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“Sobre esta personagem… O meu governo é um governo limpo que surgiu de uma moção de censura para acabar com a corrupção sistémica dos que estão na Calle Génova [sede do Partido Popular].” O chefe do governo espanhol, Pedro Sánchez, reagia desta forma, na passada quinta-feira, às acusações feitas por um antigo presidente de um clube de futebol, Víctor de Aldama. Este garantiu, durante um interrogatório, que havia vários socialistas envolvidos num processo de corrupção que está a manchar a imagem do executivo de Espanha: o caso Koldo.
Na origem deste caso esteve a celebração de contratos estatais para a compra de máscaras durante a pandemia de Covid-19. Com a vigência do estado de alarme em Espanha, por causa da situação de saúde pública, existiu uma flexibilização para adjudicações de contratos. Víctor de Aldama aproveitou-se da conjuntura e terá contado com dois importantes aliados: o então ministro dos Transportes, Mobilidade e Agenda Urbana espanhol, José Luis Ábalos, e o antigo assessor, Koldo García.
Tendo começado por uma “vingança” de Isabel Díaz Ayuso, certo é que o caso ganhou peso mediático e várias ramificações. Em muitas delas, estão envolvidos nomes próximos de Pedro Sánchez, alguns deles atualmente membros do governo espanhol. Víctor de Aldama, o empresário que esteve na base deste processo, diz ter “provas” que ainda podem dar mais dores de cabeça ao PSOE. Eis nove respostas sobre o caso Koldo.
A “vingança” do PP e de Ayuso. Como começou o caso Koldo?
O caso Koldo é um processo de corrupção que começou com uma investigação de vários contratos de emergência para a compra de máscaras durante os meses iniciais da pandemia de Covid-19. A denúncia foi feita pelo Partido Popular (PP) de Madrid, liderado pela presidente da comunidade autonómica da capital, Isabel Díaz Ayuso. Foi a dirigente partidária que coordenou diretamente o processo. Apesar disso, foi Alfonso Serrano, deputado popular e porta-voz na assembleia madrilena, que apresentou a queixa na secção do Ministério Público espanhol especializado em corrupção.
O PP de Madrid denunciava às autoridades, em março de 2022, “irregularidades que considera terem ocorrido nos contratos de emergência relacionado com Covid-19, formalizados pela administração geral do Estado e no setor público institucional”. Por essa altura, na assembleia madrilena, Isabel Díaz Ayuso apontava já para “326 milhões sacados ao erário público”. “Compraram-se máscaras por um valor entre 25 a 500% por cima das adjudicações anteriores. Vão ter de dar muitas explicações”, prometia na altura a líder popular.
A queixa foi na altura apresentada também como uma forma de ripostar contra um processo judicial que envolvia Isabel Díaz Ayuso. Em março de 2022, a presidente da comunidade de Madrid foi acusada de beneficiar empresas do irmão, Tomás Díaz Ayuso, para a compra de equipamentos de proteção sanitária durante a pandemia para a capital. “Foi a nossa vingança”, admitiu um membro do PP ao El Mundo, acrescentando: “Não pretendíamos entrar nesse terreno, mas, como a esquerda se dedicou a atacar-nos com um caso arquivado pela Justiça, decidimos investigar”.
Um ex-guarda-costas transformado em assessor e um ex-ministro leal a Sánchez. Quem está envolvido no caso?
O nome do caso foi atribuído ao antigo guarda-costas convertido em assessor, Koldo García, que trabalhava para José Luis Ábalos. O ex-governante era também um dos rostos mais próximos de Pedro Sánchez e ajudou o socialista a chegar ao poder em 2018. Considerado pela agência EFE a “coluna vertebral do PSOE e um dos membros do núcleo duro de Pedro Sánchez”, foi um principais defensores da moção de censura motivada por outro caso de corrupção (Gürtel), apresentada contra o ex-líder do governo, Mariano Rajoy — e que levou à queda do executivo do PP e subsequente chegada ao poder de Sánchez.
