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Aos 60 anos, Rui Rio deverá ser um dos mais velhos candidatos à liderança do PSD, depois de Manuela Ferreira Leite ter chegado à presidência do partido com 68 anos de idade, em 2008. O ex-presidente da câmara do Porto, que será a figura principal desta semana se concretizar a sua anunciada candidatura na próxima quarta-feira, em Aveiro, é um tímido germânico, organizado e meticuloso, desconfiado e frugal, que não aprecia eventos sociais, detesta o improviso mas que odeia ainda mais fugas para a comunicação social (pela qual também não morre de amores).
O homem que passou 12 anos à frente da Câmara Municipal do Porto, que estudou no Colégio Alemão e que podia falar com Angela Merkel sem tradutor, gosta de corridas de carros e de passar férias sossegado com a família na sua casa em Viana do Castelo. Trabalhava agora numa consultora de recursos humanos até decidir regressar ao primeiro plano para tentar suceder a Pedro Passos Coelho — que conheceu na JSD quando este era apenas um miúdo. Há cerca de uma década, quando a filha fez anos, levou-a a um supermercado para a menina escolher um brinquedo. Ficou espantado: custava 50 euros. Não gosta de gastar dinheiro. Também não gosta de Luís Filipe Menezes, e todo esse ódio com implicações políticas começou com uma traição — que já contamos. Cavaco Silva não foi a primeira escolha do seu grupo na Figueira da Foz. Ele também não foi a primeira escolha de Marcelo Rebelo de Sousa para secretário-geral do partido, em 1996. Impôs-se a nível nacional a partir do Porto. Tem opiniões pouco consensuais e polémicas. E foi recuando nos avanços anunciados até ser inevitável avançar mesmo.
Jovem balsemista do grupo que não estava com Cavaco na Figueira
Foi uma criança marcada. E isso terá transparecido em certas decisões políticas — como a de não concorrer à liderança do PSD em 2008 — sobretudo depois de ter sido pai tardio de uma filha. Perdeu um irmão de sete anos, quando tinha apenas cinco. Foi filho único desde então, numa família marcada por essa tragédia. E teve os pais separados a partir da adolescência, nas vésperas do 25 de abril (que terá sido o dia mais feliz da sua vida). Entrou para a JSD, por via da influência ideológica do Partido Social Democrata alemão (SPD), segundo Carlos Mota Cardoso, que escreveu a sua biografia “Rui Rio – Raízes de Aço” (Editora Verso da História). Chegou a ser presidente da Associação de Estudantes das Faculdade de Economia do Porto no início dos anos 80.
Nessa fase final da Aliança Democrática (AD), depois da morte de Sá Carneiro, Rui Rio era um bom jogador de bilhar, quando ainda havia um trio que funcionava na carambola política da JSD portuense: José Pedro Aguiar-Branco, Rui Rio e Luís Filipe Menezes faziam parte do chamado grupo dos “críticos”, que, como o nome indicava, criticava. O alvo era Brochado Coelho, o barão social-democrata que liderava o PSD no Porto. Estes eram jovens “balsemistas” que não vacilavam no seu apoio a Francisco Pinto Balsemão, então primeiro-ministro (até 1983), ao contrário do grupo de “críticos” liderado por Pedro Santana Lopes e Helena Roseta que, aliados a Cavaco Silva, eram na mesma altura os “críticos anti-balsemistas” ou o “grupo de Lisboa”. Os rapazes portuenses eram tão balsemistas, que durante anos correu que Pinto Balsemão tinha sido padrinho de casamento de Menezes — mas não er verdade. Aguiar-Branco manteve sempre uma relação com as empresas do fundador do Expresso e da SIC.
