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Entrevista ao presidente do ICA (Instituto do Cinema e Audiovisual), Luís Chaby Vaz. 27 de Outubro de 2022 ICA, Lisboa TOMÁ SILVA/OBSERVADOR
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TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Luis Chaby Vaz, presidente do ICA. "Temos regras que não favorecem novos autores que não tenham uma rede, que não sejam protegidos"

O presidente do Instituto do Cinema e Audiovisual fala de "melhorias a fazer" nos incentivos, reconhece as dificuldades das salas e admite que "gostaria de ter realizadores no júri dos concursos".

Há mais investimento estrangeiro na indústria audiovisual em Portugal e há a perceção de que o país entrou na rota de rodagens de grandes produções. Fruto disso foi a criação do já conhecido cash rebate, um incentivo fiscal através do qual o Estado devolve uma percentagem significativa do investimento que é feito por cá. Mas esta realidade, que tem sido espelhada um pouco por toda a parte, desde a imprensa aos próprios protagonistas do setor, com pompa e circunstância, tem uma questão paralela: o facto desse incentivo ter sido suspenso em maio e de várias candidaturas estarem ainda à espera de verem parte do seu investimento recuperado, como é o caso da série “House of The Dragon” (HBO).

O ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, já assegurou que todos os pagamentos serão feitos até ao final do ano — e que está na calha um novo modelo de incentivo para 2023, tal como garantido ao Observador. Mas o que tem a dizer um dos homens que tem estado na linha da frente de um setor tão dividido? Luís Chaby Vaz, presidente do Instituto do Cinema e Audiovisual desde 2017, admite “inexperiência” por parte de todos os envolvidos, desde os vários ministérios ao Fundo de Apoio ao Turismo ou mesmo ao instituto que dirige. ” A inexperiência não foi tanto na gestão, não houve um problema de subfinanciamento crónico, mas sim alguma parcimónia em comunicar com maior rigor em tempo útil. É algo que temos de aprender a gerir melhor, sobretudo quando estamos num universo que envolve operadores globais, que contam com a certeza da economia e de operadores públicos para entrar num determinado mercado. Temos todos de ter aprendido algo com o que se passou”, garante em entrevista conversa com o Observador.

O presidente do ICA falou também dos atrasos anuais de anúncio/pagamento dos apoios do instituto, “que não são nenhum drama”, descreve-os como “normais e habituais”, passando pela comunicação difícil com os autores, de realizadores a produtores, da barreira de acesso dos concursos que existe em relação aos mais jovens, ao facto do sistema de jurados não ter, no geral, figuras como a do produtor ou realizador para avaliar as obras que conseguem financiamento público. “É a Lei do Cinema, estamos obrigados a cumprir as normas. E depois, o país tem o tamanho que tem e as pessoas que tem. Somos um país onde dificilmente aceitamos a autoridade dos nossos pares. Ficaria bem, mas não é o país que temos”, diz.

Por outro lado, não consegue apontar culpados para a crónica falta de espectadores portugueses no cinema português, nem apontar uma crítica ao novo ministro da Cultura, Adão e Silva. Até porque, tal como anunciado pela tutela em entrevista ao jornal Público, uma parte “muito significativa das despesas” do ICA vão ser financiadas pelo Orçamento do Estado (OE). Quanto à entrada das plataformas de streaming em países como Portugal através de obrigações de investimento ou taxas de subscrição, Luís Chaby Vaz sabe que este é mesmo o caminho certo. E acredita que a produção independente não será abalada. A menos que as instituições públicas comecem a falhar. “A produção independente portuguesa terá sempre lugar se os institutos públicos e as televisões públicas forem fortes. Confio plenamente que temos uma missão junto das instituições europeias para defender a solidez destes mecanismos”, finaliza.

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Entrevista ao presidente do ICA (Instituto do Cinema e Audiovisual), Luís Chaby Vaz. 27 de Outubro de 2022 ICA, Lisboa TOMÁ SILVA/OBSERVADOR

"Prevemos que 2023 seja um ano de boas notícias no que diz respeito ao crescimento do montante disponível para desenvolver o setor"

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Estamos neste momento a discutir o Orçamento do Estado (OE) para 2023. O ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva disse, em entrevista ao jornal Público, que, por causa do cumprimento da Lei do Cinema,  as despesas do ICA vão ser financiadas pelo OE. Falou de “uma grande mudança”. Que grande mudança é essa?
É uma notícia boa para o ICA, que é uma alavanca essencial de todo o funcionamento do setor do cinema e do audiovisual. É uma belíssima notícia para o setor. A revisão da lei resulta da transposição da diretiva europeia, que previa que o Estado assumisse uma parte importante das despesas de funcionamento do ICA. Apesar do OE ainda não estar na sua fase final, as notícias que temos é que isso vai acontecer. Do ponto de vista da filosofia dos princípios, parece-me perfeitamente razoável. Este é um serviço público, com despesas de funcionamento, com uma máquina base para podermos operar. Estes encargos eram assumidos antes por receitas próprias, passarão a ser revertidos através de mais apoios.

