Tive hoje a oportunidade de ler o artigo de opinião do Senhor Primeiro Ministro relativamente ao tema da habitação. Não soubesse eu a ocupação do autor diria que se tratava de uma carta de um putativo candidato a ministro da Habitação. Isto porquê? Mais do mesmo: fizemos o programa X, investimos aqui e aumentámos ali. Tudo muito interessante exceto que demonstra um total alheamento da realidade dos portugueses. Fora a cartilha socialista e os elogios aos camaradas, nada de novo foi acrescentado (este texto foi escrito antes do fim do conselho de ministros sobre Habitação).

Quem procurou casa nos últimos tempos sabe que os programas abrangem uma pequena franja da sociedade portuguesa. Para além disso, a densidade burocrática e limitações impostas aos acessos tornam virtualmente impossível beneficiar destes apoios, ou no mínimo desencorajam o cidadão de sequer pensar em fazê-lo.

Novamente o único espaço deste artigo dado aos jovens refere-se ao Porta 65. Porque, como é de conhecimento geral, este programa resolveu todos os problemas de habitação e nem sequer existem jovens qualificados a ter que dividir casa com 3 e 4 pessoas para suportar a renda. Pegue-se no caso dos valores máximos para o concelho de Lisboa (consultado a 16 de fevereiro de 2023). Onde é que o Senhor Primeiro Ministro aconselha procurar um T2 a uma renda máxima de 1150 euros, quando isso é o valor mais comum para um T1 (baseado na minha recente procura de casa)?

No entanto, para além da publicidade ao Porta 65, faltou uma mensagem mais direcionada e menos burocrática aos jovens em início de carreira que se vêem obrigados a suportar rendas que ultrapassam largamente a taxa de esforço recomendada. É engraçado que enderecei preocupações e exemplos reais relativos a estes temas e mais uns quantos numa carta enviada ao gabinete do Senhor Primeiro Ministro e não obtive qualquer resposta. É também engraçado, para não dizer desesperante, que estas tão aguardadas medidas em nada vão ajudar a classe média, que se tem visto altamente fustigada pela crise económica e social que atravessamos. E note-se que não estou a ser pessimista. Só constato que o problema da habitação faz parte de um problema muito mais abrangente: os portugueses não têm dinheiro. Não temos condições para acompanhar a evolução do mercado que em si tem seguido as tendências europeias, enquanto o nível de vida dos portugueses tem sofrido uma dramática regressão. Desta forma, atacar o problema da habitação por si só não vai resolver o problema de fundo criado pelos salários baixos (comparando com os outros países europeus) em associação com uma brutal carga fiscal.

Ora, vendo bem e pegando nas palavras do Senhor Primeiro Ministro, de facto o governo não começou pelo telhado da casa mas sim pela caixa do correio, com anúncios, propostas e promessas tão característicos do modus operandi do PS. Entretanto, os alicerces apodreceram e a casa está prestes a ruir. Falta pujança e força de vontade, ou talvez seja só mesmo falta de criatividade para este governo atacar a situação de precariedade, pobreza e, em geral, de dificuldades que o nosso país atravessa. E por fim uma mensagem que é recorrente mas nunca é de mais repetir: falta ouvir os jovens (de preferência os que não têm cartão de militante) e de trazer novas ideias e metodologias para encarar o futuro negro que por este andar nos espera.

E por isto dou um 2/5 ao artigo, apenas por conta da boa prosa, porque do conteúdo já estamos cansados.

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