Um ódio que moveu montanhas. A última traição de Menezes
Rui Rio detestava tanto Luís Filipe Menezes (e vice-versa) que o ódio entre os dois homens do mesmo partido culminou com o primeiro a fazer tudo para impedir o segundo de lhe suceder na câmara do Porto em 2013. Rio passou tropas suas na autarquia para o lado de um independente chamado Rui Moreira, que então não se sabia se tinha quaisquer hipóteses de sucesso. O objetivo era tirar votos a Menezes, até então presidente da câmara de Gaia, que cumpria um sonho de tentar passar para a liderança da segunda maior cidade do país. Até à noite eleitoral era o favorito. Mas o seu ex-amigo e inimigo político conseguiu estragar-lhe tudo: Rui Moreira ganhou com o apoio de Rio, e Menezes viu-se remetido para um humilhante terceiro lugar com 21%. “Um homem define-se também pelos inimigos que cria”, escreveu o seu biógrafo.
Apesar de todas as guerras futuras, os dois homens tinham sido amigos até 1991. Menezes era secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares de Cavaco Silva e Rui Rio era deputado quando fizeram um acordo que viria a culminar na traição definitiva e separação de águas definitiva. Fernando Nogueira, ministro da Defesa — e braço direito de Cavaco Silva para o aparelho do partido –, estava a tentar que houvesse uma lista de unidade para a distrital do Porto. Numa manhã, em Lisboa, Rio e Menezes prepararam uma lista no Parlamento para um consenso na estrutura do partido no Porto: Menezes liderava a distrital, Rio seria o vice-presidente e Aguiar-Branco era para ser o vice-presidente da Mesa da Assembleia Distrital. No entanto, no caminho entre Lisboa e o Porto por alguma razão Menezes mudou de ideias e entregou listas diferentes: nem constava Rio nem Aguiar-Branco (que até já tinha marcado uma declaração para as televisões). Foi uma “traição”, acusaram. E apelaram a Cavaco, colocando o comportamento do secretário de Estado no plano ético. Na assembleia distrital que se seguiu, as críticas choveram e Menezes chorou. Mas a amizade acabou.
O homem do aparelho de Marcelo que o aparelho detestava
A passagem de Rio Rio pela secretaria-geral do PSD, durante a liderança de Marcelo Rebelo de Sousa, com a responsabilidade pela máquina do partido e pelo processo de refiliação dos militantes garantiu-lhe pelo menos três coisas: notoriedade nacional, ódios profundos no aparelho do PSD e uma zanga com Marcelo que separou os dois homens e os tornou para sempre desconfiados e reservados em relação ao outro.
O cargo que o tornaria famoso — de quantos ex-secretários gerais do PSD é que consegue lembrar-se de cor? — foi-lhe parar às mãos por ironia do destino. Rui Rio seria uma escolha secundária de Marcelo no congresso de 1996 em Santa Maria da Feira. Mal se conheciam. Marcelo tentou Manuela Ferreira Leite, que recusou o cargo. Depois foi o próprio Marcelo a recusar dar a secretaria-geral a Luís Filipe Menezes que se auto-propôs — o que daria mais um psicodrama. Mas seria Abílio Costa, um amigo muito próximo do próprio Menezes, a levar a Rebelo de Sousa o nome Rui Rio. Fundamental para o atual Presidente da República era ter ali um executivo com um perfil que não fosse demasiado político.
Nessa época de ressaca do cavaquismo, o novo secretário-geral do partido tinha como missão abrir um processo de refiliação e revisão estatutária que tinha como objetivo acabar com os sacos de votos, militantes mortos ou inventados e outros truques dos caciques locais — o que implicava uma redução brutal do número de militantes, a maior parte dos quais fictícios ou adormecidos. A maior guerra de Rio seria com quem? Exato, com Luís Filipe Menezes. Ou com Valentim Loureiro. Marcelo ia defendendo o seu homem que mandava na máquina dos ataques da própria máquina, mas isso não havia de durar para sempre.
