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O Kaizen Institute Portugal, criado em 1999 e especializado em consultoria e formação a empresas com base na filosofia “Kaizen”, celebrou 30 contratos com o Estado português desde o início da pandemia (março de 2020), num valor total que ascende quase aos 1,9 milhões de euros. O contrato mais caro (440 mil euros) é de fevereiro deste ano e foi firmado com o Serviço de Utilização Comum dos Hospitais (SUCH), uma associação privada sem fins lucrativos de utilidade pública, tutelada pelos Ministérios da Saúde e das Finanças, e que presta serviços hospitalares (desde a manutenção de instalações e equipamentos à gestão e tratamento de resíduos hospitalares). Objetivo? Que o instituto prestasse “consultoria para o plano de logística de vacinação, armazenamento e distribuição da vacina Covid-19“.
O contrato de consultoria, publicado no portal Base, e feito por ajuste direto, vigorou de final de fevereiro — altura em que a vacinação avançava no país nas faixas etárias mais velhas — até 31 de julho e incluiu a “definição, montagem e acompanhamento diário da operação”, a “consolidação de plano logístico estratégico”, a definição de “sistemas de car tracking“, do “sistema de gestão de armazém” e do “caderno de equipamentos”, assim como a “definição e normalização de novos processos, dimensionamento da operação de armazém, mockup e testes novos processos, gestão de stocks, simulacro”. O Observador questionou a taskforce para a vacinação contra a Covid-19 e o Ministério da Saúde sobre os efeitos práticos dessa consultoria, assim como a razão da escolha do instituto, mas as entidades remeteram as respostas para o SUCH.
A entidade, que pertence à taskforce da vacinação liderada pelo vice-almirante Gouveia e Melo, respondeu que contratou o Kaizen Institute Portugal devido à “importância de organizar uma resposta rápida e eficiente à crise de saúde pública vivida e à implementação do processo logístico (armazenamento e distribuição) do Plano de Vacinação“. Confirmou ainda que adquiriu a “prestação de serviços de consultoria no âmbito do Plano Logístico de Vacinação, Armazenamento e Distribuição”, mas não especificou que medidas foram implementadas por via dessa consultoria.
Apenas referiu que se materializou no “planeamento e monitorização de processos, no desenho do desenvolvimento dos sistemas de informação, assim como no apoio à sala operacional de coordenação do processo logístico“. E justificou a escolha do Kaizen Institute com o facto de ser uma empresa “com cerca de 40 anos de experiência multinacional, designadamente na área da saúde”. Já o instituto não quis fazer comentários ao Observador, escudando-se no dever de sigilo.
O Kaizen Institute disponibiliza serviços de consultoria e formação assentes no chamado método ou filosofia Kaizen, criado nos anos 50, no Japão. O método, que é ainda hoje usado por várias empresas, significa “melhoria contínua” e, resumidamente, trata-se de uma metodologia de gestão com vista a melhorar os resultados das empresas, através da eliminação do “desperdício”, da redução dos custos e do aumento da produtividade.
Os serviços do instituto têm sido várias vezes contratados por entidades na esfera do Estado ao longo dos últimos anos. Uma pesquisa no portal Base — onde a administração pública é obrigada a registar todos os contratos por ajuste direto acima de cinco mil euros — revela que foram celebrados 122 contratos entre o Estado e o Kaizen Institute (120 com a empresa em Portugal e dois com a espanhola) desde maio de 2010: 100 por ajuste direto, sete por concurso público e 15 por consulta prévia (quando a entidade adjudicante convida diretamente, pelo menos, três entidades à sua escolha a apresentar propostas). O valor total foi de mais de 4,8 milhões de euros. Só no período da pandemia (desde início de março de 2020), o Observador contabilizou 30 contratos registados no portal Base, em que o Kaizen Institute aparece como entidade adjudicatária (ora como Kaizen Institute Portugal, Training, Unipessoal Lda ora como Kaizen Institute Portugal, Consulting Nova, Sociedade Unipessoal Lda, entre outros), num total de quase 1,9 milhões de euros
Os contratos com as autarquias são recorrentes e o peso da região Norte é evidente (o Instituto tem sede em Vila Nova de Gaia e um escritório em Lisboa). Há registo de 15 contratos com o município do Porto, num total de 533 mil euros. O mais recente é de setembro do ano passado e foi celebrado após um concurso público. Em causa estiveram “serviços para apoio a projeto de melhoria contínua e implementação nos processos administrativos do Departamento Municipal de Espaços Verdes e Gestão de Infraestruturas”, que custaram 57.600 euros. Entre os objetos do contrato estão o “desenho de visão e implementação de solução para a gestão eficiente da água (plataforma H2Porto, sistema rega inteligente)” ou a “implementação de indicador da eficiência da atividade operacional“.
