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O ex-ministro Manuel Pinho (à esquerda) foi contratado por António Bernardo (à direita) para ser consultor da Roland Berger entre 2010 e 2013
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O ex-ministro Manuel Pinho (à esquerda) foi contratado por António Bernardo (à direita) para ser consultor da Roland Berger entre 2010 e 2013

O ex-ministro Manuel Pinho (à esquerda) foi contratado por António Bernardo (à direita) para ser consultor da Roland Berger entre 2010 e 2013

Manuel Pinho teve avença com consultora que indicou para fazer o Plano de Turismo do Governo Sócrates

Roland Berger pagou 230 mil euros a Pinho entre 2010 e 2013 mas não encontra "evidências" do trabalho realizado. Consultora recebera cerca de 1 milhão entre 2006 e 2008 para fazer Plano de Turismo.

É mais um dado novo descoberto pela investigação a Manuel Pinho. O ex-ministro da Economia fundou uma empresa de consultadoria em julho de 2010, um ano após ter saído do Governo Sócrates, tendo sido contratado por uma subsidiária espanhola da Roland Berger Portugal para prestar serviços de consultadoria na América Latina e África.

Manuel Pinho recebeu cerca de 230 mil euros entre agosto de 2010 e junho de 2013 por serviços sobre os quais a própria Roland Berger “não conseguiu encontrar documentação que comprove” os serviços efetivamente prestados pelo ex-ministro da Economia.

A Roland Berger, por seu lado, tinha sido contratada pelo Turismo de Portugal durante o mandato de Manuel Pinho como ministro da Economia, para elaborar, entre outros estudos, o Plano Estratégico Nacional do Turismo (PENT).

Ao que o Observador apurou junto de fontes do Ministério de Economia de então, terá sido o próprio Pinho a indicar a Roland Berger para elaborar o PENT para o Turismo de Portugal. O contrato custou àquela entidade pública cerca de um milhão de euros entre 2006 e 2008, sendo igualmente certo que a subsidiária brasileira da consultora contratou Sebastião Pinho, filho do ex-ministro, em 2007.

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Em decalrações ao Observador, quer Manuel Pinho, quer António Bernardo, managing partner da Roland Berger, rejeitam a prática de qualquer irregularidade.

Como Manuel Pinho se tornou consultor

Cerca de um ano após se ter demitido do Governo Sócrates depois do célebre episódio dos corninhos no Parlamento, e ao mesmo que estava a preparar-se para dar aulas na Universidade de Columbia por via de um patrocínio da EDP àquela instituição universitária norte-americana, Manuel Pinho criou uma empresa chamada Main Priority Serviços de Consultadoria e foi contratado pela Roland Berger Strategy Consultants, uma empresa de direito espanhol daquela multinacional de consultadoria.

O contrato negociado com Manuel Pinho por intermédio de António Bernardo (managing partner da Roland Berger em Portugal) deveria centrar-se de forma especial em Espanha, América Latina e em África e visava utilizar os “conhecimentos, as competências e a experiência do dr. Manuel Pinho na área da energia, à imagem do que é feito por inúmeras entidades com o perfil da Roland Berger”, afirmou António Bernardo ao Observador.

Universidade de Columbia. Manuel Pinho quis esconder patrocínio da EDP

A Main Priority faturou à Roland Berger um total de 231.102, 52 euros entre Agosto de 2010 e Junho de 2013, sendo que apenas uma vez cobrou a comissão de 5% contratualizada para a angariação de novos contratos/projetos. Logo na primeira fatura, foram cobrados 55 mil euros por serviços extraordinários praticados pela empresa de Pinho.

Nas várias missivas que enviou para os autos consultados pelo Observador, António Bernardo informou ainda que a Roland Berger “não conseguiu encontrar documentação que comprove o eventual trabalho prestado pelo arguido Manuel Pinho” e que “o exponente não conseguiu ter acesso a evidências documentais acerca do trabalho que haja tido lugar”.

Ao Observador, António Bernardo afirmou que “o pagamento inicial de 55 mil euros à entidade contratada não constituiu qualquer comissão”: “Foi a contrapartida para a elaboração de um plano estratégico para a Roland Berger Espanha sobre o setor da energia, detalhando oportunidades e atividades a desenvolver, enquadradas nas opções, prioridades e metodologias a assumir nos mercados de Espanha. América Latina e África. Por isso foi designada como sendo a contrapartida por serviços extraordinários prestados em agosto, tanto no contrato como na fatura respetiva”.

