O recente ataque perpetrado contra imigrantes, na cidade do Porto, veio demonstrar que se está a avolumar em Portugal um problema, com contornos graves, no que concerne às políticas de integração e acolhimento de imigrantes, problema esse do qual já não é possível alhearmo-nos, fingindo que não existir.

Deitando por terra a ideia de Portugal ser um país exemplar neste âmbito, o recém divulgado número de cerca de quinhentos mil processos em atraso na AIMA ( Agência para a Integração de Migrantes e Asilo) vem sedimentar o clima de preocupação sobre a matéria em causa, especialmente depois de ter sido noticiada crescente apreensão, por parte da União Europeia, no que diz respeito a falhas de Portugal na execução de medidas e políticas migratórias inscritas no Pacto para as Migrações, aprovado em Fevereiro do ano em curso.

A aparente inoperância da AIMA, um organismo que, claramente, parece não cumprir o propósito que esteve na base da sua criação, aliado a uma catadupa de dúvidas emanadas da União Europeia, designadamente no que se refere à capacidade de Portugal poder continuar a garantir o cumprimento do Acordo de Schengen, garantindo a livre circulação de pessoas, bens e serviços no espaço europeu, geram inequívoca preocupação e carecem de imediata resolução por parte dos decisores políticos.

Poderá dizer-se que uma imigração descontrolada poderá ser sinónimo de não existência de condições para integrar. Poderá dizer-se que uma imigração descontrolada poderá ser sinónimo de uma falência nos processos de inclusão.

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Estará isso a acontecer no território nacional?

Estará a crescente demanda migratória a asfixiar a capacidade que até então permitiu a inclusão e integração dos imigrantes?

Parece inequívoco que a pressão migratória internacional e mudança no âmbito dos fluxos migratórios tem vindo a contribuir para que Portugal seja hoje em dia ponto de confluência de um número cada vez mais significativo de imigrantes de variadas nacionalidades. Essa nova realidade tem vindo a transformar o país, que é hoje um caldeirão pluricultural onde urge potenciar o diálogo intercultural, para assim colmatar o défice de conhecimento existente no âmbito da diversidade existente, evitando o preconceito associado, bem como a disseminação de uma narrativa de ódio dirigida à comunidade de imigrantes e que facilmente pode desencadear o eclodir de conflitos.

A dimensão actual do fenómeno imigratório em Portugal já não se circunscreve às cidades mais densamente povoadas e é agora uma realidade existente, de forma transversal, em todo o território nacional. As cidades de dimensão mais reduzida passaram a ser procuradas por imigrantes, atraídos pelo não só pelo custo de vida mais vantajoso, como pela possibilidade de encontrar com mais facilidade uma habitação condigna para viver, mas também pela eventual existência de ofertas de trabalho que exijam menor qualificação, designadamente no sector agrícola.

Esta recente mudança, que se tem vindo a verificar e que está à vista de todos, não estará, no entanto, na grande maioria dos municípios portugueses, a ser acompanhada por consequente e responsável monitorização. Muitas autarquias, como que alheias a este fenómeno, não conhecem as comunidades imigrantes existentes nos seus territórios e, como tal, não estão capacitadas para identificar e desenvolver aquelas que seriam as políticas de integração e inclusão mais adequadas. Ora, este desconhecimento, daquelas que são novas realidades concelhias poderá desembocar num perigoso desajuste das dinâmicas sociais e económicas com consequências graves, muitas delas imprevisíveis, a vários níveis, quer para os imigrantes, quer para as populações onde estes estão inseridos e também para o próprio território.

A imigração, sob vários pontos de vista, é importante para o nosso país, quer para as grandes cidades, quer para as cidades de menor dimensão. A diversidade cultural que lhe está associada, vertida nas artes, na literatura, na gastronomia, bem como em muitas outras áreas, é já uma mais valia indesmentível. O trabalho assegurado pelos imigrantes, nos mais diversos sectores, tornou-se imprescindível para suprir falhas e constrangimentos que não poderiam ser supridas de outra forma. O clarear dos números obscuros da demografia portuguesa pelos imigrantes tem sido uma lufada de ar fresco por motivos óbvios. No entanto, é necessário acautelar que os imigrantes tenham uma vida condigna quando para o nosso país venham morar, seja nas grandes cidades como nas cidades de dimensão mais reduzida. É necessário que não se possam perpetuar situações de constante dificuldade para obter documentação, sendo preciso assegurar o adequado funcionamento dos serviços que actuam neste âmbito. É necessário assegurar condições de trabalho justas com direitos que sejam proporcionais aos deveres que lhe estão associados. É necessário acautelar o acesso aos cuidados de saúde, à educação, à habitação, erradicando situações de arrendamentos ilegais muitas das vezes em habitações sem licenças de utilização e com sobrelotação do espaço. O que tem de ser feito para integrar e actuar na inclusão de imigrantes terá de ser executado com comprometimento de todos e cada um, num esforço comum que seja capaz, para além de muitas outras coisas, de assacar responsabilidades a quem destas pessoas se tenta aproveitar, unicamente por estarem numa condição de vulnerabilidade e incapacidade de ripostarem convenientemente.

Se este caminho não for feito o Estado corre o sério risco de poder vir a perder o controlo da ordem pública o que irá unicamente ajudar o discurso político fundado na normalização do mal que é preconizado pelo racismo, pelo ódio, pelo preconceito e que, lentamente, vai legitimando a culpa colectiva de certos grupos de pessoas como é o caso dos imigrantes possibilitando a ocorrência de crimes de ódio como os que recentemente ocorreram.