Quando a crise financeira de 2007 irrompeu, e perante a forte queda observada nos mercados financeiros, o Presidente da Reserva Federal procedeu a um corte severo nas taxas dos fed funds, assegurando liquidez ao mercado e encorajando (indiretamente) a tomada de risco por parte dos agentes económicos com o objetivo de estabilizar os mercados e estimular a economia.
A atuação da Reserva Federal, em linha com o que já tinha acontecido em crises anteriores (crash bolsista de 1987, crise das savings and loan, crise asiática, entre outras), e consubstanciada na disponibilização ao mercado de uma ampla liquidez, transmitiu aos investidores a ideia de que sempre que os mercados financeiros entram em crise a Reserva Federal adota uma política monetária expansionista de forma a garantir a recuperação dos mercados financeiros.
Este comportamento da Reserva Federal em 2007 foi designado de “Greenspan Put” e corresponde à ideia de que a Reserva federal dá aos investidores uma proteção (Opção de Venda/Put Option) sempre que os mercados entram em “turbulência” (Stiglitz considera que esta Put Option se traduz numa “privatização dos lucros e numa socialização das perdas”).
Vem isto a propósito da recente decisão do Conselho do Banco Central Europeu (BCE) de reduzir a taxa de juro da facilidade permanente de depósitos, de -0,40% para -0,50%, mantendo as taxas de juro aplicáveis às operações principais de refinanciamento e à facilidade permanente de cedência de liquidez em níveis historicamente baixos (0,00% e 0,25%, respetivamente), e de retomar, a
partir de novembro, o programa de compra de dívida (no valor de 20 mil milhões de euros ao mês).
Esta decisão ocorre num contexto em que as previsões de crescimento económico para a Europa são manifestamente desanimadoras, apesar dos instrumentos de política monetária terem sido
(quase) totalmente utilizados.
Nesta fase, e perante a aparente ineficácia da política monetária, importaria parar para pensar e para colocar algumas questões (Einstein (?) dizia que “loucura é querer resultados diferentes fazendo tudo exatamente igual”). Qual o efeito da atual política monetária na poupança das famílias? E no funcionamento do sistema bancário? E na perceção de risco dos agentes económicos? Quem nos garante que a atual medição da inflação é a mais adequada para efeitos de política monetária? Deverão os (crescentes) preços dos ativos financeiros e não financeiros (i.e., imóveis) ser considerados no cálculo da inflação para efeitos de política monetária?
Na ausência de respostas, e confrontados com as dificuldades visíveis do BCE, esperar-se-ia uma União Europeia preocupada com a situação “anémica” da Europa (i.e., modestas taxas de crescimento e riscos deflacionários iminentes).
Perante esta visível ausência preocupação, será que estaremos perante uma Draghi Put? Ou seja, será que os agentes políticos, perante a incapacidade em adotar medidas e reformas políticas que permitam dinamizar a economia europeia, refugiaram-se na ideia de que o BCE irá resolver todos os problemas?
Nesta como noutras matérias, “não há almoços à borla” (muito menos Put Options à borla!). Por isso mesmo, ninguém pode ficar descansado enquanto não nos disserem qual o custo que a
adoção (de forma prolongada) de uma política monetária desta natureza terá para o futuro da Europa e sem que nos garantam que não estamos, por analogia com a “Greenspan Put”, perante
uma “politização” dos lucros e uma socialização das perdas.
Professor universitário