António Bernardo diz ainda que “é incorreto dizer-se que Manuel Pinho apenas angariou um contrato, porque, em bom rigor, nunca se associou a sua atividade à celebração de qualquer contrato”. “Procurou, todavia, produzir ideias, proporcionar contactos e apresentar sugestões de projetos a levar a cabo”, explica.

António Bernardo informou ainda os autos de que a Roland Berger “não conseguiu encontrar documentação que comprove o eventual trabalho prestado pelo arguido Manuel Pinho” e que “o exponente não conseguiu ter acesso a evidências documentais acerca do trabalho que haja tido lugar.”

Toda a informação documental relacionada com o contrato e as faturas pagas à empresa de Manuel Pinho foi enviada para os autos do chamado caso EDP de forma voluntária por António Bernardo, que correspondeu a um pedido do Ministério Público (MP) e contratou o advogado Rogério Alves para o efeito. Aliás, o advogado enfatiza ao Observador que a Roland Berger tem prestado “toda a colaboração que lhe é solicitada, tão ativa e tão completa quanto é possível, consistindo na prestação de esclarecimentos e na entrega de documentação que ainda conste dos seus arquivos”.

Questionado pelo Observador, Manuel Pinho afirmou: “Efetivamente, fui consultor internacional sénior da Roland Berger Strategy Consultants a convite do próprio professor Roland Berger, o que muito me honrou, e do seu managing partner, engenheiro António Bernardo. Esta actividade consiste, essencialmente, em partilhar uma visão sobre o posicionamento num sector em rápida mutação, acompanhar o enquadramento regulamentar, aconselhar sobre oportunidades, etc.”

Manuel Pinho confirmou a abertura e a atividade da Main Priority com a Roland Berger, diz que os serviços que prestou à empresa de consultadora seguiram as “práticas correntes” à época, mas remete qualquer esclarecimento sobre o “contrato” e os “pagamentos ” para a Roland Berger. Uma coisa garante Pinho: “Nunca tive qualquer envolvimento com projetos em Portugal.”

Roland Berger diz que contratou Pinho pelos seus “conhecimentos, competências e experiência”

A empresa Main Priority tinha Manuel Pinho como administrador único e como principal acionista, com cerca de 99% do capital social. A mulher (Alexandra Fonseca Pinho) e os advogados Gabriela Rodrigues Martins Câmara Pestana e André Huet de Bacelar Gonçalves tinham, cada um, uma participação simbólica no resto do capital da sociedade fundada a 23 de julho de 2010.

A lei impunha que uma sociedade anónima tinha de ter, pelo menos, cinco acionistas, daí que os advogados ficassem com ações simbólicas para que os critérios da lei fosse cumpridos. Contudo, a advogada Gabriela Rodrigues Martins era então uma das principais advogadas portuguesas na área da energia e tinha Américo Amorim como principal cliente.

A sede social da Main Priority localizava-se no 8.º andar do número 50 da rua Alexandre Herculano, em Lisboa, sendo que a AAA – Sociedade de Advogados tinha sede no 9.º andar do mesmo prédio.

António Bernardo explicou ao Observador que a Roland Berger “desconhecia quem seriam os outros acionistas dessa entidade e sempre o considerou irrelevante”. A consultora “pretendeu assegurar os serviços” de Manuel Pinho “para as atividades que constam do contrato celebrado em 3 de agosto de 2010”, tendo o ex-ministro indicado “como outorgante a sociedade Main Priority”.

O objetivo da contratação de Pinho era simples: “Utilizar os conhecimentos, as competências e a experiência, do professor Manuel Pinho na área da energia, à imagem do que é feito por inúmeras entidades com o perfil da Roland Berger”.

Aliás, a Roland Berger juntou também aos autos os contratos que celebrou com dois conhecidos gestores espanhóis: Angel Corcóstegui Guraya (que foi vice-presidente e CEO do Banco Santander entre 1994 e 2002) e José Ignácio Goirigolzarri (que foi presidente do Bankia entre 2021 e 2021 e é atual chairman do CaixaBank). Apesar de ambos serem “titulares de uma relevantissima carreira na banca e no universo financeiro”, nenhum desempenhou um cargo político como Manuel Pinho.

Manuel Pinho deu indicação para a Roland Berger ser contratada

O interesse dos procuradores Carlos Casimiro e Hugo Neto pela relação entre Pinho e a Roland Berger prende-se com o facto de a consultora ter sido contratada pelo Turismo de Portugal para desenvolver, entre outros, o Plano Estratégico Nacional do Turismo (PENT).

