Se há tema que quem se aventura a sair de Lisboa – quer a Norte quer a Sul – se apercebe é que Lisboa é o País, Portugal são os arredores.

Mais do que na presença física do poder político nacional, que as tentativas de descentralização não conseguem esconder, o “Lisbocentrismo” nota-se na falta de infraestruturas e na degradação (medível quase ao quilometro) dos serviços e unidades de Saúde e Educação.

A semana passada o Ministro Dr. João Galamba trouxe ao espaço público mais um sintoma, no longo quadro sintomático, da síndrome de “Lisbocentrismo”. No caso, “pareceu-lhe longe”, compreensível apenas para quem nunca tenha aterrado numa capital europeia ou nunca tenha feito mais que 40 km de autoestrada.

Esta síndrome de país fechado em Lisboa não vem de agora e resultou num agravamento com décadas de défice de coesão e desenvolvimento territorial que apenas políticas desenhadas a médio/longo prazo vão ser capazes de reverter.

Atendendo ao funcionamento atual do sistema político-partidário, incapaz de desenhar terreno comum entre os principais partidos, torna-se difícil, se não impossível, desenvolver políticas a médio/longo prazo, especialmente se não for possível atribuir às mesmas um efeito direto imediato nas urnas.

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O desenvolvimento fora de Lisboa passa, assim, muito por impulsos de investimento, quer estes venham de fundos europeus, privados ou municipais em função das disponibilidades do município.

A escolha da localização do novo aeroporto, nos benefícios que a maioria de nós (não especialistas em matérias de estratégia e gestão aeroportuária) consegue avaliar, figura um impulso muito necessário ao desenvolvimento do centro, apoiada por várias regiões do país, como Coimbra e as Comunidades Intermunicipais de Leiria, Médio Tejo e Beira Baixa.

Cumulando com a efetividade económica – das soluções apresentadas é, inequivocamente, a que menos dinheiro dos contribuintes leva — o desenvolvimento do novo aeroporto em Santarém figura uma oportunidade única para os jovens Portugueses do centro do país.

Ainda que seja possível, com políticas adequadas, promover a fixação de empresas fora dos grandes centros económicos, a grande maioria de oferta de trabalho especializado está e vai estar, em Lisboa. Contudo, a oferta laboral não acompanha, porque não pode acompanhar, a oferta habitacional exigida. Não podemos (nem quereríamos) morar todos em Lisboa. A comuta de 30/40 min até ao trabalho é a realidade na maior parte dos países e não está errada em si.

É, portanto, fundamental desenvolver estruturas de transporte público, sustentável, que permitam deslocações diárias em larga escala, permitindo a tantos deslocarem-se para trabalhar e, ainda assim, aspirarem a morar num local com condições de habitação dignas, economicamente acessíveis e capaz de proporcionar um estilo de vida saudável.

“Longe” deviam estar opções políticas que forçam uma habitação saturada, levando o valor da especulação imobiliária a níveis históricos. “Longe” deviam estar opções que não aproveitam os efeitos indiretos do investimento.

A escolha de Santarém como localização do novo aeroporto vai permitir um impulso necessário ao planeamento e investimento da habitação, das infraestruturas de transporte, do turismo e do tecido empresarial da região centro com benefício direto nos jovens portugueses.

O aeroporto não é uma solução mágica para os problemas do país, entenda-se. No entanto, os problemas existem e potencialmente agravar-se-ão se a construção do aeroporto não for acompanhada por políticas bem direcionadas.

Não é uma garantia, mas é um empurrão numa direção clara de crescimento, de crescimento do “Portugal real”. É um passo fora do “Lisbocentrismo” que nos aflige desde a construção da nossa democracia.

Só por isso esta opção já merece o nosso apoio, ainda que tecnicamente leigo, pelo que não podemos não reagir, não sentir ultraje, quando, entregues àqueles que veem a fronteira de Portugal nas portagens de Alverca, vemos o Ministro responsável enveredar por opiniões pessoais e desconsiderar trabalho de técnicos independentes pelo seu governo mandatados.

Se há coisa que o XXIII Governo Constitucional Português faria bem era relembrar-se que Portugal não é só Lisboa e o Estado não é o Partido Socialista.