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"Já assistimos a um pequeno 'crash' das bitcoins e vão acontecer mais este ano"

Frank-Jurgen Richter lidera a Horasis, organização que concorre com o Fórum Económico Mundial e que faz o seu encontro anual em Cascais. Ao Observador, falou do evento, de criptomoedas e da Europa.

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Frank-Jurgen Richter foi um dos diretores do Fórum Económico Mundial e em 2005 criou o Horasis, um think tank que traz a Portugal alguns dos políticos e empresários mais influentes do mundo. Objetivo: reunirem-se como acontece em Davos, na Suíça, para conversarem sobre o futuro. Numa entrevista ao Observador, Richter assume que um dos “principais ingredientes para preparar o futuro” é a tecnologia e que já ninguém pode travar as criptomoedas. “Já assistimos a um pequeno crash das bitcoins e vão acontecer mais este ano. Basta ver o exemplo de George Soros, que agora está a apostar contra as criptomoedas. Se ele acredita nisso, isso vai acontecer”, afirmou.

Quanto ao facto de o Horasis Global Meeting decorrer em Cascais, entre 5 e 8 de maio, confessa que isso acontece por a cidade “ser o novo centro do diálogo global”. Com o apoio do governo português e da câmara de Cascais, o evento traz ao país líderes de mais de 80 países. Segundo explica Richter, que durante quatro anos esteve no comando das operações na Ásia do Fórum Económico Mundial, o objetivo do Horasis — que o empreendedor define como “um laboratório de ideias” — é ser o que Davos “era há 30 anos”. Sobre Portugal, o alemão apregoa que o pior já passou e que a economia do país está estável e a crescer.

Para reunir todos os “players”, o alemão quer que “Horasis seja sinónimo de Cascais” — e assim tem sido, desde 2014.Pelo palco da edição do ano passado passaram nomes como o Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa, o primeiro-ministro António Costa, o ex-presidente da Comissão Europeia Durão Barroso, Deborah Wince-Smith (presidente do Conselho de Competitividade dos Estados Unidos da América), o cardeal Peter K.A. Turkso, do Vaticano, Werner Hoyer, presidente do Banco Europeu de Investimento ou os ex-prémios Nobel da Paz Bernard Kouchner, Rajendra K. Pachauri e José Ramos-Horta, ex-presidente de Timor-Leste. Para a edição deste ano, ainda não há nomes anunciados.

O Horassis é um fórum económico que junta líderes de todo o mundo com ênfase nos países em desenvolvimento

“Portugal é agora um dos países com maior crescimento económico na Europa”

Há um ano, numa entrevista, disse que “Portugal pode ser a próxima Sillicon Valley”. Um ano depois, estamos mais perto ou mais longe?
Acho que Portugal está a avançar. No ano passado ainda se sentia um impacto negativo muito grande de Bruxelas com a Comissão Europeia a olhar para Portugal como sendo um dos principais países afetados pela crise financeira. Mas acho que isso acabou. Portugal é agora um dos países com maior crescimento económico na Europa.

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Considera que a crise acabou?
Absolutamente. A crise, definitivamente, acabou em Portugal. A crise teve duas razões: uma foi externa e, como todos no mundo, Portugal foi afetado. A outra razão foi interna. Portugal tinha um grande foco no mercado imobiliário no passado. Quando a crise chegou obviamente que isso foi um problema. Mas o governo português focou-se muito em atrair novas tecnologias para atrair investimento. Não só em serviços, mas também na produção. Acho que é um pouco o ecossistema que está aqui a acontecer. Os empreendedores querem estar onde os outros empreendedores estão. Como em Silicon Valley, eles querem estar num sítio bom e com sol. E isso é o que temos em Cascais.

Ainda nos falta muito para estarmos ao nível de Silicon Valley?
Ainda há um caminho a percorrer. Sillicon Valley começou nos anos 60. Inicialmente, foi muito financiado pelo setor da defesa e obviamente que não se pode alcançar 50 anos num só dia. Mas na Europa sinto que Portugal está lentamente a chegar à primeira posição, a atrair novos talentos de todo o lado. já vi jovens russos, europeus, asiáticos, todos a viajaram para Portugal. É um buzz que está a acontecer. Vemos também que o que é preciso fazer, como em Sillicon Valley, é criar um elo forte com as universidades. E em Cascais temos agora a Universidade Nova de Lisboa que está a abrir uma nova faculdade de economia e gestão. Este elemento é muito importante pois estão a ser criadas incubadoras de startups. E há ainda o talento quem vem da própria universidade, como os professores.

