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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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"Não passarão!" PS aposta forte na colagem da direita tradicional ao Chega

Colagem entre direita tradicional e extrema-direita ganha espaço crescente na campanha do PS, a nível nacional e europeu. Bugalho responde com Assis. E há reservas no PS sobre a estratégia.

“Não passarão!”. O grito improvável encheu, pouco passava das dez da noite desta sexta-feira, o café do Teatro Municipal da Guarda, onde decorreu mais um comício do PS. A frase — que vem recuperar o lema que António Costa passou a campanha de 2022 a atirar contra o Chega — chegava em reação a mais um discurso contra a direita e a extrema-direita. Apesar de o PS dizer que não quer “misturar” essas duas direitas, o que é certo é que nesta campanha tem sido rara a intervenção em que essa associação não é feita ou essa “contaminação” não é referida — apesar de esta não ser uma ideia completamente consensual no interior do partido.

O guião está feito: se nas legislativas de 2022 o PS se focava, a nível nacional, em agitar o papão de possíveis acordos entre o PSD de Rui Rio e o Chega, desta vez o foco são as possíveis alianças entre PPE (a família política de PSD e CDS na Europa) e o grupo dos Conservadores e Reformistas, que inclui partidos como o Vox ou os Irmãos de Itália, de Giorgia Meloni, e pondera apoiar Ursula Von der Leyen para a Comissão Europeia.

Ora na campanha do PS os ataques começaram por ser feitos sobretudo por esse lado, com críticas constantes à disponibilidade da presidente (recandidata) da Comissão Europeia para ser “capturada” por partidos extremistas e por se mostrar “condescendente” com a extrema-direita. Mas chegam agora a todas as frentes: os socialistas dizem estar preocupados com os “retrocessos” que uma associação entre a família europeia da AD e a extrema-direita (parcialmente incluída no grupo dos Conservadores e Reformistas) pode representar. E esse tem sido o eixo central da mensagem que vão passando.

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Por todo o lado, na campanha do PS, se ouve a palavra “retrocesso” associada à direita. Nos sacos de pano que o partido distribui, onde se lê que o seu lema é “mais progresso, menos retrocesso”. Nas incontáveis referências aos “ataques” a direitos que os socialistas vislumbram, à cabeça o direito ao aborto — que o PS quer ver inscrito na Carta dos Direitos Fundamentais, contra a vontade da AD, que defende que há um conflito entre direitos no plano jurídico. E nas associações aos partidos de direita radical, que os socialistas garantem estar a contaminar o discurso e as prioridades da direita “dita moderada”.

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Esta sexta-feira, o ataque foi lançado por todos os protagonistas que apareceram na campanha do PS. Por Marta Temido primeiro, ao falar da tal “condescendência” que Von der Leyen terá para com esses partidos. Depois, por Pedro Nuno Santos, que numa arruada na Covilhã aumentou o tom ao prometer que o PS não quer “só combater o Chega”, mas “combater o Chega e à AD”, para travar retrocessos e políticas “conservadoras” na Europa e em Portugal.

Mesmo reconhecendo que a direita e a extrema-direita não são iguais — têm “graus” diferentes” — Pedro Nuno foi garantindo que na agenda política têm entrado “cada vez mais políticas de extrema-direita”. Depois, fez um regresso à campanha das legislativas de março, recuperando uma série de polémicas desse confronto — como se partisse para uma espécie de desforra. “Não me peçam para ignorar dirigentes do CDS que defenderam referendo” ao aborto, disse, ou “o deputado de Santarém [Eduardo Oliveira e Sousa] que fez um discurso negacionista”, ou ainda “o ex-líder do PSD que tratou a imigração de forma muito semelhante à extrema direita e patrocinou um livro com visões sobre a família que são mais próximas da extrema-direita”, atacou, referindo-se a Pedro Passos Coelho. Depois, o mesmo raciocínio aplicado a Ursula Von der Leyen: “Não me peçam para ignorar que a presidente da Comissão também esteve no último ano a cortejar Meloni” e que “altos dirigentes da AD têm tomado posições muito mais próximas do Chega do que do PS”.

Seguir-se ia Pedro Marques, que noutra arruada, já na Guarda, começou logo a disparar: “Com o PS a Europa continua a avançar. Com as forças da direita avança infelizmente em direção à extrema-direita”, disse aos jornalistas e foi repetindo às pessoas que ia cumprimentando. Depois, lançaria uma farpa direta para Sebastião Bugalho: “Alguns dizem que saem da sala se houver discursos extremistas, mas têm é de perceber que os seus líderes europeus estão a convidá-los para a sala” — o candidato da AD tinha dito que “sairia da sala” no Parlamento Europeu se alguém “fizesse uma discriminação étnica”.

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O discurso condiz com a evolução da narrativa que Temido foi trazendo para a campanha — se a candidata começou por definir o Chega como o seu adversário nesta campanha, cedo se percebeu que o alvo dos seus ataques seria, na verdade, quase sempre a AD, mas associando-lhe a tal “contaminação” de ideias vindas do partido de André Ventura ou da sua família política europeia (e dos partidos a quem poderá aliar-se).