Já temos números?
Tecnicamente não é uma receita, é uma parte das despesas que são comparticipadas. Andará à volta dos dois milhões de euros que serão revertidos para os concursos e para outros apoios que temos. Agora, como é que vão ser essas linhas de apoio, se vão para longas metragens ou curtas-metragens, isso ainda está a ser estudado. Teremos de olhar para o tamanho do bolo para perceber como cortamos as fatias. Este foi um ano de crescimento das nossas receitas, prevemos que 2023 seja um ano de boas notícias no que diz respeito ao crescimento do montante disponível para desenvolver o setor.

Como tem sido a relação com Pedro Adão e Silva? Mais fácil ou difícil do que com a que manteve com Graça Fonseca?
Colocando de parte o que são relações pessoais, que é pouco relevante, acho que, desde 2017, nunca tive razões de queixa no que diz respeito ao acompanhamento do ICA, à confiança e à cooperação. Muito pelo contrário. Sempre estiveram disponíveis para responder de uma forma interessada aos desafios que lançámos como o cash rebate, que acabou por se transformar numa ferramenta muito importante, com uma curva de crescimento que nos ia assustando. Um soluço grande. Mas nunca tive nenhum problema, nem com esta tutela, é uma relação próxima e solidária. Muito pouco interventiva no que é o dia a dia, que é o que acho que deve ter na Administração Pública.

Não lhe fez confusão ter-se extinguido uma secretaria de Estado que tutelava esta área?
É completamente indiferente. Mesmo.

Não faz falta ter alguém mais direto com quem falar?
É igual.

Tenho ouvido alguns produtores que trabalharam em Portugal com os grandes estúdios de Hollywood que referem que o governo português não está ainda sensibilizado para o impacto económico futuro do investimento que é feito no país através do cash rebate. Concorda?
Nós todos, como gostamos muito do setor e acreditamos nas suas mais avalias para a economia do país, mesmo a sua imagem, o seu soft power através da Cultura, achamos que tem um valor intangível e que é economicamente relevante. Não acredito que exista falta de compreensão por este potencial, se assim não fosse não tínhamos tido a abertura para financiar um sistema de incentivos à captação de rodagens por parte de um ministério que nem é o da Cultura. Agora, estando numa fase de revisão do sistema, acho que temos de nos sentar, fazer contas e colocar as cartas na mesa. É preciso perceber essa real mais valia económica. Ter abertura de espírito de todos os agentes envolvidos. Tenho a convicção de que há boa vontade, que esse peso é muito relevante. O prestígio internacional neste setor, de facto, não tem paralelo com os meios financeiros, técnicos e de projeção que temos ao nosso dispor.

"Estamos a falar de um sistema ['cash rebate'] que foi criado de raiz sem nunca termos tido um sistema de incentivos com estas características, envolvendo duas entidades diferentes como o ICA e o Turismo de Portugal, que nunca tinham colaborado. A inexperiência não foi tanto na gestão, não houve um problema de subfinanciamento crónico, mas sim alguma parcimónia em comunicar com maior rigor em tempo útil."

Quando fala da curva ascendente que assustou um pouco, deduzo que se refira ao facto dos incentivos terem sido suspensos em maio deste ano, porque houve muitas candidaturas. E isso manifestou-se em atrasos de pagamentos, por exemplo. O ministro da Cultura garantiu que todos os projetos de 2022 serão pagos até ao final deste ano. Mas também anunciou a tal revisão do modelo de incentivos para 2023. Isto não revela inexperiência de todos os tais agentes envolvidos, do ICA aos ministérios?
Sim, admito essa crítica. Estamos a falar de um sistema que foi criado de raiz sem nunca termos tido um sistema de incentivos com estas características, envolvendo duas entidades diferentes, como o ICA e o Turismo de Portugal, que nunca tinham colaborado. A inexperiência não foi tanto na gestão, não houve um problema de subfinanciamento crónico, mas sim alguma parcimónia em comunicar com maior rigor em tempo útil. É algo que temos de aprender a gerir melhor, sobretudo quando estamos num universo que envolve operadores globais, que contam com a certeza da economia e operadores públicos para entrar num determinado mercado. Temos todos de ter aprendido algo com o que se passou. Temos a noção que este era um fundo com um prazo limite para a sua execução, que chegou ao fim, ou seja, teríamos de o renovar. Esse trabalho foi feito com tempo, mas houve uma queda de governo com eleições, o processo eleitoral demora mais tempo do que o pensado. Fomos um pouco vítimas das circunstâncias, mas admito que deveríamos ter sido mais vivos para antecipar algumas coisas. No entanto, no final acho que tudo acabou por resultar bem. Houve azar, se quiser, uma tempestade perfeita que aconteceu.

