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"É uma ideia errada do nosso tempo: que no networking vale tudo, que nos cocktails ou nas redes sociais tudo se consegue", diz a artista
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"É uma ideia errada do nosso tempo: que no networking vale tudo, que nos cocktails ou nas redes sociais tudo se consegue", diz a artista

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

"É uma ideia errada do nosso tempo: que no networking vale tudo, que nos cocktails ou nas redes sociais tudo se consegue", diz a artista

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Joana Vasconcelos: “Mulher, portuguesa, menos de 50 anos e faz as coisas que faz? Deve haver algo errado...”

A mais conhecida criadora portuguesa de arte contemporânea fala de projetos novos e dos efeitos da pandemia. Direta e informal, comenta críticas, assume-se marxista e revela o gosto pela astrologia.

O atelier, na Doca de Alcântara, é um grande armazém virado para o Tejo e acolhe no primeiro andar a sala de trabalho de Joana Vasconcelos. “Artiste”, ironiza a placa na porta, sem deixar margem para dúvidas. Ela está a maquilhar-se num anexo e a tarefa demora o suficiente para que a assessora nos faça uma visita guiada a cantos e recantos do atelier — a entrada com trabalhos em curso, os corredores com esculturas antigas, quase ninguém por estes dias, por causa da Covid-19.

Por fim, a artista aparece. Vêm aí quase duas horas de conversa direta e informal. Joana Vasconcelos vai rejeitar a imagem do criador deprimido de há século e meio, que considera ainda hoje prejudicar o entendimento do público sobre os artistas. Vai dizer, de gravador desligado, que gosta de chegar a casa a horas de jantar e que antes da meia-noite já está a dormir, porque não perde noites em dramas criativos. Vai descrever-se como uma livre-pensadora com a função de refletir sobre o presente. E assumirá que se considera uma empresa, pois arte e negócio não são incompatíveis.

Senta-se frente a uma elegante secretária de madeira ao estilo escandinavo, cheia de bonecas e canetas, com um arranjo floral em crochet e um candeeiro que lembra os anéis de Saturno. Pinta cornucópias enquanto fala. Analisa a obra e as críticas que lhe fazem, muitas das quais diz deverem-se ao facto de ser mulher. Revela o gosto pela astrologia e conta o que acontece nos cocktails de arte contemporânea. Avalia também os efeitos da pandemia, sem adivinhar grandes sustos.

Sim, o coronavírus fez encerrar exposições e suspendeu encomendas, mas os projetos estão a regressar. Desde há poucos dias está na exposição Um Oásis ao Entardecer – 20º Aniversário dos Prémios Fundação EDP, no MAAT. Tem na agenda o Prémio Arte Chegou ao Colombo, que vai atribuir 20 mil euros a um “artista emergente” e organizar uma exposição de finalistas no Centro Comercial Colombo (Joana Vasconcelos é embaixadora do prémio por ter sido a primeira criadora a expor no Colombo, faz agora uma década, e é também membro do júri). Além disso, está outra vez empenhada em criar uma escultura visitável de 12 metros, revestida a azulejo: o Bolo de Noiva, a instalar perto de Londres por encomenda do barão Jacob Rothschild. E foi ainda convidada a apresentar-se na Galleria degli Uffizi, em Florença, provavelmente em 2023.

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A mais conhecida artista portuguesa contemporânea, descrita como escultora e artista visual de obras kitsch com materiais inusitados, nasceu há 48 anos em Paris e chegou a Lisboa depois do 25 de Abril de 1974. É filha de Teresa Vasconcelos, que estudou artes decorativas na Fundação Ricardo do Espírito Santo Silva, e de Luís Vasconcelos, fotojornalista que chegou a ser fotógrafo oficial de Mário Soares na Presidência da República. A família estava exilada na capital francesa desde o fim da década de 60 por ter atividade política contrária ao Estado Novo. Ainda hoje, Joana Vasconcelos considera ter um pensamento marxista — mas à sua maneira.

Estudou em Lisboa na Escola Artística António Arroio e no Centro de Arte e Comunicação Visual Ar.Co. Começou a expor em 1994 e fez a primeira individual no Museu de Serralves há exatamente 20 anos. O resto aconteceu-lhe num ápice: a exposição no Palácio de Versalhes (2012); o cacilheiro “Trafaria Praia” para o Pavilhão de Portugal na Bienal de Veneza (2013); a exposição no Palácio Nacional da Ajuda (2013); a estreia no museu Guggenheim de Bilbau (2018). E agora?

