A Educação em Portugal está em risco. Tudo o que foi alcançado por uma política continuada por sucessivos governos em nome da qualidade da educação e da formação, através da aposta no conhecimento, da exigência e rigor, da transparência, da dignificação da relação aluno-professor-escola, está em vias de se perder. O que demorou décadas por tantos a ser construído está hoje, por preconceito ou capricho, a ser destruído.
A Sociedade sente um mal-estar com as dificuldades na educação: as Escolas veem os seus orçamentos de funcionamento decrescer pelo terceiro ano consecutivo; Professores envelhecidos, cansados de ser permanentemente chamados em mudanças de que não vêm melhorias e de expectativas goradas, são cada vez mais descrentes de Governos ou estruturas sindicais; Alunos e famílias tornaram-se cobaias de um experimentalismo centralmente iluminado, sem sustentação empírica, que certifica para as estatísticas e para a propaganda. Todas as recentes ações do Governo de alguma forma cerceiam o conhecimento, apelam ao facilitismo, nivelam por baixo, retiram efetiva liberdade e, ao fim e ao cabo, resumem-se no desinvestimento sistemático da Educação. O Governo, no seu zelo centralizante, cria situações de conflito entre os vários atores, de alunos a professores e funcionários, procurando desviar a atenção da opinião pública da sua ação para alvos fáceis, como têm sido “os casos” dos professores. Tem-se assistido na educação a uma governação errática e incompetente, mas sempre prepotente, que deliberadamente engana e subverte as normas, os acordos, as resoluções. Sacrifica-se o futuro do País em nome da manutenção da solução parlamentar que mantém o governo.
A recente decisão do governo em alterar o funcionamento e o papel dos conselhos de turma no processo de avaliação sumativa é exemplo acabado do desvario e desnorte do Governo e desta tutela, cujos membros orgulhosamente assumem que não gostam de ser avaliados e não gostam de avaliações. Fazem lembrar aqueles alunos que insistem com os professores para adiar o teste, adiar a correção do teste, adiar a comunicação da nota e, enfim, tentar assobiar para o ar o mais possível para evitar que a negativa seja revelada. Pois bem, este Governo já chumbou, mas como não há avaliações nesta pequena utopia, o melhor e o pior são iguais, passa tudo, menos o futuro do País.
Desde a primeira hora deste governo o sistema de avaliação externo foi sujeito a um ataque sem precedentes. Em menos de três anos regrediu-se 15 anos na política de avaliação externa em finais dos ciclos e foram introduzidas 6 alterações no sistema de avaliação externa sem qualquer sustentação. Em menos de três anos para além da instabilidade e imprevisibilidade a que condenou todo sistema, foi colocada em causa a idoneidade institucional do IAVE e o rigor dos exames com fraudes validadas pelo próprio Ministro da Educação, com provas que não garantem a justiça e a equidade entre alunos. Disto é exemplo a prova de Matemática A, deste ano, em que o IAVE, por orientação superior e sem sustentação empírica, decide: i) fazer uma única prova de Matemática A para alunos que seguiam programas diferentes; ii) alterar inusitadamente a estrutura da prova; iii) não apresentar uma prova-piloto; e por fim, iv) dar indicações aos corretores para a mesma aceitar duas respostas distintas.
Já em agosto foi a vez da avaliação interna, aquela que forma um juízo global sobre as aprendizagens desenvolvidas pelos alunos e da inteira responsabilidade das escolas. O Governo, para dar respaldo às decisões e orientações da Sra. Secretária de Estado, Alexandra Leitão, e supomos – mera suposição! – do próprio Ministro da Educação, decidiu agora desvalorizar o processo de avaliação e diminuir a seriedade e a responsabilidade que o ato de avaliar exige. De facto, até sexta- feira passada ninguém punha em causa que o Conselho de Turma consistia numa estrutura coordenadora e reguladora da avaliação, onde se decidia sobre o resultado, as potencialidades e os desafios a enfrentar pelo aluno depois de um debate criterioso entre todos os professores (e técnicos se necessário) que com ele trabalharam durante o ano. No final, as decisões tomadas (até à semana passada de forma ativa por todos, sem possibilidade de abstenção) são naturalmente atos que resultam de um Conselho que era visto como muito mais do que um órgão administrativo, antes como um colégio educativo.
A partir da decisão de sexta-feira, agora a decisão passa a ser tomada, qual mero ato administrativo, bastando a presença de um “quórum deliberativo” de 1/3 dos professores. Aquela que foi tomada pelo Governo como medida de exceção, não sem críticas, numa fase excecional, passou a ser a Lei. A desvalorização política da avaliação pelos atuais membros da tutela da educação é por demais evidente: a avaliação sumativa não é um mero ato administrativo, é muito mais que isso.
Este retrocesso, mais um, agora plasmado na Portaria 223-A /2018, de 3 de Agosto, vem subverter o que a própria tutela tinha estipulado no Despacho Normativo n.º 1-F/2016, já do atual secretário de Estado João Costa, na senda aliás da anterior Portaria n.º 243/2012. De resto, ao contrário do que é afirmado pelo próprio, não se trata de uma mera clarificação da natureza do órgão deliberativo temporário. Se o fosse, não teria tido a necessidade de recorrer em julho ao Colégio Arbitral para que fossem decretados serviços mínimos, em que ficou estabelecido (processo de Arbitragem dos Serviços Mínimos, n.º 7/2018/DRCT-ASM, através de acórdão arbitral datado de 26 de junho de 2018)que para o 9.º, 11.º e 12.º ano bastaria um quórum de ‘metade mais um’ dos professores da turma em causa, já que, de acordo com a legislação, estes momentos de avaliação só podiam acontecer na presença de todos os professores de turma. Se agora a tutela está apenas a clarificar, então como permitiu que este processo se arrastasse durante meses?
Na verdade, o que assistimos, e isso foi nítido em toda a atuação dos serviços centrais do Ministério da Educação, designadamente DGEsTE e IGEC, esta última agora reduzida a uma espécie de polícia política do Ministro, foi a uma tutela que, apesar da retórica, é prepotente, não lida bem com a crítica e que legisla ao sabor dos acontecimentos. Uma tutela que quando tem de escolher entre legitimar um erro ou valorizar um processo escolhe sempre legitimar o erro aproveitando, sempre que possível, para a desvalorização da avaliação.
Este é o Governo que temos: vai passando com negativa a tudo.
Deputada do PSD