A existência de uma crise na habitação em Portugal tem-se tornado – em função do largo hiato temporal em que se vem perpetuando – cada vez mais normalizada e aceite, o que é fator impeditivo para o combate à respetiva. Desde que a temática se centralizou na agenda política, a devida atuação tem sido feita na base do remendo em detrimento da prevenção.

Os partidos têm presumido que os impostos, ou in casu a extinção destes, é a solução para tudo, todavia não se mostram capacitados de entender a extensão do problema que tem transformado, para pior, a vida dos portugueses.

O hodierno governo, em medidas exclusivamente direcionadas aos jovens, publicita no seu programa a isenção de IMT e imposto de selo aos jovens na compra de casa, o que acompanha com a garantia pública para viabilizar o financiamento bancário da totalidade do preço da aquisição da primeira casa por jovens.

O que aparenta ser uma grande medida não se reveste de grande impacto. Ora vejamos: num cenário hipotético em que qualquer jovem proceda à compra de habitação pelo valor de 175 mil euros – o que não reflete o preço de nenhuma mansão – apenas se escusará de pagar, no máximo, 3.929,30 € na totalidade dos dois impostos.

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Neste seguimento, considerando por referência o simulador de crédito à habitação disponível do site da CGD (cujas taxas de crédito possuem certa reputação), apura-se a necessidade do jovem suportar um empréstimo com prestação mensal de 746,72 €, sendo que apenas se estão a considerar a título de empréstimo 150 mil euros.

Quando a despesa mensal se cifra tão próxima do ordenado mínimo nacional, não se verifica particularmente difícil de deslindar que o entrave à aquisição de habitação pelos jovens pouco ou nada concerne com os impostos a suportar, mas muito se relaciona com os rendimentos que não possuem para enfrentar um encargo de tamanha envergadura e com elevado grau de proporcionalidade quando comparado com os rendimentos.

Outra nuance que importa esclarecer aos dias que correm, consubstancia-se no entendimento e aceitação de que não são apenas os jovens que necessitam de casa. O fluxo habitacional tem aumentado e as famílias certamente possuem significativa representação, na maioria das vezes pela infelicidade de que não conseguirem prestar a contribuição que outrora cumpriam ou pelo aumento das taxas associadas aos créditos bancários.

Voltando aos jovens, os aqui mencionados não adiam somente a compra de um imóvel. Vão colocando em suspenso todo o seu processo de emancipação com o retardar da permanência em casa dos seus pais ou familiares, o que não lhes traz toda uma componente de desenvolvimento social e pessoal e, na maioria dos casos – aliado ao receio de arriscar que se motiva na incerteza económica – prejudica as perspetivas e os avanços profissionais pelo não agarrar das oportunidades longe das próprias zonas de conforto.

Manifesta-se determinante encarar a vigente crise de outra perspetiva, precisando tal de ser feito com diferente amplitude do tem vindo sendo executado. Encontra-se mais que evidente que a redução de impostos não nos levará a bom porto e mesmo que assim suceda – o que duvido – nunca será com a emergência requerida.

É fundamental aumentar o parque habitacional público português, que se estabelece como um dos menores da Europa, representando apenas 2% da habitação em território nacional.

Por sua vez, torna-se primordial usar do desertificado interior do país para combater a nefasta crise. A referida zona territorial meramente se vê desertificada de pessoas, existindo em todo o seu património mercado habitacional, claramente umas em melhores condições que outras, disponíveis para acolher todos os potenciais residentes.

Para que tal se concretize é imprescindível que se criem novas condições laborais por forma a motivar o fluxo de quadros técnicos para as cidades, vilas e aldeias que se distanciam do litoral.

O que se apresenta capaz de suceder com expressivos incentivos às empresas que para lá, verdadeiramente (e na mira de atenta fiscalização), se mobilizem e pela atribuição de nova preponderância ao regime de trabalho híbrido e teletrabalho, podendo começar por se exemplificar na função pública, ainda que de forma rotativa.

Governar é também alargar horizontes e ser-se hábil o suficiente para compreender que os problemas de um setor se podem resolver ou atenuar com a intervenção noutros, se a solução passasse exclusivamente por cortar impostos todos nós poderíamos ser Primeiro-Ministro.