parceiro que vende oficialmente as camisolas” reais. A Splink será a “ligação” entre a camisola em realidade aumentada e o site da compra. “A venda das camisolas é com quem vende a camisola. Não somos nós que vendemos. É outro modelo de negócio”, frisou Ivan.
Eusébio é o preferido, novas miniaturas “eco-friendly” são lançadas a cada três meses
“Uma pessoa muito querida de todos” é pois um dos jogadores “mais pedidos”, apesar de já não se “encontrar connosco” e de já ter jogado “há muitos anos”. São algumas das pistas dadas por Ivan e Dulce para revelarem quem é o jogador preferido pelo público. Questionados sobre qual tinha sido o jogador cuja miniatura mais vendeu na época que passou, em uníssono, Dulce e Ivan exclamaram “Eusébio, Eusébio”. Benfiquistas, sportinguistas ou portistas. “Todos” quiseram ter uma camisola em ponto pequeno do Pantera Negra.
Não são lendas como os cinco violinos do Sporting — Jesus Correia, Vasques, Peyroteo, Travassos e Albano, uma das linhas avançadas considerada como sendo das melhores de sempre que se seguem nas escolhas. A medalha de prata vai, sem surpresas, para um antigo leão: Cristiano Ronaldo. A fechar o pódio do campeonato Splink ficou Bruno Fernandes, na última época em que jogou pelo Sporting.
Coincidiu com a mudança do jogador para o Manchester United e então esgotou rápido”, justificou Ivan ao explicar porque é que Bruno Fernandes fecha o pódio das mais de 75 mil miniaturas já vendidas no total.
Todos os anos e a cada trimestre, a Splink lança miniaturas novas. No final de cada época, um novo plantel é feito, mas as unidades produzidas noutros anos continuam a ser vendidas. Com base nas redes sociais e na interação dos fãs, os cofundadores conseguem perceber os futebolistas cuja miniatura os adeptos mais vão desejar ter. “Conseguimos perceber se as pessoas querem um jogador mais novo, por exemplo o Nuno Mendes, que é o novo lateral da seleção” ou se ainda preferem os mais velhos, como Ronaldo, explicou Ivan.
As camisolas também mudam todas as épocas. Assim, no início da época futebolística, a startup lança as miniaturas já com as novas camisolas principais. “Quando achamos que as camisolas secundárias são comercializáveis lançamos também para alguns dos clubes”, afirmou o CEO.
A Splink, por norma, tem acesso à camisola oficial antes de começar a ser vendida para que consiga fazer a produção atempadamente. Contudo, nem todos os clubes têm facilidade em mostrar “o desenho que ainda ninguém viu”, vincou Dulce. A produção das miniaturas é feita em fábricas parceiras na China, justificando a empresa que em Portugal é “impossível” e “não há mão-de-obra”.
Com a pandemia, a produção atrasou-se porque as fábricas chinesas “de vez em quando” ainda fecham um mês inteiro devido à política zero casos de Covid-19. Por isso, a startup quer explorar “novos parceiros” na Ásia para a produção.
Nós temos uma pessoa no lado asiático que trabalha connosco a nível das fábricas. O que nós enviamos para lá é o design, o desenho técnico e depois como qualquer empresa o que fazemos são amostras que temos que aprovar”, explicou Dulce.
Muito mais do que a duração de um jogo de futebol, o processo de produção e exportação para Portugal demora “à volta de dois meses”. Assim, é importante ter tempo para fazer as amostras, a verificação do produto por parte dos clubes ou das seleções e a aprovação do mesmo. “Quando já temos o produto aprovado precisamos de cerca de dois meses para o conseguirmos ter cá. Um mês para produção, um mês para exportação”, afirmou Dulce.
As miniaturas das camisolas dos jogadores são feitas com vinil, acrílico e plástico biodegradável. “Tudo materiais eco-friendly”, menos o “plástico que está à volta” que não é “tão amigo do ambiente”, mas que é “transparente e o mais fácil de fazer reciclagem porque não tem cor”. “O plástico foi necessário porque como nós temos a caixa de acrílico, se vier sem o plástico, o produto ficava todo riscado. Sendo um colecionável, para os fãs, temos de tentar mantê-lo o mais selado possível”.
