Um dos fatores que mais tem contribuído para esta elevação irracional, totalmente descontextualizada dos rendimentos das famílias e do crescimento do valor real do imobiliário, é o mecanismo de cálculo da remuneração dos agentes e agências imobiliárias.

Não ignoro que esta afirmação irá atrair uma dose de ódio e repulsa por parte de quem se movimenta ou vive desta actividade. E também não ignoro que — como sucedeu com o Alojamento Local (outro fator crítico) — muitas pessoas e famílias que perderam rendimentos, por via do desemprego ou do fecho de empresas, encontraram na intermediação imobiliária uma forma de continuarem a viver. Não acredito que isto deva mudar: o papel da intermediação imobiliária é válido e útil neste mercado.

Está errado, é profundamente injusto e resulta de uma cartelização efetiva (negociada ou não nos bastidores há muitos anos: nunca saberemos) é a fórmula de “prémio” ou rendimento por parte de agentes e agências imobiliárias. Com efeito, um dos fatores que mais contribuiu para o aumento do preço das casas desde 2009 foi o facto dos agentes e agências imobiliárias receberem à percentagem por um trabalho de custo fixo. O trabalho, promoção, quantidades de visitas e apoio burocrático é sensivelmente o mesmo, mas o valor da comissão por casa vendida depende mais do valor da habitação do que do trabalho desenvolvido na venda, porque o combinado é uma percentagem.

Esta comissão percentual parece ser atualmente de 5% em todos os agentes e agências enquanto que, no passado, era mais variável com agências cobrando 2, outras 3 e 5% (a Remax). O mesmo, aliás, ocorre com os arrendamentos, onde há alguns anos os agentes e agências cobravam uma renda como comissão percentual de 100% — novamente apesar de terem o mesmo trabalho e investimento fixo — mas onde agora (seguindo novamente o exemplo da Remax) todos cobram 150% (uma renda e meia). No caso das vendas de casa e nos arrendamentos, estamos perante uma distorção grave do mercado, porque existe um forte estímulo a que os agentes e agências inflacionem o mercado em vez de o racionalizarem.

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Para os interesses destes agentes e agências interessa que os preços continuem a aumentar, sempre, mesmo que não exista adição de valor ao imóvel através da construção de melhorias na envolvente, da realização de obras de reabilitação ou renovação na fração ou no condomínio. É claro que a dado ponto — e lá chegaremos — quando os preços chegarem a um certo nível e os nómadas digitais e os Vistos Gold acharem que os preços estão demasiado altos até para os seus rendimentos, a bolha irá estourar e aí, todos iremos perder: compradores, inquilinos, proprietários, senhorios e agentes e agências imobiliárias.

Atualmente, quanto mais os preços aumentam (sem geração de valor) mais ganham os agentes em valor absoluto. Por isso não têm estímulos a sugerirem aos seus clientes (que são — em última instância — quem define o preço apresentado ao mercado) um preço razoável e favorecem o aumento desbragado dos preços da habitação. Ou seja: têm todos os estímulos errados.

Na minha opinião os agentes e agências imobiliárias deviam auto-regular-se e aplicar concorrência entre si para que deixassem de cobrar comissões percentuais para passarem a cobrar valores absolutos para remuneração do seu papel na intermediação imobiliária. Este valor seria regulado pela concorrência do mercado em função da qualidade do serviço e do seu custo e não ser sempre o mesmo — fixo entre todos — de 5%. Ainda que se mantivesse, o cálculo percentual não é razoável. Contudo, dado que o atual sistema é tão generoso para os agentes imobiliários é altamente improvável que estes se auto-regulem e desçam a percentagem ou — idealmente — a transformem num valor fixo e tabelado por serviços prestados.

O governo da República pode, dado o fracasso da auto-regulação, do conservadorismo dos agentes e como forma de estancar a crise no imobiliário, fazer aquilo que já fazem alguns países e determinar uma comissão máxima: Suécia, Noruega, Dinamarca e Finlândia definem tetos máximos para as comissões. França, por seu lado, tem um código de conduta para agências imobiliárias que determina limites para as comissões, embora a negociação seja permitida dentro desses limites. Já a Itália tem legislação que estabelece um teto máximo para as comissões, mas a aplicação dessa lei pode variar dependendo da região para região.

Um mercado imobiliário com alta concorrência tende a ter comissões mais baixas, pois as agências competem por clientes. Nos EUA, a comissão é geralmente dividida entre o agente do comprador e o agente do vendedor, com cada um recebendo uma percentagem do valor da venda. A taxa total pode variar de 5% a 6%, mas é negociável e é frequente ser inferior a 5%. Mas no Reino Unido as comissões são geralmente pagas pelo vendedor e podem variar de 1% a 2% do valor do imóvel, embora taxas mais altas sejam comuns em áreas com alta procura. De sublinhar que, nos países nórdicos, as comissões tendem a ser mais baixas em comparação com outros países europeus, com taxas que podem variar de 1% a 2% e que, na Austrália as comissões são totalmente negociáveis e podem variar significativamente, dependendo do mercado local e dos serviços prestados. Em Portugal, há ainda que acrescentar que, no Algarve, as comissões chegam, em alguns casos, aos 10% sendo 8% normal. Nunca menos de 5%!

Considero que estas comissões foram as responsáveis pelo primeiro grande aumento dos preços após a crise de 2008 e que o valor “habitual” atual de 5% é absurdo, injusto e uma fonte de grandes e graves dificuldades para as famílias porque o valor é deduzido pelo vendedor no preço das casas e porque induz vendedores e agentes a praticarem preços cada vez mais altos.

Acredito que trabalho igual deve ter remuneração igual e não proporcional ao artigo vendido. Isto não acontece em mais nenhum ramo da economia. E que se trata de uma distorção grave criada pelo cartel (formal ou informal) das imobiliárias.

Dado o ponto a que chegou a crise imobiliária, parece-me urgente que o Governo legisle no sentido de seguir o exemplo dos países nórdicos e definir um teto para as comissões de intermediação imobiliária e para as de arrendamento (atualmente em 1,5 rendas).

É preciso também ter em conta que o IMT (Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis) deve deixar de variar de acordo com o valor do imóvel e a sua utilização (habitual, permanente ou arrendamento) dado que tem um efeito inflacionário a cada venda. Para compensar as autarquias pela perda dessa verba poderia aumentar-se o IMI (sobretudo no caso de segundas habitações). Na prática, tal como está, o IMT funciona tal como funcionam as comissões de 5%: em estímulos inversos ao controlo e travão da expansão da bolha imobiliária em Portugal. Não nos podemos também esquecer que quando o comprador paga IMT e Imposto de Selo, e percentagem à imobiliária, também terá que pagar impostos sobre impostos numa autêntica cascata fiscal que pode ser legal mas que, certamente, é profundamente injusta e contribui também para o aumento dos preços no sector imobiliário.