Também as empresas municipais Águas de Gaia, Águas do Porto e Águas do Douro e Paiva e a Lipor – Serviço Intermunicipalizado de Gestão de Resíduos do Grande Porto celebraram contratos com o Kaizen Institute. Assim como os municípios de Braga (três contratos por 158.800 euros no total), Valongo (dois por 139.700 euros), Vila do Conde (um por 19.600 euros) e Baião (um por 8.500 euros).
O segundo contrato mais caro (de 208.320 euros) foi firmado com o Hospital da Senhora da Oliveira, em Guimarães, após um concurso público. Consistiu na “contratação de serviços de consultoria externa para melhoria organizacional da gestão de processos de serviços clínicos e não-clínicos” do hospital, mas o objeto do contrato, que vigorou de janeiro a junho, não indica ao certo as alterações contratualizadas. Refere, no entanto, que o valor inclui despesas de alojamento, alimentação, deslocação de meios humanos e a aquisição, o transporte, o armazenamento e a manutenção de meios materiais, bem como encargos decorrentes da utilização de marcas registadas, patentes ou licenças.
Cascais é cliente assíduo, o Infarmed já foi
O município de Cascais tem também sido cliente frequente do Kaizen Institute. Segundo a informação do portal Base, a Câmara Municipal de Cascais celebrou, pelo menos, quatro contratos com a empresa — um em 2018, os restantes em 2020 e 2021 (dois já em pandemia).
Em fevereiro de 2020, ainda a pandemia não tinha oficialmente chegado a Portugal, o município contratualizava a “aquisição de serviços para apoio ao desenvolvimento de ações de melhoria contínua nos processos de trabalho” (32.670 euros). Com a chegada da Covid-19 e a obrigatoriedade do teletrabalho, novo contrato foi celebrado, desta vez para a adaptação àquele regime, com a compra, por 45.000 euros, de serviços para “implementação do plano de contingência e otimização de processos em teletrabalho”. Mais recentemente, um novo contrato, de 132.000 euros, de fevereiro, também visou “a aquisição de serviços de consultoria e melhoria contínua no âmbito do teletrabalho”. Em todos os casos, o recurso ao Kaizen Institute foi justificado com a ausência de recursos próprios.
Ao Observador, António Costa, senior partner do Instituto Kaizen Western Europe, explica que o contrato mais recente, que visou o teletrabalho, teve como objetivo “ajudar a preparar os processos” para a passagem ao teletrabalho. Por exemplo, permitindo que os munícipes possam submeter pedidos eletronicamente, sem terem de se deslocar à Câmara. “Imaginemos que um munícipe tem um restaurante e quer ocupar um pedaço de passeio para pôr uma esplanada. Submete o pedido, que passa por vários departamentos. É papelada que anda de um lado para o outro. São precisas aprovações, o cálculo de taxas… Este tipo de processos podem ser simplificados, podem passar a ser digitais”, exemplifica.
Ao todo, Cascais pagou pelo menos 750 mil euros ao instituto, de acordo com os contratos publicados no Base, isto se incluirmos os contratos da autarquia e de empresas municipais — como a Cascais Dinâmica – Gestão de Economia, Turismo e Empreendorismo; a Cascais Envolvente, Gestão Social da Habitação; a Cascais Próxima – Gestão de Mobilidade, Espaços Urbanos e Energias; e a EMAC – Empresa Municipal de Ambiente de Cascais.
A instalação e logística dos próprios centros de vacinação — de São Domingos de Rana e Alcabideche — também tiveram o apoio do instituto Kaizen. No que à vacinação diz respeito, António Costa, apenas mostra abertura para falar ao Observador sobre esta parceria. Diz que, em fevereiro, o instituto começou a “ajudar” o município a montar os tais centros de vacinação de acordo com a filosofia Kaizen, em conjunto com o Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) local. Como?