A ideia na mente do trio de ataque é que o colecionável, que tem o selo oficial, seja um complemento à camisola real dos clubes e das seleções. “É um colecionável oficial do clube e da Splink” que resulta de um trabalho árduo de negociações e que passa por jogadores, clubes, agentes e seleções antes de chegar aos mercados. Isto faz com que, na opinião dos cofundadores, o produto chegue “realmente ao final” com um “detalhe incrível” e com “tudo exatamente igual à camisola”.
O processo burocrático para fechar seleções e clubes tem “muitas nuances”
Benfica, Sporting, Porto, Federação Portuguesa de Futebol, Valência, Atlético de Madrid, seleção espanhola, seleção brasileira e seleção mexicana. Todos já constam no portefólio de clientes da Splink. Porém, em curso permanecem as negociações para continuar a fechar com clubes de topo em Espanha, França, Inglaterra, Itália e Brasil.
O foco da startup este ano é apostar “nas seleções nacionais” aproveitando a realização do Campeonato do Mundo, que começará em novembro no Qatar. O Brasil foi a única seleção, das quais já tem acordo, em que o trio português teve de negociar “jogador a jogador” porque a federação brasileira não tem “direitos sobre os jogadores”. “Obviamente dá um bocadinho mais de trabalho” e “nem todos os futebolistas poderão” ter as camisolas transformadas em miniatura porque alguns podem não querer avançar, explicou Dulce.
Assim como não tem “direitos sobre os jogadores”, o Brasil também não o tem sobre as “lendas” da seleção. A ideia da Splink lançar uma coleção em homenagem à conquista do pentacampeonato do mundo — que segundo Ivan foi a “época mais gloriosa do Brasil”, com “três bolas de ouro em jogadores” — implicou negociar com todos os futebolistas. Convidado para um evento do ‘penta’, o CEO falou com as lendas e garantiu que nenhuma desaprovou o produto e que todas acharam “imensa piada”.
Eles acharam imensa piada porque isto é completamente diferente. Eles estão habituados às camisolas oficiais e isto é completamente diferente”, disse Ivan, que no evento no Brasil se encontrou com Ronaldo Fenómeno e Ronaldinho, dois dos futebolistas que vão ter as suas camisolas do pentacampeonato transformadas em miniatura.
Por norma, os clubes têm os direitos assegurados pelas lendas, mas quando não têm é necessário que os jogadores sejam negociados individualmente. A Federação Portuguesa de Futebol (FPF) tem direitos sobre antigos futebolistas, o que facilita a vida à Splink que pretende lançar uma coleção com “jogadores realmente icónicos e que ainda hoje em dia toda a gente conhece” como Rui Costa, Eusébio ou Paulo Futre.
Os jogadores não são “empregados das seleções”, são “empregados dos próprios clubes”, mas costumam ceder os direitos de imagem às seleções. Assim, para transformar Bruno Fernandes ou Nuno Mendes numa miniatura, a startup dirigiu-se à FPF. Só que não funciona assim para todos. Há jogadores que são “especiais”. Futebolistas como CR7 ou Neymar “são donos” de si mesmos. Cristiano Ronaldo, por exemplo, é “detentor dos direitos de imagem dele próprio”, explicou Dulce.
Para conseguirem vender a miniatura de Ronaldo com a camisola da seleção nacional, o próprio teve que aprovar o produto, mas a negociação também passou pela seleção porque a camisola é da seleção e o produto da Splink deve ser “oficial”. O fechar de contrato com a FPF deu à empresa “uma abertura muito grande para começar a negociar com outras seleções e clubes”, mas conseguir a aprovação daquele que por várias vezes foi considerado o melhor jogador do mundo levou-os ainda mais além. “Se o Ronaldo aprovou este produto que passa por tantas fases até chegar até ele é porque isto tem pernas para andar”, acreditam os cofundadores da Splink.