"Marylin", 2009 (panelas de aço inoxidável e cimento)

Octavio Passos/Observador

O novo prémio de que é embaixadora tem como tema “O Impacto da Pandemia Covid-19”. No seu caso, qual foi o impacto?
Ainda não dá bem para equacionar, mas à partida foi grande, porque íamos a um ritmo enorme e de repente pusemos travão a fundo. Foi como se o carro tivesse feito uma pirueta. Não nos despistámos, o que é bom. Normalmente, a época mais forte das artes plásticas é partir de março e até junho ou julho. Depois vem o período estival e as pessoas vão de férias. Não estou só a falar de Portugal, acontece o mesmo a nível internacional. Setembro a novembro voltam a ser boas épocas.

Na primavera/verão é quando tem mais encomendas?
Mais encomendas, mais exposições, mais tudo. Ora, este ano, anormalmente, tivemos uma série de convites na época que não é tão boa, ou seja, dezembro, janeiro e fevereiro, quando é costume estar tudo parado a fazer contas e balanços. Tive seis exposições pelo mundo inteiro neste espaço de tempo, até inícios de março. Foi um esforço gigante das equipas, umas de um lado a montar, outras do outro lado… Ainda por cima, em sítios muito longe uns dos outros, Macau, Nova Déli, Dinamarca, Yorkshire, Lisboa, Boston.

Ou seja, quando a pandemia chegou não estava descalça.
Nós próprios iríamos naturalmente entrar numa paragem, porque tínhamos andado num corrupio e depois de seis exposições pelo mundo inteiro não é possível continuar logo a seguir. Foi toda a gente para casa, graças a Deus ninguém apanhou covid nas viagens. Eu própria tinha feito Nova Déli-Boston diretamente e até pensei que pudesse ter apanhado alguma coisa.

Veio o confinamento geral e o que é que aconteceu?
Todos os projetos que tínhamos para a saison seguinte, para abril, maio, etc., desapareceram. A própria dinâmica que se segue a uma exposição, imensos contactos e vendas, também parou. As exposições fecharam todas.

Mas já disse que o carro não se despistou. O que teria sido um despiste?
Despedir a minha equipa. Fechar o atelier, tive de fechar. Entrar em lay-off, tive de entrar. Mas o desfazer de uma equipa que demorou 30 anos a fazer teria sido uma perda imensa.

Chegou a ser hipótese?
Graças a Deus, não.

Tem uma equipa de mais de 50 pessoas a tempo inteiro. Desde quando?
Foi gradual. Comecei por ser eu e uma assistente num atelier do Bairro da Boavista [em Benfica], com 45 metros quadrados. Depois fui para um atelier em Oeiras e tinha a ajuda pontual de uma equipa que habitualmente faz cenários para cinema. Nessa fase não conseguia sustentar uma equipa. Quando viemos para aqui, em 2007, 2008, resolvi estruturar uma equipa mais consistente e regular. É preciso entender que o trabalho dos artistas nem sempre é regular, não é como um emprego normal.

Mas hoje o seu trabalho é regular.
Porque fiz um grande esforço para que isso acontecesse. Por natureza, é um trabalho não-regular. Nunca sabemos bem o que vai acontecer no ano a seguir, pode haver muito trabalho, pouco trabalho, trabalho em excesso. Não se consegue programar quem é que nos vai convidar.

"É uma ideia errada do nosso tempo: que no 'networking' vale tudo, que nos cocktails ou nas redes sociais tudo se consegue. Oiço dizer muitas vezes que os artistas contemporâneos têm de estar no Facebook, no Instagram, em todo o lado. É mentira."

Se a sua carreira tem 26 anos e está neste atelier há 12, foi a meio do percurso que conseguiu ter condições financeiras para alargar a equipa.
Sim, mas também teve muito a ver com os convites. Não é possível fazer uma exposição em Versailles de forma amadora, sem equipa. Isso não existe. Se um pintor tiver uma exposição por ano numa galeria, pinta os  quadros, não precisa de assistentes e todos os anos prepara o trabalho. Expõe, recebe o dinheiro e no ano seguinte faz o mesmo. Há muito gente que vive de uma exposição por ano, a pintura também se presta a isso. A escultura, não. Envolve uma equipa. Não posso fazer peças enormes sozinha, não tenho força, não é possível. Preciso de especialidades e características de equipa para alcançar a monumentalidade. Nas pinturas monumentais do século XV ou XVI os pintores tinham equipas, porque não é possível pintar sozinho um quadro de três por quatro metros.

