Não venham para Washington, DC. O pedido está a ser feito a todos os americanos, quer pretendam apoiar Joe Biden, quer pretendam protestar contra a sua vitória, durante a tomada de posse de 20 de janeiro. Seja qual for a intenção de cada um, a mensagem das autoridades, FBI incluído, é simples: fiquem em casa. E não é só (mas também) por causa da pandemia. É, acima de tudo, por causa da invasão do Capitólio na semana passada, o edifício onde funciona o Congresso dos EUA, e onde Biden irá proferir o juramento que o consagra o 46.º Presidente do país.
A 6 de janeiro, apoiantes de Donald Trump tentaram impedir a confirmação dos votos do Colégio Eleitoral, um ato que serve de luz verde aos resultados das presidenciais e que, neste caso, deram a vitória ao democrata. Desde então, as ameaças de ações semelhantes, incluindo as de morte a senadores e congressistas, têm surgido em todos os 50 estados norte-americanos, levando a inúmeras detenções. Só na sequência da invasão do capitólio, cerca de 70 pessoas foram acusadas, escreve o britânico The Guardian, e 30 estão detidas, segundo a CNN.
A resposta das autoridades tem sido semelhante à que é dada num cenário de guerra: há cada vez mais militares nas ruas, o FBI pediu a chefes da polícia de todo o país que estejam atentos a potenciais ameaças (e que as levem a sério, mesmo que não pareçam sê-lo) e DC, o Distrito de Columbia, está em estado de emergência até ao dia depois da posse. A 20 de janeiro são esperados mais de 20 mil militares e polícias nas ruas da capital norte-americana, um número superior ao das tropas que os norte-americanos têm atualmente estacionadas no Afeganistão (4.500), Iraque (5.000), Síria (500) e Somália (700). Contas feitas, serão cerca do dobro.
Os membros da Guarda Nacional chegam de todo o país. Ao longo dos últimos dias, há cada vez mais militares a marchar na capital, e as previsões sobre o número final de militares que serão enviados para DC têm variado, aumentando a cada nova informação. Na terça-feira, o chefe da polícia do Distrito de Columbia falava em cerca de 20 mil. A verificar-se, será o maior número de sempre na tomada de posse de um Presidente.
“Já estava preocupado antes de hoje, vou estar preocupado durante o fim de semana e estarei preocupado a seguir”, disse Robert Contee aos jornalistas, explicando que tudo se prende com “a grande ameaça de segurança” que paira sobre o evento. E tal como Muriel Bowser, a mayor de Washington, o chefe de polícia pediu aos americanos que não se dirijam a DC para a tomada de posse.
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Se algo correr mal, não será por falta de patrulha nas ruas. Para além da Guarda Nacional, o Congresso e arredores estarão sob o olhar atento da polícia do Capitólio, da polícia de Parques e do departamento de polícia de Washington. A Guarda Nacional, aliás, já se encontra estacionada dentro do Capitólio: estão, segundo o The New York Times, 3.000 soldados a cada momento a guardar o edifício, cumprindo turnos de 12 horas.
São esses os mesmos soldados cujas imagens correram mundo — centenas de militares, encostados uns aos outros, espalhados pelos corredores do Capitólio e dormindo no chão depois da noite que terminou com a aprovação da destituição de Donald Trump, a segunda de que o Presidente foi alvo.
A destituição de Trump, a invasão do Capitólio, a tomada de posse de Biden, os militares na rua, tudo está ligado. Na noite em que o Congresso confirmava os votos do Colégio Eleitoral, uma hora antes do início da cerimónia formal, o ainda Presidente fez um discurso na Casa Branca e incitou os seus apoiantes a usarem a força para reverter a vitória de Biden. A manifestação rumou ao Capitólio e invadiu o Congresso dos Estados Unidos, sem que as autoridades o conseguissem evitar. A última notícia de algo semelhante é de 1814, durante a guerra que opôs EUA e Reino Unido, quando os ingleses queimaram parcialmente o Capitólio e este teve de ser reconstruido.