Sobretudo na organização dos procedimentos e das tarefas. É que, explica António Costa, “o valor acrescentado dos enfermeiros é dar a vacina” e não propriamente prepará-la. Nesse processo perdiam muito tempo — “tinham de pegar no frasco, juntar, por exemplo, soro fisiológico, extrair a seringa, etc.”. “Se nesse centro definirmos que existe uma zona de farmácia tratada por especialistas farmacêuticos que a única coisa que fazem é preparar as vacinas e depois garantimos que existe uma pessoa responsável por distribuir as vacinas pelos postos, isso quer dizer que o enfermeiro já só dá a vacina.” E isso, assegura, permite aumentar o número de inoculações por hora “com impacto nas filas de espera e na satisfação dos clientes”.
Esta colaboração não foi alvo de um novo contrato, indica António Costa, e foi feita no âmbito do acordo celebrado em fevereiro para a adaptação ao teletrabalho. Foi uma “ajuda natural”, refere, rejeitando que tivesse sido necessário firmar novo contrato. “No âmbito de um projeto que já estava a acontecer com a Câmara, surgiu a necessidade de a Câmara montar os centros de vacinação e, como conhecia a nossa logística, em conjunto com o ACES local, montaram-se os centros com os princípios implementados”, justifica.
A Câmara Municipal de Lisboa também pediu ajuda ao Kaizen Institute para a gestão da pandemia. Contratou a empresa para a “aquisição de serviços de monitorização e acompanhamento dos contratos destinados à testagem massiva, no Município de Lisboa, no âmbito do Covid-19″, igualmente por ajuste direto, por 99 mil euros, em abril deste ano. O texto do contrato não consta no portal Base, e, contactada, a autarquia não respondeu aos pedidos de esclarecimento do Observador sobre o objeto do contrato.
A autarquia liderada por Fernando Medina já tinha adquirido, em 2019, por 56.100 euros e após uma consulta prévia, “serviços de consultoria para implementação de projeto de melhoria contínua” e, em maio deste ano, de “serviços de consultoria para a implementação de processos de melhoria no âmbito da atividade da DMMC-Contratação Pública, Controlo Financeiro e Gestão da Encomenda e Elaboração de Projetos” (72 mil euros).
Outra entidade que recorreu com alguma frequência ao Kaizen Institute, mas que deixou de o fazer, foi o Infarmed. Ao todo, contratou o instituto por cinco vezes, segundo a informação disponível no portal Base, pagando um total de 230 mil euros em 2010 e 2017, sempre por ajuste direto. Um deles, no valor de 74.900 euros foi para a contratação de “serviços especializados, para simplificação de tarefas e processos (metodologia LEAN KAIZEN)”.
“Mudar para melhor”: o berço do Kaizen
Kaizen significa “mudar para melhor” ou “melhoria contínua” (Kai é mudar; Zen, neste contexto, é “melhor”), explica António Costa, do Instituto Kaizen Western Europe. A filosofia defende que “o verdadeiro potencial só é alcançado quando envolver todas as pessoas, todos os dias, em todas as áreas da organização”. E que há sempre alguma coisa para melhorar.
O método nasceu num Japão dos anos 50 fustigado economicamente pelos impactos da Segunda Guerra Mundial, mas que se reerguia e procurava renovar a indústria. Foi a Toyota o berço desta filosofia — à data uma empresa que era 10 vezes menos produtiva do que a média dos seus concorrentes, explica António Costa. Masaaki Imai, o japonês que, anos mais tarde, viria a dar a conhecer o Kaizen ao Ocidente em livro, era, na altura, um dos responsáveis pelos “círculos de qualidade” da fabricante (focados na melhoria dos processos e na eficiência). Para colmatar a desvantagem do Japão face ao exterior, Imai tinha também outra missão: organizar visitas de estudo aos EUA e à Europa, nas quais levava empresários japoneses a ver “as melhores práticas industriais nos EUA e na Europa”.
Foi com surpresa que, na década de 70, quando a crise petrolífera embateu violentamente contra muitas empresas automóveis, a aparente imunidade da Toyota surpreendeu muitos: em contraciclo, bateu recordes de lucros. Se antes Imai levava empresários japoneses ao estrangeiro, o paradigma alterou-se e passou a levar estrangeiros ao Japão, inclusive para que percebessem “o segredo” da fabricante.
