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Depois de contrair o novo coronavírus, no início de março, o autarca de Viseu não resistiu a complicações pulmonares e respiratórias
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Depois de contrair o novo coronavírus, no início de março, o autarca de Viseu não resistiu a complicações pulmonares e respiratórias

Depois de contrair o novo coronavírus, no início de março, o autarca de Viseu não resistiu a complicações pulmonares e respiratórias

Homem de família, portista ferrenho, agregador de equipas e apaixonado por Viseu. Almeida Henriques para além da política

Três amigos de Almeida Henriques, autarca de Viseu, lembram o lado pessoal, político e mediático do autarca. Falam de um homem otimista, agregador e apaixonado pela cidade que ajudou a transformar.

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Foi sócio num bar durante a juventude, vendeu livros porta a porta, tornou-se militante do PSD e nunca negou as suas raízes. Podia ter sido ministro da Economia, dizem, mas preferiu ser autarca em Viseu, a sua cidade. Adepto fervoroso do FC Porto, fã dos livros de Mia Couto e um líder natural, António Almeida Henriques morreu este domingo, aos 59 anos, depois de 28 dias internado no Hospital de São Teotónio, em Viseu, a lutar contra a Covid-19, 25 deles nos cuidados intensivos.

“Tinha condições para ser ministro ou até mesmo eurodeputado, mas o seu amor por Viseu falou mais alto”

Conceição Azevedo, atual vice-presidente da Câmara Municipal de Viseu, era amiga de longa data de António Almeida Henriques. Conheceram-se com 24 anos, faziam parte do mesmo grupo de amigos, ambos licenciaram-se em Coimbra, ele em Direito, ela em Engenharia Civil, e até chegaram a ser sócios de um bar em Viseu. “Chamava-se ‘Chaplin’, gerimos o espaço durante uns quatro ou cinco anos, mas aquilo não dava dinheiro nenhum”, recorda em entrevista ao Observador.

Conceição conta que o amigo nasceu em Viseu, passou parte da sua infância em Moçambique, com os pais e os dois irmãos, acabando por regressar com 12 anos à sua terra natal, onde mais tarde chegou a exercer direito, curso também escolhido pela mulher. A vice viseense é madrinha de casamento de ambos, união da qual nasceram três filhos, e presença assídua na vida familiar do presidente.

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Destaca o seu “amor pelos livros” e revela que o primeiro emprego do autarca foi exatamente a vender livros porta a porta pelo Círculo de Leitores. Outra das grandes paixões de Almeida Henriques era o FC Porto, tendo sido um adepto ferrenho, sócio e espetador assíduo dos jogos no estádio, antes na Antas, agora no Dragão. O clube dividia claramente o agregado familiar, já que o autarca e o filho do meio eram portistas, enquanto a mulher e os restantes dois filhos torciam pelo Benfica. “Era engraçado ver as picardias nos dias de clássico.”

“Lembro-me que o FC Porto ganhou um jogo importante [contra a Juventus] e mandei-lhe uma SMS a felicitá-lo, mas ele não respondeu imediatamente. Aí percebi que alguma coisa não estava bem.”
Conceição Azevedo, atual vice-presidente da Câmara Municipal de Viseu

A vontade de seguir uma carreira na política não foi algo que surpreendesse Conceição. A amiga recorda que, desde os 15 anos, Almeida Henriques mostrava ser “um jovem dinâmico e reivindicativo”, dando nas vistas nas associações de estudantes, depois na Juventude Social Democrata, na Assembleia Municipal da Câmara Municipal Viseu e mais tarde como deputado na Assembleia da República e como Secretário de Estado Adjunto da Economia e do Desenvolvimento Regional. “Tinha condições para ser ministro ou até mesmo eurodeputado, mas o seu amor por Viseu falou mais alto”, explica, acrescentando que o autarca tinha “um projeto para a cidade com uma visão estratégica e de futuro, que culminava na cultura, na economia e na empregabilidade”.