Quer dizer que alargou a equipa a partir de 2007 porque estava já a investir numa expansão da sua carreira?
Não, de todo. Isso não acontece assim. Há uma coisa fundamental que tem de se perceber: o artista não determina. É como os monges ou os padres. Podemos andar num seminário, mas ser padre, além de uma vocação, é uma condição que é dada pela sociedade. Um cantor não chega ao Coliseu, bate à porta e diz que para a semana quer fazer um concerto. Um artista plástico não chega a uma galeria e diz que quer expor umas obras daqui a três meses. Isso não existe. Um artista é convidado. Como é que é convidado, é uma outra questão. Não determino nada da minha vida profissional, apenas sigo o que aparece. Neste sentido, a coisa é bastante taoista: vem uma corrente de vento e cedemos. Quando em 2005 fui convidada para fazer a Bienal de Veneza [exposição coletiva Always a Little Further], tive de me orientar para o que me era pedido, estar entre grandes artistas num sítio com uma visibilidade imensa. Tive de ser capaz de fazer a coisa bem feita, e fiz, de tal maneira que isso teve repercussões.

Mas se diz que o artista não determina…
Não determina. Eu não sei se a [curadora] Rosa Martínez vai ao Lux, vai ver A Noiva [candelabro de tampões higiénicos] e me vai ligar a seguir a dizer “adorei a tua peça, vamos fazer qualquer coisa juntas”. Não determino que a Rosa Martínez tem cinco exposições — com um nome giríssimo, La Canción del Pirata, na Roménia, por aí fora — e que me vem dizer que quer que eu faça parte. Ela é que determinou isso, não fui eu. Há dias aconteceu-me isto: ligou-me um curator com quem trabalho em Veneza, para quem já fiz peças de vidro, é o [Adriano] Berengo. “Estou aqui a jantar com o diretor das Ufizzi e ele quer muito fazer uma exposição tua.” E eu disse: “Também quero imenso.” Não posso determinar que o diretor das Ufizzi [Eike Schmidt] queira fazer uma exposição comigo. Expor ao lado do Miguel Ângelo, do Caravaggio e do Rafael? Como é que eu podia pensar que isso me iria acontecer?

Quando será essa exposição?
Lá para 2022, 23. Agora vamos entrar na máquina: orçamentos, projetos, etc., etc., uma coisa super-regulada, a máquina artística.

A artista ao lado de uma peça que faz parte da sua coleção pessoal: "Tutti Frutti", 2011 (plástico e aço inoxidável)

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

O artista não se faz convidado?
Não, é um erro pensar isso. O artista não se faz convidado.

Então o que é que se faz nos cocktails?
Conversa-se, socializa-se, mas pouca coisa, na verdade. Não é isso que faz um artista ser convidado ou não. As pessoas enganam-se, acham que é aí que nascem os convites, que é aí que se faz o trabalho de networking. O networking não serve para nada, neste caso. É uma ideia errada do nosso tempo: que no networking vale tudo, que nos cocktails ou nas redes sociais tudo se consegue. Oiço dizer muitas vezes que os artistas contemporâneos têm de estar no Facebook, no Instagram, em todo o lado. É mentira. Porque o diretor das Ufizzi ou a senhora que agora que me convidou para um projeto de arte pública em São Francisco não estão nem aí para o Instagram ou para o Facebook. Estão preocupados com uma outra dimensão: aquilo que reflete ou não o nosso quotidiano e o nosso presente. Todos os artistas, seja o pintor, o escritor ou o bailarino, existem no presente. Temos a tarefa difícil de representar e refletir o que se passa no nosso mundo, neste país ou noutro. Essa conjugação de reflexões dá um panorama sobre o que estamos a viver e o que poderemos vir a viver. Essa teia, que é tecida pelos artistas, é uma teia muito frágil, muito volátil, mas que te faz respirar, que te faz pensar “estou nesta vida, neste presente, com esta dimensão”. É uma dimensão, às vezes mais espiritual, outras menos. Os diretores de museus, os curators, os galeristas, os colecionadores, todas as pessoas que trabalham neste meio, tal como os árbitros num jogo de futebol, determinam ou não se aquele conteúdo— digo conteúdo para não me referir a nenhuma arte em concreto — é relevante ou não para o presente e para o futuro. Há um assessment que é feito pela sociedade.

Esse reconhecimento implica dinheiro e poder.
Não vale a pena focar isto na dimensão comercial e praticista, o foco está na dimensão real, na reflexão conjunta. Ou seja, se não existirem pessoas livres de constrainment, de programa, a pensar… Se não houver livre-pensadores, não há evolução. A evolução só se dá quando as pessoas vão tendo novas ideias sobre o quotidiano. Somos produto sempre de novas ideias, a evolução da humanidade vem daí. Os monges existem porque a espiritualidade é uma dimensão essencial do ser humano. Portanto, permitimos que existam seres humanos que só estão concentrados num aspeto da nossa existência. A espiritualidade é guardada de uma forma especial, conforme cada cultura, mas a criatividade também. É dada a alguns que a exploram. Depois, todos os outros determinam se aqueles alguns são aqueles que eles querem que os representem. Só existo porque a sociedade assim o quer. Não tenho um programa, a mim ninguém me diz o que vou fazer, faço o que que quiser e são muito poucas as pessoas no mundo que fazem o que querem.