Marcelo Rebelo de Sousa achava Rio demasiado rígido, autoritário e inflexível. Rio achava Marcelo demasiado disperso, hiperdecisório, mas sobretudo pouco confiável e passava a vida a cruzar informação com José Luís Arnaut — que acompanhava sempre o líder — para ter a certeza que os dois tinham as mesmas instruções. Rui Rio, nessa época ainda solteiro, trabalhava tanto que Marcelo lhe recomendava tomar vitaminas, e fazia tantos estragos que comprava guerras com meio partido, como a ideia de tentar colocar um relógio de ponto para controlar as entradas dos funcionários da São Caetano. Com as estruturas, num esforço de transparência, deixou os caciques à beira de um ataque de nervos quando enviou uma carta aos presidentes dos conselhos de administração dos bancos a solicitar o envio de todas as contas abertas em nome do PSD e respetivos saldos.
Antes das autárquicas de 1997, quando precisava de tréguas com o aparelho e usava os banhos de multidão proporcionados por Menezes ou Valentim, Marcelo começou a perder a paciência com Rio. Um dos focos de tensão era o facto de tardarem a ser libertadas as verbas para as campanhas no terreno avançarem.
As autárquicas ditariam a demissão de Rui Rio. Uma coligação com o CDS na cidade do Porto — muito criticada por Rui Rio e José Pedro Aguiar-Branco — levou Marcelo a devolver-lhes as críticas num Conselho Nacional. Rio não gostou de ver uma notícia no Expresso a referir que o líder do partido o tinha criticado nestes termos: “Em política, não incomoda quem quer, incomoda quem pode”. E agiu.
Incomodado, Rio achou-se vítima de uma intriga e mandou um fax a Rebelo de Sousa que estava de férias no Algarve a pedir-lhe que desmentisse o conteúdo da notícia. Marcelo respondeu que não podia desmentir todas as notícias e ele é que tinha de justificar se apoiava ou não as decisões da direção. Poucos dias depois, Rio escrevia uma carta ao Presidente do PSD a demitir-se com queixas sobre o clima de intriga. Marcelo apenas comentou que a vida continuava e que “a única coisa que permanece entre congressos é a liderança”. Na semana seguinte, Pacheco Pereira escrevia na sua coluna do Diário de Notícias a defender Rio e a atacar Marcelo.
Moral da história: Rio e Marcelo não são apaixonados um pelo outro e o aparelho que se lembra do seu consulado não ama o ex-secretário-geral. Mas o contrário também é verdade. Numa entrevista à Sábado, em 2005, Rio admitia que havia chapeladas eleitorais no PSD. “O que é um militante a pagar as quotas por não sei quantos? Ou um militante que entrou no dia tal e muda-se a data para ter direito a voto? A organização do partido e dos ficheiros não tem eficácia para ter diretas nacionais”. Era contra as diretas a que agora se candidatará.
Uma dúzia de anos de poder na câmara e as polémicas no Porto
Rui Rio foi imposto por Durão Barroso — então líder do PSD — como candidato à presidência da câmara do Porto, em 2001, contra a posição de Luís Filipe Menezes, presidente da distrital. Aquela estrutura deixaria o nome passar apenas por dois votos, e Menezes nunca apareceria na campanha para ajudar o partido. Quem fazia a ponte na distrital com Rio era Marco António Costa, braço direito de Menezes e com quem foi mantendo uma relação mais próxima e cordial. Na noite eleitoral das autárquicas de dezembro de 2001, a vitória de Rui Rio no Porto, de Santana Lopes em Lisboa, e de Fernando Seara em Sintra, ditaram a demissão de António Guterres de primeiro ministro e abriam mais um ciclo de governação PSD/CDS. O novo presidente da câmara do Porto já tinha lugar na história nem que fosse por ter derrotado o tido como invencível Fernando Gomes, ex-presidente socialista da câmara do Porto. Mas ficou 12 anos.
