A Autoridade para as Condições do Trabalho ( ACT) «detectou» cerca de 17.701 trabalhadores com falsos recibos verdes tendo notificado as empresas para até 16 de fevereiro efetuarem a regularização dos respetivos vínculos laborais de contrato de prestação de serviço para contrato de trabalho. Segundo a própria ACT em comunicado foram notificadas cerca de 9.699 empresas.
As notificações seguiram para as entidades patronais e o facto residiu na premissa de que 80% do valor facturado por determinados trabalhadores independentes recaiu sobre elas. Isto é, um determinado trabalhador independente no total da sua facturação anual cerca de 80% desse valor foi realizado a só uma entidade.

O fundamento principal para a decisão da ACT foi apenas a dependência económica dos trabalhadores em só uma entidade patronal e por esta razão, há então um entendimento -que parece ser excessivo, ou pelo menos vazio de conhecimento-para que se configure a existência de uma relação de trabalho dependente com base num mero princípio.

Para a ACT um só elemento consignado na Lei , será o bastante para que seja considerado o vínculo dependente e não independente, carecendo de regularização da situação e integrar os “trabalhadores independentes ” com contrato de prestação de serviços a contratos de trabalho.

Na verdade, uma das características que subjaz a uma relação laboral é de facto a dependência económica, no entanto, para que possa existir uma verdadeira relação jurídica materializada na existência de um contrato de trabalho dependente terá que existir outros aspectos e não só o que dá fundamento às notificações que agora a ACT faz chegar às empresas para que juridicamente se possa presumir e considerar a existência de um contrato de trabalho.

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Ora, para que haja uma relação de trabalho dependente que configure a obrigatoriedade de um contrato de trabalho haverá pelos menos dois princípios dos vários elencados no artigo 12. da Lei 7/2009 de 12 de fevereiro.
Presume-se a existência de contrato de trabalho quando, na relação entre a pessoa que presta uma actividade e outra ou outras que dela beneficiam, se verifiquem algumas das seguintes características:
a) A actividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado;
b) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da actividade;
c) O prestador de actividade observe horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo beneficiário da mesma;
d) Seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de actividade, como contrapartida da mesma;
e) O prestador de actividade desempenhe funções de direcção ou chefia na estrutura orgânica da empresa.

Sem fiscalização alguma, a ACT, meramente de forma de aleatória motivada por meras obrigações declarativas- opinião pessoal- presumiu então que nestas 9.699 empresas, 17.701 dos colaboradores, são trabalhadores dependentes e estão em situação irregular sem vínculo laboral efectivo. Tomando por verdade que de facto há situações irregulares e que verdadeiramente algumas empresas ferem a lei em que a presunção da existência de um contrato de trabalho é de aplicar, outras haverá que assim não é.
Não podemos aceitar que de uma mera notificação sem qualquer fiscalização prévia ou recolha de dados concretos e objectivos se conclua que estamos perante falsos recibos verdes.
Quantas empresas agora notificadas, como os trabalhadores independentes, têm na sua esfera laboral de facto trabalhadores independentes e que possuem um verdadeiro contrato de prestação de serviços? Como nada foi averiguado de forma séria para se fazer cumprir a Lei, então todos são falsos recibos verdes.

Tomemos como exemplo, um jovem arquiteto que tomou em mãos um desafiante projecto. Por essa razão grande parte do seu tempo de trabalho é dedicado a um só cliente com quem estipula um determinado valor mensal de honorários. Só por essa razão poder-se-á presumir que o “recibo verde” é falso?
Hávera neste exemplo uma verdadeira dependência económica? Se é verdade que existe ela não é suficiente para se presumir a existência de um contrato trabalho dependente.
Outras questões haverá, sem prejuízo de opinião diferente para que se consiga aferir a realidade de acordo com o quadro legal em vigor. No exemplo atrás referido, o arquiteto tem liberdade artística tendo em conta a pretensão do seu cliente, mas receberá dele ordens expressas de como deve exercer a sua actividade? Tem o arquiteto um horário pré- estabelecido para trabalhar?
O local da sua actividade é no seu atelier ou é no local do seu cliente/ beneficiário, podendo em algumas circunstâncias ser nos dois.
A quem pertence os instrumentos de trabalho do arquiteto?
Tudo isto deve ser observado para que se consiga distinguir o que de facto é ou não um falso recibo verde não bastando aferir um só elemento que a Lei indica para que se considere sem mais a existência de uma presunção de trabalho dependente.

O combate à preclaridade é feito com uma fiscalização apertada e acompanhamento in loco e não por uma mera notificação que peca por manifesta falta de fundamentação legal.
A ACT, lança mão de uma notificação que envia às empresas e não distingue o bem do mal, porque simplesmente não fiscalizou e só esta razão será suficiente para por em causa o comportamento de uma entidade que tem como missão o combate à verdadeira precariedade laboral para aferir qualquer situação verdadeiramente irregular como é seu dever.
Podemos dizer, com um elevado grau de certeza que a ACT não está a cumprir a sua função, seja porque não tem meios humanos ou outros, mas é impensável, que – até pela evolução no mundo do trabalho aos dias de hoje- uma entidade com esta notifique para regularizar uma qualquer situação sem a verificar e fiscalizar primeiro.
Pensaria que a Autoridade para as Condições do Trabalho saberia o que era uma presunção de um contrato de trabalho, mas as notificações em massa que muitas empresas e trabalhadores independentes receberam prova mais uma vez, que não se sabe o que se anda a fazer socorrendo-se da forma mais fácil e sem qualquer averiguação.

Quando não se sabe o que se anda fazer, que se pergunte para se aprender e creio que nesta instituição haverá juristas capacitados para que se perceba o que está na Lei, mesmo que estes estejam no exercício das funções de forma “ independente” mas que são de facto economicamente dependentes a exercer o seu trabalho nas instalações da própria ACT, com um horário estabelecido de acordo com a sua “chefia “sob as suas ordens e ainda com a utilização dos meios e equipamentos da instituição, auferindo uma quantia certa com determinada periodicidade.
Tudo sabemos como isto pode acabar e sem qualquer necessidade, haverá por certo litígios na área fazendo perder tempo e dinheiro a todos os envolvidos porque a ACT não cumpriu a Lei nem fez o trabalho de campo.
De qualquer forma estou com alguma curiosidade para saber quantas foram as empresas públicas que a ACT também notificou e quantos trabalhadores independentes detectou com verdadeiros falsos recibos verdes.