Um pequeno vídeo em que a apresentadora norte-americana Oprah Winfrey fala sobre pedofilia está a ser partilhado pelos utilizadores do Facebook para a acusar de estar a promover práticas criminosas de abusos sexuais de crianças. Mas a parte do discurso que circula nesta rede social foi tirado do contexto.

No inicio do vídeo, Oprah Winfrey está num palco acompanhada de outras três pessoas e diz uma frase que, por estar tirada do contexto, pode de facto parecer polémica: “Se alguém que tu admiras, respeitas e até amas — e se tu tens 7 anos — acaricia o teu pénis, vai saber bem. Mesmo que não tenhas um nome para o que está a acontecer, sabe bem”. Logo de seguida, a apresentadora comenta que quando disse este argumento pela primeira vez, anos antes, as pessoas a classificaram como “maluca”. “Toda a gente quer acreditar que o abuso sexual se trata de sexo contra uma parede e violação. E eu tenho vindo a dizer há anos: se o abusador for alguém bom, nem irás notar que está a acontecer”.

Captura de ecrã do vídeo que circula nas redes sociais

O vídeo, que tem dois minutos e meio no seu total, prossegue com uma montagem de várias imagens de Oprah Winfrey e com uma voz que se sobrepõe e que acusa a apresentadora de “legitimar o criminoso sexual João Teixeira de Faria, conhecido por João de Deus”, um brasileiro acusado em 2018 da prática de abusos sexuais no seu centro de cura. Ao mesmo tempo que vai contando a sua história, vão surgindo imagens da apresentadora com o alegado abusador sexual.

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No vídeo, é ainda feita referência à Academia que a apresentadora criou em 2007, para raparigas de famílias em situação de pobreza, na África do Sul. E ao facto de, meses após a inauguração, uma das funcionárias ter sido acusada de abuso sexual de pelo menos seis jovens de 13 e 14 anos. Como argumentos, são também mostradas fotografias de Oprah com Harvey Weinstein, o produtor de Hollywood condenado a 23 anos de prisão por violação e agressão sexual de duas mulheres, e alegadas notícias polémicas publicadas sobre a apresentadora.

Antes de mais, a primeira parte do vídeo em que se ouve Oprah Winfrey a falar é verdadeira: são 30 segundos de uma entrevista de uma hora que a apresentadora faz a Wade Robson e James Safechuck, dois homens que denunciaram o cantor Michael Jackson por abusos sexuais no documentário da HBO “Leaving Neverland”. O seu discurso é autêntico, mas foi tirado do contexto. Na entrevista publicada na íntegra é possível perceber que a apresentadora norte-americana não estava a promover abusos sexuais de crianças. Pelo contrário, estava a condená-los, lembrando que algumas crianças, por serem manipuladas pelos seus agressores, podem nem sequer se aperceber de que estavam a ser abusadas e ter noção disso apenas muitos anos mais tarde.

As declarações que aparecem no vídeo do Facebook surgem no minuto 32:37 da entrevista:

https://www.youtube.com/watch?v=wZwQ0E3iT9I

Ouvindo as declarações de Oprah desde o início, percebe-se que a apresentadora não está a promover a pedofilia:

Isto é algo que muitas pessoas não percebem. Grande parte da confusão e da vergonha para as crianças que são vítimas é que a atenção e a sedução do agressor vem provavelmente de alguém que conhecem. Para levarem os abusos avante, [os agressores], têm de ser alguém que [as vítimas] conhecem, alguém que admiram, alguém que respeitam ou até mesmo amam”, diz a apresentadora.

Depois, as acusações de que a apresentadora legitimava os abusos sexuais de João de Deus não têm fundamento, uma vez que Oprah Winfrey o entrevistou no seu centro de cura em 2012 — muitos anos antes de surgirem as suspeitas de abusos sexuais. Aliás, depois do popular médium brasileiro ter sido acusado, a apresentadora defendeu as vítimas em declarações ao The New York Times: “Fui ao Brasil em 2012 para gravar um episódio de ‘Oprah’s Next Chapter’ que explorou os controversos métodos de cura de John of God . O episódio foi para o ar em 2013. Apoio as mulheres que estão agora avançar e espero que seja feita justiça”.

Médium brasileiro João de Deus condenado a 19 anos de prisão por quatro violações

O mesmo aconteceu em relação a Weinstein. Após surgirem as primeiras suspeitas de agressões sexuais em relação ao produtor, Oprah reagiu na sua página oficial do Facebook. “Estou a processar as acusações do comportamento horrível de Harvey Weinstein e não consigo encontrar palavras para articular a magnitude da situação”, escreveu, mostrando também apoio às “vozes corajosas” que denunciaram os abusos.

A publicação feita por Oprah onde censura o comportamento do produtor de cinema

Conclusão

Embora as declarações de Oprah sejam autênticas, foram tiradas do contexto. No vídeo publicado na íntegra é possível perceber que a apresentadora norte-americana não estava a promover abusos sexuais a crianças. Pelo contrário, estava a condená-los, lembrando que algumas crianças, por serem manipuladas pelos seus agressores, podem nem sequer se aperceber de que estavam a ser abusadas e ter noção disso apenas muitos anos mais tarde.

A apresentadora também censurou João de Deus, o médium brasileiro conhecido condenado pela violação de quatro mulheres, com quem surge em fotografias no vídeo publicado nas redes sociais. E o mesmo em relação a Weinstein, cujos comportamentos de abuso sexual repudiou.

Assim, segundo a classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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