Esse “segredo” era o sistema de produção da Toyota, criado pelo japonês Taiichi Ohno, e que assentava na ideia de que só deve ser produzido o que for estritamente necessário, evitando o desperdício e a acumulação de stocks. “A seguir à Segunda Guerra Mundial, a Toyota viu-se numa situação de falência. Taiichi Ohno resolveu pôr em causa todos os seus métodos de produção e foi introduzido um sistema de produção em fluxo. Começou a reduzir o lead time [tempo que decorre entre o momento em que o cliente pede o produto e o recebe], a eliminar os stocks em curso entre as várias fases de produção do veículo, começou a corrigir a qualidade na fonte, a trabalhar em fluxo unitário (carro a carro e não lotes de carros). Tudo isto é Kaizen — mudar para melhor”, resume o responsável. Quando Imai publicou, nos anos 80, o primeiro ‘manual’ de Kaizen — o livro Kaizen: A Chave para o Sucesso Competitivo do Japão —, já a palavra era comum nas empresas japonesas.
A filosofia assenta na ideia de que “é sempre possível mudar”. “É olhar para os processos e identificar onde temos dificuldades. Essas dificuldades são desperdício. Eliminando esse desperdício — reduzindo a burocracia, encurtando os espaços físicos da movimentação —, diminuímos a quantidade de material que temos de movimentar ou transportar. Tudo isto com o objetivo de reduzir o tempo de fabricação ou de execução de determinada tarefa, melhorar a qualidade ou o nível de serviço prestado ao cliente“.
Da Toyota às prateleiras dos supermercados e às repartições das finanças
Em Portugal, o Kaizen Institute (criado por Masaaki Imai) dedica-se, desde 1999, a propagar a filosofia Kaizen nas empresas portuguesas. A primeira vez que António Costa foi ao Centro Hospitalar Universitário do Porto, há quase 20 anos, para apresentar o Kaizen, a experiência não correu bem. “Comparei a troca de doentes [no bloco operatório] com a troca de pneus na Fórmula 1. Não reagiram bem, disseram que os doentes não são máquinas, são pessoas, que não dá para desligar e voltar a ligar. O resultado é que fui conduzido à saída em menos de 30 minutos.”
Mas a ideia ficou a cimentar e, alguns meses depois, voltou a ser chamado. O problema identificado era a logística — e os fluxos desde que o hospital recebe o material de consumo clínico até que os entrega nos diversos serviços ou os administra nos doentes. É que os enfermeiros perdiam muito tempo a contar material, a verificar o prazo de validade, encomendar, receber, arrumar, quando “o valor acrescentado de um enfermeiro é prestar cuidados de saúde, não arrumar material. Isto é um desperdício da função”.
António Costa exemplifica uma das alterações mais importantes, que levou, garante, a um aumento das camas disponíveis: os serviços, e o bloco operatório, eram abastecidos pela logística duas vezes por semana, ou mesmo uma vez a cada duas semanas, o que levava a que, em cada visita, fossem entregues quantidades muito avultadas de material ou medicamentos. Como consequência, a necessidade de espaço para armazenamento era maior. O abastecimento sofreu, assim, alterações e passou a ser diário — por vezes, até várias vezes ao dia. Como chegava ao hospital menor quantidade de cada vez, “ganhou-se espaço, ganharam-se camas“.
Também na Autoridade Tributária, ao longo dos anos, tem sido aplicado, aqui e ali, o Kaizen, conta António Costa. Por exemplo, nas repartições chegavam a existir 400 formulários disponíveis. “Quando olhámos com critério, chegámos à conclusão de que só eram necessários 40 e, fisicamente, só precisamos de 10 porque os outros estão à distância de um clique, podem ser preenchidos digitalmente”, conta. Mesmo os que foram digitalizados, foram antes simplificados, para “evitar correr o risco de digitalizar desperdício”. O portal Base regista dois contratos entre a Autoridade Tributária e o Kaizen Institute — um para o “desenho de um novo modelo operacional das alfândegas” (19.800 euros) e outro que incluía melhorias nos processos de execução das decisões dos tribunais, de contratação de fornecimento de serviços externos e de atendimento presencial (28.300 euros).
O “desperdício” nos processos também foi identificado em hipermercados do grupo Sonae. Ao observar a forma como era feita a reposição das prateleiras, de madrugada, antes de as portas abrirem, o instituto apercebeu-se de que os funcionários perdiam demasiado tempo a ir e vir ao armazém buscar ou devolver produtos.