A “lealdade” do antigo professor primário que se converteu em político, iniciando a carreira na autarquia de Valência, deu frutos, sendo que Pedro Sánchez o designou como ministro no primeiro governo socialista em 2018, após a moção de censura. José Luis Ábalos continuou como governante em 2019, após as eleições e a coligação que se formou entre o PSOE e o Unidas Podemos.
Para além do ex-assessor e do ex-ministro, há outro nome estritamente ligado ao caso: o do empresário Víctor de Aldama. Foi este este homem, antigo presidente do Zamora Club de Fútbol, que esteve em contacto com o ex-assessor Koldo García através do seu irmão, Ruben de Aldama, que também chegou a ser segurança de José Luis Ábalos.
De acordo com a RTVE, Ruben de Aldama, próximo de Koldo García (já que os dois tinham sido guarda-costas no passado), enviou, a 31 de agosto de 2018, uma mensagem ao irmão empresário em relação ao antigo ministro: “Lo tienes a huevo para hacer cosas” — uma expressão espanhola que poderia ser traduzida como “Tens muito por onde pegar com ele”. A partir daí, terá começado um contacto permanente entre o Ministério chefiado por José Luis Ábalos e Victor de Aldama.
O primeiro encontro público registado entre os três homens ocorreu em dezembro de 2018 durante uma viagem oficial de José Luis Ábalos à província mexicana de Oaxaca, relata o El Mundo. Na comitiva, estava o assessor Koldo García e também Víctor de Aldama, que desempenhava o cargo de “cônsul honorário”. O ex-ministro indicou, numa entrevista, que conheceu precisamente o empresário no México, numa “reunião com o presidente da Câmara de Oaxaca e com um senador”.
Segundo o último relatório da Unidade Central Operativa da Guarda Civil — entidade responsável pela investigação —, de outubro de 2024, Víctor de Aldama manteve, desde 2018, uma “relação privilegiada” quer com o ex-assessor, quer com o antigo ministro. Esse relacionamento, “pessoal e direto com Koldo García e, por conseguinte, com o próprio ex-ministro”, concedeu ao empresário “notáveis benefícios económicos” durante a pandemia de Covid-19 através de contratos com o Estado.
O estado de alarme e a pandemia. Como foram celebrados os contratos?
Inicialmente, na denúncia às autoridades, o Partido Popular madrileno apresentou 13 contratos que provavam alegados benefícios económicos entre o ministério e o empresário. Como intermediária entre as duas entidades, havia a misteriosa empresa Soluciones de Gestión y Apoyo, que só em 2020 faturou 53 milhões de euros em contratos com o governo de Pedro Sánchez e também com as comunidades autonómicas das Ilhas Canárias e das Ilhas Baleares — na altura governadas por socialistas.
A empresa fantasma praticamente não estava ativa entre 2018 e 2019, não tendo registado qualquer lucro naqueles dois anos, algo que muda drasticamente um ano depois. E há outro rosto envolvido neste esquema: o de Juan Carlos Cueto, último beneficiário da Soluciones de Gestión y Apoyo, embora o seu nome não estivesse registado nas Finanças como diretamente ligado à empresa (o titular era Iñigo Rotaeche). Segundo a Justiça espanhola, foi com este homem que Victor de Aldama colaborou para conseguir a venda de máscaras. Investigado em paralelo por outro caso de corrupção (Durex), Juan Carlos Cueto também era próximo de Koldo García.
Entre o ministério e a empresa, os contratos foram celebrados num estado de exceção. Por causa da chegada da pandemia de Covid-19 a Espanha, a 14 de março de 2020, o governo espanhol decretou estado de alarme. Ao fazê-lo, o executivo e as comunidades autonómicas puderam acionar o artigo 120 da lei dos contratos do setor público — o que permite adjudicar contratos de forma mais rápida e sem grandes obstáculos legais.
Este contexto terá sido aproveitado por Víctor de Aldama, por Koldo García, por Juan Carlos Cueto e pelo ex-ministro. Como recorda o jornal infobae, o primeiro contrato assinado pelo organismo público Puertos del Estado (sob a tutela do Ministério dos Transportes, Mobilidade e Agenda Urbana) e a empresa Soluciones de Gestión y Apoyo foi assinado a 21 de março de 2020. Previa a compra de “oito milhões de máscaras” em troca de 24 milhões de euros.