Colaboraram juntos profissionalmente desde 2017, ano em que Almeida Henriques foi reeleito como autarca de Viseu. “Ele não tinha o poder concentrado, delegava funções, dava-nos confiança e liberdade, tinha uma atitude positiva que é muito natural. Chegava sempre à câmara com um sorriso, cumprimentava todos os taxistas da praça e adorava crianças.”

Almeida Henriques foi eleito autarca de Viseu em 2013, tendo sido reeleito em 2017. Preparava-se para uma nova candidatura este ano

Octavio Passos/Observador

Apesar de ter 59 anos e uma bronquite asmática diagnosticada há vários anos, nada fazia temer pela saúde do autarca. Na quinta-feira, 4 de março, realizou-se uma reunião de executivo da câmara feita por vídeo conferência, a última com a presença do presidente, e Conceição Azevedo ouviu-o a tossir insistentemente. “Sei que ele tem asma, mas aquela era uma tosse diferente, muito seca e persistente.” Na tarde desse mesmo dia, António Almeida Henriques fez um teste à Covid-19 que deu positivo. Acabou por ser internado no domingo, 7 de março. “Lembro-me que o FC Porto ganhou um jogo importante [contra a Juventus] e mandei-lhe uma SMS a felicitá-lo, mas ele não respondeu imediatamente. Aí percebi que alguma coisa não estava bem.”

A vice-presidente garante que na autarquia ninguém ficou infetado, mas o agregado familiar de Almeida Henriques, sim, incluindo a sogra, que chegou a ser hospitalizada, acabando por recuperar. “Veio-se a saber agora que tem também enfisema pulmonar, fruto dos muitos anos que fumou dois maços por dia. Só deixou de fumar há 28 anos, quando o primeiro filho nasceu. E isso dificultou a sua recuperação.”

A amiga de família partilha ainda que o autarca de Viseu tinha uma vida minimamente ativa, dava caminhadas de 10 quilómetros com a filha e estava a fazer uma dieta para equilibrar o seu peso. Por ser a pessoa mais próxima do presidente, são muitos os funcionários da câmara que, nos últimos dias, procuraram Conceição para obter informações sobre o estado clínico do presidente. “Ficaram todos consternados, mas com esperança que ele recuperasse. Estamos unidos para fazer um bom trabalho e o deixarmos orgulhoso disso.”

“O vírus é da oposição e resolveu atacar forte, mas vou derrotá-lo. Um abraço!”

Pedro Alves, membro da Assembleia Municipal e presidente da Distrital do PSD de Viseu, conheceu Almeida Henriques como militante do partido e teve desde cedo a imagem de uma pessoa “simpática, competente, empreendedora e dinâmica”. Destaca a sua capacidade em formar equipas, agregar pessoas e construir pontes, “fez isso tanto na política, como na vida associativa e empresarial”.

Lembra o seu papel como presidente da Associação Empresarial da Região de Viseu ou da Direção do Conselho Empresarial do Centro, “nunca largando a componente partidária”, identificando-se a 100% com os princípios e o valores ditados pelo PSD, sendo também um conhecedor profundo dos “problemas da economia na região centro-norte”. “Era uma pessoa de diálogo, muito determinada e com grande capacidade de liderança.”

Em 2002, Pedro Alves, como líder da JSD, e Almeida Henriques, como deputado e depois como vice-presidente da bancada parlamentar, tornaram-se novatos na Assembleia da República. “Nessa altura, passei a ter mais proximidade com ele, fruto dessa conivência, passámos a ter uma amizade mais sólida.” Não partilhavam boleias de carro, mas a admiração era mútua. “Penso que era uma pessoa muito consensual, respeitada e delicada. Por ser uma referência no partido, foi uma opção para muitas situações, tinha alguma ambição, aliás, na política quem não tiver ambição vai para casa.”

