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"O Casal Perfeito", a mais recente mini-série da Netflix, é uma adaptação do livro homónimo de Elin Hilderbrand e tem em Nicole o nome maior, num elenco em que claramente antiguidade não é só posto
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"O Casal Perfeito", a mais recente mini-série da Netflix, é uma adaptação do livro homónimo de Elin Hilderbrand e tem em Nicole o nome maior, num elenco em que claramente antiguidade não é só posto

"O Casal Perfeito", a mais recente mini-série da Netflix, é uma adaptação do livro homónimo de Elin Hilderbrand e tem em Nicole o nome maior, num elenco em que claramente antiguidade não é só posto

“O Casal Perfeito”: ou como o dinheiro não faz televisão nem famílias felizes

Uma das mais populares séries do momento é um cluedo em 6 episódios com quase nada de surpreendente. Mas é também eficaz a mostrar porque é que funciona, no meio de tanto desperdício de meios.

Antes de avançar, devo dizer que sou apreciadora do trabalho de Nicole Kidman. Opinião impopular, bem sei. Não tem um percurso sem mácula, reconheço. E não estou a falar do casamento com o Tom Cruise. Mas Kidman, na minha opinião, está perfeita no meu musical favorito Moulin Rouge, arrebatadora em De Olhos Bem Fechados, arrepiante no thriller Os Outros, angustiante em Big Little Lies, perturbadora no igualmente perturbador O Sacrifício do Cervo Sagrado e mais não digo, senão gasto os caracteres todos com a filmografia da dita e não é para isso que aqui estamos hoje. Serviu este preâmbulo apenas para estabelecer que o que se segue não é fruto de nenhuma embirrância (que está relativamente na moda) com a australiana dos caracóis de fogo que pôs dois hemisférios a salivar nos anos 90.

O Casal Perfeito, a mais recente mini-série da Netflix, é uma adaptação do livro homónimo de Elin Hilderbrand e tem em Nicole o nome maior, num elenco em que claramente antiguidade não é só posto, porque o talento da juventude deixa bastante a desejar em comparação com os veteranos. Mas já lá vamos. A série anuncia-se assim: “Amelia está prestes a casar com um membro de uma das famílias mais abastadas de Nantucket… até que uma morte chocante arruína a boda e todos se tornam suspeitos”. Nada de novo, parece-vos? É da maneira que não podemos acusar a plataforma de publicidade enganosa.

Os Winbury são uma família muito rica, encabeçada por Greer e Tag (Nicole Kidman e Liev Schreiber). Ela é uma bem sucedida escritora, ele é bem sucedido a ser herdeiro. O casal passa uma imagem de perfeição, juntamente com os três filhos rapazes. Os chamados “pobres meninos ricos” a quem nunca nada faltou, a não ser sarna para se coçarem, como diria a minha avó.

[o trailer de “O Casal Perfeito”:]

O filho mais novo passa a série a sair de salas de forma dramática e a bater com portas, como qualquer bom adolescente e é a cara de um jovem Shawn Mendes. O filho mais velho é um desastre em cadeia com adições várias e, para mal dos pecados da sua mulher grávida, nenhum dos seus vícios é a esposa. Esposa essa interpretada por Dakotta Fanning, a pequena da Teia da Carlota. Eu sei, já fez 1000 filmes e já não é uma miúda de totós, mas eu sou velha, deixem-me estar. Dakotta que está vários furos acima do restante elenco da sua geração. E não são muitos e não são poucos. Bastantes.

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O filho do meio, Benji, apaixona-se por uma gata borralheira dos tempos modernos. Amelia, interpretada por Eve Hewson (também conhecida como “a de Bono”), sente-se desajustada naquele meio privilegiado (irónico, não é?). E também está um pouco na dúvida se Benji será a tampa para o seu tacho, até porque o noivo tem o sex appeal de uma macieira com moléstia. Já o padrinho e melhor amigo do noivo, Shooter, é o eye candy da série, portanto noves-fora-nada, estão a ver, está visto. Até o nome denuncia: preferiam dar swipe right num Benji, que faz lembrar um desenho animado japonês que demorava três episódios a marcar um golo, ou num Shooter, que tem nome de quem faz parte do elenco do Magic Mike? E, spolier alert, tem os abdominais a condizer.

A trama começa nas vésperas do casamento . Todos muito lindos, tudo a fazer pendant, não há ninguém com problemas de retenção de líquidos, a cara da riqueza. Com exceção dos pais da noiva, que são pobrezinhos, têm comportamento de pobrezinhos e falam como pobrezinhos, não fosse alguém ainda não ter percebido que Amelia e Benji “são de classes sociais e mundos diferentes” (bocejo).

Esta série tem um núcleo de personagens centrais, mais ou menos bem conseguidas, por atores com mais ou menos talento. E depois tem um conjunto de bonecos

Mas voltemos ao cenário da festa: uma casa que é um sonho, uns drones de encher a vista, champagne, caviar, ostras, pares de cornos variados e uma morte. Os Winbury são gente que sabe receber. Em menos de nada está estabelecida a premissa. Esta gente não é tão feliz quanto parece (alguém é?), a sanidade mental não abunda (ver parênteses anterior) e nem sequer gostam assim tanto uns dos outros, apesar dos laços familiares e/ou promessas de amor (idem idem, aspas aspas). São 6 episódios de um cluedo que tem pouquíssimo de surpreendente e relativamente fácil de deslindar, sem que para isso seja preciso ter uma inteligência acima da média. Ponham os olhos em mim que percebi quem era o culpado relativamente cedo e ontem paguei 2,70€ por uma garrafa de água na Bertrand do Chiado. Poucas vezes me senti tão estúpida na vida. Mas se calhar derivei um pouco do tema. Ou será que não?