O que pode ser muito ingrato.
E muito injusto, porque há artistas que só são reconhecidos muitos anos mais tarde. A sua relevância e pertinência, no momento em que viveram, era tão avançada que não foi reconhecida e só mais tarde se vai perceber que aquele artista, naquele momento, era um reflexo coerente do seu tempo.

O seu trabalho é um reflexo coerente do nosso tempo?
Depende de como é visto. Há quem ache que sim e há quem ache que não. Pertenço à linhagem de um modo de pensar internacional. Com pouca inserção nacional, mas bastante força internacional. É como se houvesse uma linha de pensamento na qual me insiro e à qual pertenço.

O mercado não determina o caminho?
Nada, de todo. O mercado não determina coisa nenhuma.

Em função de uma encomenda ou de um contexto não há um caminho?
Não. Adoro ir à Feira de Algés, ali perto da minha casa, e vou lá há anos. Já comprei xailes, já comprei um burro.

Um burro?
Sim, o senhor tinha lá uma fotografia de um burro e eu comprei-lhe o burro. Já lá comprei as coisas mais extraordinárias. Um dia, fui comprar os crochets a uma senhora que tem uma neta e a neta diz-me que me queria vender uns telefones. “Apareceu-me aqui uma senhora a vender-me 300 telefones pretos e eu achei que ia gostar.” Eu pensei: “Que chatice agora, os telefones. Para que é que eu vou comprar os telefones.” Não estava a ver o que fazer com os telefones, odeio acumular tralha, não é nada o meu estilo. Bom, a senhora lá me mandou umas fotos dos telefones.

Comprou-os já a pensar numa peça?
Sim, porque só compro aquilo que vou usar. Entretanto, fui não sei onde e perdi o telemóvel, deixei-o dentro do avião. Fiquei desarmada, não conseguia contactar ninguém, mas lá recuperei o telemóvel. Na semana a seguir, olho outra vez para as imagens dos telefones pretos e digo assim: “Já sei o que vou fazer com os telefones, vou fazer uma pistola.” Lá fiz a pistola [peça Call Centre, 2014]. A pistola andou aí dois anos, toda a gente a achava muito gira, mas ninguém ligava nenhuma, nunca a expusemos. Até que veio cá a diretora do Guggenheim — quando comecei a negociar a exposição no Guggenheim, não sei quantos anos antes — e quis expor a peça. De repente, lá vem mais um curator, lá vendi a pistola para uma coleção em Nova Iorque. Já toda a gente queria a pistola. Uma coisa feita de forma completamente aleatória de repente virou uma das peças mais requisitadas. É impossível prever o que vai acontecer.

Terço gigante de Joana Vasconcelos para o Santuário de Fátima: "Suspensão", 2017 (resina de polietileno, LED, filtros de cor, aço)

PAULO CUNHA/LUSA

Mas numa entrevista em 2018 disse que sempre trabalhou como uma marca, como uma empresa.
Isso é outra questão. Que é uma marca e uma empresa, sem dúvida, mas as marcas e empresas não são todas iguais. Sou um paradoxo, efetivamente. Não é suposto a criatividade ser uma empresa e uma marca, é suposto a criatividade ser um autor. Um autor é um tipo deprimido lá num sótão, com imensos problemas psicológicos e dramas económicos, a sofrer imenso, a imagem romântica do artista do século XIX. Não se pensa num Velázquez ou num Rubens com grandes ateliers, a pintarem coisas monumentais e a terem empresas. O Bordalo Pinheiro tinha uma empresa e 125 anos após a morte dele a empresa continua a existir. Portanto, não é verdade que isto que está aqui seja muito moderno. É um modelo que existiu sempre na história da arte. No século XIX cria-se a ideia de um personagem artístico muito diferente da que tinha existido até aí.

Ver-se como uma empresa causa-lhe ansiedade por ter compromissos financeiros a que tem de fazer face?
Essa pergunta estaria certa se eu pudesse controlar, se pudesse dizer “agora vou fazer umas coisas para vender imenso e ser muito rentável.” Não é verdade. Não controlamos o nosso destino, a única coisa que controlamos é a performance que temos a cada momento. Se tivesse feito uma má exposição em Versailles, agora não estava aqui. E se tivesse feio uma má exposição na Ajuda também não estaria aqui. Se quando fui convidada para fazer o Pavilhão de Portugal em Veneza, e fiz o cacilheiro, se tivesse feito um projeto de que ninguém ouvisse falar, também não estava aqui. Se jogares bem e marcares golos, vais outra vez jogar.

