Sempre que falamos de inovação, a tendência é a de complicarmos, à cabeça, o processo. Pensamos que temos de inventar algo completamente novo, que mais ninguém pensou e que seja um reinventar da roda. Na realidade, a inovação é muito mais simples do que parece. Mesmo quando, como acontece com a inovação social, se procura resolver ou mitigar problemas muito complexos.
Noventa por cento das pessoas que sofrem de doenças oculares vivem em países subdesenvolvidos. Grande parte dessas pessoas vivem na Índia onde, pela dimensão e caracterização socioeconómica do País, a obtenção a cuidados médicos nesta área é economicamente inacessível, tornando estas doenças muitas vezes causa de morte. O Doutor V. – como é conhecido no país – criou a Aravind Eye Clinic, concebendo um modelo revolucionário que, depois de implementado, até parece simples. Começando pelas cataratas, que têm uma grande incidência nesta região, percebeu que o que tornava as cirurgias inacessíveis era o alto custo/hora do trabalho dos cirurgiões. Para além disso, constatou que o tempo de intervenção efetiva do cirurgião numa operação deste tipo, era muito curto, considerando o tempo total da mesma. Inspirado pelo modelo de negócio da McDonalds – produção em série, mantendo a qualidade do produto –, montou um sistema no qual um cirurgião, numa hora, em vez de intervir em um só paciente, intervinha em 10. Para além disso, criou um serviço, de alta qualidade, com instalações premium, para clientes com capacidade de pagar, criando um modelo de subvenção cruzada no qual parte das receitas destes clientes é usada para cobrir os custos de clientes que não podem pagar – o modelo Robin Hood. Com isto e com outras inovações que foi criando, o Aravind Eye Care System conseguiu salvar as vidas de muitos milhares de pessoas e desenvolver um modelo que, segundo as medições de impacto e em termos comparativos, se tornou mais eficaz e mais eficiente, em muitas áreas, do que o sistema de países como o Reino Unido. Inventou alguma coisa? Não. Observou a realidade tal como ela existia, nas suas diversas partes, e associou-lhe inspirações vindas de outros modelos que já existiam.
Mas não são apenas empreendedores inspirados que veem o que muitos não conseguem ver e que, movidos pela sua paixão e competências, resolvem problemas sociais e ambientais um pouco por todo o mundo, através da inovação social. Muitas empresas percebem agora os enormes benefícios, não apenas para pessoas, comunidades e planeta, como também para os seus próprios negócios, de aplicarem os modelos e ferramentas desta aproximação à inovação. O IKEA cria relações de longo prazo com a sua cadeia de valor, investindo nos seus fornecedores, por exemplo através da criação de um código de conduta e um sistema de monitorização de exploração infantil, desenvolvido em conjunto com a UNICEF (Save the Children); a Danone, com base em estudos sobre hábitos de saúde de 52 países, desenvolveu produtos adequados às necessidades nutricionais de cada País – no Brasil, por exemplo, reformularam um queijo que era produto estrela, reduzindo o açúcar e acrescentando vitaminas e no Bangladesh, com o iogurte Shokti-Doi, rico em nutrientes, servem 600.000 crianças com problemas de nutrição por semana. Inventaram alguma coisa? Não. Uma vez mais observaram, focaram a sua lente na criação de valor que, em simultâneo, melhorasse o negócio ou gerasse novo negócio e, com isso, inovaram gerando impacto positivo na vida de muitas pessoas.
A inovação social não é um quebra-cabeças. Mas sim – precisa de foco, empatia, vontade de ação e determinação no caminho. E está ao alcance de todos.