Muito se discute, especialmente à direita, qual o rumo e os limites do relacionamento com o Chega. Pois bem, se o ditado diz dá-se a mão, querem logo o braço, eu por mim digo que ao Chega não se estique nem um dedo.

A dinâmica e função dos partidos políticos, como salvaguarda da democracia, é muitas vezes desconsiderada. O distanciamento é indicado, pelos cientistas políticos e pelos exemplos históricos, como a ferramenta mais eficaz no afastamento do extremismo e autoritarismo.

A relação entre Rafael Caldera e Hugo Chavez, marcada pelos vários discursos de apaziguamento que culminaram num indulto, permitiram a Hugo Chavez uma capacitação política que lhe permitiu ter credibilidade suficiente para ser considerado um candidato verosímil. Este é um mero exemplo de como cada ação política de apaziguamento ou normalização de discursos populistas autoritários com motivações antidemocráticas ou antisistema raramente é tão inofensiva como parece.

A permeabilidade do espaço político a este tipo de discurso fragiliza a democracia e o funcionamento das instituições democráticas.

O relacionamento entre o Chega e o PSD, no enquadramento nacional e a um ritmo distinto, pode vir a ser comparável à capacitação da ascensão de vários regimes que vieram a fragilizar, e eventualmente a quebrar, as suas democracias, até aí saudáveis.

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A importância do partido político enquanto bastião da democracia é cada vez mais um instrumento fundamental para garantir a democracia e impossibilitar que candidatos com ideais extremos ganhem espaço dentro dos partidos.

A Bélgica dos anos 1936 e seguintes, num espetro, à data, com dois partidos de extrema-direita (Partido Rexista – “Rex” – e a União Nacional Flamenga – “Vlaamsch Nationaal Verbond”), com resultados estrondosos nas eleições, foi palco de um exemplo interessante e que convém relembrar.

O Partido Católico Belga reagiu aos resultados afirmando que qualquer coligação com estes partidos era incompatível com os valores do Partido, desenvolvendo trabalho interno de identificação de apoiantes e afastamento dos mesmos. Além disso, passou a focar o seu trabalho em chegar às bases de suporte desses partidos.

Esta estratégia culminou com a formação de um governo liderado pelo Partido Socialista como forma de evitar um governo de direita que coligasse ambos os partidos de extrema-direita.

Com estes exemplos em mente, o PSD, enquanto partido de centro-direita, tem a oportunidade de reforçar a democracia portuguesa como provavelmente nenhum partido em Portugal desde os tempos de ‘74.

Um trabalho a desenvolver a dois tempos. Por um lado, repudiando abertamente e sem margem para dúvidas qualquer entendimento ou colaboração com o Chega. Por outro, num sentido mais interno, rever as suas bandeiras e bases ideológicas de modo a poder responder aos problemas dos portugueses com soluções concretas, oferecendo uma alternativa à mão cheia de nada que André Ventura oferece aos que, e com razão, não se revêm nas soluções políticas do País.

A história ensinou-nos que dar um dedo que seja ao extremismo é aceitar a possibilidade de perder um braço. Permitir qualquer normalização de um discurso político como o que o Chega apresenta é mostrar que não aprendemos com os erros da História. Qualquer coligação com o Chega é minar o espírito do PSD e inquinar uma democracia que, como sabemos, é mais frágil do que o conforto da realidade nos leva a pensar.