"No ano passado ainda se sentia um impacto negativo muito grande de Bruxelas com a Comissão Europeia a olhar para Portugal como sendo um dos principais países afetados pela crise financeira. Mas acho que isso acabou. Portugal é agora um dos países com maior crescimento económico na Europa"

No ano passado o tema da conferência foi “building togetherness” [construir a união]. Estamos mais unidos atualmente?
Estamos mais unidos, mas diria que nem toda a gente. Há países na Europa de leste que foram por um caminho próprio, como a Hungria e a Polónia. A dúvida é se estes países ficam sequer na União como membros.

Há uma forte possibilidade de esses países saírem da União Europeia?
Não diria uma hipótese forte, mas estes países têm mesmo de pensar no que fazer. Isto porque atualmente estão a ir contra a corrente nas grandes questões: na questão da imigração, os padrões europeus, e por aí adiante. Mas na Hungria há eleições este ano e vamos ver o que muda. No entanto, o resto da Europa está a ficar mais forte. Por um lado, a relação entre a Alemanha e França. Por outro, também a relação entre os países do norte e do sul. No passado, sentia-se muito esta questão dos países do sul e do norte, mas agora sinto que a Europa está mais próxima. Países como Portugal, Espanha, Itália e até a Grécia, estão a tentar acompanhar o passo com o norte. É uma nova harmonia.

Questões como a independência da Catalunha é algo que não deve ser motivo de preocupação?
A Catalunha é um caso especial e não vejo nada semelhante a acontecer noutras partes da Europa. Disse-se que o mesmo ia acontecer noutros países, como em Itália ou na Bélgica, mas o fenómeno não se alastrou. A Catalunha é realmente um caso especial. A longo prazo, a Catalunha vai permanecer parte de Espanha. Talvez vá ter mais autonomia em assuntos específicos, mas isso é algo a negociar. Uma Espanha forte e unida é um bom exemplo para o resto da Europa. No fim, o que conta não é a identidade nacional. Devemos ser todos europeus. Estamos a trabalhar numa identidade europeia e não numa nacionalidade local. Portugal é um bom exemplo disso porque é muito pró-europeu. Devemos também querer que a Europa tenha um papel mais ativo no mundo, que tenha algo mais a dizer na agenda global. Não é deixar todos os assuntos para os americanos, por um lado, e para os chineses, por outro. Precisamos de uma Europa mais forte. E o nosso evento vai ajudar nisso. Vamos convidar ministro de toda a Europa e o ministro português da Economia está a convidar outros países europeus. Debater o futuro da Europa é algo que se quer e que é preciso.

“Não vejo as criptomoedas a substituírem as moedas existentes num futuro próximo”

Disse no passado que “confiança é a moeda”, não o dólar ou o euro. Estamos a assistir a um movimento cada vez maior de pessoas a utilizar criptomoedas. Acha que é uma moda ou uma abordagem definitiva da sociedade contra as instituições bancárias?
Essa é precisamente uma das maiores questões atualmente. Há quem diga que as criptomoedas são o futuro, temos várias conferências de fintech e criptomoedas no evento. Obviamente que vemos exemplos de países como a Venezuela, que começou a utilizar criptomoedas por causa da fraca valorização da moeda, que se deveu a uma inflação de 20%. A pergunta é quão independentes podem ser as moedas nacionais contra as criptomoedas. No longo prazo, as criptomoedas vão existir. Não vejo as criptomoedas a substituírem as moedas existentes num futuro próximo.

É uma bolha?
É algo que vai acontecer, só falta é saber quando. A pergunta é se as criptomoedas são uma economia paralela que vai continuar a existir ou se vão substituir as moedas atuais. Nos próximos 10 ou 15 anos vamos continuar com o sistema antigo, mas as criptomoedas vão continuar a existir. Mas por exemplo, já assistimos a um pequeno crash das bitcoins e vão acontecer mais este ano. Basta ver o exemplo de George Soros, que agora está a apostar contra as criptomoedas. Se ele acredita nisso, isso vai acontecer. Mas falar de criptomoedas é falar na tecnologia que está por detrás, o blockchain. As criptomoedas são baseadas em blockchain, mas o blockchain pode fazer outras coisas, pode reinventar a Internet. Toda a inteligência artificial utiliza o [protocolo do ] blockchain, é uma alteração no no paradigma.

