É com frequência quase semanal que os meios de comunicação social nos confrontam com a existência de um novo caso de alegada corrupção nas esferas das autarquias locais, protagonizando-se em todo o território independentemente da cor partidária e até às mais despovoadas e isoladas autarquias.

A supra evidenciada exposição mediática, na qual se tratam as suspeitas e investigações como transitadas sentenças, provoca um efeito nefasto na reputação dos governantes e planta a semente da descrença nos eleitores, resultando a futuro no afastamento entre os cidadãos e a política.

Neste sentido, mostrar-se-á primordialmente pertinente diagnosticar o mal de que padecemos. Importando, desta forma, evidenciar o favorecimento, o nepotismo e a fraude fiscal, sem esquecer a problemática que se agiganta, objetivando-se na normalização destas práticas de índole criminal.

Estas constantes ocorrências não têm sido tratadas com a pertinência e rigor que merecem, sendo em parte significativa reduzidas a arma de arremesso político entre os partidos. A postura de apontar o dedo ao prevaricador e não apresentar uma solução, vem consolidando o quadro no qual – em prejuízo das res publica – se atribui superior importância aos benefícios políticos resultantes de cada escândalo.

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Embora nos situemos perante comportamentos enraizados e cuja exploração é do interesse de diversos agentes políticos, vivemos tempos que desesperam por uma alteração estrutural neste âmbito, por intermédio da qual se fomente a transparência autárquica.

A promoção de um canal de denúncia de atos de corrupção e infrações conexas, legalmente sustentada pelo Regime Geral da Prevenção da Corrupção (DL N.º 109-E/2021 de 9 de dezembro) aliado ao Regime Geral de Proteção do Denunciante de Infrações (lei n.º 93/2021), na expectativa de se transformar numa solução eficaz revela a ausência de sensibilidade quanto à realidade da temática e encobre a inexistência de medidas materiais nesta esfera.

Para o efeito, manifesta-se fulcral apostar na digitalização e disponibilização aos cidadãos – dentro do legalmente permitido – de todos os documentos que se consubstanciem de distinto interesse.

A atuação de autarquias que divulgam repetidamente nos portais oficiais o programa das festas, escusando-se por sua vez – em plena era digital – de contemplarem nas mencionadas páginas e sites qualquer informação respeitante às atas das reuniões, demonstram as contrariedades impostas pelo poder político.

Semelhantemente, o uso e contorno das normas de contratação pública de modo a, intencionalmente, criar benefícios e vantagens a terceiros afetam a sociedade de forma extensiva, estendendo-se pelas mais distintas ramificações.

Para que seja possível combater estes costumes verifica-se necessária a implementação de um quadro legislativo mais claro e vigilante a este respeito. Começando pela clara e inequívoca consagração do carácter excecional do regime simplificado do ajuste direto e limitando a escolha das entidades convidadas, podendo-se concretizar com o alargar do espectro que considera a entidades especialmente relacionadas patentes do n.º 6 do artigo 113.º do Código dos Contratos Públicos.

A digitalização e a revisão de particulares normas legais munem-se de indispensabilidade no desígnio de facilitar a atenção e intervenção das entidades fiscalizadoras, permitindo a efetiva identificação de práticas criminais e, simultaneamente, despoletando o receio de prevaricar nos agentes públicos.

A corrupção não é apenas uma via direta ao enriquecimento ilícito. No âmbito autárquico – e recordando a proximidade do ato eleitoral – transforma-se num mecanismo de garante eleitoral, sendo abusadamente usada como garante de vitórias.

Cada vez mais – principalmente no interior do país – são precisos agentes políticos que lutem pela valorização territorial e apresentem medidas neste sentido, enquanto os mencionados persistirem manobrando os instrumentos de corrupção e servindo-se do erário público para passarem o mandato em plena campanha eleitoral não desenvolveremos positivamente.