“Fizemos-lhe o convite num sábado e ele disse que tinha que falar com o primeiro-ministro, Passos Coelho, e o ministro da Economia, Álvaro Santos Pereira. Terça-feira à tarde a candidatura é aceite a nível nacional. Não fez nada para correr, mas esteve sempre disponível.”
Pedro Alves, membro da Assembleia Municipal e presidente da Distrital do PSD de Viseu

Em 2011, Almeida Henriques foi nomeado Secretário de Estado Adjunto da Economia e Desenvolvimento Regional no governo de Pedro Passos Coelho e Pedro Alves elogia algumas das marcas que o amigo deixou no cargo. “Teve uma grande responsabilidade na reprogramação dos fundos comunitários e na criação de programas de recuperação e ajuda às empresas, nomeadamente no que toca às exportações.”

Dois anos depois de estar no governo, o social democrata mostrou-se disponível para concorrer à Câmara Municipal de Viseu, deixada pelo histórico Fernando Ruas, e tomou essa decisão de ser candidato em poucas horas. “Fizemos-lhe o convite num sábado e ele disse que tinha que falar com o primeiro-ministro, Passos Coelho, e o ministro da Economia, Álvaro Santos Pereira. Terça-feira à tarde a candidatura é aceite a nível nacional. Não fez nada para correr, mas esteve sempre disponível.”

Estávamos em 2013 e Pedro Alves era diretor de campanha no primeiro mandato de Almeida Henriques a Viseu, época em que descobriu a sua espontaneidade nas ruas, o seu gosto por comer bem e o seu jeito para dançar em bailaricos. “Passava mais tempo com ele do que com a minha própria família, nunca nos chateámos. Era pontualíssimo e tinha sentido de compromisso.”

Numa das muitas reuniões de direção de campanha que tiveram juntos, foi discutida a limitação de custos em outdoors e um arquiteto sugeriu arranjar outdoors movíveis, possíveis de serem deslocados. “Ele gostou da ideia e perguntou logo ao homem se ele ficaria responsável pela mobilidade dos outdoors. Ouvindo a recusa do arquiteto, afirmou que não se pode ter ideias e não as concretizar. Era muito prático.”

O social-democrata era conhecido por ser determinado, agregador e dar especial importância ao mundo empresarial e económico

Pedro não esquece o espírito “jovem, aberto e sem preconceitos”, o político “bastante liberal nos costumes e comportamentos”, capaz de “respeitar a diferença e aceitar a mudança”. “Era um homem de família, muito ligado às suas origens e raízes.” Requalificar o Mercado 2 de Maio ou o Viseu Arena e transformar a cidade na capital vinhateira do Dão eram metas do autarca que, segundo o companheiro de partido, defendia também a regionalização.

Com Rui Rio tinha uma relação “meramente institucional”, uma vez que nunca o apoiou, ainda assim Pedro Alves acredita que Almeida Henriques “era um homem do partido”, não pretendia liderá-lo, mas “dava a cara, não se escondia, e assumia as suas funções”. Após completar 60 anos de vida, a 5 de maio, o autarca de Viseu preparava-se para apresentar, agora, nesse mesmo mês, a sua recandidatura. “Estava contente com esta possibilidade.”

Quando soube que o amigo estava infetado com o novo coronavírus, o presidente da distrital do PSD/Viseu ficou surpreendido, preocupado, mas também revoltado. “Revolta-me muito porque ele era uma pessoa extremamente cuidadosa consigo e com os outros. Lembro-me de ir falar com ele à câmara, estarmos separados uns quatro metros no gabinete e mesmo assim ele não tirava a máscara.” Pedro Alves conta ainda que já positivo, o presidente fez questão de estar presente na cerimónia virtual de entrega dos diplomas de mérito aos alunos do concelho. “Estava com a voz rouca e disse-lhe para não se meter em frente ao computador porque que isso cansava muito. Mesmo assim, ele foi. Creio que não queria dar uma prova de fraqueza.”

Outro motivo da sua revolta é o facto de o autarca não ter sido vacinado. “A obrigação do Estado é proteger os cidadãos, o Governo tinha que dar prioridade aos autarcas na vacinação. Ele queria tomar a vacina e estava em contacto com a população. Talvez a vacina evitasse esta situação.