Às tantas já se sabe qual a performance esperada e o artista pode atuar dentro desse esquema.
Era bom. O artista não é uma máquina de encher chouriços. Se eu pudesse vender sempre o mesmo chouriço, tudo bem: sabia que aquele produto era bom, vendia sempre o mesmo e estava garantida. Agora vamos dizer ao Cristiano Ronaldo para marcar sempre os mesmos golos… Estamos a contar com a performance dele, mas não sabemos o outcome. Ele vai marcar os golos que conseguir marcar, apesar de ser um grande jogador. No nosso caso, é a mesma coisa. Podem estar a contar com a minha boa performance, mas não sabem o outcome. Tenho sempre de fazer peças novas, a partir da base que é o meu trabalho. E se a peça nova não for boa?

E se não for?
Pode não ser, não é uma questão de eu querer ou não querer, é uma questão de caminho. Há três pessoas que treinam na mesma escola de futebol, com a mesma idade e qualidade física. A seguir, não há três Cristianos Ronaldos, pois não? Porquê? Há algo característico nas pessoas que faz com que haja essa excecionalidade. Podia explicar isto de muitas maneiras. São características que cada um desenvolve na sua área e que tornam aquelas pessoas, com a mesma base, com a mesma educação, diferentes uma das outras. Há um elemento diferenciador.

Teme que essa excecionalidade um dia acabe?
Pode acabar amanhã.

E se acabar?
Vou fazer outra coisa qualquer.

Como por exemplo?
Posso fazer qualquer coisa, porque já hoje faço o que não tem programa nenhum.

"Quando comecei a entrar no mundo do luxo, onde o dinheiro tem uma tal dimensão, com pessoas de pensamento de direita, comecei a confrontar-me com um mundo antagónico àquele de onde vinha."

Quando é que descobriu essa visão das coisas?
É uma forma de estar, não se descobre. À medida que vamos avançando vamos percebendo que estamos a ter uma vida diferente das outras pessoas e percebemos que existimos no mundo de uma forma diferente, que estamos preparados de alguma maneira com outras características. Quando se está preparado para se ser mais um número, preparado para entrar na linha de montagem da sociedade — escola, emprego, casamento, filhos — e se sai fora dessa linha, tornamo-nos uma peça solta.

Com que idade descobriu que era uma peça solta?
17, 18 anos.

Antes de estudar no Ar.Co?
Sim. Quando fui para a António Arroio respirei fundo e pensei que afinal não era a única. Havia mais peças soltas. Havia montes de jovens com uma maneira de estar diferente. Eu vinha de um bairro periférico, de Linda-a-Velha, da classe média, escola normal. Tudo normal, toda a gente formatada nos mesmos liceus, mais ou menos nas mesmas famílias. Os clusters sociais estão muito organizados. Quando cheguei à António Arroio percebi que o mundo estava cheio de malta como eu. Depois vão resistindo muito poucos. Na minha turma do Ar.Co éramos 25 e dois de nós somos artistas.

Quem é o outro?
Ah, não vou fazer isso.

Ter pais artistas influenciou o seu caminho?
Sem dúvida. A minha família teve um papel preponderante na minha liberdade. Já não tinha esse constrainment pessoal e também não o tive na família. Na verdade, foi uma boa escolha de família, porque me deixaram ser quem eu era. A minha família já tinha vários seres pensantes, pessoas que tinham feito as suas carreiras de forma bastante original. Foi o caso do meu pai, do meu tio Álvaro, da minha tia, da minha mãe, a minha avó era pintora. Já havia uma liberdade de expressão adquirida, sem necessidade de controlo ou de manipulação daquilo que o jovem deve ser. Fiz karaté a partir dos oito anos. As meninas iam todas para o ballet, eu decidi que ia para o karaté. Ninguém se chateou.

A sua mãe estudou na Fundação Ricardo do Espírito Santo Silva?
Estudou decoração, depois tomou conta de nós. A vida do meu pai era muito exigente, era fotojornalista de guerra, portanto tinha de sair muitas vezes. Mas a minha mãe sempre pintou e desenhou, sempre foi dedicada às artes. Viver com uma mãe que todos os dias desenha fez com que acabasse por ir para desenho. Quando fui para o Ar.Co, fui para desenho.

Os seus pais estavam exilados, por isso é que nasceu em Paris?
O meu tio Álvaro era líder político do PCP-ML [Partido Comunista de Portugal (Marxista-Leninista), fundado em 1970], ainda hoje é comentador de política, fez disso a sua vida. Os meus pais juntaram-se a essa dinâmica e faziam parte do PCP-ML em Paris. Nasço nesse contexto revolucionário, a olhar o mundo de outro ângulo, gente muito republicana, muito avançada para o seu tempo, com uma dinâmica de vida muito particular.

Ainda é marxista?
Sim, de alguma maneira, sim. A discussão política era ativa e diária. Ainda hoje temos um grupo de WhatsApp de família e estamos sempre a discutir política. É uma família que adora debater ideias. As nossas reuniões familiares tinham sempre debate político e cultural.