Este longe de ser o único, havendo registo de dezenas de contratos. Seis dias depois, a Adif, empresa que administra as infraestruturas ferroviárias e que era gerida pelo ministério de José Luis Ábalos, fez outro contrato com a empresa Soluciones de Gestión y Apoyo de 12,5 milhões de euros pela compra de cinco milhões de máscaras.
Que suspeitas recaem sobre Francina Armengol, a presidente do Congresso dos Deputados e aliada de Sánchez envolvida no processo?
É um dos nomes atualmente mais próximos de Pedro Sánchez, estando no núcleo duro do socialista. Em 2020, a empresa fantasma de Juan Carlos Cueto vendeu máscaras ao governo da comunidade autonómica das Ilhas Baleares, na altura liderado pela socialista Francina Armengol, a atual presidente do Congresso dos Deputados, a câmara baixa do Parlamento espanhol.
Em abril de 2020, de acordo com o El Mundo, Francina Armengol entrou em contacto direto — e verbal — com Koldo García para adquirir máscaras para a região autonómica. Quatro dias depois depois desse contacto, o executivo regional celebra um contrato de 3,7 milhões de euros com a Soluciones de Gestión y Apoyo, em troca de 1,4 milhões de máscaras FPP2 (designadas de bico de pato).
O executivo balear gastou fundos comunitários para a compra de máscaras, num processo cujos contornos estão a ser investigados pela Procuradoria Europeia. E houve uma agravante: as máscaras vendidas pela empresa fantasma não eram as chamadas máscaras “bico de pato”, como o acordado, mas antes cirúrgicas. O equipamento de proteção individual foi colocado num armazém e nunca foi usado. O governo das Ilhas Baleares entrou depois com um processo em tribunal, reivindicando 2,6 milhões de euros à Soluciones de Gestión y Apoyo.
Questionada numa comissão de inquérito no governo balear, Francina Armengol garantiu que as “decisões eram totalmente técnicas e eram tomadas a um nível técnico e funcional”, recusando ter havido qualquer interferência de Koldo García. A atual presidente do Congresso dos Deputados assegurou também que nunca falou com o ex-assessor sobre o contrato das máscaras. O PP não acreditou nestas justificações e pediu a demissão da socialista.
Uma moradia e uma vivenda para a companheira. Quais são os “notáveis benefícios económicos” dos membros da rede?
O dinheiro dos contratos públicos servia como lucro da empresa Soluciones de Gestión y Apoyo. No total, em adjudicações, terão sido angariados, segundo estimativas do Ministério Público, 60 milhões de euros. Havia ainda 16,5 milhões de euros envolvidos em comissões e 88 mil euros para que houvesse comunicações seguras entre os intervenientes do caso Koldo.
Segundo o El País, Victor de Aldama tinha um documento chamado Máscaras no seu computador pessoal, criado em março de 2020, em que geria os potenciais ganhos do esquema que havia montado. Globalmente, o ex-presidente do Zamora Club de Fútbol terá ganhado cerca de 5,5 milhões de euros, enquanto Juan Carlos Cueto poderá ter obtido até 9 milhões de euros.
Os pagamentos ao ex-ministro eram feitos de forma menos óbvia, usando testas de ferro para o efeito. A investigação aponta que a rede organizada por Victor de Aldama comprou uma moradia em Cádiz a José Luis Ábalos. Os investigadores escrevem, no relatório de outubro de 2024, que, “imediatamente depois das adjudicações públicas”, a casa foi comprada, tendo sido “selecionada em primeiro por Ábalos e adquirida por Aldama através de terceiro, sendo [o ex-ministro] quem usufruía da casa”.
Para além disso, Víctor de Aldama também arranjou forma de pagar 90 mil euros para arrendar uma casa, na Praça de Espanha, em Madrid, à companheira do ex-ministro, uma mulher chamada Jessica R.G.