Almeida Henriques foi internado a 7 de março, “chegando ao Hospital de S. Teotónio pelo seu próprio pé”, tendo depois sido transferido, três dias depois, para a unidade de cuidados intensivos, onde esteve ventilado vários dias. Emocionado, Pedro Alves relê ao Observador a última mensagem que recebeu do autarca: “O vírus é da oposição e resolveu atacar forte, mas vou derrotá-lo. Um abraço!”

“No Governo tinha um perfil britânico, na autarquia tornou-se um beirão”

Jorge Sobrado, atual vereador da Câmara Municipal de Viseu, não esquece o dia em que conheceu o advogado: 16 de dezembro de 2011. Foi seu assessor no governo de Pedro Passos Coelho e seu ajunto no município de Viseu durante o seu primeiro mandato, entre 2013 e 2017. “Tinha um perfil britânico, pose institucional, trato afável, mas com alguma distância. Era um bom orador, tinha uma voz característica, muito forte.” O perfil de Almeida Henriques “adocicou-se” quando migrou para o poder local, tornando-se “mais popular, mais solto e mais informal”, livre das “amarras protocolares”. “Podemos dizer que passou de um perfil britânico para um beirão, onde dançava e cumprimentava toda a gente.”

“Reunia todas as condições para ter um cargo nacional, tinha ambição para isso, os jornais até o apelidavam de ‘quase ministro da Economia’. É uma das figuras nacionais do PSD, respeitado por todos, e poderia ter sido ministro.”
Jorge Sobrado, atual vereador da Câmara Municipal de Viseu

O vereador fala de um homem “trabalhador e muito determinado”, que estudava todos os dossiês, procurava documentar-se, informar-se, e só depois tirar as suas próprias conclusões. “Não foi um político de sound bytes, foi ao fundo dos problemas e isso deu-lhe uma predisposição para lidar com várias questões, sendo multidisciplinar em várias frentes, como um bom autarca deve ser.”

Sobrado garante que Almeida Henriques “respirava Viseu por todos os poros” e que mesmo no Governo, como secretário de Estado, nunca se esqueceu da cidade, falava dela a todos os colaboradores e tinha-a “no seu pensamento e na sua agenda”. Foi precisamente esta “ligação à terra” que o fez abraçar o poder local, uma decisão, segundo Jorge Sobrado, tomada “rapidamente e com o coração”. “Reunia todas as condições para ter um cargo nacional, tinha ambição para isso, os jornais até o apelidavam de ‘quase ministro da Economia’. É uma das figuras nacionais do PSD, respeitado por todos, e poderia ter sido ministro.”

Em Viseu, o vereador não executivo sublinha que há “um antes e um depois” da governação “mais aberta e participativa” de António Almeida Henriques. “Deixa uma marca definitiva na cidade, ligou Viseu ao país. Viseu estava isolada e desconectada com outras cidades, ele abriu as janelas e tornou Viseu mais arejada.” Da programação cultural aos incentivos para a instalação de empresas tecnológicas na região, são muitos os exemplos enumerados que realçam a importância do autarca, que era também vice-presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), na qual dirigia a secção de Smart Cities.

Hospital de Viseu

Foi no Hospital de S. Teotónio, em Viseu, que Almeida Henriques foi internado, infetado com Covid-19, a 7 de março

Octavio Passos/Observador

Para Jorge Sobrado, o advogado era um homem profundamente otimista, com interesse na mudança e que pensava o futuro, apesar da sua grande paixão por história. “Era um leitor compulsivo de romances históricos, adorava Mia Couto.” Os “fortes laços” com a família e os amigos não passavam despercebidos ao amigo, que, emocionado, define dois traços fundamentais da personalidade do político. “A capacidade de rir de si próprio e de tudo o que estava à sua volta, mesmo das coisas menos boas, e o seu cuidado com as pessoas. Tive um susto de saúde há uns tempos e ele esteve sempre lá.”

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