Não vou avançar muito mais na descrição da trama, porque não quero fazer spoilers ou dar pistas, até porque se tirarmos essa parte de espectador-detetive da equação, fica muito, muito pouquinho. Porque — correndo o risco de me repetir — a narrativa não tem absolutamente nada de novo, a realização é o chamado “é o que é” e as interpretações não são todas péssimas, mas há para ali banalidade com fartura.

Os atores mais velhos dão dez zero aos mais novos. O desempenho da Nicole, a princípio, fez-me lembrar a Luísa de Alexandra Lencastre de Ninguém como Tu, mais popularmente chamada por “Quem matou o António”. Sim, estou a comparar uma série da Netflix com uma novela da TVI, do início dos anos 2000. Processem-me! Com o avançar da história, parece que Nicole vai ganhando amor à Greer e dá-lhe mais substância do que “a matriarca controladora que odeia pobres”. Mas não contes com o Globo de Ouro, linda!

Esta história, que eu diria com alguma confiança, que não vai ficar para a história e não vem acrescentar ponta de chavelho ao panorama audiovisual, tem um orçamento que dava para contar resmas delas que estão a ganhar mancha de humidade em gavetas de armários do IKEA em tê-zeros e tê-uns por esse mundo afora, mas…. "It is what it is".

A personagem de Liev Schreiber, o marido, não faz a ponta de um corno, passa o dia com um copo numa mão e um charro na outra. Há vidas piores, diriam. Um bom tio bêbado é sempre divertido, como ser humano não vale nadinha e Liev vai muito bem nisso. Outra menção honrosa para a personagem da detective Nikky, o reforço que vem de fora, chega à pequena cidade e tenta impor-se à bruta, é rejeitada pelos colegas e depois ficam os melhores amigos. Inovador, não é? Mas Donna Lynne Champlin faz uma personagem com alguma estranheza, sarcasmo e zonas cinzentas. O que é incrivelmente refrescante neste mar de estereótipos. E isso é o que mais me chateia nesta série. Preparem-se, agora é que é, vem aí raivinha e ranger de dentes.

Esta série tem um núcleo de personagens centrais, mais ou menos bem conseguidas, por atores com mais ou menos talento. E depois tem um conjunto de bonecos, que não lhes consigo chamar outra coisa, a planar à volta. Caricaturas que contrastam de forma berrante no tom, cheias de tiques e maneirismos. Não sei se é suposto funcionar como comic relief, mas a mim não me aliviou nada, deu-me só uma profunda camada de nervos.

A narrativa não tem absolutamente nada de novo, a realização é o chamado “é o que é” e as interpretações não são todas péssimas, mas há para ali banalidade com fartura

A empregada de leste que quer comer o patrão e acha todas as mulheres que o rodeiam umas megeras inúteis e devassas. O assistente da Greer que é uma gay viperina. Fim, só isto. A inenarrável personagem da Isabelle Adjani que me magoou a vários níveis, especialmente porque vi a Rainha Margot demasiadas vezes. Uma francesa de meia-idade, que diz coisas em francês e depois pede ajuda para ser traduzida, com um sotaque impossivelmente forçado, que devia causar um incidente diplomático. Promíscua, comeu toda a gente na sala e não tem nenhum tabu com diferença de idades no leito, claro. Juro que mais estereotipada, só se andasse com uma baguette debaixo do braço. E a minha última pergunta, que não posso calar: porque raio Suzanne Bier, uma realizadora que ganhou o Óscar de Melhor Filme Estrangeiro com Num Mundo Melhor, que é um belo de um filme, que realizou o The Night Manager, que é uma bela de uma série, se presta a isto?

“Então, mamaste 6 episódios de um dia para o outro e não tens nadinha de bom para dizer?” Arranja-se qualquer coisinha. É divertido tentar descobrir quem-matou-quem, claro. Especialmente, se o fizerem em conjunto com o vosso cônjuge e acabarem a série a dizer em tom relativamente alto ”Chupa! Eu não disse? Quem é a maior?”, enquanto fazem um pequeno twerk ao lado do aparelho televisivo. Isto pode ou não ser baseado em factos verídicos.

Pouco mais tenho a dizer. É curto, entretém minimamente e não se vê com grande enfado (isto podia ser a descrição de um date sofrível). Mas sinto que o verdadeiro prazer que se retira daqui é mais profundo. Ou então sou só eu. Gostamos de ver gente rica e privilegiada a marrar com os cornos contra a parede. Os que olham de cima para baixo e se julgam melhores que os demais em processo de “crash and burn”. É bom entretenimento ver uma mansão de luxo a ganhar salitre, o papel de parede com bolhas de ar e a descolar nas pontas, a racha a estalar o estuque. Um apelo que já foi usado centenas de vezes com sucesso junto das audiências. Vaticinar aquele “O dinheiro não compra tudo”. Será? É que esta história, que eu diria com alguma confiança, que não vai ficar para a história e não vem acrescentar ponta de chavelho ao panorama audiovisual, tem um orçamento que dava para contar resmas delas que estão a ganhar mancha de humidade em gavetas de armários do IKEA em tê-zeros e tê-uns por esse mundo afora, mas…. It is what it is.

Ah, ia-me esquecendo: o fim é péssimo.

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