Há contradição entre essa ideologia e o mundo da arte contemporânea povoado de pessoas com grande riqueza material?
Os artistas não são assim, os colecionadores, sim, são gente muito rica, com uns parâmetros e formas de estar até muito… Quando comecei a entrar no mundo do luxo, onde o dinheiro tem uma tal dimensão, com pessoas de pensamento de direita, comecei a confrontar-me com um mundo antagónico àquele de onde vinha. Obviamente, foi muito interessante perceber as diferenças, como são feitas as coleções de arte, como é que os grandes empresários se tornam colecionadores, de que maneira tudo isso influencia… Foi muito interessante ter de entender o outro lado, que eu nunca tinha visto. Tinha visto uma versão republicana, marxista-leninista, e de repente tive de começar a lidar com o poder económico, com uma visão muito mais comercial da vida.

Como é que se adaptou?
Nunca me adaptei. Há coisas que trazemos dentro de nós. Aquilo que pude fazer foi, pegando nesse passado e naquilo em que acredito, criar uma comunidade. Criei o meu atelier à imagem daquilo em que acredito.

Isso consubstancia-se em quê?
Estamos aqui todos juntos o máximo de tempo possível, as pessoas têm todas contrato de trabalho, comemos todos juntos na cantina [no r/c do atelier], a cantina é para todos e ninguém tem de pagar. Temos um lado de saúde e bem-estar, em que as pessoas podem fazer yoga e aulas de karaté, temos uma terapeuta para as pessoas tratarem de si. Trabalho para o todo, não para mim, não estou primeiro. Isto, conceptualmente, é uma grande diferença.

Quando há uma exposição, a rotina muda?
Às vezes, sim.

"Muitos colecionadores não querem o têxtil, acham que são coisas de menina", afirma a artista (junto a uma da sobras da série "Pinturas em Crochet" (crochet em lã feito à mão, sobre placa de fibra)

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Parece dar muita atenção à espiritualidade.
Sim. Sou de uma família republicana, com zero de ligação à igreja católica, nem batizada sou, mas obviamente, num processo criativo, a certa altura confrontei-me com a dimensão da espiritualidade, que é um dos papéis que a escultura ocupa secularmente. O escultor representa a espiritualidade, basta pensarmos nas igrejas cheias de santos. Na contemporaneidade uma pessoa pode safar-se a esse papel, nunca tendo de o fazer e eu safei-me muito bem durante uns anos.

É verdade que gosta de astrologia?
Um dia fui com uma comissária espanhola, María del Corral, à Bienal de Pontevedra [Galiza]. E ela diz: “Temos de ir a Santiago ver a missa do botafumeiro”. Pensei: “Esta senhora está enganada. Vai haver uma festa logo à noite, com malta do mundo inteiro, e no domingo de manhã ela quer ir à missa?” A verdade é que ela alugou um autocarro e no dia seguinte, depois de dormir pouquíssimo, vou tomar o pequeno-almoço e vejo-a toda preparada para a ir para o autocarro. Comento com a Clara, que trabalha comigo há 20 anos e que é supercatólica. Lá decidimos ir, foi tudo a dormir dentro do autocarro. Lembro-me de que a [artista brasileira] Ana Maria Tavares estava nesta viagem. Chegámos a Santiago, olhei para a igreja cheia de gente, motards, miúdos, gente de todo o mundo. Não fazia ideia. De repente vêm os monges vestidos a rigor com o botafumeiro, vozes incríveis e roupas incríveis, uma performance muito bem feita, que dura há séculos e séculos. Acabámos todos abraçados uns aos outros. Pensei para com os meus botões. “Há aqui qualquer coisa que eu não sei. Se isto aqui em Espanha é assim, se calhar lá em Fátima é parecido.” No dia 2 de Maio de 2003 fui a Fátima para ver o que se passava.

Foi a fé católica que a fez despertar para a espiritualidade?
Com a igreja católica, que é aquela que envolve a minha cultura, é que me apercebi. Quando comecei a perceber que em mim havia esse despertar, fui à procura de coisas que tivessem a ver com a minha personalidade e a minha pessoa. Depois conheci a Carmen [Maraschin], que é astróloga. Já tinha conhecido outras, mas isto não me dizia muito. De repente comecei a ver que a astrologia tinha raccord sobre uma série de evidências que eu conseguia relacionar, comecei a interessar-me.

Toma decisões com base em aconselhamento?
Na astrologia não se toma decisões, não é assim. A astrologia não é um fortune telling. A astrologia dá uma indicação de possibilidades. O livre-arbítrio é nosso. Tenho à minha frente dois caminhos: posso ir para a esquerda ou para a direita, a astrologia diz que posso caminhar por aqui ou por ali e na verdade todas as hipóteses são válidas.

