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A história passa-se nos anos 30 e divide-se em duas partes e dois cenários muito diferentes. O primeiro é um circo itinerante, onde Stanton Carlisle (Bradley Cooper) se vê acolhido por uma vidente, Zeena (Toni Collette) e o marido, Pete (David Strathaim)
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A história passa-se nos anos 30 e divide-se em duas partes e dois cenários muito diferentes. O primeiro é um circo itinerante, onde Stanton Carlisle (Bradley Cooper) se vê acolhido por uma vidente, Zeena (Toni Collette) e o marido, Pete (David Strathaim)

Kerry Hayes

A história passa-se nos anos 30 e divide-se em duas partes e dois cenários muito diferentes. O primeiro é um circo itinerante, onde Stanton Carlisle (Bradley Cooper) se vê acolhido por uma vidente, Zeena (Toni Collette) e o marido, Pete (David Strathaim)

Kerry Hayes

O portfólio da mãe modista e um livro comprado nas Amoreiras. Como Luís Sequeira criou o guarda-roupa de “Nightmare Alley"

O novo filme de Guillermo del Toro acaba de estrear-se na salas portuguesas. O realizador voltou a colaborar com o luso-canadiano nomeado para um Óscar com “A Forma da Água”.

Num dia brincava entre tecidos e botões a ver a mãe costurar, no outro estava nomeado para um Óscar pelo seu trabalho em “A Forma da Água” — realizado por Guillermo del Toro, foi considerado o melhor filme de 2018. Antes de chegar a Hollywood, a história de Luís Sequeira escreve-se no Canadá, onde nasceu e cresceu. Porém, as suas raízes estão em Lisboa, onde a mãe, portuguesa, teve um atelier de costura nas décadas de 40 e 50. O portfólio materno serve muitas vezes de inspiração para o figurinista que tem no currículo “It Capítulo 2” (2019) ou “Mamã” (2013) e voltou a fazer parte da pesquisa para “Nightmare Alley — Beco das Almas Perdidas”, uma nova colaboração com del Toro que ocupa as salas de cinema a partir desta quinta-feira, 27 de janeiro.

Apesar de o livro com o mesmo nome, de William Lindsay Gresham, ter dado origem a um filme de 1947, este projeto não é um remake e o luso-canadiano não usou a anterior versão como referência. A história passa-se nos anos 30 e divide-se em duas partes e dois cenários muito diferentes. O primeiro é um circo itinerante, onde Stanton Carlisle (Bradley Cooper) se vê acolhido por uma vidente, Zeena (Toni Collette) e o marido, Pete (David Strathaim). Inteligente, absorve tudo o que pode (muitas vezes de forma duvidosa) e na década seguinte é um sucesso entre a elite poderosa e rica de Nova Iorque, onde faz um número de mentalista com Molly (Rooney Mara), que abandonou a feira para ir com ele. Surge então uma psiquiatra misteriosa, Lilith (Cate Blanchett), que pode ser ainda mais perigosa do que Stanton.

Luís Sequeira © ANDRÉ CARRILHO/OBSERVADOR

O guarda-roupa destas personagens foi quase todo criado de raiz, isto porque Luís Sequeira sabia que era impensável usar peças vintage em cenas com chuva, por exemplo. “Iam desintegrar-se”. As roupas dos figurantes foram alugadas na Europa, já que foi impossível encontrar o que era preciso na América do Norte. Estava tudo destinado a outros filmes. No entanto, a peça fundamental para o guarda-roupa estava em casa do figurinista desde o final dos anos 80: três volumes sobre moda masculina dos anos 30 comprados nas Amoreiras, em Lisboa.

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A partir do Canadá, o responsável pelo guarda-roupa de “Nightmare Alley — Beco das Almas Perdidas” contou esta e outras histórias ao Observador, explicou a importância da cor vermelha nos visuais e revelou o que guardou do projeto.

Vamos começar pelo início do projeto, que para si foi em 2018. As coisas avançaram muito rápido apesar de depois terem sido travadas devido à pandemia, certo?
Sim, começamos a falar em 2018 e no início de 2019 estava a trabalhar num filme na Austrália quando recebi a chamada a dizer que este projeto ia avançar. Originalmente íamos filmar dali a 15 semanas. Ainda tinha um par de semanas na Austrália e tive de me meter num avião, vir para Toronto durante alguns dias e depois voar de imediato para a Europa para começar a recolher peças de roupa. Tive uma reunião rápida com o Guillermo sobre o look geral e com isso avancei e comecei a reunir tecidos e peças de lojas de aluguer na Europa e também a fazer pesquisa fotográfica.

Essa pesquisa levou-o também até às memórias da sua família? Estou a falar especificamente do lado português, já que a sua mãe era modista.
Sim, claro. A minha mãe era designer de vestidos de noiva em Lisboa e tinha o portfólio dela, digamos assim. Tinha também fotos antigas mas sendo na Europa [o que se usava] era um pouco diferente da América do Norte.