Como é percetível, o processo burocrático tem várias particularidades e “nuances”. Uma delas tem que ver com o mercado de transferências. Na época passada, a startup vendia a miniatura da camisola de Darwin Núñez, jogador do Benfica que foi transferido para o Liverpool. E agora? Este ano os fãs do uruguaio já não vão conseguir comprar o produto da Splink? Como o Benfica detinha os direitos de imagem de Darwin Núñez na época passada, e a miniatura da startup é dessa altura, é possível continuar a venda com a camisola das águias.
Apesar de existirem exceções como aconteceu com Darwin Núñez, é comum que os jogadores que estão no ativo não possam ter miniaturas de outros clubes por onde tenham passado. No início do negócio, a Splink quis fazer uma miniatura de Saviola com o equipamento do Benfica, mas como o jogador estava já noutro clube (e não tinha sido transferido de uma equipa que era cliente da startup na época anterior) o negócio não andou para a frente e os fãs do clube lisboeta ficaram sem um produto associado ao argentino.
Mas, às vezes, o problema não são os jogadores. Quem o disse foi Ivan, que acredita que quem “gere os futebolistas, sejam os agentes sejam as pessoas que trabalham a gestão dos direitos de imagem”, é que tenta colocar certos negócios fora de jogo.
Nós navegamos neste mar um bocadinho complicado e então arranjamos sempre maneira de chegar aos jogadores. Nem que seja através de um outro jogador que já tenha aprovado e pedimos-lhe para falar com o colega. Isso ajuda porque no futebol ‘se um tem, todos os outros querem'”, frisou.
Com o Mundial do Qatar este ano, o grande foco da Splink é continuar a fechar parcerias com seleções nos próximos meses e lançar miniaturas com os jogadores que atuam nas mesmas. Os negócios entre a startup e federações ou clubes são sempre fechados no mínimo por três anos, revelaram ao Observador os confundadores.
As negociações em si são demoradas. Há clubes que podem demorar duas a três semanas a aceitar um acordo com a Splink, mas no caso das equipas da Premier League, por exemplo, só o processo negocial demora mais de seis meses. Desta forma, a empresa também acaba por ser mais seletiva e nem todos os países entram nos planos do trio de ataque. Itália é uma daquelas em que ainda não decidiram entrar por ser um mercado “muito burocrático”.
Os valores envolvidos nas parcerias já concretizadas não foram divulgados, com os cofundadores a explicarem somente que existem vários “modelos aplicados” consoante os clubes. “Temos alguns negócios que são revenue share [partilha da receita]” e outros que são através do “pagamento de royalties [direitos]”, revelaram posteriormente numa declaração escrita enviada ao Observador.
Como nós fazemos produto oficial, nós entramos sempre neste modo de licenciamento com o clube para o produto físico portanto temos sempre que gastar bastante dinheiro e cada vez os clubes são maiores, mais dinheiro temos que gastar para entrar num determinado clube”, justificou Dulce.
Apesar do montante gasto com os clubes, a Splink só procurará por mais investimento no próximo ano. Por agora, relembram que receberam, em maio de 2021, 7,6 milhões de euros. “A nossa ronda de investimento foi grande não só pela procura que estava realmente a crescer como pelo número de contratos que estávamos a negociar e também porque precisávamos desse dinheiro para investir na abertura de um mercado novo”, afirmou Dulce.
Questionados sobre a mudança de nome da empresa e a aposta dos investidores, como o piloto português António Félix da Costa, no novo produto, os cofundadores sentiram a necessidade de esclarecer que “não houve nada por detrás” das alterações. “Isto foi simplesmente rebranding por causa daquela questão de termos um nome gender neutral” e, “sim”, os investidores continuam a apoiar a equipa.
As apostas para as próximas épocas
Apesar de terem uma patente registada a nível internacional, os cofundadores sabem que “não há volta a dar” à possibilidade de as miniaturas que vendem poderem vir a ser copiadas à medida que as expandem a um número maior de países e mercados.