A astrologia não influencia em nada a sua vida profissional?
Nada, ajuda a descodificar os caminhos. A nossa astróloga faz um estudo muito interessante do atelier, enquanto corpo. Ao longo dos anos, íamos fazendo astrologia. Várias pessoas do atelier começaram a inscrever-se. A nossa astróloga vem cá duas vezes por ano e algumas pessoas faziam a sua carta astral, à vontade delas. Ao longo dos anos ela foi estudando as pessoas e descobriu que várias delas tinham dois aspetos astrológicos: estélios e papagaios. Eu própria tenho papagaios. Esta mulher é formada em astrologia, vem das ciências, é uma personagem muito interessante. Disse-me isto e acrescentou que é um aspeto raro, em cada 100 pessoas há um papagaio. E eu aqui tenho sete ou oito pessoas com papagaios. Pensei: “Não vejo o que é que vá fazer com isto, mas ótimo.”

É uma característica positiva?
É uma configuração astrológica que dá às pessoas a capacidade de ligarem coisas e entenderem o mundo de uma forma mais dinâmica, digamos assim. Ela quis estudar porque é que aqui há tantos papagaios juntos, porque é que nos atraímos. Aí nasceu o projeto de estudar o atelier. É uma coisa que a Carmen anda a fazer há anos, não interfere naquilo que faço no dia-a-dia, é um side-effect.

"A sombra de que tenho um truque qualquer para fazer as coisas, e que não é devido ao meu trabalho e ao meu profissionalismo que as consigo, não corresponde à verdade."

Voltemos à sua obra. Diz-se que tem uma estética exuberante, formas aparatosas, cores fortes. Revê-se?
É tudo verdade. Mas a minha obra não é sobre isso. A minha obra tem no fundo um pé bem enraizado, é feita a partir do quotidiano, do doméstico, do ambiente privado e do ambiente público, sobre o que se mostra em privado e em público, o que se revela ou não, de que forma as mulheres se identificam com o que são no espaço privado e público, tem a ver com o micro e com o macro, como é que uma coisa muito grande pode ser muito pequena, como comunicamos para fora ou para dentro. Estas dualidades e contradições são aspetos muito portugueses. “Sou feliz e desgraçada”, já dizia a Amália.

Pode não ser uma contradição, pode ser a mesma coisa.
Se calhar. Mas é um modo de estar na vida e que eu herdo por ser portuguesa. Depois, como cada um trabalha isso, são outros quinhentos. Tenho o lado público e de apresentação, que aprendi nos anos todos em que trabalhei [como segurança] no Lux, com os meus amigos, as pessoas da moda, as pessoas do teatro, que são expansivas. Depois aprendi a espiritualidade e a meditação, o lado para dentro. O jogo do íntimo e do privado, tudo isso é retratado na minha obra.

Há quem não aprecie. Considera-se mal-amada como artista?
Finalmente, a pergunta certa.

Porque é que é a pergunta certa?
Porque todas a coisas têm uma sombra. Não há espaço com luz que não tenha uma sombra. A sombra é parte de todas as situações. Obviamente, tenho essa sombra, uma sombra que paira sempre. “Ela é mal-amada, ela tem uma coisa aqui em Portugal…”

É verdade?
Depende de como se vê. É e não é. A sombra existe, está lá, aceitamos que há muitas pessoas que não gostam do meu trabalho e às vezes até acham que não sou bem uma artista, sou uma coisa que não é verdade. Mas como não posso obrigar as pessoas a ir ver uma exposição minha, não posso obrigar ninguém a gostar do meu trabalho. Não tenho técnica nenhuma escondida atrás de mim que faça com que eu consiga fazer as coisas.

Quem critica é porque não conhece o seu trabalho?
Normalmente não me conhecem sequer a mim, nem o trabalho nem a mim. Se conhecem a obra, e podem não gostar dela, e me conhecem a mim, e também podem não gostar, há uma coisa que não podem dizer: que nós aqui, eu e a minha equipa, não fazemos o melhor possível e não trabalhamos sempre com o coração primeiro. Isso é o que fazemos. Se concordam ou não, têm o direito de não concordar. A sombra de que tenho um truque qualquer para fazer as coisas, e que não é devido ao meu trabalho e ao meu profissionalismo que as consigo, não corresponde à verdade. O meu trabalho e o meu profissionalismo, e o desta equipa, produz os resultados que estão à vista de todos.

