Nos dias que correm, costuma dizer-se que o que não se comunica, não existe. A Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) tem essa missão ingrata de trabalhar na sombra e de quase nunca se conhecer a sua ação. Como uma das suas missões é evitar crises sanitárias, normalmente, quando se comunica com estrondo algo sobre a DGAV, é porque surgiu uma crise que a DGAV, no seu ofício silencioso, não foi capaz de impedir.

No passado dia 14 de agosto, foi declarado um foco de Gripe Aviária de Alta Patogenicidade, do subtipo H5N1, numa exploração de detenção caseira de aves, no concelho de Viana do Castelo.

A propagação do vírus da Gripe Aviária a partir de um foco, pode representar prejuízos económicos muito avultados no setor da avicultura, uma diminuição drástica da oferta e subida do preço ao consumidor da carne de aves.

Além disso, vírus do subtipo H5N1 pode infetar humanos e provocar doença grave e morte. Uma das maiores preocupações dos especialistas em saúde pública é a de que um vírus do subtipo H5N1 possa sofrer uma mutação que lhe permita, não só infetar humanos, como transmitir-se de humanos para humanos, algo que ainda não aconteceu, mas que, a acontecer, representaria uma pandemia de proporções e impacto inimagináveis, só comparada à pandemia de gripe espanhola que, entre 1918 e 1920, matou cerca de 50 milhões de pessoas em todo o mundo.

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Pois, no feriado de 15 de agosto , um grupo de mais de uma dezena de elementos da Direção de Serviços de Alimentação e Veterinária da Região Norte, entre eles médicos veterinários, assistentes técnicos e assistentes operacionais, juntamente com a médica veterinária municipal de Viana do Castelo, com elevado sentido de missão e com plena consciência do momento que viviam, vestiram os fatos protetores (EPI) e neles estiveram ao calor, durante 2 dias, no foco, a eliminar fontes de contaminação e nas explorações envolventes, acompanhados pelas forças de autoridade, a colher amostras das aves para testagem em laboratório. Um trabalho hercúleo, num contrarrelógio contra a propagação do vírus.

Decorridos 30 dias do surgimento do foco de Gripe Aviária de Alta Patogenicidade, a DGAV levantava as restrições impostas no Edital n.º 25, na ausência de qualquer evidência de propagação do vírus a outras explorações.

Todos os meios de comunicação se apressaram a dar nota do surgimento daquele foco de Gripe Aviária de Alta Patogenicidade. Nenhum deles deu nota acerca da mitigação e eliminação total das ameaças que poderiam surgir daquele foco de Gripe Aviária de Alta Patogenicidade, nem do labor incansável daquele grupo de pessoas. E é bom sinal. Se não se fala da DGAV é porque já não existe uma situação de crise sanitária.

Porém, este silêncio, que é, no fundo, o melhor reconhecimento para a atuação da DGAV, é também a sua maior ameaça. Na opinião pública, a DGAV não existe ou não se conhece a sua missão e esta falta de reconhecimento repercute-se depois nas prioridades dos decisores políticos. A DGAV tem sido sucessivamente desprovida de quadros técnicos e de meios.

Veja-se o exemplo de algumas Divisões de Alimentação e Veterinária (DAV), que, mantendo a lógica orgânica de proximidade da DGAV, servem amplas regiões e conseguem resolver de forma irrepreensível crises sanitárias como a decorrente daquele foco de Gripe Aviária de Alta Patogenicidade, além de assegurarem todo o trabalho programado com o objetivo de prevenir novas crises. Muitas destas divisões, lidam com perdas de funcionários, quer médicos veterinários, quer assistentes técnicos, mantendo as mesmas competências, ou inclusivamente, acrescendo novas.

O défice de recursos humanos não se limita a estas DAV, ou à Direção de Serviços onde se integram, estendendo-se às restantes unidades desconcentradas. É igualmente importante realçar que o último procedimento concursal comum para contratação de 4 técnicos superiores para a Direção de Serviços de Alimentação e Veterinária do Norte, não incluía um único médico veterinário.

O Mapa de Pessoal da DGAV prevê 1.136 funcionários, mas o número de funcionários está algumas centenas aquém, e já inclui uma quantidade de trabalhadores em jornada contínua ou em teletrabalho, instrumentos previstos na lei, mas que condicionam muito a execução do trabalho externo, que é maioritário nas DAV. A DGAV tem espalhadas no território continental 5 Direções de Serviço e 19 Divisões de Alimentação e Veterinária, a que acrescem 21 Núcleos, que prestam um serviço exemplar de proximidade e de coesão de território e se confrontam com uma hipótese sombria: limitarem-se a ser meros balcões de atendimento e depois deixar de existir, não porque não se justifique a sua existência, mas porque não têm recursos humanos para exercer as suas competências junto dos produtores pecuários – e há-os mais em Moimenta ou no Crato que no Campo Grande.

Necessitamos uma DGAV forte, capacitada, atuante e abrangente a todo o território nacional. É chegada a hora de prever mais investimento na DGAV para além do recentemente anunciado em Orçamento de Estado para 2025. Precisamos de uma maior valorização e capacitação dos seus recursos e também uma gestão mais eficiente desses mesmos recursos. E sim, necessitamos de criar a carreira médico-veterinária para garantir a vinculação de profissionais à administração pública e atestar ao nível internacional a qualidade do trabalho dos médicos veterinários, que são mais do que meros técnicos superiores, são médicos que zelam pela saúde de todos nós, através da medicina exercida nos animais, vigiando as suas relações e interdependências e zelando na grande maioria das vezes silenciosamente por Uma Só Saúde.

Saibamos compreender que a discrição da DGAV, que é intrínseca à sua missão, não deve condená-la à indigência. A DGAV é um pilar fundamental para a proteção da saúde pública e ela é absolutamente essencial para a manutenção da qualidade de vida de que gozamos. Saibamos todos reconhecê-la e valorizá-la. Saibamos defendê-la e saibam os decisores políticos acautelá-la por um futuro saudável e próspero.