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Aitana Bonmatí com a medalha de vencedora do Mundial de 2023
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Aitana Bonmatí com a medalha de vencedora do Mundial de 2023

Maja Hitij

Aitana Bonmatí com a medalha de vencedora do Mundial de 2023

Maja Hitij

Uma das "cabecilhas da revolta" que se infiltrou entre as campeãs: quem é Aitana Bonmatí, a MVP do Mundial

Teve que negociar com a Federação espanhola as condições para estar no Mundial, acabou por integrar a convocatória e foi a melhor jogadora do torneio. Eis o fenómeno que Guardiola comparou a Iniesta.

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É raro o caso em que os ídolos têm o número de telefone das pessoas que os admiram. Xavi Hernández, atual treinador da equipa masculina do Barcelona e um dos que melhor tratou a bola quando era jogador, também não tem uma lista de contactos para mandar mensagem aos fãs. No entanto, há situações em que uma compilação desse tipo podia ser útil. Sendo que não há um número universal como o 112 para o qual se possa ligar e do outro lado atender alguém que tenha uma resposta para os problemas, Xavi recorreu a outra solução para chegar a Aitana Bonmatí: o Instagram.

Num ato de reconhecimento, a mensagem que lhe enviou foi de conforto após Bonmatí ter sido expulsa na meia-final do Mundial Sub-20 e, consequentemente, ter ficado de fora da final que a Espanha viria a perder para o Japão. A jogadora conta que Xavi lhe disse que não desmotivasse, pois teria mais oportunidades para jogar finais. Cinco anos depois, Aitana Bonmatí sagrou-se campeã do mundo de futebol feminino e arrecadou o prémio de Melhor Jogadora do torneio que se realizou na Austrália e na Nova Zelândia.

No prefácio da autobiografia de Bonmatí, Xavi define-a como perfecionista. A própria não o esconde, revelando até sintomas de síndrome de impostor. “Digo sempre que é muito difícil para mim reconhecer quando fiz um bom jogo, é como se encontrasse sempre um lado negativo. É verdade que nos últimos anos tenho conseguido controlar isso muito melhor, porque acredito que não saber como geri-lo me prejudica mais do que me beneficia. Mas, por outro lado, existe a autoexigência”, contou numa entrevista ao Mundo Deportivo. “Sou uma inconformada. Muitas vezes dizem-me ‘Que jogo que fizeste!’ e eu penso ‘Errei dois passes…’. Vou ficar com isso ao invés de guardar o lado bom, mas sei como lidar bem com isso agora”.

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Apesar de ter sido campeã do mundo com a camisola 6, no FC Barcelona, Bonmatí usa o 14 em homenagem a Cruyff

DeFodi Images via Getty Images

A busca pela perfeição é como a distância entre a Terra e o sol: convém encontrar a medida certa para não nos destruir. O prémio de MVP do Mundial de 2023 foi para Aitana Bonmatí a demonstração de tudo o que aprendeu com a genialidade. Aproveitando a característica rara que possui, a centrocampista utilizou o pé esquerdo para quase marcar no início da segunda parte um grande golo a Mary Earps, guarda-redes da Inglaterra, seleção que a Espanha bateu por 1-0 para se sagrar vencedora do Campeonato do Mundo pela primeira vez. Ficou evidente que para a jogadora do Barcelona o pé preferencial é aquele que tem bola.

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“Nos treinos com o Barça muitas vezes dizem-me que posso chutar com o pé direito e procuro o pé esquerdo. É como se ao nível do passe me sentisse mais confortável com o direito, mas ao nível da finalização fosse melhor com o esquerdo. É algo que adquiri e que sai naturalmente. É bom que me digam, porque é sinal que às vezes consigo rematar com o direito e instintivamente faço-o com o esquerdo. Saia com que pé sair, um golo é um golo”, comentou a ambidestra ao portal Relevo.

A oportunidade de se tornar Bola de Ouro (sucedendo a Alexia Putellas)

Com Alexia Putellas, vencedora das duas últimas Bolas de Ouro da FIFA, lesionada durante quase toda a época, Aitana Bonmatí teve que assumir as funções da colega ao longo da época no Barcelona, sendo que, neste momento, colocou-se em posição de também ficar com o próximo prémio de Melhor Jogadora do mundo e não é só a Liga dos Campeões conquistada pelo clube blaugrana que o justifica. O desempenho no Mundial, onde a prestação de Putellas foi muito condicionada pelos problemas físicos que obrigaram a muita gestão de Jorge Vilda, brindou Bonmatí com o reconhecimento de quem andava mais distraído.

O caminho da Roja para o Mundial foi marcado pela tensão entre a as jogadoras e a Real Federação Espanhola de Futebol. A polémica estalou quando 15 jogadoras enviaram um email ao organismo que tutela o futebol espanhol queixando-se das condições de trabalho da equipa, nomeadamente dos métodos utilizados pelo selecionador Jorge Vilda. Apenas três dessas jogadoras estiveram na convocatória final do treinador para a maior prova de seleções: Mariona Caldentey, Ona Batlle e… Aitana Bonmatí.