Que justificações encontra para a sombra?
Todo o sítio que tem luz, tem sombra. É parte de quem eu sou. Que diz a sombra? Que houve qualquer coisa que aconteceu, que não tinha a ver com a minha capacidade, para eu conseguir o que consigo. É uma sombra não apenas minha, é uma sombra transportada ao longo de séculos para as mulheres. Mulher, portuguesa, menos de 50 anos e faz as coisas que faz? Deve haver algo errado…

A ideia de que isso se deve ao facto de ser mulher não é uma justificação simplista?
Mas existe. Os colecionadores chegam e dizem “gosto muito da sua obra, mas não quero aquelas coisas, assim, femininas que você faz.” C’est la vie. E depois eu digo: “Olhe, não há problema, eu tenho ali uma coisa para si, toda em ferro, uma peça muito boa.” As peças em crochet, o têxtil, muitos colecionadores não querem, acham que são coisas de menina. Eu sei o que é entrar numa exposição e ser exposta com as coisas de mulher ali a um canto, para ninguém ver muito bem.

"Sou a primeira a expor na Ajuda, aqui e ali, e o que é que aconteceu às outras antes de mim? Não estavam cá? Estavam. Não eram boas? Eram. Então porque é que sou a primeira?"

Mas dizer que se é discriminado por uma característica pessoal arruma o assunto e não permite analisar para além disso.
Não, não, não é uma característica pessoal. É que eu transporto essa característica do privado para o público, para o meu trabalho, esse é que é o drama. Olham para o lustre e acham lindo, depois chegam-se perto e não querem. Então os homens, até viram a cara. De repente, o objeto tampão, o objeto tabu que devia estar guardado lá numa gaveta para que ninguém o visse, está ali exposto. Acontece que as pessoas, segundo a sua cultura e os seus preconceitos, vão ficar ou não horrorizadas com aquilo.

O mundo da arte contemporânea é sobretudo masculino?
Sem dúvida. Nas Ufizzi há quadros e quadros e o que mais está representado é o corpo das mulheres. Os artistas são todos homens.

Pode ser interpretado como uma celebração da mulher.
É uma celebração, tudo bem, não há problema, mas podiam deixar as mulheres pintar, não? Ao longo da história pintaram, mas não foram mostradas. Quando não é uma teoria mas uma constatação… Não estou a falar de uma política reivindicativa feminina, não estou a dizer que sou super pelas mulheres, ‘bora lá. Não. Estou a falar da minha vida, daquilo que me aconteceu. Sou a primeira a expor na Ajuda, aqui e ali, e o que é que aconteceu às outras antes de mim? Não estavam cá? Estavam. Não eram boas? Eram. Então porque é que sou a primeira?

Está a abrir um caminho?
É-me dada agora a oportunidade, nesta sociedade e neste contexto político, nacional e internacional. A abertura que hoje existe é diferente da que havia há uma geração. As mulheres podem estudar e ter liberdade sobre as suas decisões e o seu próprio corpo. É uma coisa que ainda não chegou ao ponto de igualdade, mas já muito foi feito.

Em março a artista mostrou aos jornalistas o protótipo do edifício de 12 metros que está a projetar para Inglaterra

MÁRIO CRUZ/LUSA

O bolo de noiva que vai fazer para o barão Rothschild, deveria ter sido inaugurado em setembro.
Sim, mas por causa da pandemia não pôde ser. Agora estou a tentar recuperar o projeto e recolocá-lo. Mudou o sítio, etc., etc.

O bolo de noiva vem na linha desse discurso feminino, mas pelos vistos não feminista…
Exatamente. O casamento é sem dúvida um dos veículos mais tradicionais para a transformação da vida de uma mulher. Muito mais das mulheres que dos homens, porque elas é que são transferidas de uma família para a outra. O dote, o vestido de noiva, o anel da noiva, o bolo da noiva. Há uma pressão histórica exercida sobre a figura feminina, muitas vezes elas não tinham escolha, os casamentos eram arranjados. A mim, o que me interessa como artista é falar de como essa tradição está a mudar e o que é que tu levas do passado para o futuro que seja interessante. Há coisas do passado que não são minimamente interessantes, há tradições péssimas. Mas há algumas que nos fazem pensar em como reestruturar o futuro. A noiva que não vá de branco, passou-se. Uma noiva que se case de preto ou de cor-de-rosa não está bem, porque não é pura, porque não é virgem, porque, porque… O vestido foi a primeira coisa [peça A Noiva, 2014], depois o anel de noivado, uma peça sobre o desejo da felicidade [Solitário, 2018]. E agora o bolo. Estou a trabalhar a simbologia, a forma como as tradições são apresentadas. Como humanos balizamo-nos pelos rituais e símbolos. O que é que fazem os escultores? Os símbolos.

Podemos saber se é casada?
Já fui casada, já me divorciei e não voltei a casar.

Foi de branco, levou o anel e cortou o bolo?
Não levei um vestido branco, era amarelo, e não houve anel, mas havia bolo.

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