Mas talvez grandes produtoras não estejam muito interessadas nos “azares” que acontecem em Portugal.
Eles estão habituados. Estivemos sempre em contacto. Estive sempre disponível, reuni-me com toda a gente, das grandes plataformas aos grandes estúdios americanos para fazer um ponto da situação. Mantive-os envolvidos no processo decisório para se perceber que não havia desinteresse da nossa parte. Faz parte de um jogo de tensões que se vai gerindo, nunca senti que havia, da parte deles, uma cisão ou um abandonar do barco. Estão habituados, sobretudo quando se fala dos mecanismos de fundos. Estes solavancos são habituais. Quanto aos de créditos fiscais, são mais complexos e geram mais desconfiança.

Adão e Silva disse ao Observador que, quanto ao cash rebate, está a ser preparado um novo modelo para 2023. O que é que já se pode saber?
Posso dizer-lhe em que fase é que estamos. Ainda faltam negociações que não ocorreram, claro. Nós, a par de outras entidades, fomos chamados a apresentar um contributo para a revisão do atual sistema. E iremos dá-lo. Foi também encomendado um estudo a uma entidade externa para perceber a eficácia deste tipo de incentivos. Este fundo resultou de um enorme sucesso, mas temos de ter noção que a baliza financeira existente é demasiado pequena para o posicionamento que já temos no mercado internacional. Como tenho a consciência de que Portugal não tem capacidade financeira para aumentar proporcionalmente os fundos disponíveis para acomodar todas as produções que venham, talvez seja necessário um sistema bicéfalo.

O que é que isso significa?
Que acomode o crédito fiscal para projetos de maior dimensão que não tenham problemas de cash flow. Esse é o nosso grande contributo, que resulta da nossa experiência em comparação com mecanismos internacionais. Quanto ao first come, first served, que o ministro disse que iria terminar, tudo depende do grande tabuleiro em que se vai gerir estes programas de captação e fixação de rodagens.

"O setor está a crescer e a ter capacidade de integrar muita gente no mercado de trabalho. Acho que é sentido por todos"

ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Com a introdução do cash rebate ou de outras ferramentas fiscais como as taxas de obrigação de investimento para as plataformas de streaming, acha que, após discussões mais acesas, o setor está mais tranquilo com esta nova etapa que se vive?
A conjunção desta nova fonte de financiamento com o aumento das receitas que são dedicadas à produção e a outras frentes deste setor, ajuda a que as pessoas tenham esperança que existam condições para a afirmação, fixar talento, formar novo talento. Retira-nos um bocadinho uma angústia do futuro imediato, que era o que acontecia quando o ICA era financiado através do OE, que nunca sabíamos como iria ser. Cada OE era uma aventura. Agora, desde a lei de 2012, em que se criou alguma estabilidade financeira, com as produtoras a terem uma noção dos projetos que estão em jogo, já existia uma sustentabilidade daquilo que o setor podia contar para novas criações. Acho que consolidou um bocadinho o mercado e deu segurança económica. Com o cash rebate, em paralelo da criação de obras independentes, temos este perfil industrial que permite às produtoras e aos profissionais terem uma vida melhor. Poderem estudar uma área técnica e terem, depois, um futuro em Portugal que não os obrigue a terem de ir trabalhar para um supermercado. O setor está a crescer e a ter capacidade de integrar muita gente no mercado de trabalho. Acho que é sentido por todos. Até se está a sentir um problema já do outro lado, transversal a todo o mundo, que é a escassez de mão de obra.

Até tem outro “problema”, neste caso bom para quem trabalha na área: estarem a ser melhor pagos nestas produções internacionais do que se estivessem a trabalhar em produções portuguesas.
Esse é um problema, sobretudo, europeu. É de primeiro mundo, claramente. Portugal pertence à Associação Europeia de Film Agencies, a semana passada fizemos um workshop só por causa deste tema. De facto, a ausência de profissionais técnicos e de relações laborais entre o setor é um problema porque o ICA não é uma entidade patronal que representa o setor, nem tem essas funções. Não sabemos bem quem é o condutor deste autocarro. Se é o ICA, se deve ser o Ministério do Trabalho ou da Economia. É preciso algum reacerto desta nova realidade. Há um incremento de produção, fruto também da pandemia, da introdução de novos players, com ritmos e contratos mais elevados. As pessoas estão a viver melhor, mas os filmes independentes estão a ser rescalonados, não encontram talento. Portanto, é preciso encontrar novas ferramentas.

