A viagem de carro de Lisboa até Peniche, cerca de uma hora por boas estradas e sem interrupções, permite fugir à manhã cinzenta da capital e receber o sol do Oeste. Um sol que não vai prolongar-se durante o resto da semana e que deixa a terceira etapa do WSL World Tour, na Praia de Supertubos, refém da meteorologia dos próximos dez dias.
“A única previsão que temos é imprevisível”, brincou Francisco Spínola, diretor-geral da WSL para Europa, África e Médio Oriente, na apresentação oficial do evento. A 15.ª edição do MEO Rip Curl Pro Portugal foi lançada esta terça-feira em Peniche, no Hotel MH Peniche, e vai acontecer entre os dias 6 e 16 de março. É a terceira etapa do WSL World Tour, depois de Banzai Pipeline e Sunset Beach, ambas no Havai, e conta com a participação de três surfistas portugueses.
Desde logo, Frederico Morais. O surfista de 32 anos regressou à elite do surf mundial em 2024, depois de um ano fora do World Tour, e vai jogar em casa após ter ficado em 17.º e nono nas duas primeiras etapas da temporada. Depois de não ter conseguido o apuramento para os Jogos Olímpicos de Paris e de ter falhado os de Tóquio por ter contraído Covid-19, o grande objetivo de Frederico Morais é manter-se no principal escalão – para isso, precisa de ser um dos 24 melhores a meio da época, em abril, depois dos dois eventos na Austrália.
Surfistas Joaquim Chaves e Francisca Veselko juntam-se a Kikas em Supertubos
Depois, Kika Veselko. Num ano em que já se tornou a primeira mulher a competir no Capítulo Perfeito de Carcavelos, a surfista de 20 anos que é campeã mundial júnior recebeu um dos dois wildcards e vai surfar as primeiras ondas no World Tour em Supertubos. Por fim, Joaquim Chaves. O jovem surfista de 20 anos também recebeu um wildcard, apesar de não estar no World Tour, e vai estrear-se ao mais alto nível depois de se ter sagrado campeão nacional no passado mês de outubro precisamente em Peniche.
“Vai ser um dos momentos mais importantes da minha vida, se não o mais importante. Sonho em participar no World Tour desde que comecei a surfar e sinto-me muito privilegiado por poder estar no meio dos melhores do mundo, por poder vestir a licra e competir com pessoas que idolatro. É uma oportunidade que vou tentar aproveitar ao máximo, vou levar esta etapa como uma experiência. Estou muito contente. Vou dar o meu melhor para poder representar Portugal da melhor maneira. Estou com muita vontade”, disse o surfista ao Observador.
Existente desde 2009, o MEO Rip Curl Pro Portugal continua a ser a única etapa europeia do WSL World Tour, estatuto alcançado em 2022 quando o evento do sul de França saiu do calendário. Para além de Portugal e ao longo de 10 etapas, o Mundial passa por Estados Unidos, Austrália, Tahiti, El Salvador, Brasil e Fiji. Competem 36 homens e 18 mulheres e a meio da temporada existe o tal cut – só seguem em frente os melhores 24 homens e as melhores 12 mulheres, que ficam também automaticamente apurados para o World Tour de 2025.
O brasileiro Filipe Toledo – que interrompeu a carreira para cuidar da saúde mental – e a norte-americana Caroline Marks são os atuais campeões mundiais, sendo que o também brasileiro João Chianca e a também norte-americana Caitlin Simmers defendem o título em Peniche, onde venceram no ano passado. Na conferência de imprensa desta terça-feira, para além dos três surfistas portugueses em competição, marcaram ainda presença Kanoa Igarashi, medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Tóquio, John John Florence, atual líder da classificação masculina e campeão mundial em 2016 e 2017, Molly Picklum, atual líder da classificação feminina, e também a própria Caitlin Simmers.
Frederico Morais vai dar “tudo por tudo” no regresso à elite mundial do surf
Kanoa Igarashi, surfista japonês que tem casa (feita de raiz e pensada por si numa ideia que nasceu durante a pandemia) na Ericeira e que fala um português irrepreensível, garantiu que Portugal tem “as melhores ondas do mundo” e sublinhou a vontade de dar continuidade ao bom momento depois de ter ficado no segundo lugar em Sunset Beach. “No ano passado saí do Havai no último lugar, cheguei a Portugal com muita pressão por causa do cut. Agora estou numa posição melhor e quero aproveitar para entrar no top 5 e entrar na segunda metade do ano em posição de lutar pelo título mundial”, começou por dizer.
“Esta é uma etapa onde todos os surfistas querem chegar cedo e aproveitar as ondas. Podemos acordar um dia e ter os melhores tubos e condições para fazer aéreos, condições para mostrar tudo aquilo que treinamos na pré-época. Tenho casa na Ericeira e passo muito tempo cá a surfar com os portugueses. Vejo Portugal como uma segunda casa”, completou o surfista de 26 anos.
Surfista norte-americana Caitlin Simmers estreia-se a vencer na elite em Peniche
O facto de Peniche continuar no WSL World Tour não é propriamente um mistério: explica-se através das ondas de classe mundial, condição base para a aprovação da etapa, e do investimento financeiro público e privado que permite organizar um evento de tal envergadura. “Os apoios públicos, Turismo de Portugal e Câmara Municipal de Peniche e restantes organismos, não chegam a 15% dos 3,5 milhões de euros necessários para realizar o evento. O resto é privado, em que quase 30% vem do investimento privado local, da MEO e da empresas angariadas em Portugal e a restantes angariação da nossa equipa a nível internacional”, explicou Francisco Spínola, deixando claro que o evento “paga-se a si mesmo” através do “impacto direto dos impostos”.
Para além das 500 pessoas envolvidas na preparação da etapa, a edição do ano passado contou com 150 mil pessoas na Praia de Supertubos – 30% eram cidadãos estrangeiros –, para além de 43,5 milhões de visualizações no site e na aplicação da WSL durante os heats. Números que a organização espera superar em 2024 e já a partir desta quarta-feira, com o primeiro período de avaliação das condições meteorológicas a arrancar às 7h30 e a competição a poder começar às 8h. O prize money total do MEO Rip Curl Pro Portugal ronda o milhão de euros e o impacto financeiro para a região de Peniche chega aos 12 milhões de euros.
“É inequívoco que o surf traz um desenvolvimento não só para a zona de Peniche, mas a todo o Oeste. Especialmente os locais que recebem provas da WSL, Ericeira e Nazaré. E não falo em termos de retorno mediático. Quem viaja pelo estrangeiro só ouve ‘Cristiano Ronaldo e Nazaré’. Estamos a criar um evento em março, a criar uma nova sazonalidade. Cada euro que entra nesta altura era um euro que não existia, é criado pelo evento”, terminou Francisco Spínola.