Cria as peças mas também compra muitos acessórios em feiras e lojas vintage. Consegue escolher um desses adereços que seja especial por algum motivo?
Nas feiras da ladra arranjam-se sobretudo os acessórios, botões, carteiras, chapéus. A maioria das roupas foram feitas para o filme. Uma das peças que adorei era da Cate Blanchett. Agora chamo-lhe vestido sombra, porque a vemos nas sombras na primeira vez que ela aparece no Copa. Era um tecido de veludo que tinha umas franjas entrançadas douradas. Na minha opinião era esplêndido, foi lindíssimo de fazer e foi incrível vê-lo nela. Antes de ir para o set, ela virou-se para mim e disse: “Senhor Sequeira, isto é um lindo vestido”. O que foi um selo de aprovação. Foi ótimo trabalhar com ela, como foi com a Toni Collette, a Rooney Mara e o resto do elenco, mas lembro-me de esse ser um bom momento de congratulação, um comentário vindo de uma das estrelas.

Cate Blanchett, Rooney Mara, Toni Collette, Willem Dafoe e Richard Jenkins juntam-se ao elenco deste thriller neo noir

Queria perguntar-lhe sobre a cor vermelha, que está sempre presente no filme, seja nas roupas da personagem da Rooney Mara, seja em detalhes mais subtis, como nas gravatas do Bradley Cooper mais à frente na história. Qual é a importância desta cor?
O vermelho é um detalhe muito específico que o Guillermo gosta de usar nos filmes dele, representa a verdade e uma passagem. A Rooney Mara é a base da verdade ao longo do filme. Nas áreas da feira itinerante ela usa mais um vermelho bordeaux e depois na cidade vemos o vermelho brilhante. No Bradley não usamos bem o vermelho, é mais um carmesim, isso remete para a feira, que tinha esses tons. Portanto, apesar de ele estar vestido com fatos caros e monocromáticos, há pequenos detalhes que nos transmitem um pouco da sua história. Na essência ele teria queimado todas as suas roupas antigas, mas a sua estética continuou muito presente quando se mudou para a cidade.

Quando começa a imaginar o guarda-roupa de uma personagem, qual é o ponto de partida?
Quando me reuni com o Guillermo falámos um pouco de cada. O Guillermo também gosta de escrever biografias sobre as personagens, de onde vêm, e isso ajuda muito para começarmos a invocar as roupas de uma personagem. A partir daí começa a formar-se o imaginário e eu agrupo coisas em painéis de inspiração. Isso solidifica a direção para onde vamos, não apenas para o Guillermo e para mim, mas também para os meus compradores, os cortadores, para as pessoas que envelhecem [as roupas]. Quando falamos com o elenco, envio os painéis de inspiração para que saibam para onde vamos. Nesta era do Zoom e de chamadas virtuais, numerei as fotos todas e dizia “reparem na número três, número nove” e por aí fora. Funciona bem ao termos logo um diálogo antes de sequer nos juntarmos num provador.

Onde fizeram as compras para este filme?
Tive a sorte de poder ir à Europa alugar muitas das roupas dos figurantes. Na América do Norte estava tudo esgotado basicamente, foi muito popular nesse ano filmar aquele período específico. Tive de procurar noutros sítios, em Roma, Madrid, Reino Unido. Comecei a comprar tecidos que achei que seriam bons para o filme e a amontoar uma espécie de biblioteca de tecidos, fitas e noções. Há um local em Madrid que está em funcionamento desde, creio eu, 1820 e é incrível. Tem um milhão de tipos de botões e acessórios que até podemos encontrar na América do Norte mas dá trabalho. Aqui está tudo no mesmo local. Numa manhã gastámos milhares de dólares em pequenas coisas que dão os toques finais às roupas.

Bradley Cooper é "Stanton Carlisle"

KERRY HAYES

Alugou muitas coisas na Europa?
Alugamos para os figurantes. Para o elenco fizemos 90% de raiz. No ambiente da feira, embora fosse roupa antiga, tínhamos cenas com chuva e eu não conseguia sequer imaginar roupa alugada que fosse antiga. Ia desintegrar-se. Portanto, criámos as peças todas e envelhecemo-las para parecerem bastante usadas. Na cidade tínhamos alta-costura e não íamos encontrar alta-costura com 80 anos super bem preservada, por isso criámos. Nunca encontramos exatamente o que queremos na cor certa, no tamanho certo. Pode acontecer mas é um milagre.

Novo ou antigo? Há algum que ocupe mais espaço nos seus projetos?
Adoro os acessórios antigos, os detalhes que se perderam. Às vezes compro roupa antiga só pelos detalhes. Por exemplo, pode haver qualquer coisa numa blusa que quero duplicar de forma diferente. Acho que ambos têm espaço. Eu venho da moda, por isso construir é como uma segunda natureza para mim. Sinto-me muito confortável a ver pano e a imaginar aquilo em que vai tornar-se, a trabalhar com os cortadores e os alfaiates e a dar vida a essas coisas.

É um comprador compulsivo? Compra coisas a achar que um dia podem vir a ser úteis e se calhar nunca usa?
Às vezes, faço isso sobretudo com pesquisa e livros. Comprei um livro em Lisboa, nas Amoreiras, no final dos anos 80 e foi muito dinheiro, o equivalente a 200 euros. Era só sobre a moda masculina dos anos 30. Na altura não tinha um filme dos anos 30 para fazer mas era uma referência incrível com três volumes e comprei-o. Acabou por ser primordial para este projeto porque tinha os fatos, os casacos, as camisas, as gravatas. Portanto, sim, sou um pouco acumulador.

O que guardou para si deste projeto?
Tenho a pesquisa e no fim do filme comprei muitos dos acessórios, porque para mim os acessórios são o que finaliza um look. Tenho mais de cinco mil gravatas mas há sempre espaço para mais uma.

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