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Dos 27 doentes autorizados pelo Infarmed a usar o Kaftrio, quase um terço está no Santa Maria, em Lisboa
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Dos 27 doentes autorizados pelo Infarmed a usar o Kaftrio, quase um terço está no Santa Maria, em Lisboa

Constança Braddell/Instagram

Dos 27 doentes autorizados pelo Infarmed a usar o Kaftrio, quase um terço está no Santa Maria, em Lisboa

Constança Braddell/Instagram

Doentes tratados com medicamento de Constança estão a melhorar. Médicos entre a esperança e a cautela

Não chegam a 30 os portugueses que tomam o medicamento inovador para a fibrose quística conhecido após caso de Constança Braddell. Hospitais de Santa Maria e São João com resultados promissores.

O tempo que passou é curto e as equipas clínicas não estão prontas para celebrar. Apesar da prudência, tanto em Lisboa como no Porto os resultados são, para já, promissores entre os doentes de fibrose quística que estão a tomar o Kaftrio, o medicamento inovador que Constança Braddell — a jovem de 24 anos que morreu no domingo — tornou conhecido após o seu apelo nas redes sociais para que fosse disponibilizado com urgência. Se entre os doentes é conhecido como o comprimido milagroso, para os médicos ainda faltam dados sólidos para considerá-lo uma aposta ganha da ciência.

Uma das histórias que tem sido pautada pela sucesso é a de uma paciente do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, que congrega o Santa Maria e o Pulido Valente. Desde que começou a tomar o comprimido cor de laranja, teve melhorias significativas, sem historial de novos internamentos.

“Sem dar pormenores sobre nenhum caso em particular, podemos exemplificar com a situação de uma doente com um quadro base mais grave, que não teve qualquer internamento por agudização pulmonar desde que iniciou o Kaftrio (19 Março)”, revela ao Observador fonte oficial do Lisboa Norte. Em 2020, tinha tido seis internamentos por agudização.

Fibrose quística. Kaftrio, o medicamento de Constança, deve ficar disponível para todos os doentes ainda este mês 

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Os doentes, esclarece o centro hospitalar, têm referido sentir uma franca melhoria da qualidade de vida, algo que os médicos também observam — ganho de peso e respiração menos pesada. “Os doentes a fazer Kaftrio tiveram de uma forma generalizada melhoria do quadro respiratório e do estado nutricional, observando-se em alguns doentes aumento ponderal muito significativo”, detalha o Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte na sua resposta ao Observador.

Dos 27 doentes autorizados pelo Infarmed a tomar o Kaftrio, quase um terço está no Santa Maria. Para além desses 8 pacientes, naquele centro hospitalar há ainda 16 doentes com fibrose quística a usar outros moduladores, o Orkambi e o Symkev (de um total de 46 no país) . “Após 3/4 meses de terapêutica todos os doentes vão ser estudados com avaliação completa da situação clínica e de efeitos adversos”, garante o Lisboa Norte.

No Porto, o Centro Hospitalar de São João já submeteu sete pedidos de medicação com Kaftrio ao Infarmed, aguardando a avaliação dos quatro mais recentes. Nesta fase, todos os olhos da equipa estão sobre os doentes que já fazem a medicação inovadora.

Até à data não se registaram efeitos adversos graves em nenhum dos doentes. Apesar disso, em resposta ao Observador, fonte oficial do São João argumenta que a equipa clínica pensa ser necessário mais tempo para avaliar a eficácia do tratamento.

Os doentes têm referido sentir uma franca melhoria da qualidade de vida, algo que os médicos também observam — ganho de peso e respiração menos pesada. “Os doentes a fazer Kaftrio tiveram de uma forma generalizada melhoria do quadro respiratório e do estado nutricional", detalha o Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte.

“Todos os doentes em que o Kaftrio foi aprovado no Hospital de São João são seguidos de forma muito rigorosa, por forma a monitorizar a eficácia e segurança desta medicação inovadora”, acrescenta o centro hospitalar.

Contactados pelo Observador, o Centro Hospitalar Universitário de Coimbra e o Centro Hospitalar do Porto escusaram-se a dar informação sobre  a evolução do estado clínico dos doentes a quem administraram este medicamento. Já a resposta do Centro Hospitalar Lisboa Central não foi recebida até à publicação deste texto. Cada um dos centros fez, pelo menos, dois pedidos de uso do Kaftrio.

Em três meses, praticamente duplicaram os pedidos feitos pelos centros hospitalares para usar o medicamento inovador para a fibrose quística. Até ao final de julho, o Kaftrio deverá ficar completamente disponível no mercado nacional, já que, como o Observador noticiou, o Infarmed e a farmacêutica Vertex estão prestes a chegar a acordo.

Assim que o contrato ficar fechado, fica selado o acordo que estabelece o preço base do medicamento em Portugal, embora a farmacêutica que produz o Kaftrio (Trikafta nos Estados Unidos) possa estabelecer, depois disso, acordos comerciais diferentes de hospital para hospital.