Já Koldo García, escreve a Cadena Ser, recebia periodicamente cerca de 10 mil euros em efetivo. Quando foi detido, o antigo assessor tinha em sua casa 24 mil euros. Adicionalmente, o ex-braço direito de Victor de Aldama terá em seu nome bens na ordem dos 1,5 milhões de euros.
A detenção e a saída à força do PSOE. Qual foi a resposta de Sánchez a esta tempestade política?
Durante uma remodelação do governo em julho de 2021, José Luís Ábalos sai do executivo espanhol e é substituído por Raquel Sánchez, presidente da Câmara de Gavá. É uma saída relativamente pacífica e que não estará diretamente associada ao caso Koldo, que, na altura, ainda não existia — uma vez que o PP de Madrid apenas fez denúncia meses depois. O presidente do governo espanhol garantiu que a saída do seu aliado tinha motivos políticos. Lembrando a “crise profunda da pandemia”, Pedro Sánchez assinalou que era necessário “renovar e relançar o executivo” e isso fez com que o “ex-ministro Álabos saísse”.
O caso foi apresentado em março de 2022 pelo PP Madrid e começou a ser investigado um mês depois. Em fevereiro de 2024, o processo — que já servia como arma de arremesso político — ganhou ainda maior destaque. O ex-assessor Koldo García foi detido pela suspeita de cobrar comissões ilegais nos contratos para a compra de máscara durante a pandemia. Também foram detidos Víctor de Aldama, Joseba García, irmão do antigo assessor e Íñigo Rotaeche, titular da Soluciones de Gestión y Apoyo.
Foi o início de um tempestade política para o PSOE, que teve de lidar com um alegado processo de corrupção de grande atenção mediática, devido à ligação que Pedro Sánchez mantinha com José Luis Ábalos. Apesar de os detidos terem saído em liberdade condicional, o escândalo alastrou-se ao executivo espanhol. E a reação dos socialistas foi rápida.
O PSOE tentou demarcar-se do caso e fez tudo para que José Luis Álabos renunciasse ao cargo de deputado, para o qual tinha sido eleito em 2023. Nas eleições gerais, o nome do ex-governante foi incluído nas listas do PSOE, apesar de já haver desconfianças sobre o envolvimento do socialista no caso Koldo. Para que renunciasse, María Jesus Moreno, vice-presidente e braço direito de Pedro Sánchez, deu o pontapé de saída. Dias após a detenção, a ministra das Finanças pressionava o antigo governante: “Não posso dizer o que senhor Álabos vai fazer, mas eu sei o que faria”.
José Luis Álabos resistia à ofensiva de Pedro Sánchez e garantia que não se demitiria. Perante a “pressão” da direção do PSOE, o ex-ministro garantiu que ia “defender a sua honra pessoal até as últimas consequências”. Desafiando o chefe de governo, o deputado anunciou que passaria a ser não-inscrito, integrando o “grupo misto” do Congresso dos Deputados. “Não posso fazer um tributo à direta, como acredito que faz a direção do meu partido. Não posso acabar a minha carreira política quando sou inocente.”
Os socialistas não ficaram indiferentes ao desafio de José Luis Álabos. A direção do PSOE suspendeu-lhe a militância, abrindo ao mesmo tempo um inquérito interno. Num email enviado a militantes socialistas a que a Europa Press teve acesso, Santos Cerdán, membro do secretariado realçou que era necessário “salvaguardar a imagem” do partido, recordando que o deputado não tinha cumprido várias normas do PSOE.
Victor de Aldama complica a vida ao PSOE. O que disse o empresário no seu último interrogatório?
Em outubro de 2024, o relatório da Unidade Central Operativa da Guarda Civil deixava duras acusações a todos os envolvidos no processo, em particular ao ex-ministro. A secção do Ministério Público espanhol especializada em corrupção deixava claro que José Luís Álabos teve um “papel relevante e de responsabilidade na relação direta com Koldo, Aldama e a organização criminosa”.