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Os números que não são ainda conhecidos é de quantos membros da Guarda Nacional estarão armados, embora seja certo de que as tropas responsáveis pela segurança exterior estarão, decisão tomada pelo Departamento de Defesa. Esta força de reserva pode levar a cabo diferentes tipos de missões, com recurso a armamento ou não. Mas ter a Guarda Nacional na rua, armada, a fazer frente a cidadãos é algo que sempre se tentou evitar, assim como militalizar a polícia do Capitólio.
Sem grandes detalhes, até por questões de segurança, de como se irão organizar as diferentes forças de segurança no dia da tomada de posse, a imprensa dos EUA dá como certo de que, para além da vigilância do Capitólio, haverá militares a controlar o trânsito e os transportes públicos. Quem estiver estacionado no edifício do Congresso estará equipado com armas M9, rifles automáticos e espingardas, para além do equipamento de proteção anti-motim.
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A foto do dia da tomada de posse de Joe Biden vai ter muitos lugares vazios e é assim mesmo que o candidato quer que aconteça. Um cenário completamente oposto ao de 2017, quando as imagens oficiais do primeiro dia de Donald Trump como Presidente deram origem a uma polémica, por causa da forma como foram editadas. O motivo? A multidão de Barack Obama era maior do que a sua.
Entre as cadeiras vazias estará a do próprio Trump. Antes ainda de o Twitter ter apagado a sua conta indefinidamente, o Presidente cessante deixou o aviso: “Para todos aqueles que pediram, não irei à posse em 20 de janeiro.” Com esta decisão, o Presidente que abandona a Casa Branca nesse mesmo dia torna-se o quarto chefe de Estado a não estar presente na cerimónia de transição de poder, algo que não acontecia há 152 anos. Os outros foram John Adams (Presidente entre 1797-1801), John Quincy Adams (1825-1829) e Andrew Johnson (1865-1869).
“É uma boa decisão”, disse Biden, frisando que o vice-presidente Mike Pence será “bem-vindo”, presença que já foi confirmada. Quem também garantiu que estará no Capitólio são os antigos presidentes Barack Obama, George W. Bush e Bill Clinton.
Os três, bem como as suas mulheres, irão acompanhar Biden e Kamala Harris, a vice-presidente, no momento em que será depositada uma coroa de flores no túmulo do soldado desconhecido no Cemitério Nacional de Arlington, algo que acontecerá já depois de lido o juramento presidencial: “Juro solenemente que cumprirei fielmente as funções de Presidente dos Estados Unidos e farei o melhor que estiver ao meu alcance para preservar, proteger e defender a Constituição dos Estados Unidos.” E bastará isto para que Joe Biden passe a ser o mais recente ocupante da Sala Oval.
Apesar de reduzida ao mínimo por causa também da pandemia, a cerimónia contará, como habitualmente, com a presença de estrelas da música. Lady Gaga cantará o hino nacional e Jennifer Lopez encerrará a cerimónia com uma atuação. Se, em anos anteriores, chegaram a vender-se 20 mil bilhetes para os lugares sentados perto do Capitólio, este ano só estão disponíveis mil. O desfile habitual pela Avenida Pensilvânia até a Casa Branca também foi cancelado e o National Mall, o parque para onde olham os Presidentes enquanto juram cumprir a Constituição com a mão em cima de uma Bíblia, estará encerrado.
Para além da cerimónia no Capitólio, o momento será celebrado com um programa televisivo, transmitido em simultâneo em vários canais e nas redes sociais, substituindo os festejos e o baile tradicional. O ator Tom Hanks será o anfitrião e haverá atuações de músicos como Jon Bon Jovi e Justin Timberlake.
No final do dia, Joe Biden muda-se para a Casa Branca para começar um mandato de quatro anos.
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