Em relação à Portugal Film Comission (PFC), Manuel Claro acabou por sair há umas semanas, notando-se alguma insatisfação da sua parte pela forma como todo este processo do cash rebate tem sido gerido e pelo excesso de burocracia entre os vários organismos envolvidos. Como é que é a relação do ICA com esta entidade? Quase todos os países têm uma, só faltava Portugal…
Quanto à convicção sobre a utilidade da PFC, é total, porque foi uma proposta do ICA desde a primeira hora. E essa visão não foi alterada. Achamos que um instituto público não tem essa função, mas sim entidades como esta. Quanto à questão da burocracia, não consigo perceber bem. Existiu um processo que foi demorado e desgastante, mas que resultou da própria lei e não tanto do excesso de burocracia. O mandato normal da PFC nunca teve um problema burocrático. Voltamos à tal tempestade perfeita. As pessoas são funcionárias públicas e começaram a ver alguma dificuldade de perceber que poderia não haver futuro.

Mas a PFC continua a fazer sentido?
Absolutamente.

"Defendemos quotas e obrigações de investimento, taxas de exibição e subscrição. Defendemos institutos fortes, porque é a única forma de defender uma certa identidade europeia e não estarmos todos a produzir o mesmo sob a lei de um grande operador internacional."

Algum dia poderemos “sonhar” com uma percentagem de taxa de subscrição às operadoras de TV ou às obrigações de investimento que ultrapassem os 5%? Falou-se muito num passado recente de como essas percentagens eram francamente baixas.
Vim ontem de Bruxelas onde estive no Parlamento Europeu num processo em que fui chamado a intervir para dar conta daquilo que está a ser o processo da diretiva europeia. É uma fase ainda muito preliminar das transposições comunitárias que resultaram em leis nacionais. Há um país cujo processo não está concluído e é um dos mais importantes: a Irlanda, que tem a sede de algumas das operadoras mais impactantes neste mercado. É muito extemporâneo falarmos de grandes alterações agora. Cerca de metade dos países têm taxas impostas aos operadores, outros têm obrigações de investimento, quanto a Portugal tem o sistema misto, como a Croácia ou a França, com valores diferentes que resultam de condições de mercado muito diferentes. Tem de haver um equilíbrio entre operadores nacionais e internacionais, a nossa dimensão não é comparável, por exemplo, ao da França. Eles não precisam de bater o pé.

As pessoas acharam a percentagem pequena.
Sim, é pouco, mas salienta-se pouco algo que se conseguiu, que é um verdadeiro cavalo de Troia, que foi submeter plataformas de partilha de vídeos como o Youtube ou o Facebook. Os resultados de receita para o ICA têm sido muito significativos. São uma novidade do ponto de vista europeu e fizemo-lo porque achámos que tínhamos espaço para o fazer mediante o nosso enquadramento jurídico. Parece-me que a Comissão Europeia deveria impor esta mesma obrigação. Claro que há lugar para melhorias, a diretiva será revista em 2026. Agora está-se a fazer uma primeira ronda, mas todos sentimos que é extemporâneo.

Mas está a demorar.
Esta área é especialmente complexa porque envolve tecnologia, questões de concorrência, cultura. Existem três comissários diferentes, do ponto de vista técnico é complexo.

Então não receia que as plataformas de streaming “engulam” países pequenos como Portugal? Ou seja, perder-se uma certa independência criativa “à portuguesa”.
Essa é uma pergunta muito mais dirigida aos interesses que as plataformas hão de ter. No que nos diz respeito, de fixação de talento europeu, os institutos são firmes na defesa das suas barreiras: defendemos quotas e obrigações de investimento, taxas de exibição e subscrição. Defendemos institutos fortes, porque é a única forma de defender uma certa identidade europeia e não estarmos todos a produzir o mesmo sob a lei de um grande operador internacional. Mas não foi só nos pequenos países que se deram crises com esse perfil. Na Alemanha ou em Espanha, que são grandes centros de produção nacional, atravessa-se um momento de grande dificuldade em relação à produção independente.

Portugal poderá escapar-se, então.
Acho difícil dizer. A produção independente portuguesa terá sempre lugar se os institutos públicos e as televisões públicas forem fortes. Confio plenamente que temos uma missão junto das instituições europeias para defender a solidez destes mecanismos.

Falemos do Plano Estratégico para o Cinema e Audiovisual. São poucas as notícias sobre este assunto e penso que deveria ter sido já apresentado entre 2020 e 2021. O que aconteceu?
É uma ferramenta interna do ICA, não visa ser uma espécie de estados gerais do cinema e do audiovisual. É algo, antes de mais, virada de dentro para fora, não é uma projeção política.