Em reação, após o relatório, Pedro Sánchez assegurava que não haveria “impunidade”. “Desde que houve o mínimo indício de corrupção, atuou-se com contundência e determinação”, disse, acrescentando que foi aberto um processo para “expulsar” José Luis Álabos do PSOE. Haverá, de acordo com o chefe do governo espanhol, uma resposta “determinada, transparente e de colaboração com a Justiça”.
O executivo socialista tentou conter os danos, afastando as polémicas e culpabilizando somente José Luis Álabos e Koldo García. No entanto, no final de outubro de ano, o El Mundo publica uma fotografia que veio levantar suspeitas sobre o papel de Pedro Sánchez neste processo — e lançou a dúvida sobre se o chefe do executivo espanhol teve conhecimento de antemão dos contratos para a compra de máscaras.
O jornal El Mundo publica, na primeira página, uma fotografia de Pedro Sánchez ao lado do “nexo corruptor” — título que a Justiça espanhola atribui a Victor de Aldama. A foto foi tirada nos camarins do Teatro La Latina, em Madrid, após um comício socialista a 3 de fevereiro de 2019 e prova que o secretário-geral do PSOE tinha privado com o empresário antes do caso Koldo.
#Exclusiva EL MUNDO revela la fotografía que demuestra que Pedro Sánchez y Víctor de Aldama se conocen. Fue tomada en febrero de 2019 por Koldo García en la zona vip del Teatro La Latina tras el acto de presentación de Pepu Hernández. pic.twitter.com/6y5TV5L1Ut
— Esteban Urreiztieta (@eurreiztieta) October 26, 2024
Mas o cerco ainda se ia apertar mais a 21 de novembro deste ano. Um mês antes, Victor de Aldama foi detido na sequência doutro processo de corrupção, desta vez ligado com o negócio de hidrocarbonetos. O empresário decidiu colaborar com as autoridades no caso Koldo — e apontou a dedo a vários membros da direção do PSOE, em particular a Pedro Sánchez.
Victor de Aldama alegou que Pedro Sánchez o queria conhecer em 2019, no momento em que foi tirada a foto — e que lhe queria agradecer pelo trabalho que havia feito no México. E não foi o único socialista que mencionou durante o interrogatório. Também falou sobre Santos Cerdán e María Teresa Moreno, dois aliados do núcleo duro do chefe do governo espanhol.
Em concreto, o empresário detalhou as verbas que entregou aos seus alegados parceiros no caso Koldo. Terá atribuído 400 mil euros em dinheiro a José Luis Álabos, 250 mil dos quais pelos contratos com as máscaras e o restantes por outros favores. Koldo García terá recebido 100 mil euros. Com uma novidade: Victor de Aldama terá pagado 15 mil euros a Santos Cerdán, um dos principais rostos do PSOE e membro do secretariado socialista. Estas informações foram, esta terça-feira, desmentidas pelo ex-assessor Koldo García.
Em resposta a estas críticas, Pedro Sánchez classificou Víctor de Aldama como uma “personagem”. “No que diz respeito a mim e ao governo, tudo o que disse este senhor é categoricamente falso”, reforçou o chefe do governo espanhol, assegurando que executivo que lidera está “limpo”. O PSOE está agora a preparar um processo em tribunal contra o empresário.
Porém, Aldama, que saiu da prisão por ter colaborado com as autoridades no seu testemunho no caso Koldo, ripostou contra as acusações de Pedro Sánchez. “Vai ter provas de tudo o que eu disse”, disse aos jornalistas o empresário no momento em que abandonava a prisão onde estava. “Chamou-me ‘deliquente’ e ‘personagem’. Este senhor [Pedro Sánchez] tem de saber que ele é um mitómano e tem Alzheimer. Quando lhe perguntaram duas vezes se me conhecia, não respondeu”, criticou ainda.
El empresario Víctor de Aldama carga contra Pedro Sánchez: "Es un mitómano y tiene alzhéimer".