“O valor acrescentado do repositor é colocar material na prateleira. Se temos um hipermercado em que há dezenas de pessoas a ir e voltar ao armazém com paletes porque é que não colocamos o repositor no corredor e as paletes aparecem no corredor, por exemplo, de forma estandardizada? Ou seja, a cada 30 minutos, garante-se que está lá uma palete cheia e recolho a vazia.” Esse trabalho passou a ser feito por uma mesma pessoa com um transporte de forma quase automatizada. Os ganhos de produtividade refletiram-se nas horas de entrada — das 4 da madrugada, os funcionários passaram a poder chegar às 6 ou às 7 da manhã. Empresas como a Sonae acabaram mesmo por criar uma equipa só focada na melhoria dos processos, com base na metodologia Kaizen.
Com essa crescente automatização, não pode o método propiciar despedimentos? António Costa, do Kaizen Institute, garante que não é esse o foco. “Se tenho trabalhadores a mais para o meu output, com a capacidade que tenho, tenho de ganhar mais output, fazer mais vendas.”
Porém, na Costa Verde, empresa de Aveiro dedicada ao fabrico de louça cerâmica em porcelana para uso doméstico, hotelaria e restauração, a reorganização da empresa não impediu a redução de pessoal, de cerca de 350 trabalhadores para cerca de 310, num processo gradual, “ao longo do tempo” (desde 2007), e em que se tentou transferir pessoas para os setores com maior necessidade de mão-de-obra. Aí, a decisão de aderir ao Kaizen surgiu com o desenvolvimento de novos produtos e as “dificuldades no planeamento e na logística”, conta o administrador, Francisco Proença.
Entre as mudanças adotadas, em 2007, está o “Kaizen diário” — reuniões curtas diárias, de cinco a dez minutos, entre os coordenadores das equipas e a respetiva equipa, para “brainstorming” sobre a qualidade, a produtividade e a organização do trabalho. A simplificação dos processos levou ainda a alterações na organização da fábrica. Os postos de trabalho, antes interligados, passaram a individuais e tornaram-se “mais ergonómicos e funcionais”, com “separação de produtos e encomendas do cliente”. Deixaram de ser abastecidos pela própria operadora — “que tinha de se baixar e apanhar a loiça” — para passarem a ser abastecidos por outro trabalhador com essa única tarefa: com o recurso a uma máquina, colocar as paletes à altura da mesa. Os ganhos de produtividade passaram os 25%, garante Francisco Proença.
A pandemia veio trocar as voltas ao negócio — que, em 2019, tinha “dores de crescimento”. E, aí, a metodologia Kaizen não foi suficiente para evitar quedas. O negócio, muito dependente da hotelaria e da restauração (dois dos setores mais afetados pela crise), viu a faturação cair 32% no ano passado e as encomendas recuarem para metade.
Já na ROQ, uma empresa de Famalicão que fabrica máquinas de impressão digital e de serigrafia para estamparia têxtil, o recurso ao Kaizen surgiu da necessidade de “profissionalizar a empresa”, que não parou de crescer com a pandemia (a faturação subiu 9% no ano passado e 18% até julho de 2021). Na lógica de produzir em fluxo, deixaram de fabricar para stock e passaram a fazê-lo apenas para encomenda. “Estarmos a produzir sem saber se temos clientes para as encomendas é um desperdício”, diz ao Observador Fernando Pinto, CEO da empresa. Isso ajudou a reduzir o prazo de entrega em cerca de 30 dias, para dois meses e meio.
Na organização dos departamentos, o Kaizen levou a uma maior “integração das operações”. Fernando Pinto conta que os departamentos estavam muito segmentados — “Tínhamos engenheiros que tratavam da automação, outros da parte elétrica, outros da parte mecânica”. A organização começou a ser feita não por competências, mas por famílias de produtos: um grupo para impressão digital e outro para serigrafia. “Temos equipas multidisciplinares. Neste momento, o engenheiro de automação, o elétrico e o mecânico trabalham em equipa para o projeto digital.”
Um dos focos do Kaizen é a medição constante dos indicadores de performance. A ideia é que os resultados estejam visíveis, sejam transparentes. Na fábrica da ROQ, há quadros espalhados por toda a parte, com indicadores de performance, produção e segurança, o que permite monitorizar e acompanhar os resultados de cada equipa e de cada trabalhador. Não para penalizar quando se entra no vermelho, garante Fernando Pinto, mas para corrigir imediatamente. “É tudo muito visual, as coisas não estou escondidas no gabinete do diretor“.