"As criptomoedas são baseadas em 'blockchain', mas o 'blockchain' pode fazer outras coisas. Podemos reinventar a Internet. Toda a inteligência artificial utiliza o 'blockchain', é uma alteração no no paradigma"

Voltando ao tema deste ano, já que falou no blockchain. A inteligência artificial é a resposta para unir mais as pessoas?
É uma das respostas para nos unir mais. Isto porque a tecnologia blockchain é baseada na partilha, não é como se uma pessoa pudesse controlar e ser o único detentor da tecnologia. É uma abordagem muito interessante. Vimos tentativas semelhantes no passado, por exemplo, com software como o Linux. Deve a Microsoft deter estes programas ou devemos partilhá-los? Mas agora com o protocolo blockchain o modelo de partilha está mesmo a acontecer. A tecnologia de blockchain é uma das respostas para o futuro, o único problema é que a maioria das pessoa ainda não a conhece bem. A maior parte do governos ainda não conhece e não tem noção do que está a acontecer. Com a inteligência artificial a ganhar maior importância a forma como trabalhamos vai mudar. Tudo vai seguir um modelo automatizado. Basta ver o exemplo dos carros autónomos: já não precisamos de camionistas. Há centenas de milhar de camionistas em todo o mundo que vão perder os empregos. Isto é uma grande revolução para o mercado de trabalho e também para a educação. As escolas vão ter de mudar a forma de ensino e ver que tipo de estudantes precisamos e que tipo de trabalhadores vamos precisar no futuro.

Estas novas ferramentas estão a criar riqueza para a humanidade enquanto um todo, mas também tem de ser redistribuída. Como devem os Estados tratar estes assuntos?
Podemos sempre ver o copo como meio cheio ou meio vazio. Por um lado, o mercado de trabalho está a mudar e as pessoas estão a perder empregos. No entanto, vamos ganhar mais tempo livre e mais tempo para passar com as nossas famílias. Quem sabe, no futuro, não vamos todos ser trabalhadores móveis. De repente, já não temos um emprego para toda a vida. Se calhar o que vai acontecer é que não vamos ter emprego de todo. As pessoas vão trabalhar por conta própria, com os seus portáteis a fazer apenas trabalho temporário, apenas a mudar de projeto em projeto. É uma grande revolução que está a acontecer.

“Quando nos referimos ao digital não vejo grandes empresas [europeias]. O normal é serem americanas ou chinesas”

Mas acha que a sociedade está pronta e os governos dispostos a criar as regras necessárias para partilhar a riqueza que está ser criada graças à inteligência artificial?
Não, não creio que os governos estejam prontos. Não há sequer muitos governos do mundo a pensar sobre isto. Um dos governos que está a trabalhar muito nesta questão é a China. A chinesa Tencent, que tem o WeChat, é agora a quinta maior empresa do mundo, mas na China tudo está ligado ao governo e há grandes think thanks ligados ao governo que estão a tentar reinventar o futuro. Eles estão a trabalhar em cenários a longo prazo. Na década de 1990 vivi durante quatro anos na China e, na altura, sempre que se queria um táxi bastava apanhar um na rua. Agora já não se pode fazer isso. É preciso ir pelo Didi — que é como o Uber — e se não se estiver nesta plataforma não se pode pedir um táxi. É um sistema que não utiliza dinheiro físico e, mesmo nas zonas rurais do país, as pessoas estão a utilizá-lo. As pessoas já não andam com dinheiro. A China passou de uma idade média para o futuro. Agora é tudo sobre inteligência artificial, pagamentos eletrónicos e a China está à frente.

"Por um lado o mercado de trabalho está a mudar e as pessoas estão a perder empregos. No entanto, vamos ganhar mais tempo livre e mais tempo para passar com as nossas famílias. Quem sabe, no futuro, não vamos todos ser trabalhadores móveis. De repente já não temos um emprego para toda a vida. Se calhar o que vai acontecer é que não vamos ter nenhum emprego de todo"

Mas não crê que estas tecnologias vão criar uma divisão maior entre pessoas que se podem conectar à Internet e os que não podem ou conseguem?
Absolutamente. É algo que acontece entre as pessoas ,mas também entre países. Estive na Guiné e no aeroporto percebi que os bilhetes eram processados à mão, não havia computadores. Ainda há países que não estão digitalizados.

