Nos últimos anos, as greves nos transportes públicos tornaram-se um problema constante para quem vive e trabalha na região metropolitana de Lisboa. A cada nova paralisação dos comboios, do metro, dos autocarros ou dos barcos, milhares de cidadãos ficam sem alternativa para se deslocar, salvo aqueles que tenham carro próprio. Os trabalhadores possuem o direito à greve, mas é justo protestar enquanto se tira o direito de ir e vir de outros trabalhadores? É ético fazer de refém trabalhadores que nada têm a ver com as condições acordadas entre as empresas de transporte e os seus trabalhadores?
O transporte público é um serviço essencial para o deslocamento de milhares de trabalhadores entre casa e trabalho. Todos esses cidadãos estão a contar diariamente com determinadas rotas e horários para cumprirem os seus compromissos laborais, de estudo, de lazer e até mesmo de emergências. Além disso, uma grande parcela da população paga o passe mensal, ou seja, paga pelo serviço de transporte de um mês inteiro antecipadamente, estando a contar que durante esse mês pelo qual pagaram terão o serviço devidamente prestado. Quando um grupo, ao pensar apenas nos seus próprios interesses, decide deliberadamente recusar-se a prestar o serviço, só está a prejudicar aqueles que mais precisam.
Recentemente houve greve no metropolitano de Lisboa, marcada justamente para o horário de ponta da manhã, com a paralisação total do serviço nesse período. Nenhum serviço mínimo foi prestado, deixando aqueles que dependem do metro sem alternativa, a não ser esperar até mais tarde e chegar atrasado aos seus compromissos, tentar a sorte com os autocarros que já vão lotados em situações normais, ou caminhar por longas distâncias.
É verdade que o direito à greve é um direito do trabalhador garantido por lei, mas qual é o seu limite? Pode o direito de um pequeno grupo prejudicar a grande maioria sem que seja fornecida qualquer alternativa, atentando contra o direito de ir e vir e fazendo de refém pessoas que não têm qualquer culpa pelas relações entre empregadores e empregados das empresas de transporte? E também é absurda a alta periodicidade com que as greves têm ocorrido nos últimos anos. Não me parece nada ético. Pior ainda, quando a paralisação é total em horário de ponta, sem um comprometimento de serviços mínimos. Alguns que tenham condições chamarão um táxi ou Uber, desembolsando um valor não previsto para as deslocações mensais, sendo que dos 40 euros do passe mensal nenhuma compensação será paga pelo dia em que o serviço não foi prestado.
Se o objetivo fosse pressionar o empregador, um protesto válido seria circularem sem cobrar nem inspecionar as passagens, de forma que aqueles que não têm passe e usam esporadicamente não pagariam e a receita perdida faria com que o empresário tivesse interesse em evitar ou acabar o mais breve possível com a greve, interesse que não é tão relevante na paralisação dos serviços quando esses empresários não utilizam o transporte, enquanto os verdadeiros usuários são prejudicados.
Um protesto desse tipo não seria novidade. Em 2018, os trabalhadores da Ryobi Group, no Japão, anunciaram uma greve, mas não deixaram de prestar os serviços. Apenas deixaram de recolher dinheiro dos passageiros. Aliás, o Japão dá grandes exemplos ao mundo com a eficiência de seus transportes públicos. A pontualidade é levada rigorosamente a sério, tanto que até por atrasos de poucos segundos as empresas de transporte indemnizam os passageiros.
Precisamos com urgência de um projeto de lei que defina os transportes públicos como serviço essencial e que a obrigatoriedade de serviços mínimos esteja prevista na lei, principalmente e de modo mais alargado em horários de ponta.
Vale lembrar também que a greve é apenas um dos problemas. Atualmente, no metro de Lisboa, não se pode confiar na frequência de horários nem nas estimativas dos visores instalados nos cais. Isso porque quase que diariamente há “perturbações na linha”. Sim, numa linha em que só passam as carruagens do metro, numa frequência de 5 a 10 minutos, alegam perturbações. Fora a questão da sinalização, que avaria constantemente, também afetando a frequência entre comboios.
Por isso, a melhor maneira de fazer grandes deslocações, que não sejam viáveis a pé ou de bicicleta, é de carro particular. Ainda há o problema do trânsito, mas isso o autocarro e até o elétrico também enfrentam. Os semáforos das ruas são mais fiáveis que a sinalização do metro, além de que dificilmente haverá perturbações numa rua em que passe um carro a cada cinco minutos. E o condutor é você próprio, portanto, a não ser que deseje fazer greve da condução do seu carro, nunca mais será prejudicado com greves indesejadas. Compre um carro e liberte-se da escravidão do transporte público.