Uma crise global, que em Portugal se manifestou em março, levou-nos a todos para longe da nossa zona de conforto e, por uma questão de sobrevivência, empurrou-nos para uma unilateralidade e solidão sem precedentes.

O distanciamento social e as medidas de segurança afetaram não só a forma como cada um de nós vive os seus relacionamentos interpessoais, como também a nossa própria perceção de empatia. Levanta-se a questão: será que estamos a viver uma crise global empática?

Neste artigo publicado na plataforma científica Frontiers, The Psychological and Social Impact of COVID-19: New Perspectives of Well-Being” afirma-se que houve uma evolução no conceito de empatia, nos últimos meses. Afastamo-nos uns dos outros fisicamente, mas saltamos para os mais variados ecrãs com o objetivo de nos relacionarmos diariamente, tanto do ponto de vista pessoal, como profissional.

As pessoas identificam-se mais facilmente com quem sofre, compreendem e revêem-se nas situações e dificuldades pelas quais passam os seus amigos, familiares e vizinhos. Isto deu origem a várias ações solidárias e humanitárias realizadas em nome individual, em grupo ou mesmo através da criação de movimentos de impacto.

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Houve três movimentos que foram, para mim, incontornáveis este ano: o #tech4COVID19, pela importância que assumiu a mobilizar esforços e a inspirar os portugueses a juntarem-se para fazer uma diferença efetiva na luta contra a Covid; o #compraospequenos, que veio apresentar e apoiar a pequena economia; e a Cooperativa Rizoma, que nasceu no início do ano e que, com a chegada da pandemia, sentiu um crescimento significativo do interesse da comunidade local em fazer parte de um modelo de mercearia colaborativo, ecológico, justo e acessível. Destaco, de seguida, o conceito e a missão destes que considero que foram os melhores exemplos a nível nacional de união e empatia.

#tech4COVID19

Não somos mais B2B, ou B2C; somos H2H – Human to Human.

Criatividade, disponibilidade e solidariedade são as palavras de ordem que estão na base do #tech4COVID19. Este foi, para mim, o movimento do ano. Nasceu de uma forma espontânea, pela mão da comunidade tecnológica portuguesa, e diferenciou-se precisamente pelo seu caráter de “Humano para Humano”, que lhe valeu uma mensagem de gratidão e louvor do Presidente da República.

Neste momento, o movimento #tech4COVID19 conta com mais de cinco mil voluntários, entre os quais engenheiros, cientistas, designers, marketeers, profissionais de saúde, entre outras especialidades, e continua a unir o talento português com o objetivo de ajudar a população a ultrapassar o desafio da Covid.

#compraaospequenos

A pequena economia de amanhã depende de nós hoje.

O #compraaospequenos apoia os pequenos negócios e empreendedores portugueses que lutam pela subsistência durante a crise atual. São muitos os negócios que sofrem e uma percentagem significativa teve a necessidade de se reinventar na totalidade para sobreviver e adaptar-se às necessidades atuais do público.

O movimento criou uma lista, na qual mapeia os pequenos negócios que têm ofertas adaptadas à situação de isolamento que vivemos. Ajudar é simples: em vez de nos apressarmos a ir ao shopping, basta consultar esta lista e mudar um pouco a nossa rota. Fazermos as nossas compras na pequena economia faz toda a diferença.

Cooperativa Rizoma

Uma iniciativa de vizinhos para vizinhos, que quer trazer para Portugal um modelo de mercearia colaborativo, ecológico, justo e acessível.

Foi em janeiro deste ano, num jantar entre amigos, que nasceu o projeto da Cooperativa Rizoma. À mesa, enquanto discutiam a dificuldade de encontrarem alimentos de qualidade nas grandes cidades, a preços acessíveis e com uma margem justa para o produtor, surgiu a ideia de criarem uma mercearia comunitária e participativa que pertencesse aos próprios membros e que por eles fosse gerida.

Este projeto foca-se sobretudo em valores sociais, ecológicos e colaborativos; o lucro ocupa um lugar secundário. Estes eixos refletem-se na intervenção que pretendem ter na cadeia de produção e distribuição de bens de necessidade básica, através do contacto direto com o produtor – saltando intermediários -, da promoção de métodos de produção agro-ecológicos e éticos e do trabalho em rede dentro da própria comunidade.

A empatia está viva e de boa saúde. Pode ter assumido novas formas, mas é seguro dizer que não se dissipou nem pelo medo, nem pela insegurança, nem pela instabilidade. A empatia está viva e há-de continuar a viver e a evoluir através de cada um de nós. Nas palavras de Jana Stanfield, “I cannot do all the good that the world needs. But the world needs all the good that I can do.

Rita Ferreira é licenciada em Ciências da Comunicação: Jornalismo, Assessoria e Multimédia, pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto, e mestre em Gestão de Marketing, pelo IPAM. O seu percurso profissional começou no mundo corporate, nas áreas de assessoria de imprensa e de comunicação, mas a grande necessidade de criar impacto – razão pela qual também fez voluntariado – fê-la entrar neste ecossistema. Já tendo passado por várias áreas – comunicação de marca, relações públicas, gestão de comunidade, experiência do utilizador, marketing e branding – aplica agora os seus conhecimentos ao serviço do Impacto e da Inovação Social. No IES – Social BusinessSchool é responsável pela Comunicação e pelo Marketing.

O Observador associa-se à comunidade Portuguese Women in Tech para dar voz às mulheres que compõe o ecossistema tecnológico português. O artigo representa a opinião pessoal do autor enquadrada nos valores da comunidade.