Alimentou polémicas intermináveis, mas ainda nestas eleições de 2017 tinha o candidato do PSD, Álvaro Almeida, a segurar-se à sua herança como uma boia de salvação que o salvasse da desgraça (não conseguiu, teve apenas 10%). Quando chegou à câmara, deixou cair os projetos que vinham de trás para realizar em parceria com Gaia: ponte pedonal sobre o Douro, táxis fluviais a ligar as duas margens, etc. Comprou guerras, mas havia de dizer que não as podia comprar todas ao mesmo tempo e ganhá-las a todas. “Só as compro se o benefício for maior do que o custo”, diria já no segundo mandato.
Teve a guerra com o FC Porto por causa do Plano de Pormenor das Antas, que aproveitou a oportunidade se passou para Gaia. Quando o FCP era campeão, os festejos tinham lugar do outro lado do rio, junto de Luís Filipe Menezes. Quando o clube ganhou a UEFA, Menezes deu a Pinto da Costa a medalha de ouro da cidade e uma réplica aos jogadores. Teve a guerra “Porto feliz”, para erradicar os arrumadores e toxicodependentes das ruas da cidade. Terão passado mil pessoas pelo programa que lançou e os arrumadores tornaram-se numa realidade residual ao fim de quatro anos. Teve a guerra das contas, que também ganhou.
Sem maioria, foi o comunista Rui Sá que lhe viabilizou o executivo. “Nunca houve um acordo em que ele tenha roído a corda”, havia de reconhecer o vereador da CDU, descartado quando Rio chegou à maioria em 2005. Ao longo do mandato, foi fazendo denúncias à Polícia Judiciária e à procuradoria Geral da República sobre o que ia encontrando nas gavetas da autarquia. Quando chegou, foram detidos três funcionários apanhados em flagrante com a sua colaboração. O ex-vereador do urbanismo Paulo Morais denunciou pressões sobre a câmara. Rio respondeu que o combate à corrupção era uma bandeira e determinou uma sindicância aos serviços de urbanismo da autarquia que gerou duas participações crime e cinco processos disciplinares.
Na secretária, no seu gabinete da avenida dos Aliados, tinha um cartão com a palavra “Não”. Podia ser uma brincadeira, mas tinha significado. Quando as propostas dos vereadores custavam mais dinheiro — ou mais do que ele achasse razoável — levantava o pedaço de papel e estava a resposta dada, sem precisar de gastar o seu latim: “Não!” Pôs as contas do Porto em ordem, e em 2012 fazia pagamentos a fornecedores a 12 dias. Uma das razões para impedir que Menezes lhe sucedesse era para não desbaratar a sua obra. Do primeiro para o segundo mandato, mudou toda a equipa de vereadores menos Matilde Alves. Lamentou-se por a lei não permitir a um presidente de câmara fazer a remodelação da sua equipa, como se fosse um primeiro-ministro.
A sua relação com a cultura e com os agentes culturais foi dos aspetos mais polémicos dos seus mandatos. “Não se pode gastar em teatro o dobro do que em ação social”, diria, depois da crise do Rivoli, em outubro de 2006, no segundo mandato, em que mandou a polícia tirar os jovens e agentes culturais que tinham ocupado o teatro às seis da manhã a protestar contra a venda do Teatro Municipal. Em 2005, já tinha sido criticado e vaiado na inauguração do Fantasporto, que a câmara subsidiava, por não lhes dar os apoios pedidos. A partir daí, impôs a sua “cláusula”: instituições apoiadas pela câmara é suposto absterem-se de fazer críticas à autarquia.
Embora a primeira coisa que fazia de manhã era ler os jornais a caminho da câmara, a relação com a imprensa era tempestuosa, sobretudo com o Jornal de Notícias e o Público. Nessas polémicas, passou a usar o site da câmara como arma de contra-informação, com títulos com este: “JN manipula informação…” Punha desmentidos nos ecrãs publicitários da câmara por toda a cidade. Chegou a dizer: “Peguei no site e fiz o que me faziam. Parece que um jornal que vende 100 mil pode fazê-lo e um sítio visto por cinco mil já não pode!” José Leite Pereira, ex-diretor do JN, revelou a existência de pressões para o demitirem. Henrique Granadeiro, que nessa época presidia à Lusomundo — empresa que detinha o jornal — nunca o desmentiria. Rui Rio tem tanta dificuldade em lidar com os jornais que até fazia desmentidos de notícias dadas com base em relatórios do Tribunal de Contas, como quando o JN escreveu, em outubro de 2006, que a câmara tinha recebido 400 mil euros a mais para construir um bairro social.
