Os vencedores

Luís Montenegro

Tem, aparentemente, o Orçamento do Estado no bolso. E, com isso, ganhou dois anos e meio no poder. Nada mau para quem, há dois anos, no seu primeiro Congresso como líder do PSD, apareceu no Porto com a perspetiva de ter uma longa travessia no deserto da oposição e estava votado, muito provavelmente, à fatalidade de ser um líder de transição. Com um partido completamente controlado — o poder é um afrodisíaco importante —, apresentou-se em Braga para fazer essencialmente um balanço dos últimos sete meses. No discurso de encerramento, elencou sete grandes medidas e prioridades do Governo, continuando a tentar prolongar a mancha de influência da Aliança Democrática junto dos vários segmentos do eleitorado – medidas para a segurança e imigração, mas também novas propostas para o Ambiente, para a Habitação, para os mais velhos e para as crianças. A partir de agora, começa um novo ciclo político e acabaram-se as desculpas em torno da dramatização e dos bloqueios da oposição. Agora é mesmo a valer – Montenegro será julgado pelo que fizer e não fizer ao longo dos próximos anos.

Sebastião Bugalho

Contrariamente ao que o independente Sebastião tinha dito nos últimos meses, o “companheiro” Bugalho aceitou filiar-se no PSD. Bastou um convite de Montenegro para o porta-voz do PSD em Bruxelas personificar um êxito de Dengaz: “Eu queria dizer que não, mas não consigo”. Bugalho disse “sim” e teve evidentes ganhos políticos com isso. Agora é militante, subiu ao palco e teve um dos discursos mais aplaudidos do Congresso. E de pé. Ainda agora chegou e já é uma das figuras do partido, aproveitando a agilidade do seu pensamento político e a notoriedade que adquiriu na televisão para a sua afirmação política. Foi elogiado por notáveis (Castro Almeida e Carlos Moedas) e é uma estrela de uma geração – os jovens sociais-democratas. Se um dia quiser ser primeiro-ministro, o que não enjeita, ter cartão de militante é passo importante. Também aí, Bugalho, que aos 28 anos já foi cabeça de lista de uma eleição nacional, pode fazer “check”.

Pedro Santana Lopes

A “alma” dos Congressos do PSD tinha saído do partido, mas o bom filho à casa torna e não podia ser melhor recebido. Santana Lopes queria ir para as bancadas, como um simples observador, mas o partido sentou-o na primeira fila, com honras de ex-líder que nunca saiu. A somar a isso, Hugo Soares diria já este domingo: “Esta é a casa dele”. A vontade do regresso é mútua entre a direção de Montenegro e Santana, sendo uma questão de tempo até o ex-primeiro-ministro subir ao palco de um Congresso para receber o cartão da sua refiliação. O secretário-geral disse ainda que faz todo o sentido o PSD apoiar uma recandidatura de Santana Lopes à Figueira da Foz, indo mais longe nessa sugestão do que foi com qualquer outra autarquia. Santana ainda não fechou a 100% a questão presidencial, mas parece mais focado na Figueira. E, nesse particular, tem o apoio do PSD, o que lhe pode permitir vencer, tranquilamente, com maioria absoluta aquele município.

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Leonor Beleza

Luís Montenegro gosta de reservar uma grande surpresa para cada Congresso. Desta vez, essa surpresa foi o nome de Leonor Beleza, que deixou a reforma política para se tornar a primeira vice-presidente do partido. Depois de uma falsa partida, com Hugo Soares a lançar o nome de Beleza como potencial candidata ao palácio de Belém e com a presidente da Fundação Champalimaud a recusar sequer “ponderar” essa hipótese, dá-se agora o regresso. É, obviamente, aquilo a que em política se chama “um nome forte” — dentro do partido, que a aclamou, e fora também. Mas ser “um nome forte” não chega. Nas primeiras declarações depois do anúncio, Leonor Beleza pareceu não ter ainda uma ideia clara de qual vai ser o seu papel daqui para a frente. Em breve, vamos ter de perceber se Luís Montenegro pretende que a sua nova vice seja apenas um troféu ornamental ou uma efetiva conselheira diária para o combate partidário.

Hugo Soares

Dono e senhor do aparelho social-democrata, vê o seu poder no partido reforçado depois deste Congresso. Os demais pesos-pesados do PSD deixaram a direção mais restrita e passaram a ser vogais da direção alargada. No momento de anunciar que iria propor a recondução de Hugo Soares como secretário-geral do PSD, Montenegro não conseguiu esconder o sorriso de satisfação. Quando foi apresentado pela speaker ao congresso, no domingo, foi o mais aplaudido, além de Leonor Beleza e Luís Montenegro, naturalmente. O sucesso ou não do próximo ciclo autárquico também depende dele e das pessoas que conseguir convencer para determinados desafios – mas a confiança plena de Montenegro, essa, ninguém lhe tira.