Se pensar muito nessa hipótese, no imediato, a Splink prepara antecipadamente — como os clubes de futebol também fazem — as próximas temporadas. Entre as várias ideias que têm para o futuro há uma que sobressai: conseguir fechar mais clubes e seleções para terminarem este ano com cerca de 30 parceiros. A aposta para as próximas épocas promete ser forte. Uma coleção dedicada à seleção feminina portuguesa já foi falada porque é um mercado que a startup considera “interessante” e com potencial porque tem “estado a crescer imenso”. “É algo em que vamos começar a apostar num futuro próximo”, garantiu Dulce, a responsável pelo fecho de novas parcerias e negócios.
No campo da realidade aumentada as ideias também surgem. Um exemplo: “Gravar a voz do jogador para depois colocar uma parte de inteligência artificial” para que o mesmo responda ao adepto. Como esta é uma tecnologia que está em desenvolvimento, o novo conceito “ainda está muito por pensar”, mas a Splink acredita “que é possível”. “Às vezes a tecnologia não acompanha o nosso pensamento, portanto nós ainda temos que perceber” de que forma será exequível. A ideia da dupla passa por conseguir mais “interação” entre adeptos e jogadores, que “ao contrário do que se pensa são super normais”.
“Queremos conseguir criar mais ferramentas para que se possa trazer essa proximidade que se está a perder no futebol”, considerou Ivan que explicou que a “queda brutal” de atenção que as novas gerações mostram face ao futebol leva a empresa a estar preparada para expandir a outros desportos. O caminho das quatro linhas até às pistas ainda é longo, mas a ideia da Splink é conseguir ter “uma abrangência maior no tipo de fãs” que atrai, seja na NBA, na Fórmula 1, na Fórmula E ou nos Esports.
A Fórmula 1 tem cada vez mais fãs e a startup já sabe bem como quer entrar neste mercado. À partida, a ideia será vender miniaturas do fato completo do piloto com capacete — porque “não existe pele à vista” e assim não se impõe o problema de terem de fazer uma cabeça diferente para cada um. Do lado dos fãs, tal como já acontece no futebol, os cofundadores da Splink querem que os adeptos consigam visitar o que “normalmente não lhes é acessível”: desde o interior do carro até às boxes.
O facto de um dos investidores da Splink ser o piloto português António Félix da Costa dá à startup “muito conhecimento” e a possibilidade de perceber que “a maior parte das pessoas que consome Fórmula 1 ou Fórmula E não é rica”, pelo que não consegue pagar para visitar as boxes dos pilotos e necessita da tecnologia de realidade aumentada para realizar tal visita.
Os objetivos de entrarem em novos mercados são a longo prazo e “provavelmente não para este ano”. Por sua vez, para as quatro linhas também há novas ideias: uma coleção de miniaturas totalmente dedicada a Paulo Futre, cujas camisolas em ponto pequeno da seleção já estão disponíveis e do Atlético de Madrid estarão em breve acessíveis para os fãs. O português será o único jogador para o qual farão uma coleção. “Temos contacto direto, o que facilita. E o filho dele trabalha connosco”, revelou Ivan.
O filho de Paulo Futre, futebolista “que jogou nos três” grandes, é designer, só que trabalha agora na parte de negócio como account manager. Mas não é o único. O universo da Splink conta, neste momento, com 23 jogadores e existem planos para continuar a crescer. A startup revelou ao Observador que está a contratar e que tem mais de 15 vagas abertas — para account manager, para a área de design, mas também a nível tecnológico para a parte do 3D.
A entrada em novos mercados e novas áreas de desporto, uma equipa com cerca de 30 pessoas e o crescimento também em termos de faturação são os principais objetivos da Splink. Manter os clientes habituais como um que “sempre que sai Benfica quer tudo o que existir do Benfica” ou um “do Canadá, que não é português e que compra tudo o que existe da seleção do ano que Portugal venceu o Campeonato da Europa” e ganhar novos adeptos também estão nas ambições do trio de ataque Ivan, Dulce e Hugo.