Choque de regime: regionalização, imprensa, justiça e impostos para pagar a dívida
“A personalidade de Rio é fraturante na sociedade portuguesa. E ainda bem que é”, escreveu Carlos Mota Cardoso em “Rui Rio – Raízes de Aço”. A propostas de Rui Rio ao longo dos anos têm sido controversas e muitas vezes originais dentro do partido que agora quer dirigir. Faz parte da minoria dentro do PSD a favor da despenalização do aborto, tem tendências regionalistas, critica duramente a comunicação social e a justiça e diz que, se o sistema político não for reformado, caminhamos para uma ditadura. Recentemente, defendeu um imposto para pagar a dívida pública, como forma de as pessoas perceberem o esforço que o país estava a fazer nesse sentido. Até disse que concordava com todas as medidas tomadas por António Costa no seu primeiro Orçamento do Estado. Se o seu programa for neste sentido, avizinham-se discussões interessantes no PSD.
Rui Rio tem tanta consciência das suas originalidades que diria numa entrevista ao Diário de Notícias em novembro de 2016, que, só avançaria para a liderança se houvesse um ambiente de aceitação: “[Avanço] se houver espaço para implementar o fundamental das minhas ideias e da minha maneira de ser, que como sabe tendem a ser um pouco disruptivas relativamente à política na sua forma mais tradicional”.
Desde que deixou a câmara do Porto, depois de mais de uma década à frente da autarquia, Rui Rio foi limitando as suas aparições públicas a conferências ou palestras, onde geralmente fazia duras críticas aos sistema político, ao sistema judicial e à comunicação social. Nem foi ao último congresso dos sociais-democratas, em abril de 2016, para não “ofuscar” o líder, uma declaração que caiu mal no partido. O ano passado, esteve no Parlamento para dar o seu contributo na comissão eventual para o reforço da transparência no exercício de funções públicas e defendeu que a democracia “está doente”, à boleia da “desconfiança permanente das pessoas face aos políticos”, mas que a culpa não é só dos políticos; é também do jornalismo:
“[A comunicação social] ao longo do tempo matou a sua credibilidade e a credibilidade da política, com sentenças na primeira página”, disse aos deputados.
Rui Rio. Um político anti-sistema que precisa de conquistar o aparelho
Muito crítico do sistema judicial, afirmou que a justiça “não consegue condenações e ainda exibe a sua fraqueza na praça pública, com a ajuda da comunicação social”. Em abril de 2016 fez mais uma das suas declarações assumidamente politicamente incorretas, insinuando que na ditadura salazarista os tribunais eram mais capazes de defender os cidadãos: “Não é politicamente correto dizer, mas se formos sérios, temos de reconhecer que, comparando, o sistema de Justiça está menos capaz de defender os direitos dos cidadãos do que estava há 40 anos”. Numa conferência na Faculdade de Direito, tinha feito outra das suas polémicas proclamações: “Se Portugal continuar assim, se não fizer reformas profundas no regime, caminhamos para uma ditadura sem rosto”.
Do ponto de vista económico, Rui Rio não é menos polémico. Quando comentou o primeiro orçamento da “geringonça”, disse numa entrevista à RTP que estava a favor de quase todas as reversões promovidas pela esquerda, mas o tema pode esmorecer numa futura campanha interna se não houver um candidato que defenda a herança do passismo. “Concordo com todas as medidas — devolução dos salários da função pública, redução do IVA, eliminação da sobretaxa de IRS, melhores prestações sociais. As pessoas merecem, o problema é correr riscos demasiado grandes”.