Carlos Moedas

O presidente da Câmara de Lisboa não quis anunciar a recandidatura a presidente da Câmara de Lisboa, mas também não era preciso: com ou sem anúncio, comportou-se sempre como recandidato a presidente da Câmara de Lisboa. No discurso de sábado, apresentou-se como o grande alvo, a grande vítima, o grande perseguido pelo Partido Socialista. Na manhã de domingo, em entrevista à Rádio Observador, aumentou o tom, dizendo que “o PS faz ataques ao caráter das pessoas” (sendo que “as pessoas” é ele). Um dos objetivos deste Congresso era, precisamente, fazer o partido acordar para as eleições autárquicas — e isso deu espaço e embalo para o discurso de Carlos Moedas, que aproveitou para carregar no acelerador da campanha. Ao contrário do que aconteceu nos últimos congressos, não conseguiu levantar os delegados da cadeira. Mas, mesmo assim, esteve no top 5 dos mais aplaudidos. E, no discurso final de Luís Montenegro, recebeu um presente adicional: o anúncio de um grande projeto de reabilitação da Área Metropolitana de Lisboa. Para quem quer conquistar uma maioria na câmara, dificilmente poderia ser melhor.

Os vencidos

Luís Marques Mendes

O mais difícil já estava feito: ter um grande empurrão do líder do partido para Belém. Mas Marques Mendes decidiu ir fazer uma espécie de rodagem presidencial a Braga, não para falar, mas para ser visto. A curta visita esteve, no entanto, longe de ser um momento marcante. Embora aplaudido, foi uma entrada morna para quem até tinha motivado um grande entusiasmo no Congresso em 2022. Como se não bastasse, ainda teve de partilhar a popularidade de corredores com um antigo líder carismático, Pedro Santana Lopes. Mais do que isso: Luís Montenegro não voltou a dizer o nome dele e nas três vezes que discursou não falou uma única vez de presidenciais. Mendes disse que foi ao Congresso por uma razão política e por uma razão afetiva, mas, no fim do dia, não teve nenhum ganho político evidente e o afeto que recebeu de volta foi, no mínimo, pouco entusiasmante. Comparar a presença inócua de Mendes em 2024 com a fervorosa de Marcelo em 2014 também não abona nada a favor do atual comentador.

Miguel Pinto Luz

Em 2020, foi candidato à liderança do partido como clara e assumida forma de se posicionar para voos futuros. Em 2021, esteve ao lado de Paulo Rangel na luta contra Rui Rio, e perdeu. Quando chegou a líder, Montenegro escolheu-o para vice, num esforço de união do partido. Mais tarde, fez dele ministro com as importantes pastas da Habitação e das Infraestruturas – que, olhando para os oito anos de poder socialista, se revelou um verdadeiro presente envenenado. Agora, deixa de ser ‘vice’ do PSD e passa a vogal da direção alargada. Não faz sequer parte do esquadrão de combate (Rangel, Leitão Amaro, Castro Almeida, Pedro Duarte, Hugo Soares) que defendem a honra do Governo sempre que se impõe. Perdeu a oportunidade de ser presidente da Câmara Municipal de Cascais, ambição que nunca escondeu. A avaliação dos méritos do seu percurso como ministro só poderá ser feita mais à frente. Mas a sua ligação ao partido e ao combate político vai-se esbatendo.

Os ignorados

Pedro Nuno Santos

O plano inicial de Pedro Nuno Santos era revelar o sentido de voto do PS no Orçamento apenas depois do congresso do PSD. Mas, de forma inesperada, mudou de ideias no final da semana e acabou por falar ao país na quinta-feira à noite. Ao anunciar que viabilizaria o Orçamento, libertou toda a pressão que comprimia o PSD e permitiu que o partido se concentrasse noutras coisas. Apesar de tudo, neste fim de semana o PSD optou pela prudência: criticou o PS, mas poupou Pedro Nuno Santos, para não correr o risco de cutucar a onça. Em anteriores congressos do PSD, Pedro Nuno Santos aparecia como o “radical” e o “extremista”; desta vez, foi como se não existisse.

André Ventura

André Ventura precisa que falem dele, André Ventura vive para falarem dele, André Ventura faz de tudo para falarem dele — mas, no congresso do PSD, quase ninguém falou dele. Não é que não se tenha esforçado. Nos últimos dias, o líder do Chega levou ao extremo a oposição ao PSD, anunciando um voto contra o Orçamento e, mais do que isso, acusando Luís Montenegro de estar a montar uma terrível cabala política que pretendia enganar o povo português e levar, de forma oculta, o Chega para o governo. Neste congresso, o PSD não cortou definitivamente com o Chega, porque nunca se sabe de que votos pode precisar amanhã, mas as poucas referências que existiram mostraram que algo mudou. Em entrevista ao Observador, o ministro dos Assuntos Parlamentares, Pedro Duarte, sublinhou as cautelas futuras: “Temos tido contactos institucionais e não vamos reduzir esse esforço. Distinto é o primeiro-ministro ter reuniões reservadas, o que sempre aconteceu na história da democracia. É evidente que um pressuposto é um mínimo de confiança entre as pessoas. Parece-me óbvio que, não tendo capacidade para ter confiança, as reuniões têm de decorrer de uma forma distinta.” Tirando isto, como acontece com o proverbial elefante na sala, o PSD fez de conta que o Chega não existe, ao mesmo tempo que, no discurso final, Luís Montenegro anunciava medidas em áreas que preocupam os eleitores do Chega. Para André Ventura, isto é o mesmo que cortarem-lhe o oxigénio.