"Temos de olhar para as questões de diversidade e de geração e integrá-las nas produções"

ANDRÉ CARRILHO/OBSERVADOR

Mas já devia ter saído.
Sim

Porque é que não saiu?
Voltamos à conversa da tempestade perfeita. Tínhamos em 2019 a responsabilidade de apresentar esse estudo e foi decidido, em conjunto com a tutela, que era importante, na fase inicial, termos inputs de parceiros externos ao ICA porque não tinha sido essa a dinâmica anterior, um pouco autocentrada. Foram pedidos dois estudos simultâneos, um a uma entidade externa para ver as experiências que existem lá fora, porque é que a experiência internacional com os conteúdos portuguesas ocorre de determinada forma. A outra foi uma avaliação mais sustentada, ouvindo vários agentes do setor, sobre o que tem sido a vida do ICA nos últimos anos e quais serão as suas principais fraquezas e vantagens.

Mas já estão feitos?
Sim, entregues e concluídos e já entregámos o nosso. Apresentámos para uma primeira revisão da tutela e entrámos num processo de auscultar bilateralmente as associações que estão presentes na SECA (Secção Especializada do Cinema e Audiovisual) e apresentar algumas linhas de orientação. O que é importante referir é que temos limitações, somos um instituto pequeno com uma ambição enorme. O desafio é de que forma vamos conseguir, desta forma, motivar equipas submetidas a uma carga intensa de trabalho, com um desgaste de capital humano enorme porque tentamos recrutar pessoas boas, mas não conseguimos pagar melhor e o que merecem, porque somos um instituto público, e como manteremos chama viva. Acreditamos que é através de puxar ao máximo pelas pessoas, darmos a melhor formação possível e sermos os melhores especialistas em Portugal em várias áreas, que não apenas produzir ou agarrar numa câmara. Dados de mercado, oportunidades de promoção, apoio à produção, termos estratégias sólidas internacionais, temos de ser muito, muito competentes.

Quer dar um exemplo concreto sobre esse Plano que materialize essa visão?
O Plano está totalmente concluído, mas o processo tem um conjunto de etapas de apresentação parcial. Não tem de ser aprovado por ninguém, é um documento interno nosso que queremos partilhar com tempo. Não queremos fazer um power point, queremos ouvir a opinião das pessoas. Uma das coisas que queremos é que o ICA vai ter de passar a ter uma relação mais próxima com os agentes que estão no mercado. Pontes de diálogo permanentemente abertas. Porquê? Não é uma questão de democracia partilhada, mas sim porque a realidade é de tal forma dinâmica que, com os riscos administrativos que correm, podemos ficamos fora da carruagem. Temos de ser mais rápidos, mais abertos e flexíveis à mudança. E acessíveis, que muitas vezes não somos. Não criarmos dogmas que são muito típicos da administração portuguesa. Se há oito festivais, só oito festivais é que existem, porque as coisas fazem-se de uma determinada forma há anos e por isso mantêm-se.

Maior presença física. Mas isso significa mais despesa, não?
Sairmos mais de casa. Talvez, sim. É mais despesa, mas é melhor despesa. Temos preocupações de maior diversidade geográfica, os nossos apoios centram-se muito na região de Lisboa e do Porto. O país não é só isso. Temos de criar públicos e hábitos de cinema noutras regiões do país. Por outro lado, temos de olhar para as questões de diversidade e de geração e integrá-las nas produções. Tem sido difícil chegar a outros agentes que são importantes no mercado porque a criatividade vive disso.

"Uma das coisas que queremos é que o ICA tenha uma relação mais próxima com os agentes que estão no mercado. Pontes de diálogo permanentemente abertas. Não é uma questão de democracia partilhada, mas sim porque a realidade é de tal forma dinâmica que, com os riscos administrativos que correm, ficamos fora da carruagem. Temos de ser mais rápidos, mais abertos e flexíveis à mudança."

Essa ambição tem de lidar com algo drástico: a relação do público português com o seu cinema. De acordo com os números de espectadores entre duas estreias, o “Restos do Vento”, do Tiago Guedes, um dos mais presentes em festivais internacionais, e o “Curral de Moinas — Os Banqueiros do Povo”, de Miguel Cadilhe. O primeiro teve cerca de 9 mil espectadores na sua estreia e o segundo cerca de 300 mil. O que é que isto significa? O reconhecimento internacional do cinema português não leva os portugueses às salas de cinema?
A quota de mercado do cinema português em Portugal é uma tragédia. Ao contrário do discurso fácil que existe, em que se atribui este problema a uma espécie de criação elitista, que está distante do público, eu considero que essa é uma simplificação. Primeiro, contribui para a adesão do público português o facto de existirem salas para o receber. Algo que em Portugal estamos longe de garantir. Existe um setor de distribuição e exibição excessivamente concentrado do ponto de vista económico. O que não facilita para que haja uma rede diversificada de programação do ponto de vista geográfico que ajude a fazer uma curadoria de públicos. Isso dificulta a relação com um cinema mais independente, quer seja português ou não. Ou seja, temos um problema de market share, mas também um problema relacional com o cinema europeu independente. Onde é que não somos tão maus? Nas comédias populares.

