A Inteligência Artificial (IA) está a redefinir o futuro da Medicina, oferecendo ferramentas poderosas para diagnóstico precoce, gestão de riscos e melhoria de sistemas de saúde. No entanto, à medida que abraçamos estas inovações, devemos considerar um imperativo que não pode ser ignorado: a responsabilidade ambiental.

A utilização de IA na Medicina cresce a um ritmo acelerado. Modelos avançados, como os que integram algoritmos de aprendizagem profunda, consomem energia em volumes alarmantes. Desde 2012, a potência computacional necessária para treinar modelos de IA tem duplicado a cada 3-4 meses. Atualmente, servidores de IA consomem entre 85 a 134 terawatts-hora por ano, representando cerca de 1% do consumo global de eletricidade. Cada modelo de IA treinado consome energia suficiente para cerca de 200 viagens de carro entre Lisboa e Porto. Este consumo tem implicações diretas no aumento das emissões de carbono, destacando a necessidade urgente de soluções mais sustentáveis.

Para enfrentar este desafio, a comunidade científica começa a implementar práticas mais responsáveis. Uma delas é o uso de computação na nuvem, que centraliza recursos e reduz o desperdício energético.  Outra abordagem relevante é a utilização de energia renovável para alimentar os centros de dados, promovendo a transição para fontes mais limpas e sustentáveis. Em acréscimo, o design modular de hardware, que permite a atualização de componentes individuais em vez de substituir sistemas inteiros, ajuda a minimizar o desperdício eletrónico e a prolongar a vida útil dos equipamentos, reduzindo ainda mais o impacto ambiental.

Outra estratégia essencial é a transparência no relato das emissões associadas à IA. Embora setores como a aviação já adotem práticas semelhantes, na Medicina este passo ainda é raro. Integrar métricas de consumo energético e emissões de carbono nos critérios de avaliação de projetos de IA não só promove a sustentabilidade como estabelece padrões claros para futuras inovações. O desenvolvimento de algoritmos mais eficientes e de baixo consumo energético também desempenha um papel crucial, devendo ser premiado no acesso a financiamento público para a investigação. Nem todas as perguntas científicas exigem modelos altamente intensivos em recursos. Reduzir a complexidade computacional, mantendo resultados clinicamente úteis, é uma abordagem viável que pode equilibrar inovação com sustentabilidade.

Estamos perante uma oportunidade única de moldar o futuro da saúde digital. A IA pode ser tanto uma ferramenta para melhorar a vida humana como um motor de transformação responsável para o planeta. Para tal, é essencial que instituições de saúde, investigadores e decisores políticos colaborem na construção de um ecossistema que integre inovação e sustentabilidade.

O caminho é claro: a Saúde Digital deve ser não só eficiente e inclusiva, mas também ambientalmente responsável. A verdadeira revolução não está apenas na tecnologia que usamos, mas na forma como escolhemos utilizá-la para beneficiar a humanidade sem comprometer o futuro do planeta.

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