Então vai criar uma divisão maior entre países.
Sim. Diria que vai criar uma nova batalha pela dominância tecnológica: quem está à frente manda no mundo. Penso que a China está a ir nesta direção. A Índia vem logo a seguir. Depois países como Singapura, que é agora como a Sillicon Valley da Ásia. Na China, temos Shenzhen (onde é a base da Huawei), que é muito próxima de Hong Kong e é a Sillicon Valley da China. A pergunta é como é que podemos combater esta divisão entre os que têm acesso à Internet e os que não têm. Basta pensar nos mais idosos e nas pessoas de meios rurais. O lado otimista, voltando a falar do exemplo da China, é que todos os agricultores do país utilizam pagamentos eletrónicos e têm smartphones.

Quando diz todos não é exagerado?
Eles têm, vou à China quatro/cinco vezes por ano. Vejo que nas quintas está tudo ligado à Internet através de smartphones. E estamos a falar de pessoas de meios rurais. É deslumbrante. A China está na vanguarda do e-commerce. Se quisermos ter alguma coisa numa aldeia no interior é possível encomendá-la pela Internet numa das plataformas. A China está à frente.

Então a União Europeia não está…
A UE não está. Quando nos referimos ao digital não vejo grandes empresas. O normal é serem americanas ou chinesas.

Em maio, vai ser aplicada uma nova lei da proteção de dados, na qual o deep learning e a inteligência artificial são conceitos cruciais. Graças a estas tecnologias é possível traçar o perfil de um consumidor assim que entra num website. Este tipo de legislação é um revés para a UE ou é o lado humano a controlar os efeitos da tecnologia?
Podemos referir que é o “lado humano”, mas também podemos dizer que a União Europeia está a ir a um passo mais rápido do que devia ou até que está a avançar a um passo maior do que devia nesta questão da proteção. Isto porque a Internet vive da liberdade de expressão. Os chineses foram noutra direção. Na China, temos uma grande barreira na Internet. No que toca a conteúdos a China é muito protecionista. Mas, mesmo assim, a China está a prosperar tecnologicamente.

Isso devia ser um exemplo?
Não devia ser um exemplo para a Europa. A China é um caso especial e está numa fase muito particular de desenvolvimento económico. A China precisa de uma forma diferente de governo quando comparada com a Europa. Não podemos aplicar a democracia de um país ocidental num país como a China. Talvez daqui a 30 ou 40 anos, mas não agora. O que o governo chinês está a fazer é correto. Passo a passo abrem as portas, como o controlo dos media e por aí adiante. Basta pensar no sucesso da Singapura, que não tem um modelo democrático com se vê no ocidente.

“Cascais pode ser o novo centro do diálogo global”

Porque é que criou o Horasis?
Porque acredito no diálogo global. Para que as pessoas de todo o mundo possam conhecer-se e discutir o futuro. Atualmente, há muitos desequilíbrios no mundo. Há desequilíbrios entre os países desenvolvidos e os países não desenvolvidos; desequilíbrios dentro de cada país que levam a populismos e à ascensão de partidos extremistas na Europa (e também nos Estados Unidos). Basta pensar na questão do terrorismo no mundo todo e percebemos que há alguma desconexão entre o poder e o fenómeno da globalização. No Horasis, queremos defender a globalização. Acreditamos que a globalização é uma coisa boa, mas temos de nos reposicionar e dizer que todos se devem juntar e trabalhar connosco [a Horasis] para fazer deste mundo um mundo melhor. Para nós, o Horasis é uma plataforma para a qual queremos convidar os principais agentes económicos, políticos e da sociedade civil no mundo todo.

Escolheu organizá-lo em Portugal porquê?
Acho que por duas razões. A principal é que gosto do país, é quase como se fosse uma história de amor. Gosto muito de vir cá, gosto muito da cultura. Depois, Portugal tem os ingredientes certos. A História: são um povo de navegadores que descobriram o mundo. Têm a globalização nos vossos genes, no vosso ADN. Depois, a vossa localização. Portugal está a meio caminho entre a Ásia, a Europa e as Américas. É como um ponto de encontro entre o este e o oeste, mas também entre o norte e o sul. A ligação de Portugal-África. A localização é uma grande vantagem. Muitas empresas estão agora a descobrir Portugal como um hub. E estão a mudar os negócios para aqui, nesta época pós-Brexit vemos várias empresas a mudarem-se de Londres para Lisboa. Outra das razões é o governo português ser muito proativo. Temos [o Horasis] uma relação muito boa com o governo e, claro, com o município de Cascais.