E mesmo essas têm números inferiores. Por exemplo, falando de dois autores de renome, António Pedro Vasconcelos e João Botelho, o número de pessoas que viu este ano os seus filmes é irrisório.
Lá está. Os filmes do António ou mesmo este, “A Fada do Lar”, do João Maia, que tradicionalmente trariam um grande público, à volta dos 100 mil espectadores, vão fazer perto de dez mil. Isso está ligado ao fenómeno que decorreu por causa da pandemia, em que o número de espectadores baixou bastante em toda a Europa. Não sendo futurista, temo que haja um movimento de não retorno a um determinado consumo de cinema. Mas este é um problema mais complexo do que só o tipo de conteúdos. Essa comparação que faz entre dois filmes diferentes sempre existiu. Os nossos números são baixos porque se produzem poucos “Currais de Moinas” em Portugal, poucos com o perfil de comédia popular. O que é que acontece? Eles não são financiados pelos institutos públicos.

Mas isso não revela uma falha crónica indireta dos institutos públicos como o ICA ou outros de não conseguirem chamar as pessoas para as salas de cinema?
Não acho que seja isso. A maior parte dos países têm operadores, televisões e estúdios privados que investem nesses conteúdos. Arriscam nesses conteúdos e existem mecanismos financeiros para isso. Em Portugal, isso não existe. Já tivemos o Fundo de Investimento para o Cinema e Audiovisual (FICA), para financiar projetos com essas características, mas os fundos públicos não investem em nenhum lugar da Europa. São apoiados pelo mercado e muito bem.

Portanto, onde diria que está o problema?
Os filmes de nicho são-no em Portugal e em qualquer parte do mundo.  O que agrava no país o facto dos nichos serem pequenos é que não existem grandes oportunidades de um filme ter uma história. Temos muitos filmes apoiados publicamente que tiveram duas sessões. Não são dois dias, são duas sessões. Depois fazem o trajeto dos cineclubes, claro, mas são coisas muito precárias. Se sairmos de Lisboa, onde existem salas de cinema independentes, vemos um quadro trágico. Tenho muita esperança que isso venha a ser alterado com a rede de teatros e cineteatros e das salas digitalizadas. Precisamos de criar uma rede pública em capitais de concelho que dê uma nova vida a isto e trabalhe os públicos. Não é só ter lá o conteúdo, carregar no botão e as pessoas aparecem.

"Temos conteúdos cada vez mais acessíveis e menos capacidade financeira para promover filmes em sala. Tudo isto contribui para algum afastamento"

ANDRÉ MARQUES / OBSERVADOR

Disse que acha que os hábitos de consumo de cinema estão a mudar ou mudaram definitivamente. As pessoas vão mesmo deixar de ir às salas?
Não. Acho que o setor, tal como existe em Portugal, é hiperconcentrado nas salas de centros comerciais e esse é o que sofre, mais do que as salas independentes, com programações mais ligadas ao público. Em relação ao consumo europeu e até global do cinema, os filmes que alimentavam as salas, como os de super heróis ou comédias populares, continuam a ter o seu lugar. Fazem menos espectadores, mas estão lá. O “Bullet Train” teria feito meio milhão de espectadores antes da pandemia, agora fez cerca de 100 mil. Ou seja, é um filme claramente de grande consumo, com uma grande estrela como o Brad Pitt. O que está a entrar agora em Portugal são filmes para os miúdos e os grandes blockbusters. O filme do “Avatar” está com números francamente baixos. A seguir à pandemia, com uma crise económica em cima, começa-se a fazer as contas.

Então não podemos olhar aqui para um só culpado.
Acho que não há propriamente um dedo a apontar. A tecnologia contribuiu muito para isto, temos conteúdos cada vez mais acessíveis e menos capacidade financeira para promover filmes em sala. Tudo isto contribui para algum afastamento.