Há menos de um ano, sugeriu a criação de um imposto para pagar os juros da dívida pública quando moderava um debate sobre fiscalidade. A seguir, defender-se-ia numa entrevista ao Público, sublinhando que “a maioria das pessoas nem tentou entender a questão”. E tentou explicar-se: “Não fiz nenhuma proposta, nem falei num novo imposto para pagar a dívida. Pedi apenas um comentário aos palestrantes de um debate que estava a moderar sobre uma ideia em concreto. E essa ideia consistia na possibilidade de se baixar um ou mais impostos e, por contrapartida, criar um novo dedicado ao pagamento dos juros da dívida pública que todos estamos a pagar anualmente. Ao contrário do que alguns maldosamente insinuaram, nenhum cidadão iria pagar mais impostos.” Para Rui Rio, era uma forma de “criar uma pressão benigna sobre os Governos no sentido da redução da carga fiscal”, porque os contribuintes “pagam na mesma e nem sequer têm consciência da brutalidade que estão a pagar em juros. O valor é idêntico ao que custa o SNS ao Estado. Acha que as pessoas têm noção disto?”
Outro tema que pode dividir o PSD: a regionalização: Rio é adepto de maior autonomia regional. Mas apoia a regionalização? Já defendeu um “debate sério” no país sobre a regionalização, “em nome” do interesse nacional, dos contribuintes e de uma despesa pública “mais saudável”. No entanto, as suas declarações parecem ser mais pró-regionalização, embora vá dizendo que não é a favor nem contra, como isto que disse em dezembro de 2016 numa palestra em Elvas: “O poder local democrático, nestes 40 anos tem uma obra notável e é isso que me faz ponderar e colocar à consideração do debate público se nós queremos estancar esta dívida brutal, se nós não devemos repensar da melhor maneira a forma de gerir os recursos públicos. E é aqui que eu enquadro um debate sobre a regionalização, sério, à escala nacional”.
Fez campanha pelo “não” no referendo de novembro de 1998, mas passaram 20 anos que trouxeram “algumas experiências” e que o “levaram a pensar de outra forma”. Em abril de 2016, num debate sobre o poder local promovido pelo Clube Coimbra XXI, dizia: “Não consigo descortinar nenhuma grande reforma que possa dar esse abanão no regime. A única que eu vejo é a regionalização”. Mas com regras financeiras apertadas.
O homem que andou de recuo em recuo até ao avanço final que se avizinha, deve mostrar esta semana ao que vem. Rui Rio esteve para suceder a Menezes na liderança do partido, em 2010. Mas voltou atrás na decisão durante a viagem de regresso ao Porto, quando já estava tudo acertado. Foi aí que pesaram as razões familiares e a necessidade de ter de abandonar a câmara do Porto. Foi essa decisão que levou Manuela Ferreira Leite a chegar a líder. “Queriam que eu fosse candidato ao PSD duas vezes. E porque é que eu não fui candidato ao PSD? Porque em ambas as vezes eu tinha sido eleito no Porto e tinha um compromisso com quem me elegeu e a gente enobrece a política honrando a palavra até ao fim”, chegou a afirmar, sem referir as questões pessoais.
Passou 2015 a alimentar a possibilidade de se candidatar às presidenciais de janeiro de 2016, mas Marcelo Rebelo de Sousa tinha o terreno bem marcado. Anda há ano e meio a percorrer as estruturas do partido na sua carrinha cinzenta, muitas vezes sozinho, e a trabalhar com um núcleo duro muito restrito, quase “na clandestinidade”. Miguel Relvas disse ao Expresso que pagava para ser se Rio avançava. É bom que tenha a carteira preparada na quarta-feira.
Corrigida, a 24 de novembro, a informação de que Balsemão tinha sido padrinho de casamento de Luís Filipe Menezes e retirada a informação de que Menezes tinha apoiado os balsemistas no congresso da Figueira, por estar incorreta.