Já nesta sexta-feira à noite, e de volta ao Teatro Municipal da Guarda, o ex-secretário de Estado Adjunto de Costa, que no terceiro Governo costista assumiu a pasta dos Assuntos Europeus, Tiago Antunes, desenhou uma espécie de guião para justificar esta associação — ou o “deslizar da direita tradicional para a extrema-direita” — e rebater os argumentos da AD, que diz estar a ser confundida com as posições mais extremas da sua família política. No Teatro Municipal da Guarda, Antunes começou por acusar o PPE de querer “trocar o centro pela extrema-direita” e de estar “desejoso de fazer um acordo com Meloni”.

Depois, explicou o argumentário: por um lado, indo ao programa do PPE, que atacou por defender a “construção de muros” para travar a imigração e a “deportação automática dos requerentes de asilo para países terceiros”. Admitindo que a AD explica que estas medidas não estão inscritas no seu programa, mas antes no do PPE, perguntou ainda assim como é que o PPE tenciona então melhorar o Pacto das Migrações — “são os grupos políticos europeus que negoceiam as leis”.

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Depois, abordou a composição dos Conservadores e Reformistas para acusar a AD de usar “táticas de disfarce” e dizer que o grupo “não é assim tão mau” porque há partidos mais extremistas no grupo do lado, o ID. “Não podemos aceitar nem a extrema-direita nem a direita extrema”, atirou, numa formulação semelhante à que Temido tem usado com frequência — num dos debates televisivos a ex-ministra da Saúde argumentou que “não há uma extrema-direita fofinha e palatável.

E recordou os partidos que fazem parte do primeiro grupo — “o espanhol franquista, o italiano descendente dos fascistas de Mussolini, o francês mais extremista do que Le Pen” — para perguntar se “é com esta gente que a AD se quer entender” e garantir que estes partidos escondem a sua verdadeira agenda, “xenófoba, misógina e homofóbica”. Seria Tiago Antunes o autor do “não passarão!” que se transformaria num grito de guerra na sala de espetáculos da Guarda.

Reservas no PS sobre a estratégia. Bugalho usa Assis como arma

Não é segredo, no entanto, que no passado recente esta estratégia motivou discordâncias até no interior do PS e da própria lista para as europeias — não quando o assunto que estava em cima da mesa era a eleição para Bruxelas, mas para o Parlamento nacional. Foi, aliás, o cabeça de lista da AD, Sebastião Bugalho, quem recordou isso mesmo num comício esta sexta-feira, perguntando se “os portugueses vão votar no PS de Pedro Nuno Santos ou de Francisco Assis [número dois da lista às europeias], no PS que acha que a direita é toda igual ou no que sabe que a democracia foi construída com base na alternância saudável”.

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A questão era levantada porque tem sido o próprio candidato (e ex-eurodeputado) o autor dos avisos mais vocais sobre o perigo desta estratégia. Em entrevista ao Observador, em julho de 2023, Assis alertava que era preciso “ter cuidado” com a colagem da direita à extrema-direita, tática que poderia transformar-se num “mau serviço à democracia”, e chegava mesmo a dizer que seria “um crime tentar identificar o PSD com o Chega”. Os partidos do centro deviam, defendia Assis, “respeitar-se” e ter a capacidade de não perder “a ligação” entre si.

Depois, no congresso que entronizou Pedro Nuno Santos, em janeiro de 2024, Assis insistia em recordar que o PSD é “um grande partido democrático”, garantindo que “não há nenhum risco de o PSD ceder a um discurso de extrema-direita — estar a querer contaminar partidos democráticos com a ideia de que eles próprios já incorporaram vírus antidemocrático é altamente negativo”. E em abril, quando Passos Coelho apareceu na apresentação do livro que Pedro Nuno Santos veio agora recordar, Assis viria pedir “serenidade” e capacidade de distinguir “os verdadeiros inimigos”, frisando que o ex-líder do PSD não é uma pessoa de extrema-direita.

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Na campanha da AD tem-se insistido que a colagem é despropositada, tendo Bugalho garantido, numa entrevista ao Expresso, que a AD tem posições mais “humanas” do que a sua família europeia em matérias como as políticas de imigração. E acrescentou que é injusto associar a AD a governos como o de Giorgia Meloni, como seria injusto associar Marta Temido a governos socialistas como o de Malta, que proíbe o aborto. Há, de resto, uma parte do próprio PS que continua, avaliando o discurso do partido nesta campanha, a ter dúvidas sobre a ideia de “homogeneizar” uma direita que é “heterogénea”, como diz um destacado socialista ao Observador, considerando “um erro” meter extrema-direita e direita tradicional no mesmo saco. “Estamos a colocá-los num bloco”, lamenta a mesma fonte, desejando que se fale mais de temas “concretos” e com “políticas que correspondam às necessidades das pessoas”.

Resta saber se o número dois da lista socialista é da mesma opinião, tendo em conta o discurso que domina a campanha socialista, ou se neste contexto até concorda com ela. Até agora não se sabe, uma vez que Francisco Assis só aparecerá ao lado de Marta Temido — tem tido agenda própria durante toda a primeira semana — este sábado, no Porto, onde terá, se quiser, a oportunidade de responder à campanha da AD. Certo é que os restantes socialistas que passarem pelo palco deverão dar gás à mesma estratégia que o PS vem ensaiando, com cada vez mais força, durante a campanha — dia 9 se verá se com bons frutos.

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