Mudemos de assunto e falemos do funcionamento do ICA. Tenho falado com vários realizadores e produtores e todos repetem algo que parece também já ser habitual neste organismo: os atrasos na atribuição dos apoios e da própria avaliação de candidaturas. Confirma?
Ciclicamente, apesar de sermos um instituto sem um problema financeiro, temos um problema económico. Um problema de tesouraria. Como somos um instituto público, recebemos receitas, mas não as podemos utilizar logo que as recebemos. Existem processos administrativos pelo meio…

Mas, repito, os atrasos não têm a ver apenas com atribuição dos apoios, têm a ver com a avaliação. Ainda no início deste ano algumas associações queixaram-se disso mesmo.
Isso não há, não há…

A notícia é de fevereiro de 2022.
Deve ter estado relacionado com as curtas-metragens de Animação ou algo do género. Podemos falar de casos concretos, não há problema. Há concursos que demoram mais tempo do que outros, é inegável. Não tem a ver com incapacidade administrativa e financeira, tem a ver com a sua complexidade e com o processo decisório. Por vezes atrasam, outras vezes não. Nós não introduzimos novidades “na nossa máquina” todos os anos que façam balançar daquilo que é o nosso ritmo normal. Lançamos cerca de 50 concursos anualmente, há uns que correm melhor, outros pior. Existem uns com jurados mais experimentados, outros mais lentos com mais dúvidas. Reuniões que demoram mais ou menos tempo. É mais difícil chegar a conclusões.

Os atrasos são recorrentes.
São recorrentes e normais.

Então as pessoas têm é de se habituar?
Tentamos ser previsíveis. Lançar e fechar concursos para que as pessoas se organizem. Atrasos na conclusão de processos, não digo que não houve. Tivemos um que ocorreu por causa de um problema que tivemos na gestão de recursos humanos, de excesso de processos em cima de pessoas. Aí sim. De resto, existem atrasos, tentamos minimizá-los, não gostamos, tentamos cumprir. Em relação a 2021, por exemplo, resolvemos com muita rapidez. Executámos nos últimos dois anos mais orçamento do que nunca. Nunca se trabalhou tanto no ICA em prol do setor. Por causa da pandemia, houve necessidade de um reforço contratual para ajudar as produtoras a ultrapassar os problemas resultantes da Covid-19. Foi uma carga administrativa e financeira brutal. Acho que esse efeito da tesouraria só será ultrapassado, talvez, em meados do próximo ano. Ainda estamos, neste momento, a executar verbas do novo coronavírus. Ou seja, a nossa taxa de execução é muito mais rápida do que era há três anos. Há muito mais dinheiro, portanto pedimos mais reforço financeiro e mais agilidade na máquina do Ministério das Finanças.

"Nunca se trabalhou tanto no ICA em prol do setor. Por causa da pandemia, houve necessidade de um reforço contratual para ajudar as produtoras a ultrapassar os problemas resultantes da Covid-19. Foi uma carga administrativa e financeira brutal. Acho que esse efeito da tesouraria só será ultrapassado, talvez, em meados do próximo ano. Ainda estamos, neste momento, a executar verbas do novo coronavírus"

Mas compreende o nervosismo do setor.
Claro. Todos os dias trabalhamos para que isso não aconteça. Não há é nenhum drama. É um aborrecimento enorme que tentamos corrigir. Esse é um dos pontos centrais do nosso Plano. No final deste ano apresentamo-lo às entidades e no início do próximo ano queremos apresentá-lo publicamente.

Em relação aos jurados, numa pesquisa que vi, reparei que existe muita gente ligada à academia e à crítica cinematográfica. Porque é que não se repensa neste modelo e não se tenta atrair pessoas que trabalham mesmo na área? Bem sei que existe um constrangimento da lei…
Concordo em absoluto, mas existe a tal legislação administrativa que coloca um entrave grave. Portugal é um país muito pequeno, logo, é muito difícil encontrar pessoas com determinadas características que não tenham ou um projeto a concurso ou um projeto da produtora com quem trabalham a concurso. É difícil não encontrar essas incompatibilidades do ponto de vista jurídico-administrativo. Gostaria de ter mais pessoas a apreciar filmes a concurso, como realizadores, produtores e atores

Não é possível então mudar?
É um bocadinho difícil porque estamos obrigados ao cumprimento dessas normas. Advém da Lei do Cinema.

Ou seja, temos pessoas a avaliar filmes que, apesar da legitimidade cinematográfica, nunca colocaram “as mãos na massa”. E daí advêm muitas críticas à escolha dos jurados.
O que não há verdadeiramente são realizadores, produtores e até, muitas vezes, atores.

Três peças essenciais para se fazer um filme.
Sim, são. Acho que tentamos incorporar esse perfil nos outros concursos onde não existem esses problemas da lei, como o luso-francês ou luso-italiano. É aí que os encaixamos. Mesmo com críticos temos imensas dificuldades porque foram argumentistas ou trabalham com determinados produtores. O país tem o tamanho que tem e as pessoas que tem. Somos um país onde dificilmente aceitamos a autoridade dos nossos pares. Ficaria bem, mas não é o país que temos.