Constança melhorou, mas não resistiu à doença

Constança Braddell, de 24 anos, sofria de fibrose quística e, através das redes sociais, queixou-se de não ter acesso ao Kaftrio. Mais tarde, o seu pedido para utilização excecional de medicamentos (AUE) foi autorizado pelo Infarmed 24 horas depois de ter sido submetido pela equipa que a seguia no Hospital de Santa Maria, em Lisboa.

Em maio, em entrevista à SIC, Constança falava da sua experiência após ter tomado o comprimido pela primeira vez a 12 de março, apelidando-o de milagroso. “Estou muitíssimo melhor, não tem comparação. Ainda tenho aqui o meu amigo, mas que espero poder deixar de usar”, contou, apontando para a mochila onde transportava o oxigénio.

“Quando tomei o comprimido senti logo muito mais energia”, contou, acrescentando que também teve bastante mais apetite e conseguiu recuperar quase metade do peso perdido no último internamento hospitalar. As dores também melhoraram: “Já tenho muito menos tosse. Antes acordava todas as noites com vários ataques por noite. Tinha muitas dores de cabeça e nos pulmões. Agora praticamente não tenho tosse.”

Este domingo, Constança Braddell acabaria por morrer, quatro meses depois de ter feito o tratamento pela primeira vez e após ter estado internada nos cuidados intensivos em estado muito grave nas últimas três semanas. O agravamento do estado de saúde deveu-se a um pneumotórax.

O que pode explicar o agravamento súbito do estado de saúde de um doente com fibrose quística?

Kaftrio. Reino Unido foi o primeiro a chegar a acordo

Em Portugal, o comprimido deve ficar disponível dentro de poucos dias, deixando de ser necessária a mediação do Infarmed para o comprimido entrar no país. Para já, só pode ser usado através de uma autorização de utilização excecional de medicamentos (AUE). Isto significa que, ao invés de o comprarem diretamente ao laboratório, os hospitais devem dirigir-se ao Infarmed com o pedido para usá-lo num doente concreto, mantendo o seu nome anónimo.

Se estiverem cumpridas as condições de acesso no Programa de Acesso Precoce (PAP) do Kaftrio, o Infarmed dá autorização para a compra do medicamento. Até à data, todos os tratamentos efetuados em Portugal foram a custo zero. O preço final com que será comercializado dificilmente será público, já que estes contratos têm cláusulas de confidencialidade que proíbem as partes de divulgar os valores acordados.

Em Espanha, ainda não há solução à vista. Depois do anúncio francês, a Fundação Espanhola de Fibrose Quística tem aumentado a pressão sobre o Ministério da Saúde para financiar com urgência o Kaftrio, citando os exemplos de outros estados europeus onde o processo de financiamento está mais avançado ou mesmo finalizado.

Na Europa, República Checa e Áustria estão entre os mais recentes países a fechar acordo com o laboratório e a garantir que, neste mês de julho, o medicamento para a fibrose quística da Vertex vai ser comparticipado pelo Estado. Em França, o anúncio do acordo foi feito, no final de junho, pelo ministro da Saúde, Olivier Véran e, desde 6 de julho, o reembolso do medicamento é de 100%.

Em Espanha, ainda não há solução à vista. Depois do anúncio francês, a Fundação Espanhola de Fibrose Quística tem aumentado a pressão sobre o Ministério da Saúde para financiar com urgência o Kaftrio, citando os exemplos de outros estados europeus onde o processo de financiamento está mais avançado ou mesmo finalizado.

Constança Braddell, a “guerreira” que sofria de fibrose quística, morre aos 24 anos

Em Itália, o acordo foi fechado pouco dias antes do francês, a 25 de junho. Em Malta, a 7 de julho, foi o próprio primeiro-ministro, Robert Abela, quem anunciou ter selado o negócio com a Vertex.

No Reino Unido, o acordo estava pronto mesmo antes da autorização oficial da Agência Europeia do Medicamento. Assim que o ‘ok’ da EMA chegou, em agosto de 2020, o Kaftrio ficou disponível através dos Serviços Nacionais de Saúde (NHS) de Inglaterra, do País de Gales, da Irlanda do Norte e da Escócia. Na Irlanda, o acordo foi selado em Outubro de 2020.

Nos Estados Unidos, onde o medicamento é comercializado com o nome de Trikafta, a aprovação da FDA (Food and Drug Administration) aconteceu a 21 de outubro de 2019. No entanto, desde junho desde ano que a aprovação do medicamento — que tal como na Europa visava apenas maiores de 12 anos — foi estendida a crianças a partir dos 6 anos.

As estimativas apontam para que a fibrose quística afete mais de 80.000 pessoas em todo o mundo. Em Portugal, haverá cerca de 400 pessoas com esta doença rara, que não tem cura e que reduz esperança média de vida dos doentes para os 40 anos.

O Kaftrio não cura a fibrose quística, mas melhora as condições de vida do doente, podendo aumentar a sua sobrevida. No entanto, também há riscos associados ao próprio medicamento e, apesar de se ter mostrado seguro e bem tolerado nos ensaios clínicos, pode ter efeitos adversos graves em algumas pessoas.

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