Poco después de declarar ante el juez, Víctor de Aldama ha salido de la madrileña prisión de Soto del Real pic.twitter.com/l72njMV5pS
— expansioncom (@expansioncom) November 22, 2024
Perante esta troca de acusações, o líder do Partido Popular, Alberto Núñez Feijóo, anunciou que estaria disposto a apresentar uma moção de censura contra o governo de Pedro Sánchez, caso algum dos parceiros do PSOE decidisse deixar cair o governo. No entanto, a decisão não deverá ir avante, ainda que os populares vão continuar a explorar o tema para debilitar ainda mais o executivo.
Alberto Núñez Feijóo notou que já há “algum tempo que a corrupção tocava no coração do governo, do PSOE e do próprio” Pedro Sánchez. “Já não há dúvidas de que tínhamos razão. Estamos diante do ‘caso Sánchez’ e, perante isso, há que atuar”, enfatizou o presidente do Partido Popular, lembrando ainda o caso de corrupção em que estará envolvida Begoña Gómez, mulher do chefe do governo espanhol. “É evidente que o senhor Sánchez não veio servir [a nação], mas antes veio servir-se.”
Por seu turno, Isabel Díaz Ayuso ainda foi mais longe. “É imprescindível a demissão em bloco deste governo. É urgente”, atirou a presidente da comunidade de Madrid, antevendo: “Ainda falta muitíssimo para ver. Veremos quantos dias vai demorar Sánchez para ver como volta a arranjar uma nova estratégia para atacar juízes, procuradores, políticos e todos aqueles que estão a fazer o seu trabalho”.
O que tem a Venezuela a ver com deste processo?
No seu interrogatório, Aldama levantou um assunto periférico ao caso, mas também potencialmente grave para Sánchez. Antes da compra da pandemia e dos contratos para a compra de máscaras, garantiu, houve um polémico encontro no aeroporto de Barajas, em Madrid, em que esteve presente Delcy Rodríguez, vice-presidente da Venezuela e figura próxima do Presidente Nicolás Maduro. Mas havia um grande problema: a responsável política venezuelana não podia entrar no espaço Schengen (nem sobrevoá-lo), por ser alvo de sanções pela União Europeia.
No entanto, Delcy Rodríguez aterrou em Espanha. A vice-presidente venezuelana era próxima de Victor de Aldama, que terá combinado a viagem com Koldo García e que recebeu também o aval de José Luis Ábalos. Segundo o testemunho do empresário, Pedro Sánchez e todo o governo espanhol tiveram conhecimento da viagem de uma das aliadas de Nicolás Maduro, apesar de a União Europeia o proibir.
A chegada da vice-presidente da Venezuela tinha um objetivo: a venda ilegal de ouro venezuelano, segundo apurou o Ministério Público. Em concreto, na visita de Delcy Rodríguez a Espanha, seriam vendidas 104 barras de ouro — avaliadas em 68,5 milhões de euros — a uma empresa espanhola.
A venda acabou por não se concretizar — tal como a reunião fora de Barajas. Estaria previsto que Delcy Rodríguez abandonasse o aeroporto e se deslocasse a uma moradia no centro de Madrid, num encontro que já teria sido previamente planeado. Entre várias declarações confusas, o governo de Pedro Sánchez reconheceu que sabia da viagem da vice-presidente, tendo tido conhecimento da mesma “horas antes” e que foi cancelado no momento em que o executivo se apercebeu das “sanções individuais” de que Delcy Rodríguez era alvo.
Sociedades para desviar fundos. Qual o papel de Portugal neste caso?
Portugal não passou ao lado deste mega processo de corrupção. Victor de Aldama, de acordo com um relatório judicial de 2023 consultado pelo Expresso, “colocou bens móveis e imóveis dos quais é proprietário em nome de empresas constituídas em Portugal”, de modo a “esquivar-se a sanções económicas da Autoridade Tributária [de Espanha]”.
As empresas em questão têm sede em Elvas e em Lisboa. Terão servido para adquirir bens, num processo de branqueamento de capitais resultante da celebração de contratos para a compra de máscaras. Segundo a acusação, Victor de Aldama terá comprado, através da sociedade portuguesa, uma “casa situada numa urbanização em Madrid por dois milhões de euros” e ainda um carro Ferrari F12, que foi “adquirido com parte dos fundos investigados”.