À segunda, cai quem quer. E os USA quiseram, querem, idolatram e entronizam Trump.

Ou mais de metade, pelo menos. Mais do que suficiente para que o exótico modelo eleitoral americano volte a abrir as portas da Casa Branca a este proto-herói, condenado e condenável em tantos aspetos.

Do lado de cá do Atlântico, com surpresa mal disfarçada e alguma arrogância olha-se para este fenómeno como um triunfo da boçalidade. Been there, done that. And will keep doing… Ainda que também haja telhados de vidro na velha Europa.

Enquanto isso, solidifica-se mais um acrónimo para o qual, modéstia à parte, reclamo já direitos de autor: os RUCKs (Rússia, USA, China e Korea), leia-se Really Upsetting and Challeging Kingdoms? Uma liga de países com lideranças… “musculadas” e tiques ditatoriais óbvios. Que relegam o conceito de democracia para um qualquer folclore desnecessário e descartável mediante as situações.

Mas este foi e é um ongoing project. No caso americano, teve ponto alto com a 1a eleição de Trump, após episódios agora light de agressividade, xenofobia e misoginia nunca antes vistos. Episódios que tomaram por assalto uma população que tem hoje – e por causa “dele” – um discurso, atitude e pensamento binário. O “nós” (vítimas perseguidas e injustiçadas) e o “eles” (pérfidas entidades e pessoas a combater). A necessidade, por isso, de identificar e eleger o herói que diz, faz, promete e ameaça tudo o que vai na alma da nação. Ainda que tal signifique mentir, manipular, ofender. Ainda que o cadastro seja negro. Ainda que, fora de portas, a figura de Trump embarace e crie desconforto e desconfiança até numa reunião de finalistas de relações internacionais. Ainda que.

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O que interessa é vender o ideal da America Great Again. Ainda que.

Saberemos para quem vai ser grande, novamente. Ou sempre. O fluxo corre sempre para o mesmo lado. E o american dream será, também ele, folclore para animar e distrair as “minorias”. Essas mesmo que, paulatinamente e surpreendentemente, ao longo da campanha, parecem ter cedido aos encantos do bully que ama (muito) mulheres, latinos (ou hispânicos?), negros, a bíblia e sobretudo os dólares. Tanto que deve milhões a financiadores desconhecidos. E é eleito, ainda que.

É certo que a democracia não é barata.

De resto, estas foram as eleições mais caras de sempre. Mas os custos de a não termos serão maiores, à falta de solução melhor.

É certo que a democracia começou e foi durante muito tempo, coisa de ricos e poderosos. Ter propriedades, ter conhecimento (saber ler e escrever), ser branco e NÃO ser mulher. Eis os filtros democráticos que nos serviram desde Atenas até praticamente aos nossos dias.

Custou muito afinar esses filtros e erguer democracias plenas. Em vidas e tempo. Não é preciso muito para que ela deixe de existir ou seja desvirtuada por oportunismos populistas que invadem capitólios, tribunais ou postos eleitorais. América dixit. Mas as mulheres do Irão ou os grupos LGBTQI+ da Rússia magister dixit. Ou melhor… já não têm o direito de dizer.

Oportunista ou não, o discurso de um personagem laranja, rico (ou ricamente endividado), privilegiado, casado com emigrantes, fértil e criativo nas ofensas, e ainda mais fértil nas mentiras é… Great Again. E um pouco por todos os Estados. Ao ponto de deixar os opositores acantonados em guetos intelectuais e citadinos, dizem algumas estatísticas. E há tanto mais para ver (e votar) nos USA para além das cidades cosmopolitas.

Oportunista ou não, o exemplo trumpista que teve cópias de ainda pior qualidade por esse mundo, não deveria levar-nos a olhar para a democracia como um mito urbano.

Para tal, o trabalho é, sempre, de formiga. Constante no tempo, abrangente no espaço e pluralista no destinatário.

Não podemos enredar em estratégias de aposta em swing states. A democracia é construída com todos e não apenas com estatísticas nos grupos ou regiões que nos são favoráveis e dão bons enquadramentos fotográficos e soundbites. A democracia merece mais.

Do alto da sala oval, teremos novamente um personagem surpreendente. Mas nesta edição temos um upgrade, e o Trump 2.0 traz consigo uma Inteligência Artificial que vai acoplar à sua entourage e Inteligência Comunicacional. Dupla perigosa.

Sabe Deus que América teremos. Que Ucrânia e Palestina.

Que NATO. Que Mundo.

Sabe Deus… e Elon Musk.