De facto, o Turismo de Portugal confirmou ao Ministério Público que pagou à Roland Berger um total de 1.004. 138, 56 euros entre 2006 e 2008, tendo o PENT sido apresentado em janeiro de 2006 numa cerimónia de inauguração da Bolsa de Turismo de Lisboa que foi presidida pelo então ministro Manuel Pinho. A maior tranche dos pagamentos do Turismo de Portugal à Roland Berger, de cerca de 558 mil euros, foi paga em 2007.

Ao que o Observador apurou junto de fontes do Ministério da Economia que trabalharam com Manuel Pinho entre 2005 e 2009, uma primeira versão de um plano estratégico para o turismo começou por ser desenvolvido pelos serviços internos do Ministério. Uma fonte da Economia diz que essa era a prática comum na época: os estudos costumavam ser desenvolvidos internamente pela Direção-Geral de Turismo ou por outros serviços do Ministério.

Tal versão chegou a ser apresentada a Pinho, tendo o então ministro dado a indicação de que um organismo tutelado pela Economia (o Instituto Turismo de Portugal e a Direção-Geral do Turismo eram as hipóteses) deveria contratar a Roland Berger para desenvolver o que veio a ficar conhecido como PENT.

Pinho não responde e Roland Berger diz que é a autora do PENT

O Observador confrontou Manuel Pinho por escrito com todas as informações que constam deste artigo, nomeadamente com a indicação que terá dado para a contratação da Roland Berger. O ex-ministro da Economia optou por não responder diretamente, não tendo, contudo, desmentido a informação. “A Roland Berger é reconhecida como um líder mundial na área de consultadoria no sector do turismo (esteve na origem do lançamento de algumas das maiores cadeias internacionais de hotéis) e o PENT foi inovador, tendo tido um papel importante na definição de uma política global e não casuística para o turismo, a qual teve grande sucesso, como os factos vieram a mostrar”, afirmou.

"O PENT foi um trabalho de fundo que é da responsabilidade da Roland Berger", como "muitos outros que criou no desenvolvimento das suas competências na área do turismo, que a tornam uma empresa líder a nível mundial".
António Bernardo

Já António Bernardo, que também enfatiza que a Roland Berger é reconhecidamente “uma das maiores especialistas mundiais em consultoria estratégica, nomeadamente na área do turismo, onde desenvolve atividade regular”, foi mais claro: “O PENT foi um trabalho de fundo que é da responsabilidade da Roland Berger”, como “muitos outros que criou no desenvolvimento das suas competências na área do turismo, que a tornam uma empresa líder a nível mundial”. O que aconteceu, “como é usual (…) neste tipo de projetos”, é que houve “um envolvimento da entidade adjudicante que colabora com os quadros da Roland Berger designados para a elaboração do Plano. Assim ocorreu aqui também”, afirma.

António Bernardo desmente categoricamente que “haveria um Plano já elaborado, que teria sido conhecido, usado ou aproveitado pela Roland Berger”: “Isso é uma mentira grosseira no que à Roland Berger diz respeito. A Roland Berger nem sequer concebe que alguém haja dito tal coisa.”

Filho de Manuel Pinho trabalhou na Roland Berger Brasil

Há mais uma informação que consta dos autos do caso EDP que envolve a Roland Berger e Manuel Pinho: a contratação de Sebastião Pinho, filho de Manuel Pinho, pela subsidiária brasileira da Roland Berger.

Formado em Portugal, Estados Unidos e Brasil, Sebastião começou a trabalhar em setembro de 2007 na Roland Berger Espanha (Madrid), tendo sido transferido em outubro de 2008 para a subsidiária da multinacional em São Paulo — onde esteve até fevereiro de 2011, segundo a sua página de Linkedin.

É verdade que António Bernardo é, segundo a sua página do Linkedin, managing partner  da Roland Berger no Brasil, México, Portugal e Angola mas apenas assumiu as suas funções na subsidiária brasileira “em 2013, isto é, seis anos após a contratação” de Sebastião Pinho, esclareceu António Bernardo ao Observador.

Questionado sobre se alguma vez falou com António Bernardo para que o seu filho Sebastião fosse contratado pela Roland Berger Brasil, Manuel Pinho não respondeu diretamente: “Milhares de jovens trabalham em empresas de consultadoria depois de sair da faculdade. O meu filho integrou a empresa com o nível de analista. Trabalhou em Espanha, Estados Unidos, Brasil e México, tendo chegado à Roland Berger à categoria de principal. A meio do percurso, foi quadro superior de uma grande empresa de S. Paulo, a CPFL. Actualmente trabalha no Brasil noutra grande consultora internacional em São Paulo [Kerney], onde tem o nível de sócio”.

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