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Aitana Bonmatí e Fridolina Rolfö, companheiras de equipa no Barcelona trocaram camisolas após a meia-final do Mundial entre Espanha e Suécia

FIFA via Getty Images

O jornal espanhol El Confidencial classificou Aitana Bonmatí como uma das “cabecilhas da revolta”. A Federação espanhola terá reunido com todas as jogadoras descontentes. Aitana Bonmatí terá sido sensível à ideia de que, tal como aconteceu no Barcelona, também na seleção espanhola ia ter o protagonismo que anteriormente pertencera a Alexia Putellas, o que a podia colocar na frente da corrida à Bola de Ouro, mesmo que, ao Mundo Deportivo, tenha dito não ter particular interesse por prémios individuais. “Nem tudo depende de ti e são o que são, tento dar o menor valor possível a esses prémios”. No fim de contas, a jogadora de 25 anos acabou mesmo por ser uma das vencedoras do torneio. A Bola de Ouro é o próximo passo.

“Senti que a Federação espanhola tinha que investir mais em nós. Houve certas mudanças que tinham que ser feitas se quiséssemos ganhar grandes torneios”, escreveu a própria Aitana Bonmatí no The Players’ Tribune. “Durante a temporada – e só posso falar por mim – tive algumas reuniões com a Federação. Concordámos e aceitámos que algumas coisas tinham que mudar para que eu voltasse. Naquela altura, esperava que a Federação nos desse o apoio que merecíamos. Então, no final, decidi jogar o Mundial”.

A comparação com Iniesta, o 14 de Cruyff e o sangue blaugrana

“Tenho uma jogadora pelo qual estou completamente apaixonado pela forma que tem de jogar. Diria que é o Iniesta em mulher. Joga no Barcelona, um clube que teve um impacto tremendo no cenário do futebol feminino”. Nestas declarações, Pep Guardiola confessou-se admirador de Aitana Bonmatí. Ambos catalães, mas de gerações bastante diferentes, Bonmatí cresceu a ver o super Barcelona treinado por Pep Guardiola. No The Players’ Tribune, disse que Xavi e Iniesta eram os jogadores a que mais prestava atenção, pelo que foi com satisfação, percetível na maneira como agradeceu nas redes sociais as palavras do técnico, que a jogadora recebeu o elogio.

Aitana Bonmatí chegou ao Barcelona com apenas 13 anos. Evoluiu em La Masia até chegar à equipa principal ao mesmo tempo que ia somando sucessos nas seleções jovens de Espanha. Tornou-se peça fundamental nas últimas cinco épocas em que o clube blaugrana foi quatro vezes à final da Liga dos Campeões, tendo vencido duas.

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Aitana na final da Liga dos Campeões onde o Barcelona venceu o Wolfsburgo

Getty Images

Ainda assim, esteve muito perto de desistir do futebol europeu. “Naquela época, a equipa feminina do Barcelona não dava na televisão. Elas não estavam nas redes sociais. Não havia hipótese para as mulheres jogarem em Camp Nou. Durante muito tempo, as melhores seleções femininas da Espanha também não foram profissionais”, refletiu no The Players’ Tribune. “Então, quando jogava nas Sub-15 do Barça, não via forma de viver do futebol. Não sabia muito sobre futebol feminino noutras partes da Europa, como Inglaterra, Espanha ou Alemanha, mas as pessoas falavam muito sobre os EUA. Eu pensei: ‘Ótimo!’. Os meus pais e eu estávamos a conversar sobre a Universidade de Oregon e que testes teria de fazer”.

Acabou por permanecer na Catalunha e a verdade é que toda ela transpira Barcelona, quer no estilo de jogo tiki-taka, quer nas referências. Além de se inspirar em Guardiola, Xavi e Iniesta, usa o número 14 na camisola em homenagem a Johan Cruyff. Sem perspetivas de ser profissional, quando teve oportunidade de se juntar à equipa principal do Barcelona, a integração não foi fácil. “Foi bastante frustrante, porque nas categorias inferiores joguei absolutamente sempre. Foi tudo muito fácil e cheguei à primeira equipa e tive que ganhar lugar e enfrentar as melhores. Às vezes, sou um pouco impaciente e é difícil de controlar, mas se trabalhares a nível psicológico, como eu fiz, tudo pode ser controlado”, contou ao La Vanguardia.

Do psicólogo aos 13 anos até doar o prémio de melhor em campo a refugiados

O trabalho mental acompanha Bonmatí desde os 13 anos, quando foi ao psicólogo pela primeira vez para procurar ajuda face a um período conturbado da vida pessoal como explicou no La Vanguardia. “Sou jogadora de futebol, mas primeiro sou uma pessoa. Ir ao psicólogo é um investimento em mim como pessoa que se verá ao longo dos anos. É um longo processo em busca de autoestima, de confiança… Cada um tem os seus medos e, quando guardamos para nós, a bola fica grande e aí é mais complicado”.

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Aitana com o troféu que a Espanha conquistou pela primeira vez

FIFA via Getty Images

Além de se ajudar a si, Aitana também se preocupa com os outros. Na final da Liga dos Campeões de 2021, onde o Barcelona bateu o Chelsea por 4-0, a jogadora foi considerada a melhor em campo, o que lhe valeu um prémio de 50.000 euros que doou ao campo de refugiados de Lesbos, na Grécia. De resto, atualmente trabalha junto do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados e participa em ações de integração de refugiados por via do desporto, contribuindo também com a doação de material. É ainda embaixadora da Fundação Johan Cruyff.

Ainda não era nascida e Aitana Bonmatí já lutava por causas sociais, nomeadamente no que há reivindicação pela igualdade de género diz respeito. Os pais, professores de literatura catalã, afrontaram a lei espanhola para que Aitana tivesse o apelido da mãe antes do apelido do pai, ao contrário do que era regra até 2000. A nível académico, dedica-se a um Mestrado em Gestão Desportiva.

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