O Governo comprometeu-se a apresentar em Setembro deste ano a estratégia portuguesa para a inserção das redes móveis de quinta geração, vulgarmente denominadas de “5G”.
Em Março de 2018, a Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM) tinha anunciado que estava a preparar o lançamento do 5G, nomeadamente através de um procedimento de consulta pública relativo à libertação de espectro, particularmente das faixas de 700MHz, anteriormente utilizadas para serviços audiovisuais.
Nos termos acordados com Bruxelas, até 2020, Portugal deverá disponibilizar o acesso à rede 5G.
O 5G promete ser um marco na forma como se processam as interacções entre a sociedade e a tecnologia. Mais do que em qualquer outra altura, as fronteiras entre o mundo “real” e “virtual” vão ser ténues ou inexistentes.
A diminuição da “latência”, isto é, os tempos de espera para abertura de conteúdos online, as velocidades a alcançar (que prometem ser 10 a 100 vezes superiores às atingidas pelas redes de quarta geração, podendo atingir os 20Gbps e os 500Km/hora) e o grande número de dispositivos ligados (1 milhão / Km²) podem ser a chave para a verdadeira revolução tecnológica do século XXI.
Uma (re)revolução
Nos últimos 40 anos, o mercado de telecomunicações sofreu sucessivas revoluções.
Introduzida em 1980, a tecnologia de primeira geração veio permitir as primeiras transferências de dados por via “celular”, permitindo apenas comunicações de voz. Uma década depois foi introduzida a segunda geração, que permitia, de forma digital e encriptada, a transferência de dados e uma utilização mais eficiente do espectro. No seguimento da segunda geração, evolui-se para o denominado 2,5G que introduziu as bases para o que hoje chamamos de internet móvel (WAP). A tecnologia de terceira geração permitiu a introdução das “videochamadas” e do acesso (relativamente) rápido à internet móvel. A tecnologia de quarta geração veio banalizar a utilização dos ecossistemas de aplicações e permitiu que a internet móvel se tornasse uma verdadeira alternativa ao tradicional acesso físico, nomeadamente a fibra óptica.
O impacto do 5G será substancialmente mais forte. A MIT Technology Review descreve a introdução do 5G como uma mudança de paradigma semelhante à transição da máquina de escrever para o computador.
O impacto jurídico do 5G
A nível jurídico, todas as áreas serão fortemente impactadas. Desde as áreas de Telecomunicações, Media e Tecnologias de Informação (TMT), enquanto área core regulatória, passando pelos direitos de autor, pela propriedade industrial e pelo direito das tecnologias de informação, com o desenvolvimento tecnológico que se fará sentir.
Iremos também assistir a uma flexibilização dos locais de trabalho, reduzindo-se a necessidade da presença física de pessoas e aumentando a autonomia geográfica dos recursos humanos. Empresas e empregadores terão de encontrar formas de garantir a segurança destes novos “locais de trabalho 5G”. O aumento do trabalho remoto irá também gerar novos dilemas na separação entre a vida pessoal e profissional, que se antecipa que serão mais facilmente confundidas, sem falar nas questões associadas, por exemplo, à responsabilidade por acidentes laborais durante o horário de trabalho, nos casos de trabalho remoto.
A Internet das Coisas (“IoT”), os veículos autónomos, as realidades virtuais e aumentadas trazem também inúmeros desafios. Se os veículos autónomos levantam questões pertinentes de responsabilidade civil e penal, a IoT coloca reais desafios de privacidade e de tratamento de dados pessoais a uma escala nunca vista.
O novo Código Europeu das Comunicações também prevê soluções para alguns destes desafios. Este diploma pretende incentivar o aumento da concorrência e do investimento em comunicações electrónicas, uma melhor e mais eficiente utilização de radiofrequências, maior protecção dos consumidores e um ambiente mais seguro para os utilizadores, bem como regras mais seguras e equitativas para prestadores de serviços em linha.
É difícil para o legislador responder de imediato a todos estes desafios. Algumas das soluções para estes temas apenas poderão ser colmatadas a nível supra nacional, nomeadamente pelo legislador europeu. A promoção do mercado único digital, com legislação harmonizada, uma (ainda) maior concertação global, em matéria de privacidade, um reforço dos mecanismos de portabilidade de dados, novas formas de definição do foro legal das transacções/operações/litígios e um reforço da responsabilização individual e da chamada accountability individual são algumas das possíveis soluções que o legislador deverá considerar.
Espera-se que o direito consiga alcançar com sucesso o objectivo de acompanhar a tecnologia, assumindo um papel de aliado, primordial nesta revolução tecnológica.
Advogada Coordenadora do Departamento de Propriedade Intelectual, Dados Pessoais e TMT da Cuatrecasas e Advogado Associado da Cuatrecasas