Falemos das gerações mais jovens. Corrija-me se estiver errado mas, ao olhar para as candidaturas apoiadas, vejo poucos realizadores jovens, que saíram agora das faculdades, mas que até já têm uma certa experiência, a conseguirem apoios do ICA. Porquê?
É um problema central, é um problema central. Acho que o nosso número de curtas-metragens é significativo para a nossa dimensão, acho que aí não há um problema. Mas é preciso fazer mais no que diz respeito aos tais desígnios estratégicos. Continuamos a ter muita dificuldade em trazer autores para o setor. E jovens autores.

Não é que eles não queiram.
Não, não é. Mas temos um sistema de concurso que não favorece esta entrada no mercado. É pesado do ponto de vista administrativo, porque muitos jovens autores morrem na praia e têm projetos maravilhosos que não são valorizados. Temos um conjunto de regras que não favorecem autores que não tenham uma espécie de rede já por debaixo, uma produtora que tenha visto o seu talento, ou que não sejam protegidos. Temos de olhar para isto com mais atenção.

"Espero deixar o instituto melhor do que o que encontrei. É o que qualquer gestor público deve ter como missão"

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Talentos que depois fogem.
Exato, fogem para a publicidade ou mudam de vida ou de país. É preciso arranjar ferramentas para isto, entre a escola e a primeira experiência. Depois, é preciso incentivos para não se centralizarem na curta-metragem e terem capacidade de atrair investidores. Claro que reconheço essa crítica.

Não existem propostas concretas sobre esta matéria.
Não. É uma linha estratégica. Vamos reforçar, do ponto de vista financeiro, as primeiras obras, mas não é só por aí. Nem o Plano Estratégico nem o cheque vai resolver este problema de que falamos. Tenho a convicção de que muita gente está fora desta estrada. E sem nos centrarmos nas principais escolas que produzem realizadores para o cinema português, como a Universidade Católica ou a Lusófona. Temos talento espalhado pelo país inteiro que tem pouco espaço para entrar.

O presidente do ICA revela uma grande ambição, mas a tarefa não será demasiado grande com esta estrutura pequena que está a ter cada vez mais trabalho?
Os tempos são exigentes. Só podemos ter este caminho de maior ambição internacional e pertinência nacional. É a partir do setor público que podemos fazer isso. Temos de trabalhar nas parcerias internacionais, retomar outras, por exemplo com o Brasil, que está agora a renascer das cinzas, com o restabelecer da relação com a ANCINE. O fundo bilateral Portugal—Brasil está na antecâmara de regressar, bem como outros com países da América Latina, como da Argentina e Uruguai. Estamos em fase acelerada com o Canadá e manifestações de interesse da Austrália. Como sabe, tenho responsabilidades internacionais, quer na Europa, quer na América Latina, faço muito este trabalho de alargar as fronteiras do nosso setor.

Passa mais tempo lá fora do que em Portugal?
Não, não. Tenho acesso privilegiado a uma rede de contactos que, de outra forma, não teria. Só assim conseguimos fazer crescer projetos e produções.

Para esse caminho ser bem trilhado, não podemos ter só a RTP1 a contribuir para a projeção internacional, certo? Ainda por cima, falando-se sempre no seu subfinanciamento.
Valia a pena entrarem os privados, sim. Seria essencial Portugal conseguir captar investimento privado neste setor. Não acredito num sector 100% saudável se não houver uma forte presença de investimento privado. Acho que existe esse lugar e perfil no mercado. Infelizmente, Portugal não tem tido essa tradição.

É certo que Portugal está apostado em ter presença nos mercados internacionais, mas depois conheço relatos de autores que têm muita dificuldade em contactar com o ICA. É outra linha do Plano que precisa de ser melhorada?
Pode melhorar, sim. O facto de sermos muitas vezes inacessíveis é um problema que foi agravado pela pandemia e de alguma burocratização informática que temos de corrigir. É preciso abrir mais as portas e sair mais à rua. Temos também de ser mais cooperantes. Muitas vezes temos uma postura demasiado defensiva e pouco cooperante com muitos dos interessados com quem trabalhamos. Somos uma das partes da produção e é do nosso interesse estar nesse processo.

Mas o Luís está no cargo desde 2017, não acha que isso já deveria ter sido acautelado?
Acho que não melhorámos tanto como devíamos. É verdade. A relação do ICA com os produtores tem muito a melhorar, temos muito a aprender e a partilhar.

Estando na presidência desde 2017, sente-se confiante para continuar durante mais anos?
Não tenho propriamente um apego às funções que desempenho. Se me sentir útil, continuo com imensa vontade. Tento que o ICA se desafie a si próprio, com um grau de insatisfação permanente. Estar sempre a inventar. Quando achar que a energia for abaixo, que venha outro. E espero deixar o instituto melhor do que o que encontrei. É o que qualquer gestor público deve ter como missão.

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