Vivemos tempos turbulentos. Primeiro tivemos a COVID-19, depois uma guerra no nosso continente, e agora uma crise energética sem precedentes que está a exercer uma enorme pressão sobre as nossas sociedades e as nossas economias. Poderá perguntar-se se este é o momento adequado para refletir sobre o futuro dos nossos sistemas de educação e formação. Responderei com uma palavra apenas: absolutamente.

Na verdade, os tempos de crise favorecem frequentemente a inovação e a criatividade, levando-as a prosperar e a levar a melhor sobre as rotinas enraizadas. Permitam-me dar um exemplo muito específico.

Na Europa, nos dois últimos anos, o setor das tecnologias educativas (EdTech) atingiu a maioridade. Por EdTech entenda-se a utilização de software e hardware nas salas de aula ou para a aprendizagem em tempo próprio: tabletes, ecrãs e programas interativos, kits de robótica, conteúdos em linha e plataformas. Tratam-se de novas formas de aprender e de multiplicar as iniciativas para percebermos qual é a melhor maneira de dar novos conhecimentos e competências a pessoas de todas as idades. Devido ao rápido desenvolvimento das tecnologias, isto apresenta-se em constante evolução.

Orgulho-me de partilhar convosco que, em 2021, a Europa teve um dos crescimentos mais rápidos na cena mundial da EdTech. A UE acolheu com orgulho o seu primeiro unicórnio EdTech, uma empresa privada avaliada em mais de mil milhões de dólares. E, em meados de 2022, o investimento total superou os 7,5 mil milhões de dólares[1].  O setor da EdTech demonstrou que as empresas solidárias e baseadas em valores são a marca da Europa. Desde o início de 2020, as empresas deste setor passaram a disponibilizar gratuitamente os seus serviços aos alunos, professores e pessoal educativo durante a pandemia. Voltaram a fazê-lo para os refugiados ucranianos. Por exemplo, a plataforma New Ukrainian Hub, que dá acesso a recursos educativos aos estudantes deslocados, é uma iniciativa cofinanciada pela UE que conta com todo o meu apoio.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Apesar deste arranque promissor, o setor da EdTech enfrenta uma série de desafios para consolidar a sua posição. A fragmentação entre os mercados e as culturas nacionais, ou a dificuldade em superar desafios na criação de parcerias eficazes com ministérios, escolas e universidades, são apenas alguns dos obstáculos que empreendedores do setor europeu da EdTech enfrentam atualmente.

Em julho de 2021, criei um grupo de empresas europeias de EdTech com o intuito de melhor compreender o setor e as suas necessidades. Durante as mesas redondas, trocámos experiências e explorámos possíveis novas formas de cooperação. Em resultado destes encontros, o setor chegou a acordo sobre uma visão comum para o seu futuro, apresentada durante o primeiro Fórum das partes interessadas na educação digital, organizado por mim em março de 2022. Congratulo-me com o apelo dessas empresas a que o setor da EdTech seja baseado em valores, inovador, escalável e capacitado enquanto motor essencial do ecossistema de educação digital da UE.

E acredito que chegou o momento para o setor agir com base nesta visão e produzir resultados. O primeiro passo, que é crucial, consiste em provar aos nossos professores e alunos a qualidade das soluções propostas pela EdTech. Para tal, a pedagogia e as necessidades dos alunos têm de ter prioridade sobre o sucesso comercial. As ferramentas de EdTech não são uma extensão da produtividade nem um software de entretenimento; a sua função consiste em melhorar os processos e os resultados no domínio da educação.

Embora eu acredite firmemente no potencial da EdTech, não espero que este setor jovem consiga evoluir sozinho. Tal como é salientado no nosso Plano de Ação para a Educação Digital, o avanço da educação digital europeia não deve ocorrer de forma isolada; precisamos da participação de todos os atores deste ecossistema. Foi por esta razão que lancei, com uma reunião no início de novembro, um segundo ciclo de mesas redondas com representantes do setor europeu da EdTech. Pela primeira vez, abordámos os temas da garantia da qualidade e da eficácia das parcerias público-privadas, e debatemos a forma como podemos enfrentar estes desafios em conjunto.

Permitam-me que partilhe algumas das minhas conclusões. Em primeiro lugar, ao desenvolverem os seus instrumentos, muitas empresas EdTech europeias começam a trabalhar em soluções com o objetivo de dar resposta às necessidades existentes, mas tendo também em conta os programas curriculares oficiais. É claro que também analisam o impacto das suas ferramentas, através do acompanhamento dos percursos dos licenciados, e que trabalham com investigadores para medir os objetivos de aprendizagem alcançados. É verdade que não é fácil reunir os mundos dos sistemas públicos de ensino e das empresas privadas, especialmente quando se trata de empresas em fase de arranque ou de PME, uma vez que tendem a funcionar de formas distintas. Assim sendo, há ainda que promover um ambiente de confiança, transparência e inovação.

Felizmente, existem boas práticas, como a criação conjunta, a colaboração contínua e a contratação pública orientada para as empresas em fase de arranque do setor EdTech. Embora tenham dimensões diferentes, estas boas práticas abrem caminho a parcerias contínuas.

É claro que abordar estes temas é essencial para avançar e congratulo-me com o compromisso das empresas de EdTech com as quais me reuni para o fazer. Existem histórias de sucesso, mas precisamos de uma abordagem mais coordenada e ambiciosa. E eu estou empenhada em ajudar.

Concretamente, com o programa Erasmus+, o programa emblemático da UE para a educação, iremos apoiar o setor pela primeira vez. No próximo ano, o convite à apresentação de propostas para os Projetos Orientados para o Futuro beneficiará os projetos que apresentem um quadro de garantia da qualidade baseado em dados concretos para soluções de EdTech e que formem parcerias público-privadas eficazes. Estas são oportunidades reais. O programa Horizonte Europa oferece oportunidades ao setor para aprofundar as suas soluções através do Conselho Europeu da Inovação e do Instituto Europeu de Inovação e Tecnologia.  Estes são pequenos passos a nível da UE, mas não há dúvida de que contribuem para a realização dos objetivos visados.

Convido agora o setor europeu da EdTech a implicar-se, a assumir as suas responsabilidades e a apoiar a transformação digital em curso nos domínios da educação e da formação. Estou confiante de que o seu espírito criativo e empresarial impulsionará a evolução futura da educação rumo à qualidade e à inclusão para todos.

[1] Ver Holon Global EdTech Funding 2022 — Half Year Update.