Está a ser partilhada uma publicação no Facebook com uma imagem de uma crónica — “A Voz do Cigano” —, com uma fotografia de um alegado “patriarca cigano de Beja” a lamentar o atual valor do Rendimento Social de Inserção (RSI): “3500 euros de RSI para 4 pessoas já não dá para a gente se governar”.
A publicação é partilhada por um utilizador de Facebook que associa as críticas ao valor do RSI ao líder do Chega:
“Como diz o dr André Ventura, quem tem direitos tem que ter deveres! Eu tenho que trabalhar, às vezes 24h por dia, desconto, pago as minhas contribuições e não tenho direito a nada. Deixo aqui a sucinta pergunta: O que devo fazer para ser cigano??”
Comecemos pela imagem, antes de irmos às declarações. Para averiguar a sua veracidade, o Observador recorreu à ferramenta TinEye, que, como o próprio site explica, com recurso a tecnologia de reconhecimento de elementos gráficos, permite pesquisar a origem de uma imagem que não esteja contextualizada ou seja manipulada.
Esta ferramenta remete-nos para a verdadeira imagem do dito “patriarca cigano” como sendo Tiago Matos Gomes, numa fotografia publicada a 8 de março de 2021, no Jornal Público. A notícia apresentava o político como “mais um candidato à Câmara de Lisboa: chama-se Tiago Matos Gomes e é lider do Volt”. Pouco mais de um ano depois, Tiago Matos Gomes desfiliava-se do Volt Portugal e prepara-se para fundar outro partido, o Partido Democrata Europeu. Apesar das reviravoltas políticas, continua a não corresponder à designação com que é apresentado na publicação verificada, “patriarca cigano de Beja”.
As diferenças entre a imagem de Tiago Matos Gomes e a imagem manipulada do “patriarca cigano” mostram claras diferenças. A cara está alargada e o tom de pele está escurecido. Ao Observador, Tiago Matos Gomes admite que já tinha sido alertado por “familiares e amigos” a propósito do uso da sua fotografia. Confirma que se trata de uma fotografia sua, manipulada, desconhece o autor, mas acredita que não foi um ato “intencional” contra o próprio.
Quanto à citação, não há registo de um “patriarca cigano de Beja” a criticar o valor do Rendimento Social de Inserção: “3500 euros de RSI para 4 pessoas já não dá para a gente se governar”, nas crónicas publicadas pela Associação Amato Lusitano, uma associação sem fins lucrativos situada em Castelo Branco.
Num esclarecimento enviado ao Observador, o presidente da associação, Arnaldo Braz, explica que o objetivo da Amato Lusitano é promover o “emprego e formação” da região através de uma “integração adequada com espaços e entidades de âmbito regional, nacional e internacional”.
De facto, a associação publicava uma crónica mensal “A voz dos Ciganos” no semanário local A Reconquista, uma ação que fazia parte dos projetos desenvolvidos em conjunto com a “comunidade cigana albicastrense, com vista à sua integração na sociedade local”. A crónica terminou em 2021 e no que toca à publicação que corre nas redes sociais, o responsável é claro:
Nunca tivemos conhecimento de qualquer publicação desta natureza, nomeadamente desta que está em causa. Desconhecemos completamente este assunto e nunca partilhamos qualquer artigo a criticar o valor do RSI.”.
Não é a primeira publicação a circular nas redes sociais a associar o Rendimento Social de Inserção à comunidade cigana.
De acordo com os dados de novembro de 2020 do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (MTSSS), o RSI era distribuído por 210.490 pessoas. Em média, “o valor processado de prestação de Rendimento Social de Inserção (RSI) por beneficiário é de 119,11 euros”. Num contexto mais alargado, o valor médio por família era de “262,26 euros” mensais.
Fact Check. Família com cinco elementos tem direito a 1200 euros de RSI?
Conclusão
Além de uma fotografia manipulada, de Tiago Matos Gomes, e de um artigo a criticar o valor do Rendimento Social de Inserção, que a Associação Amato-Lusitano garante nunca ter sido publicado na sua crónica “A Voz do Cigano”, também os números que são alegados: “3500 euros de RSI para 4 pessoas já não dá para a gente se governar”, não são verídicos. Cada família recebe em média pouco mais de 260 euros por mês.
Assim, segundo a classificação do Observador, este conteúdo é:
ERRADO
No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:
FALSO: As principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de factchecking com o Facebook.