"Cascais pode ser o novo centro do diálogo global. Algo semelhante ao que atualmente é Davos. Davos, nos Alpes Suíços, penso que pode -- e deve ser -- Cascais no futuro. Isto com Portugal a ser o país anfitrião"

E porquê Cascais?
Cascais é um lugar fantástico para fazer a reunião. Os participantes gostam do local e tem ótimos acessos, como a ligação ao aeroporto. Cascais pode ser o novo centro do diálogo global. Algo semelhante ao que atualmente é Davos para o Fórum Económico. Davos, nos Alpes Suíços, penso que pode — e deve ser — Cascais no futuro. Isto com Portugal a ser o país anfitrião. Cascais tem muita vantagens. Tentamos evitar grandes cidades por razões de segurança. Muitos destes participantes vêm a Cascais e trazem a família, alguns até vêm um dia antes para jogar golfe. Temos uma óptima relação de trabalho com o presidente e o vice-presidente da câmara. Este tipo de negócio é baseado na confiança e na relação a longo prazo. E é isso que temos. Convidaram-nos para mantermos a reunião nos próximos quatro anos e vai ser quase como um sinónimo para Horasis, porque vamos ficar sempre num só local.

Cascais foi o primeiro município português a estar representado na CES, o maior evento de tecnologia do mundo. Um dos temas comuns à conferência deste ano é o deep learning e a inteligência artificial e a conferência está relacionada com estas temáticas. Porquê?
Antes de tudo, Portugal está a desenvolver-se lentamente num pólo tecnológico. Muitos jovens empreendedores escolhem Portugal como um hub porque ir para Silicon Valley é muito caro. E o que as startups mais recentes agora gostam é de estar em Portugal. Há muitos empreendedores tecnológicos a virem de todos os cantos do mundo, incluindo muitos americanos. Temos vários empreendedores que viajam para Portugal para descobrir o que se está a passar na indústria tecnológica. Cascais foi um dos primeiros municípios a utilizar a “e-governação” [governação electrónica]. Um dos nossos tópicos, o tema principal do evento é “inspirar o nosso futuro” [inspiring our future] e um dos ingredientes importantes é a tecnologia. Acreditamos que a tecnologia consegue fazer coisas boas para a humanidade, especialmente quando pensamos em inteligência artificial.

Trabalhou com o fórum económico social na Ásia durante quatro anos. O que podia ter feito de diferente enquanto esteve no cargo?
Davos é como que um monopólio. É o maior e o melhor encontro em todo o mundo. Mas no que toca a monopólios nunca é bom. É preciso sempre mais concorrentes. E penso que o que podíamos ter feito de diferente é o que fazemos agora em Cascais [com o Horasis], em que utilizamos o modelo que Davos tinha há 30 anos. Um modelo com reuniões mais pequenas, mais orientado para negócios.

Voltando ao populismo. Disse que a Europa está afastar-se destas questões, “que o pior já passou”, mas vimos a Catalunha a declarar unilateralmente a independência e a crise dos refugiados a ficar sem resposta. O populismo acabou na Europa? Ou é algo que ainda vai escalar?
O populismo ainda está lá, mas o momentum já passou. No ano passado, vimos acontecerem eleições em França, com Marie Le Penn a perder e com Emmanuel Macron, que é muito pró-europeu, a aparecer como a nova figura central. No final das contas, os poderes que estão no centro estão a ganhar. Mesmo no Reino Unido penso que quem o incentivou o Brexit está a perder impacto. O Reino Unido está mais pró europeu. Trump ter começado o populismo é quase como um benção disfarçada para a Europa. Isto porque a Europa vive agora um momento muito crítico em que pode repensar as estruturas centrais e, talvez, até reformar a Comissão Europeia. Acho que isso está a acontecer agora. A Europa vai sair maior forte e unida depois destes movimento populistas.

Vamos ver nascer uma Europa mais unida e forte?
Absolutamente. E vamos falar disso na nossa sessão em Cascais sobre o futuro da Europa (o ministro dos negócios estrangeiros português vai lá estar). O governo português está a ganhar uma grande reputação na Europa porque o chefe do Eurogrupo é o vosso ministro das finanças. Portugal tem agora um grande número de representantes em altos cargos mundiais, como o chefe das Nações Unidas, por exemplo. Há cada vez mais figuras portuguesas a terem responsabilidade. Na Europa, as pessoas estão a ver o caminho português porque Portugal não está necessariamente na abordagem miraculosa de apenas “poupar dinheiro”. Não passou apenas por reduzir orçamentos. Portugal ainda está a gastar, mas a gastar sabiamente. Isto, especialmente, em tecnologias do futuro.

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