Nos idos tempos da “Década Perdida para a América Latina”, a de despótica oitenta, a malograda cantora brasileira, Elis Regina, em jeito patriótico, tal como impregnado na veia da generalidade dos “brasucas”, editava o seu inconfundível álbum “Saudade do Brasil”, em plena ditadura militar, onde denunciava de forma intrépida a corrupção político-social que mina(va) galopantemente o país na famosa canção “Alô, Alô, Marciano”. Desabafava na letra da referida música que o Brasil estava em guerra e “a crise tá virando zona”, apontando como causa deste descalabro “down the high society”.
O Brasil é grande, bonito, rico, demasiado populoso e com uma diversidade peculiar. Possui um clima tropical bastante atractivo a todos os níveis, paisagens formidáveis e pessoas deveras simpáticas. É um país onde há enormes assimetrias sociais, imperando resignadamente o nepotismo, o abuso, a marginalização, a descriminação, a injustiça, a corrupção, a pobreza e um alto índice de criminalidade urbana. Encerra paradoxos praticamente em tudo – tanto no bom como no mau sentido. Convive devotamente com Deus e concomitantemente com o Diabo. Por isso, incorpora no seu âmago o “Cristo Redentor” e, da mesma sorte, o esoterismo de umbanda, o espiritismo, a bruxaria, o candomblé e múltiplas outras perniciosas denominações do paganismo.
A crise actual que afecta dramaticamente o país é o manifesto reflexo de tais contradições. As elites políticas não estão a conseguir mobilizar a sociedade civil para as reformas estruturais prementes, com vista à dinamização definitiva do país para a senda do desenvolvimento sustentável e sustentado. As leis da República, em certos aspectos, são praticamente ineficazes. Os políticos estão completamente impunes e simultaneamente desprovidos da autoridade requerida para governar, tendo em conta os flagrantes casos de corrupção que têm surgido ao longo dos tempos. Há um patente divórcio entre os governantes e governados que, de certa forma, acaba por obstar decisivamente ao progresso nacional.
O Brasil tinha, em termos objectivos, tudo para ser um país bem-sucedido, próspero e uma potência mundial. Acontece que a realidade prática tem demonstrado o contrário, infelizmente, devido à miopia dos políticos e à fragilidade das instituições da República. E perante tudo isto, a pertinente questão que se coloca é: até quando mais o país continuará refém deste marasmo obstrutivo? Eis o grande mistério que nos interpela.